Pronunciamentos

SR. MÁRCIO REZENDE FREITAS, Comentarista esportivo.

Discurso

Comenta o tema: “Aprimoramento da arbitragem de futebol: profissionalização e uso de tecnologia?”
Reunião 91ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 18ª legislatura, 1ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 28/11/2015
Página 73, Coluna 1
Evento II Ciclo de Debates Muda Futebol Brasileiro.
Assunto ESPORTE.
Observação No decorrer de seu pronunciamento, procede-se à exibicao de slides.

91ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 18ª LEGISLATURA, EM 10/11/2015

Palavras do Sr. Márcio Rezende Freitas

O Sr. Márcio Rezende Freitas - Obrigado. Boa tarde a todos. Cumprimento os membros da Mesa na pessoa do deputado João Leite, que foi um dos melhores bandeirinhas que tive quando eu apitava. Sempre que havia lançamento ele já levantava o braço.

O presidente – É verdade.

O Sr. Márcio Rezende Freitas – Lembra, João? É um prazer estar com vocês aqui. Agradeço o convite da Assembleia para participar deste ciclo de debates, que é muito importante. Esperamos que, ao final, com todas as apresentações, os objetivos possam efetivamente ser atingidos. Falaríamos de um tema, mas nos propuseram mais um. Então, peço um acréscimo de tempo, para dar conta dos dois temas.

O presidente – Três minutos.

O Sr. Márcio Rezende Freitas – O que é isso, João? Três minutos é tempo carimbado. Um no primeiro tempo e três no segundo. Aí não tem jeito.

No primeiro momento, chamaram a minha atenção as palavras do Prof. Júlio Garganta em relação ao talento. Conversamos agora há pouco. Ele disse uma frase marcante: “Tendemos a classificar como talentos os praticantes que não têm tempo para a prática”. Ao falar da profissionalização da arbitragem e da tecnologia, percebi que a arbitragem está com um problema sério, que o processo de profissionalização está lento. A arbitragem é álibi de tudo, principalmente no erro. Tentaremos cumprir o nosso tempo e mostrar algumas imagens a vocês.

Aqui vocês podem ver a foto dos 5% da Lei nº 12.867, que trata da regulamentação da profissão dos árbitros. Está havendo uma guerra, pois a presidente acabou tirando do escopo da lei 0,5% relativo ao direito de imagem dos árbitros. Os árbitros estão ali em cima. Essa foto que está fazendo 80 anos mostra os funcionários no topo de um arranha-céu, sem nenhum equipamento de proteção. Está igual à arbitragem, ou seja, sem proteção alguma.

É importante saber o que acontece com a arbitragem. Citarei alguns dados. É necessário profissionalizar a arbitragem? É a primeira pergunta. Sim, necessário. Agora, como funciona e como é feito isso? É só dinheiro? Obviamente não.

Vejamos a realidade no Brasil. Um árbitro Fifa recebe hoje algo em torno de R$3.675,00 por partida na Série A. Se for aspirante à Fifa, um degrau logo abaixo, recebe R$2.820,00. Nos dois casos, há uma diária única de R$500,00. Só que, se ele vai fazer um jogo na quarta-feira, viaja na terça, apita quarta e volta quinta. Se você fosse o chefe dele no trabalho – que ele tem de ter, para ser árbitro –, como você procederia se ficasse sem o seu funcionário por três dias? Ele vai viajar terça, apitar quarta e chegar quinta.

O árbitro Fifa apita aproximadamente – estamos trabalhando aqui com a elite do futebol brasileiro – de 35 a 40 partidas por ano, entre Campeonato Brasileiro, Copa do Brasil, os campeonatos regionais, o mineiro, aqui no nosso caso, e ele pode ganhar em torno de R$145.000,00 brutos por ano. Você pode pensar que é muito dinheiro dentro do contexto da economia brasileira. Vamos ver que não. No borderô do jogo, na hora, já são descontados 11% de INSS, 27,5% de Imposto de Renda e 2% da Associação Nacional de Árbitros, que é para ajudar o crescimento da associação, logística, questões administrativas etc.

Vamos fazer um comparativo aqui com outros órgãos no mundo. Por exemplo, futebol com a NBA. Na elite do basquete norte-americano também há quem ganhe R$3.700,00 por jogo, mas são os árbitros jovens, iniciantes na NBA. O valor, que é teto no Brasil, é o piso de árbitros novatos lá, ainda assim podem chegar a receber R$6.800,00 por jogo.

No segundo momento, na comparação com os árbitros experientes da NBA, os ganhos variam de R$10.000,00 a R$15.400,00 por jogo. Como a competição tem muito mais partidas que a Série A do Campeonato Brasileiro, os rendimentos anuais podem chegar de R$696.000,00 a R$1.900.000,00 para os veteranos.

Comparemos o nosso futebol com a Europa. No europeu, o salário que mais se aproxima dos brasileiros – está aqui o Prof. Júlio Garganta conosco e pode confirmar isso – é o pago em Portugal, onde os árbitros recebem algo em torno de R$4.500,00 por partida. Já no campeonato inglês o valor é mais ou menos idêntico, mas os árbitros profissionais têm um bônus na temporada em que estiverem atuando que varia de R$148.000,00 a R$162.000,00, de acordo com a experiência, vivência, número de jogos e uma série de coisas. Em todas as outras grandes ligas – vamos falar da Espanha, Alemanha, Itália, França –, os valores pagos estão bem acima do que o que é pago na Série A do futebol brasileiro. A Espanha paga hoje algo em torno de R$23.100,00 por jogo; Alemanha, R$13.800,00; Itália, R$13.100,00; França, R$10.600,00.

Vamos nos preocupar aqui agora, só para vermos o que acontece, só com o lado direito da tabela que está no telão. O Brasil é um país enorme, de dimensões continentais.

O campeonato paulista paga em torno de R$2.770,00; o carioca, em torno de R$2.800,00, mas, na final, de R$5.000,00 a R$7.500,00. No entanto, no Piauí, no Amazonas, no Mato Grosso há árbitro recebendo de R$300,00 a R$400,00 por jogo. O que é mais grave ainda, senhores: às vezes, não recebe. Vai para a competição com a taxa combinada antes da competição, no valor de R$300,00, R$400,00, R$500,00 que seja, apita e não recebe. Temos vários casos desses pelo Brasil. Cabe à Associação Nacional dos Árbitros de Futebol, que é a representante maior dos árbitros no Brasil, ajudá-los nesse aspecto, porque o árbitro, infelizmente, está abandonado em todos os sentidos.

As taxas praticadas no Brasil atualmente na Série A: R$3.675,00, Fifa; o aspirante, R$2.820,00; CBF-1, R$2.500,00; o da CBF-2 é estratificado, tipo um acesso em descenso, R$2.290,00; CBF-3, R$1.800,00; 4º arbitro, o árbitro assistente e reserva, R$480,00; O assistente, que é o bandeirinha, recebe metade da taxa do árbitro com quem ele estiver trabalhando, dentro dessa gradação também – se o assistente for Fifa, se for aspirante a Fifa, etc.

Existem inúmeros jogos. Há jogo para todo mundo. São vários campeonatos. Há Séries A, B, C, D, Copa do Brasil, Copa do Nordeste, agora deve ser lançada a Copa Sul Minas, Copa Verde no Centro-Oeste do País, Copa do Brasil de Futebol Feminino, Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino, Campeonato Sub-17, Sub-20, Campeonato Brasileiro Sub-20 e por aí vai. São 1.592 partidas por ano. Esses dados são da CBF. Foram escalados 7.960 árbitros.

O que vemos que acontece no futebol brasileiro? Sempre há dinheiro para tudo, mas, toda vez que vai se falar de arbitragem, acham a arbitragem cara. Historicamente vamos repetindo esse processo danoso em relação à arbitragem. A cobrança é violenta, mas o investimento é ínfimo.

Segundo a CBF, ela gastaria em torno de R$6.586.080,00 por ano mais o transporte aéreo ou terrestre dos árbitros para fazer as quatro séries do Campeonato Brasileiro. Nas Séries C ou D, o árbitro vai de carro ou de ônibus, pois não há transporte aéreo para ele. O árbitro é ser humano, é casado, normalmente tem um trabalho, tem filhos. Na parte da manhã, ele veste seu terno e gravata, sai trabalhar, trabalha 8, 10 horas por dia, volta para a casa e tem de dar assistência aos filhos e à mulher. Lá pelas 8 horas, 9 horas da noite ele vai correr, vai dar aquela corridinha e volta para a casa para começar tudo novamente no outro dia. Falta uma melhor preparação. É a busca do talento de que o Prof. Júlio Garganta falou.

Propus a ele e até o provoquei a Mesa para que comece um trabalho desse com a arbitragem. Ele me disse que já está fazendo isso em Portugal. Lá já há um árbitro trabalhando nisso com ele. Isso é muito importante. Temos de pescar – usando um termo dele – esses talentos também na arbitragem. Vocês podem não acreditar, mas há muito menino querendo ser árbitro de futebol – não procuram só ser jogador –, com todo o ônus dessa atividade, que não é profissão, é uma profissão votada. Agora vocês me perguntam: “Márcio, o que mudou nesses dois anos, pois a lei é de 2013?”. Vou responder: nada. Não mudou absolutamente nada. Continua a mesma coisa.

O óbice hoje é muito mais político que econômico e financeiro. Posso atestar isso a vocês. Se realmente não houver essa vontade política das federações e da CBF... A CBF ainda tem algo que facilita muito seu trabalho. Os árbitros não são da CBF, eles são das federações. Portanto, o ônus, o custo dessa profissionalização vai afetar somente as federações, não vai afetar a CBF. A CBF capta os árbitros durante o Campeonato Brasileiro nas federações, utiliza-os e depois os devolve para as federações.

Ainda há pouco falávamos do Brasil, e sabemos que 80% da Europa cabem dentro do nosso país. Há esse problema de logística, de distâncias, uma série de coisas que ainda acabam inviabilizando o processo.

O que mais causa espanto e assusta hoje as federações é quando se fala na profissionalização, porque se entende que essa profissionalização seria a carteira assinada, todos os direitos trabalhistas, a CLT, essa coisa toda. Primeiro, estamos em um país em que os encargos sobre a folha de pagamentos são os maiores do mundo, haja vista os impostos que pagamos também – poderíamos traçar essa analogia: INSS patronal, fundo de garantia, férias retorno. Poderíamos citar várias coisas que fazem parte desse arcabouço. Devido à elevada carga sobre a folha de pagamentos que atravanca a competitividade das empresas, o governo vem estudando, há algum tempo – não creio que isso hoje vá sair – a redução na contribuição do INSS de 20% para 14%. Mas estamos com fatores hoje – 85, 95, para chegar até 100 –, e creio que isso é natimorto, não mexerão, porque é preciso arrecadar, e não diminuirão neste momento.

Passamos por um processo, e Portugal também utilizou bastante isso, que é o sorteio. A MP nº 671/2015, recentemente aprovada pelo Congresso Nacional, estabelece, no art. 40 e no Estatuto do Torcedor, que é direito do torcedor que os árbitros de cada partida sejam escolhidos mediante sorteio, dentre aqueles previamente selecionados, ou audiência pública transmitida ao vivo pela rede mundial de computadores, sob pena de nulidade. O sorteio ou audiência pública serão realizados 48 horas antes do evento, em local e data previamente definidos, e o sorteio será aberto ao público para dar uma ampla divulgação e transparência a isso também, obviamente.

A introdução do instituto do sorteio da arbitragem público e transmitido pela internet é um avanço significativo no sentido de se obter transparência no processo, como já dissemos. Mas não é suficiente, porque não resolve uma questão primordial, que é essa formação, esse acompanhamento do árbitro, ter árbitros mais bem preparados, indicados para um jogo de acordo com o seu perfil. Em jogos mais difíceis, árbitros mais experientes; em jogos mais palatáveis, mais fáceis, pode-se usar um árbitro que ainda não é tão experiente. Esse jogo agregará ao seu currículo, ao seu cabedal essa experiência no transcorrer do tempo. E a formação e o aperfeiçoamento dos “profissionais” de arbitragem, profissionais aqui ainda entre aspas.

A Anaf. Algumas sugestões que já trabalhamos. Fui presidente da Associação Nacional dos Árbitros de Futebol – Anaf – por dois mandatos, e há essa nossa luta pelo reconhecimento da arbitragem como profissão. Vimos aqui, ainda há pouco, a professora falando também. Há um contexto muito profissional nos discursos que nos antecederam. Fiquei durante 25 anos na arbitragem, e vemos que a coisa é a mesma. Um quarto de século dentro de uma atividade e não se muda, a arbitragem continua amadora, numa cadeia em que os elos são cada vez mais profissionais. Não se vê o esforço efetivo para se mudar essa realidade. A Anaf propõe, na mudança do art. 32 do Estatuto do Torcedor, quase que a mesma coisa que lemos e que já está no texto de lei. Ela pede uma comissão de arbitragem autônoma, ou seja, não intramuros como acontece hoje na CBF, mas fora da CBF. Para mostrar que realmente deve haver... Porque isso aqui é profissionalismo também, não é só a carteira assinada, são os meios pelos quais vão-se qualificar, capacitar, auxiliar, treinar esses árbitros para que prestem um serviço de excelência. O que ela propõe? Isso já foi proposto. Uma comissão formada por cinco ex-árbitros, com pelo menos cinco anos de experiência de atuações em competições oficiais.

A indicação será de vários segmentos: associação dos clubes, que é parte muito interessada nisso; Sindicato dos Árbitros; Sindicato dos Atletas; Tribunal Desportivo e CBF. Cada um indicaria um ex-árbitro para compor essa comissão e fazer esse trabalho de cunho profissional.

Nas competições estaduais, a CBF seria substituída pela federação, e nas estaduais, quando fora da Federação, seria um representante da liga. A divulgação e a indicação continuam da mesma forma, previamente definidas, garantida a plena divulgação, transparência etc.

Continuando as sugestões, na teoria, ter a atividade reconhecida como profissão é muito bonito, mas, na prática, a realidade é bem diferente. Ouvimos o deputado dizer que deveríamos estar falando sobre os brasileiros, nada contra a seleção portuguesa, mas o futebol brasileiro tem de se modernizar, óbvio. E o futebol moderno, o brasileiro por consequência, é um grande negócio, movimenta bilhões de reais. Se antes os árbitros administravam paixões, na minha época, na época do João, hoje são milhões de dólares. Não pode mais o ser humano, amador, que trabalha fora, ir para o campo de futebol com toda pressão, com tudo que gira no entorno daquele estádio, dentro e fora, estar mal preparado. O João falava há pouco que viu um estudo de 300 campos na Alemanha. Não há um centro de treinamento no Brasil para os árbitros. Quando se usa, é a Granja Comary, da CBF. Levam os árbitros para lá e fazem um processo de final de semana, que não resolve nada, porque o trabalho deve ser contínuo e dinâmico. Os campos de futebol estão acabando, os árbitros amadores vão acabar por consequência. Eu joguei na várzea, joguei no Monte Azul, disputei Copa Itatiaia pelo Monte Azul. Vão acabar também.

Então, esse trabalho pode ser feito, tenho convicção plena disso, pelas federações e pela CBF. Recursos não faltam. É uma realidade palpável. A cobrança em cima dos árbitros é absurda e o retorno é desproporcional. O ideal seria poder dedicar-se exclusivamente à arbitragem. É o que os sindicatos e a Associação Nacional dos Árbitros buscam. Os resultados apresentados seriam bem melhores do que os atuais, tenho certeza disso também. Quanto mais se treina mais se dedica, e a pessoa só vai pensar no que está fazendo, produzindo melhor.

Já falamos de 0,5% no primeiro slide, essa participação que os árbitros estão buscando, pois é uma forma de investir na sua atividade. Isso também é profissionalização, melhoria de suas condições de trabalho.

Sugerimos, no primeiro momento, uma coisa mais embrionária, um processo que acontece na Associação de Futebol Argentino – AFA. Os árbitros Fifa – lá eles chamam de 1ª A, 1ª B do campeonato nacional da primeira divisão – têm um contrato com a AFA e dedicam três ou quatro dias da semana, 8 horas por dia, ao treinamento. Não é só a parte física, mas tomadas de decisão, pressão, trabalho psicológico muito grande, que é extremamente necessário. Eles recebem uma quantia fixa para dedicar esse tempo à AFA, mais a taxa dos jogos.

Outra sugestão é construir um grande centro de treinamento no Brasil para os árbitros, com sede a ser definida, mantido pela CBF, e reunir esses árbitros quinzenalmente, fazendo um trabalho efetivo.

Tudo isso seria viável, mas esbarramos em uma coisa básica: coragem. Não se tem coragem para realizar isso no Brasil. Aos gestores, muito se fala em investimento maciço na arbitragem, mas na prática isso não ocorre. A receita da CBF é enorme – ela deve ter hoje no mínimo 15 patrocinadores –, e isso poderia ser destinado à arbitragem. Para deixar um dado com vocês, o patrocínio estampado na camisa dos árbitros – na manga, no peito ou nas costas – vai para a CBF. É um dinheiro que deveria ser “uso e fonte”: se está nos árbitros, que seja investido nos árbitros, para sua qualificação, capacitação, etc.

A Associação Nacional dos Árbitros de Futebol – Anaf –, depois de tudo isso que rolou no Brasil pela regulamentação da profissão, tem tido muito mais voz e vez, e uma das coisas que ela está tentando fazer agora, que até já adiantamos um pouco, é modificar a seguinte situação: atualmente, quando os árbitros saem para apitar uma partida de futebol, eles não têm o dia abonado. Então, a Anaf está buscando modificar essa situação para ajudar os árbitros, porque isso tem prejudicado muito os árbitros que se ausentam do trabalho para apitar uma partida. Muitos estão repondo durante as férias e feriados os dias não trabalhados, para não correram o risco de ser demitidos. Para que isso não aconteça, estão trabalhando nas suas férias e em outros momentos em que poderiam estar com a família.

Deixo aqui algumas reflexões, algumas questões que ainda estão sendo trabalhadas e estudadas. Qual seria o salário ideal para uma dedicação exclusiva dos árbitros? Com a profissionalização e com o custo advindo dela, a quantidade de árbitros vai ser reduzida? Como os árbitros se reuniriam para os treinamentos e avaliações? Sobre isso, já demos uma sugestão há pouco. Qual seria a estrutura para se realizar essa atividade? Falamos de logística – campo, salas, instrutores para cuidar dos pilares físico, técnico, psicológico, etc? O árbitro faria o contrato por temporada? Ou seja, se foi mal na temporada que acabou, seria demitido? Isso é do contrato de trabalho: todos que trabalhamos, se não formos bem em nosso emprego, seremos demitidos para que outros entrem. Mas, em caso de demissão, o que faria o árbitro? Ele deixaria a sua atividade para ser apenas árbitro? Haveria uma legislação previdenciária especial para fins de aposentadoria? Pensaríamos em uma semiprofissionalização neste primeiro momento, contratando, por exemplo, uma empresa para a gestão de tudo isso? As árbitras e as árbitras assistentes, que hoje já têm pouquíssimas chances, seriam colocadas de lado? São reflexões em que temos de trabalhar e não podemos deixar de lado de maneira alguma.

Chegando ao final desta primeira parte, apresento uma breve conclusão. A profissionalização da arbitragem é necessária e urgente. Profissionalizar a arbitragem vai muito além da carteira assinada e dos direitos reconhecidos, como já dissemos. Passa, necessariamente pelo fair play em todos os sentidos e por condições dignas de trabalho. É preciso fazer um investimento de vulto na qualificação e na capacitação dos árbitros e parar com essa falácia de que o árbitro é profissional, porque ainda não é. Existem recursos para tudo na CBF e federações, mas, quando se trata da arbitragem, sempre existem óbices. Sabemos que não existe uma fórmula mágica para que os árbitros possam ter um trabalho de excelência; isso só será alcançado com muito investimento e esforço de todas as partes. Os dignos presidentes da CBF e federações deveriam acordar para o problema. Não podemos mais brincar de fazer arbitragem neste país.

Vemos aqui alguns documentos que a Anaf já encaminhou. Foram encaminhadas à CBF, por exemplo, entre outras, várias solicitações sobre passagens. O fato é que o árbitro não tem como modificar sua passagem; ele tem de cumprir a passagem emitida. Assim, às vezes o árbitro viaja dois dias antes de um jogo que vai acontecer em São Paulo. E ele tem de ir, porque, se mexer na passagem, vai pagar multa. Ele não pode mexer na passagem. São coisas que aconteceram e continuam acontecendo, e a Anaf tem trabalhado para mudar isso. E nossa mensagem final é que vamos chegar a um momento como o que vemos aqui: vamos caminhar para isso aí; ou melhor, já estamos caminhando. Sabemos que o tempo está curto, mas chegamos ao final desta primeira parte.

Pediram-nos e vamos, rapidamente, falar alguma coisa sobre o uso da tecnologia. É um projeto do Manoel Serapião, membro da Comissão de Arbitragem da CBF.

O futebol pondera que vale a pena aderir àquilo que é rotina em muitos outros esportes: o uso de vídeo e tecnologia em decisões da arbitragem. A Comissão Nacional de Clubes fez esse pedido à comissão de árbitros, ou seja, para que se usasse a tecnologia para resolver os problemas dos erros dos árbitros no campeonato nacional. A visão é quase unânime: há vantagens na parceria com a tecnologia, mas com ressalvas. Os próprios atletas – há aqui ex-atletas que poderiam falar sobre isso, e muito bem – lembram que o vídeo não elimina erros e questionam o risco de quebra da dinâmica do jogo, da paralisação do jogo para que se resolva aquele problema – e acho que até os torcedores também. Esse projeto da CBF fala basicamente que os benefícios seriam: menos paralisações – eu acho que não, pois se você paralisou o jogo para tomar uma decisão, a paralisação vai demandar tempo; mais gols, e todos legítimos; menos violência; menos lesões; menos simulações; menos punições; resultados legítimos; mudança filosófica; e ética plena. Os objetivos são: corrigir os erros de arbitragem em lances claros e indiscutíveis que possam alterar os resultados das partidas – gols, pênaltis, impedimentos e ações violentas; legitimar os resultados dos jogos; dar mais dinâmica e fluência ao futebol; diminuir a violência; diminuir a pressão sobre arbitragem; e uma evolução educacional dos jovens atletas.

Eles falam em inserir um árbitro de vídeo. É um árbitro que ficaria vendo o jogo aqui de cima, com toda a parafernália tecnológica, e havendo uma dúvida de um lance que não é de interpretação... A regra é interpretativa. Sobre todo fato existem sempre três pontos de vista: o meu, o seu e o correto. Então não nos esqueçamos disso.

Eu falava agora, na hora do almoço, sobre o lance no jogo entre Cruzeiro e São Paulo. Entre quatro comentaristas que são ex-árbitros e mais um menino que trabalhou no jogo, as opiniões são divididas. Estaríamos no Mineirão discutindo até agora sobre se foi pênalti ou não, e não chegaríamos a um consenso. Então, é preciso tomar muito cuidado com isso. Outra coisa: quem vai gerir e gerar as imagens? Quem vai gerir? A Fifa tem a HBS, que é a prestadora de serviço. Nós transmitimos a Copa do Mundo agora no Brasil e, se não vier o replay, não vem. Ninguém mete a mão num botão e fala: “Volte esse lance aí para ser comentado”. Não vem! Então só põem no ar aquilo que interessa, que não conflite, que não dê problema para a arbitragem. Quem vai gerir e gerar isso? Quem vai resolver?

A comunicação será feita por meio eletrônico. Esse é um projeto da CBF que estamos apresentando a vocês. Os lances aplicáveis seriam: dúvida sobre se a bola entrou ou não na meta; dúvida sobre se a bola saiu pela linha de meta, tiros livres, etc.

Os impedimentos. O árbitro de vídeo só atuará em lances de ganho de vantagem e interferência no adversário, quando o erro de arbitragem for claro, indiscutível – mas quando o erro é claro e indiscutível, é mais fácil de o assistente acertar; jogo brusco grave – seria uma agressão, uma conduta violenta. A própria CBF fala que essa tecnologia não evitará erros de arbitragem em lances que exijam interpretação. O processo pode ser iniciado imediatamente e sem necessidade de aparato tecnológico.

Bola em treinamento. Não atuar em lances cujas imagens não os elucidem. O árbitro de vídeo deverá ter conhecimento profundo das regras de futebol e muita prudência. Faz-se uma crítica àqueles que gostam da polêmica no futebol para não perder a graça.

Busquei a opinião do próprio torcedor, e ele fala que a tecnologia já é utilizada, mas esse tipo de coisa é que transforma o futebol no que ele é hoje. Acredita que, com a tecnologia, iríamos perder um pouco desse sentimento. Essa é fala de um torcedor, é a visão dele.

A Uefa é favorável. A Fifa é contrária, pelo conservadorismo, a tudo que vai nesse sentido. A CBF foi natimorta quando levou isso para a Fifa, para a International Football Association Board, porque a Board não aceita.

No basquete e no futebol americanos já é usado. O futuro. De repente, teremos o “Põe na tela”, ou seja, o Hawk-eye, que é aquele DAG, a linha do gol, se a bola entrou ou não. Tivemos isso em todos os estádios da Copa do Mundo. No entanto, assim que a Copa acabou, todos foram retirados. Ele é uma ajuda para a arbitragem. Segundo a CBF, o custo era muito alto, e retiraram tudo. Os árbitros já têm decidido por meio de bandeiras eletrônicas e sistema de comunicação.

O vídeo é totalmente justo? Não. A Fabi traz um exemplo disso no jogo da Alemanha com o Brasil no Grand Prix. A Alemanha disse que a jogadora brasileira havia tocado na bola, que havia acontecido o desvio no bloqueio, e a arbitragem deu ponto para o Brasil. Pediram o desafio. A arbitragem foi e olhou o vídeo: “Não, o ponto é do Brasil”. E de fato havia ocorrido o desvio. Então, são seres humanos. Aqui mostramos que alguns esportes já praticam isso, como o tênis, principalmente.

Para encerrar, trazemos algumas reflexões. A CBF trouxe isso no momento em que havia vários erros de arbitragem no Brasil. Então, é para um desvio de foco, ou seja, tirar o foco daquilo que estava acontecendo. Não há respaldo legal. Já perguntamos quem gerará as imagens e assumirá os custos. Aí sairemos de um parâmetro para outro. Em vez de os árbitros que estão no campo trabalhando no jogo serem questionados, o árbitro de vídeo é quem passará a ser questionado na decisão em que tomar utilizando o vídeo. A regra é interpretativa. Sempre teremos duas ou três opiniões diferentes. Esse problema da paralisação e da demora pode operar no ânimo do torcedor e fazer com que também se afaste do campo. Creio que, em algum momento, caminharemos para isso. Só que é preciso tomar muito cuidado, ter zelo e equidade para trabalhar com isso. Corri um pouco porque o tempo já está acabando. Já estou nos acréscimos. Obrigado a todos pela paciência. Foi um prazer estar com vocês.

– No decorrer de seu pronunciamento, procede-se à exibição de slides.