Pronunciamentos

MARCO RÉGIS (PSB), Ex-Deputado Estadual-MG

Discurso

Comenta a realização do Ato "Assembléia pela Paz".
Reunião 13ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 15ª legislatura, 1ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 25/03/2003
Página 26, Coluna 4
Assunto DIREITOS HUMANOS. RELIGIÃO.

13ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 15ª LEGISLATURA, EM 20/3/2003 O Sr. Marco Régis - Sr. Presidente, Embaixador Musa Amer, Vereador Betinho Duarte, Bispo Ricardo Chambarelli, Carlos Calazans, Gilson Reis, Rubens Abdur, Deputados, imprensa, especialmente a TV Assembléia, tradutora Najwa, senhoras e senhores, paradoxalmente, sinto-me entristecido e embevecido por ocupar esta tribuna como ex-membro desta Casa - Deputado que, durante oito anos ou até antes disso, como Prefeito, tentou fazer da política um artesanato. Infelizmente, fazer esse tipo de política é difícil, e os meus praticamente 18 mil votos me alijaram do convívio dos novos companheiros e do corpo de funcionários desta egrégia Assembléia Legislativa. Estou entristecido e confesso para todos que, desde a perda da eleição e durante a transição para a nova legislatura, suportei estoicamente a nuança da derrota, porque democracia é alternância de poder e substituição de personalidades. Hoje, estava deprimido em minha casa, porque passei a noite acompanhando o noticiário das diversas redes de televisão nacionais e internacionais e, pela manhã, revi uma caixa de fotografias da Assembléia. Eis que, às 13h30min, recebi telefonema do gabinete do ilustre e nobre Deputado Rogério Correia, convidando-me para participar desta reunião. Da depressão, da tristeza pelos acontecimentos, surgiu um lado de embevecimento e de vaidade de minha parte por ter sido lembrado. Agradeço ao Deputado Mauri Torres, proficiente Presidente da Assembléia Legislativa de Minas Gerais, pela lembrança do meu nome para estar nesta Casa, nesta solenidade pela paz e contra a guerra no Iraque e todas as guerras. E ainda ao meu querido amigo e ex-companheiro da CPI do Narcotráfico, Deputado Rogério Correia. Isso me trouxe um lado positivo. Estava deprimido não pela derrota, mas pela falta de oportunidade para usar minha voz, como usei nesta Casa ininterruptamente durante oito anos, em dois mandatos consecutivos, uma voz quase como um samba de uma nota só, anti-americano, veemente, contundente. Poderia dizer que essa lembrança do Deputado, com a anuência do Presidente desta Casa, de me ceder este espaço é para mim uma satisfação, maior ainda por ser lembrado como um Deputado que construiu a sua vida política não só artesanalmente, mas também pela contundência e transparência do comportamento nesta Casa. Nunca peguei numa arma nem tive uma briga de rua em minha vida. Nunca levantei a mão para dar tapa em uma pessoa. Quando aqui cheguei, fui festejado não só por alguns companheiros como por membros da imprensa, dos jornais “O Tempo”, “Hoje em Dia” e “Estado de Minas” e da TV Assembléia. Disseram: esta reunião sem a sua presença seria uma falta para com a sua pessoa, pois ela tem a cara daquilo que V. Exa. defendeu nesta Casa durante oito anos de mandato. Isso me tirou da depressão. Fico feliz pela lembrança de que a minha trajetória possa ter sido marcada aqui pela posição firme. Eu, que nunca levantei a mão para dar um tapa em uma pessoa nem pus uma arma na mão nem por brincadeira, tenho uma trajetória às vezes interpretada como de homem violento. Certa feita, fui tachado por uma leitora do jornal “Estado de Minas” como a escória da sociedade de uma cidade perdida em algum canto de Minas Gerais. Que maldade com a minha cidade: a pequena Muzambinho! Cidade de 20 mil habitantes, berço da educação do Sul de Minas e de Minas Gerais, onde aprendi com os meus mestres até protestar contra a conquista do México por Cortés; a dos incas por Pizarro e, hoje, a do mundo pelos Estados Unidos da América. A Espanha que se aliou aos EUA é a mesma que destruiu as civilizações inca e asteca. O próprio Primeiro-Ministro José Barroso, de Portugal, que veio tirar uma fotografia na última hora, oportunista e ridícula, ao lado dos três senhores da guerra - Espanha, Inglaterra e EUA -, também teve na colonização portuguesa os seus pecados na destruição dos povos indígenas do nosso País. O que eu diria segundo a visão de mim como homem violento, a partir de meus discursos na Assembléia? Criei aqui expressões que estão contidas nos anais da Assembléia Legislativa, como “condomínio global antiamericano”, como “império do mal”, referindo-me aos Estados Unidos antes de chamarem Iraque, Coréia e Irã de “eixo do mal”. Tive a coragem de dizer aqui, em 1999, dois anos antes dos atentados terroristas de 11 de setembro, que Saddam Hussein e Osama Bin Laden eram heróis. Bin Laden só ficou tão conhecido depois do 11 de setembro. Por que defendia Bin Laden e Saddam Hussein? Não porque compactue com a ditadura, mas porque tinha que elogiá-los, defendê-los e exaltá-los por serem duas das poucas vozes ativas contra o império anglo-americano que se instala neste pós-guerra desde 1945. Dizia eu, e muitos oradores que nos antecederam disseram a mesma coisa: que Bin Laden é cria dos Estados Unidos na época da invasão soviética no Afeganistão. Saddam Hussein também é cria dos Estados Unidos no preparo de armas de destruição em massa, patrocinadas pelos Estados Unidos para a guerra contra o Irã, seu inimigo desde a revolução dos aiatolás. Na verdade, todos esses homens que eram amigos dos Estados Unidos se tornaram, de uma hora para outra, inimigos. Simbolizam, hoje, a luta da população mundial, que quase sempre é acomodada, amesquinhada, amalgamada aos interesses econômicos, aos interesses pessoais e nacionais. Essas personalidades têm a coragem de se rebelar contra os Estados Unidos. Com o tempo livre que me tem restado, achei nos meus guardados, em minha casa, exemplares dos jornais “Estado de Minas” e “O Tempo”, do dia 12/9/2001, onde eu dizia: Por que teria piedade de um país pelos ataques de 11 de setembro, tratando-se de um país que sempre foi impiedoso para com os outros? O “Estado de Minas” dizia: “Deputado defende atentados de 11 de setembro”. Não sou belicoso, sanguinário. Sou um pacifista, até porque minha profissão, a medicina, exige que exalte e eleve a vida como compromisso principal. Quando exaltamos figuras odiosas como Saddam Hussein, ditador em seu país e praticante de atrocidades; como Osama Bin Laden, com sua rede Al Qaeda, os exaltamos porque o mundo está carente de oposição desde que foi extinta a União Soviética e acabou a bipolaridade. A hegemonia dos Estados Unidos nos leva a situações como esta. Quando Prefeito de Muzambinho, quando da primeira invasão do Golfo Pérsico, em 1991, tive a oportunidade de estampar num trio elétrico, numa grande carreta da Prefeitura, simbologia que expressava a opinião do Prefeito. Pedi que se pintasse um demônio com chifres e rabo bem longos, para que o povo entendesse que era o diabo, com uma camiseta de basquete em que estava escrito USA, para que ficasse bem simbolizado que eram os Estados Unidos. Esse trio elétrico desfilou por várias cidades da minha região, levando música de carnaval, e era, já naquela época, o meu protesto contra a dominação dos Estados Unidos, dominação esta que foi o símbolo da minha campanha. Quando falava meu nome e número na campanha eleitoral, quatro palavras eram a mensagem contra a dominação dos Estados Unidos. Resta-me apenas agradecer a oportunidade de demonstrar que, durante oito anos, preguei o sentimento contra a dominação dos Estados Unidos. Sou a favor da paz, mas não vejo como conquistá-la acenando lenços e vestindo camisetas brancas. Precisamos de orações do Pastor Ricardo. Enquanto o Pastor Sérgio Miranda orava no Canal 23, os Estados Unidos bombardeavam Bagdá. Precisamos da oração do Papa João Paulo II, que passou a noite orando pela paz; de Chanceleres como Dominique Villepin, da França; Joschka Fischer, Alemanha, e Igor Ivanov, da Rússia, para baterem o pé e inverterem a situação. O ataque foi à revelia do direito internacional e da ONU. Se quisermos paz, uma comunidade pacífica, teremos de ter um organismo internacional que ouça todos, poderosos, emergentes ou fracos. Não podemos aceitar os Estados Unidos invadirem o Iraque. Minha simbologia é: hoje o Iraque, ontem, o Vietnã, a Líbia, Granada e a Coréia. E amanhã? O Brasil, a Amazônia? O ataque dos Estados Unidos ao Iraque, em nome do combate ao terrorismo, representa uma balela. Hoje é o Iraque, amanhã, a Coréia, possuidora de grande potência bélica e da bomba atômica, podendo atingir seu vizinho do Sul, parceiro importante dos Estados Unidos. Daí vêm os temores. Quem patrocinou todas as ditaduras depois da Segunda Guerra Mundial? Recentemente, o Embaixador Lincoln Gordon revelou agressões dos Estados Unidos ao Brasil, em caso de necessidade, no Golpe Militar de 1964. Os Estados Unidos, que patrocinaram Fujimori e Pinochet, querem devolver a democracia ao Iraque. Nestes dias, em que ainda estou sem uma atividade principal, tenho acompanhado, com sofrimento, as reuniões das Nações Unidas e visto a galhardia de países latino-americanos, como o México e o Chile, que não se entregaram, defendendo a posição da paz, e não da guerra. Eles são dois dos membros rotativos do Conselho de Segurança, que é formado de 15 membros, sendo 10 transitórios e 5 efetivos. Dos efetivos, apenas Estados Unidos e Inglaterra foram pela guerra, enquanto França, Rússia e China foram contrárias. Dos transitórios, além do Chile e do México, foram contrários Guiné, Angola, Camarões, Alemanha e Síria, enquanto Bulgária e Espanha foram favoráveis. Ao assistir às reuniões, pude perceber o esforço dos Embaixadores. Quero saudar o Embaixador do Iraque, que fez defesas veementes, e também Hans Blix e El Baradei, da Comissão Internacional de Energia Atômica, que tudo fizeram para evitar a guerra, mas que foram contidos em seus sonhos, já que os interesses dos Estados Unidos aqui enunciados pelo Embaixador Musa são mais importantes. Não é interessante um nova geopolítica para a região. O que lhes interessa é o petróleo e até a água do Tigre e do Eufrates, para não falar de outras riquezas milenares da região da Mesopotâmia, onde está o Iraque e que é berço da civilização, terra de Abraão, pai dos árabes, dos judeus e dos cristãos. Essa civilização, durante a guerra, será sensivelmente atingida. Quero lembrar que o inimigo de antes, o comunismo, tem agora seu lugar cedido para um outro, sem rosto: o terrorismo. E o terrorista do Estado de Israel, Ariel Sharon, que não se comove com as escavadeiras e tratores que passam sobre as casas de familiares de palestinos, parentes de mártires que tiveram a coragem de se imolar, perder suas vidas para fazer um atentado, única forma de manifestação que resta ao povo palestino, já tão humilhado e oprimido? Diante de tudo isso, só lhes resta perder a vida para, em um ato de desespero, mostrar o protesto de seu povo. Nos noticiários desta noite, foi dito que tudo isso só piorará a situação. A ONU tem que se reunir para sustar essa guerra. O Presidente Lula foi muito corajoso ao dizer que é contra a guerra e que Bush quer dominar o mundo. Quero parabenizá-lo e saudar a mudança de Governo no Brasil. É fundamental termos Presidentes como Lula, Ricardo Lagos e Vicente Fox, que tiveram a coragem de opor-se aos Estados Unidos, que hoje contam, na América, com asseclas como Uribe, da Colômbia, e os Presidentes de São Salvador e Nicarágua, os três únicos países sul-americanos que apóiam a guerra. Agradeço a oportunidade de manifestar meu pensamento e rememorar minha passagem pela Assembléia Legislativa, em cujos anais estão contidas minhas manifestações. Se queremos um mundo novo, um mundo de paz, temos de deter a guerra. Não basta ser contra, há que se agir, por meio de países como o Brasil, com importância econômica e populacional, apesar de sua fraqueza militar. Os países precisam se unir e reagir de forma concreta para impedir a guerra, senão a ONU não servirá para mais nada, e cada país terá o direito de se armar para não ficar à mercê do condomínio global do mal, encabeçado por Estados Unidos e Inglaterra. Que a paz venha a todos. Muito obrigado.