MILTON NOGUEIRA DA SILVA, Consultor Internacional do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Minas Gerais - CREA-MG
Discurso
Discursa sobre o tema: "O biodiesel em Minas Gerais e no Brasil:
perspectivas e entraves".
Reunião
24ª reunião ESPECIAL
Legislatura 15ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 31/05/2005
Página 65, Coluna 4
Evento Ciclo de Debates Biocombustíveis: Álcool e Biodiesel.
Assunto ENERGIA. AGROPECUÁRIA.
Legislatura 15ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 31/05/2005
Página 65, Coluna 4
Evento Ciclo de Debates Biocombustíveis: Álcool e Biodiesel.
Assunto ENERGIA. AGROPECUÁRIA.
24ª REUNIÃO ESPECIAL DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 15ª
LEGISLATURA, EM 23/5/2005
Palavras do Sr. Milton Nogueira da Silva
Agradeço ao Deputado Márcio Kangussu o convite e a excelente
reunião realizada pela manhã, que muito enriqueceu o tema. A minha
contribuição é pequena, pois vários pontos importantes -
institucionais, legais e econômicos - já foram tratados.
Salientarei a parte internacional do biocombustível, que não se
trata de um “commodity”, como a soja, o açúcar e o algodão, pois é
um combustível fluido; não é líquido nem gasoso. Como tal, ele é
uma das mercadorias estratégias dos séculos XX e XXI. Aconteceram
várias guerras no século XX em razão de combustíveis líquidos,
petróleo e gás natural. O biodiesel e o álcool devem ser vistos
como uma mercadoria internacional, de interesse estratégico, ou
seja, vai além das questões de preço, legislação e de cota de
mercado.
Em matéria de combustível líquido, os principais blocos
econômicos do mundo funcionam fechados. Essa é uma lição que não
podemos esquecer ao cuidar de biodiesel, seja em Montes Claros, no
Estado de Minas Gerais, seja no restante do Brasil. É uma
mercadoria de valor estratégico em todo o planeta.
Um dos aspectos do biocombustível de interesse de vários países é
a possibilidade de captação do CO2. Qualquer uma das plantas
halógenas, como a cana-de-açúcar, captam o gás carbônico da
atmosfera e o fixa. Surge assim uma grande contribuição, já
mencionada: a possibilidade de o biodiesel ser objeto de
negociação internacional e, a partir de agora, da ratificação do
Protocolo de Kyoto.
Ou seja, ele já tem uma cota de contribuição. Há a possibilidade
de todo produtor e consumidor negociar cotas de redução de gás
carbônico. Como isso funciona? A partir da ratificação do
Protocolo de Kyoto, foram criadas três ou quatro fórmulas de
negociação. Uma delas, que provavelmente será a mais influente no
caso do biocombustível, é o chamado mecanismo de desenvolvimento
limpo. O que significa isso? Uma espécie de câmara de compensação
de créditos. Se um país industrializado possui débitos de gás
carbônico enquanto outro em desenvolvimento possui créditos, faz-
se uma compensação de toneladas. Essa compensação é chamada de
mecanismo de desenvolvimento limpo. Funciona segundo a fórmula de
determinação de um fluxo produtivo, de um ciclo de produção, por
exemplo, do álcool ou do biodiesel.
Há a determinação do volume de gás carbônico a ser captado em
longo prazo, 20, 30 ou 50 anos. Uma vez determinado esse volume, a
tonelagem física - não me refiro ao valor econômico - é negociada
com o país signatário do Protocolo de Kyoto, que faz uma
compensação do volume, da tonelagem. Essa fórmula de negociação
exige a confecção de alguns projetos. Assim sendo, surge uma
dificuldade, pois essa fórmula de negociação ainda constitui uma
novidade em escala mundial. Há menos de dez anos, está sendo
feita; portanto, os métodos, apesar de existirem, ainda não estão
estabelecidos.
Em primeiro lugar, o detentor do crédito de carbono - a empresa,
a região, a cooperativa - deve possuir fórmulas institucionais,
legais e técnicas para garantir que a captação ocorra em longo
prazo. Em segundo lugar, a negociação deve ser avaliada por um
preço, pois é objeto de negociação entre o país que tem débito de
carbono e o que tem crédito. Em terceiro lugar, é preciso que essa
negociação seja supervisionada durante a negociação em si e,
depois, em longo prazo, promovendo-se um acompanhamento para que
todas as promessas de captação sejam executadas. Ou seja, existe
uma certificação.
Vale lembrar às universidades, aos centros de tecnologias e às
empresas líderes em tecnologia que não é qualquer tecnologia que é
elegível para esse crédito de carbono, mas apenas as tecnologias
já certificadas. Ou seja, os desenvolvedores de tecnologias, os
pesquisadores precisam se preocupar, desde o início, com a
preparação de formulários e com as demonstrações para que essa
tecnologia venha a ser certificada.
O mecanismo de desenvolvimento limpo, além de aplicar-se ao
biodiesel e ao álcool, aplica-se a muitos outros setores da
sociedade. Ou seja, aplica-se às florestas, ao metrô, entre
outros. Todavia, vou me concentrar no caso do álcool e do
biodiesel. A fórmula é de fácil execução. A empresa ou entidade
que detém o crédito formula e descreve sua tecnologia, seu ciclo
de vida, bem como a maneira que será implantada. Feito isso, a
proposta de projeto de crédito é certificada primeiro pelo Governo
brasileiro. Há uma Comissão Interministerial de Mudança Climática,
que conferirá, por meio de um balanço, se a tecnologia é realmente
captadora de gás carbônico. Depois, ela emite um certificado.
Feito isso, ela é submetida à convenção. Há um pequeno
departamento, em Bonn, na Alemanha, onde há uma certificação final
para que essa tecnologia seja objeto de crédito por um país da
lista 1 do Protocolo.
São duas formas de certificação. Uma vez obtida essa carta de
emissão certificada, as duas partes estão em condições de iniciar
a negociação. Ou seja, vai-se estabelecer preço, quantidade de gás
carbônico que será absorvido num certo período, quantidade de
combustível fóssil que será deslocada pelo uso de biodiesel ou de
álcool. Tudo isso entra nesse mesmo balanço. As duas partes,
aquela que tem débito de carbono e a que tem crédito, negociam o
preço e a forma. No final, essa negociação resulta em um contrato
internacional, que passa a vigorar.
No Brasil, existem muitas informações sobre o Protocolo de Kyoto,
citando as razões por que foi criado e os motivos pelos quais
certos países não aderiram a ele. Existem também muitas
informações sobre quais os setores da sociedade, da economia e da
agricultura são passíveis de negociação de crédito de carbono.
Parece que chegou a hora de esse método de preparação de projetos
de cálculo do balanço de gás carbônico e de energia serem
ampliados.
O CREA de Minas Gerais organizará, em agosto, um curso de
preparação de projetos para as entidades e empresas que queiram
formular seus próprios projetos. Muitas vezes a empresa ou
entidade quer, com a ajuda de consultores, deter o controle da
evolução do projeto e de todos os cálculos.
Em todas as discussões, seja no laboratório, seja na agricultura,
seja na fábrica, não podemos nos esquecer de um aspecto
fundamental: o combustível líquido é mercadoria muito especial e
estratégica no mundo de hoje. Já o era no passado, mas, a cada
dia, torna-se mais estratégico. Esse combustível não está baseado
apenas em preços e cotas, mas na geopolítica que vai muito além
disso, influindo na hegemonia e no controle de poder mundial.
Temos, no Brasil, uma Arábia Saudita: o biodiesel e o álcool.
Quanto a essa importância estratégica, chamo a atenção para o
papel desta ilustre Casa, que habilmente tem acompanhado várias
outras situações.
O CREA de Minas Gerais coloca-se à disposição para tomar parte
dos trabalhos dessa Comissão e trazer suas contribuições, como
sempre fez no Estado. Agradeço a qualidade das apresentações e dos
temas aqui abordados, assim como a profundidade com que foram
tratados. Muito obrigado.