Pronunciamentos

MÁRCIO UTSCH, Diretor-Presidente da Empresa Alpargatas S.A.

Discurso

Agradece homenagem à Empresa Alpargatas S.A. pela instalação de sua nova fábrica no Município de Montes Claros.
Reunião 11ª reunião ESPECIAL
Legislatura 17ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 25/05/2013
Página 4, Coluna 1
Assunto CALENDÁRIO. INDÚSTRIA, COMÉRCIO E SERVIÇOS.
Proposições citadas RQS 2253 de 2013

11ª REUNIÃO ESPECIAL DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 17ª LEGISLATURA, EM 20/5/2013

Palavras do Sr. Márcio Utsch


Palavras do Sr. Márcio Utsch

Boa noite. Confesso que fiquei emocionado por receber esta homenagem em nome da Alpargatas, dos nossos 18 mil empregados, chegando a 20 mil agora, com os outros 2.250 que estão prestes a serem admitidos na nossa unidade de Montes Claros. De fato, fico bastante feliz e honrado por estar aqui. De alguma forma, quero tentar representar a Alpargatas, o que não é fácil. Teremos 20 mil pessoas daqui a pouco atuando em 86 países, sendo que temos operações próprias em 9 deles.

É muito interessante olhar a empresa de 2007 para cá. Começamos a produzir em três idiomas: português, inglês e espanhol. Isso demonstra o grau de internacionalização que estamos perseguindo. Daqui a pouco seremos globais, se Deus quiser.

Estão aqui comigo o Rui Porto, responsável pela área de comunicação, a Fernanda Miguel e a Cássia Navarro, que vieram participar deste evento comigo e o organizaram.

Cumprimento o Presidente da Casa, Deputado Dinis Pinheiro, e lhe agradeço a gentileza da recepção; agradeço aos Deputados Arlen Santiago e Jayro Lessa a iniciativa da homenagem feita para a Alpargatas e para mim. Cumprimento ainda o Gil Pereira, aqui representando não somente o Nordeste, mas também o Governador Anastasia, que me ligou na sexta-feira, juntamente à Secretária Dorothea Werneck, para dizer que estão viajando hoje para buscar mais empresas para Minas Gerais. Espero que tenham sucesso. Fiquei muito feliz e honrado com a ligação deles ao explicarem o motivo pelo qual não poderiam estar presentes. Também cumprimento a Desembargadora Márcia e todas as pessoas presentes, meus amigos, minhas amigas. Também se encontram aqui meus familiares, irmãos, irmãs, sobrinhas, os familiares da Sílvia, minha querida mulher, que não está mais entre nós. Agradeço muito a vocês todos por tudo isso.

A Alpargatas foi fundada em 1907 aqui no Brasil, tendo aberto o seu capital em 1913. Nunca mais o fechou. No dia 24 de abril completamos 100 anos de capital aberto. Nesse período passamos por várias crises, troca de moedas, intempéries sérias, guerras econômicas, séries tributárias. Mas a empresa cresceu bastante de lá para cá e construiu um pouco o que na época era futuro e hoje é presente. Nos últimos 10 anos de capital aberto, ou seja, de 2003 a 2013, a Alpargatas se valorizou em 1.561%. Isso significa que, se você tivesse comprado uma ação da empresa aplicando R$1,00, teria hoje R$1.561,00. No mesmo intervalo de tempo, a valorização do Ibovespa, índice que mede a variação da Bolsa em termos pontuais, foi de 178%. Isso mostra a pujança da Alpargatas, o time que temos, as pessoas brilhantes que trabalham na empresa. Enquanto estou aqui falando, muitos estão trabalhando e produzindo sandálias pelo Brasil afora, fazendo-nos crescer ainda mais.

Às vezes as pessoas confundem a Alpargatas, a Alpargatas S.A., o Grupo Alpargatas. Mas a empresa é uma só: Alpargatas S.A., e o CNPJ é único. Há várias marcas, todas da mesma companhia, que tenho a honra de presidir. Nossa principal marca é a Havaianas, que representa cerca de 50% do nosso negócio. Ela partiu de uma série que fez 50 anos no ano passado. Ela é de 1962. Nesse período, fez uma história bonita. Depois, começou a perder valor em 1995, 1997, quando iniciamos a fase de reconstrução da marca. Às vezes, recordar é viver. O tempo passa muito rápido. Nos últimos 15 anos, o mundo mudou bastante. Se olharmos o mapa da Europa, veremos quantos países desapareceram, quantos foram criados. Naquela época, a propaganda era estrelada pelo Chico Anísio. Numa das últimas campanhas, ele aparecia na mídia impressa, em revistas, com um revólver e a seguinte frase: “Recusa as fajutas. Legítimas, só Havaianas”. Imaginem uma propaganda com revólver hoje. Certamente ela seria banida, e com justa razão. Não se faz isso mais.

De fato, as coisas evoluíram muito. Naquela época, cantávamos “atirei o pau no gato, mas o gato não morreu. Dona Chica admirou-se com o berro que o gato deu”. Era uma covardia com o pobre do gato. Ensinávamos as pessoas que era “legal” ser assim. De fato, evoluímos bastante na forma de fazer e de pensar. Essa foi uma evolução muito prezada por nós na Alpargatas. De lá para cá, construímos a marca Havaianas e adquirimos outra empresa, a Companhia Brasileira de Sandálias - CBS -, a marca Dupé, completando um pilar de marcas, que são as marcas de calçados de moda, representados por Havaianas e Dupé, que é uma marca de entrada.

O segundo pilar de sustentação da companhia, em termos de produto, é representado pelas marcas de artigos esportivos. Temos Rainha e Topper, duas marcas muito tradicionais no Brasil. A Topper é mais focada no futebol, e a Rainha é mais focada no passeio, chamado de “run active”, que é um esporte, uma forma de caminhar e passar certo tempo curtindo a vida com a marca Rainha. Depois, temos a Timberland, uma marca americana da qual temos a licença de produção, distribuição e fabricação no Brasil, e a Mizuno, uma marca japonesa de tênis muito conhecida. Temos a licença, relativa à América Latina inteira, desde o México até a Patagônia, para produção local, distribuição e “marketing”. Até aí são dois pilares: Havaianas e Dupé, calçados de moda; Rainha, Topper, Mizuno e Timberland, um pilar de sustentação de calçados e materiais esportivos.

Recentemente fizemos aquisição da Osklen, uma marca de luxo chamada de “new look bryant”, um segmento diferente que se propaga a partir do Brasil. Não é uma marca de luxo como a Gucci, a Dolce & Gabbana, mas é uma marca que, se compararmos internacionalmente, parece-se com a Prada, que é uma marca de luxo, mas de um produto que não aparece muito, que não tem muita lantejoula e brilho. É uma marca muito internacionalizável, que tem uma grande participação de calçados em seu bojo. São marcas importantes, são três grandes pilares.

Temos, como apoio, uma marca de calçados profissionais, que é a Sete Léguas. O nosso maior comprador, o Ivan, está nos ouvindo. Temos também a nossa rede de varejo “outlet”, que é um “megashopping”, onde temos uma grande ferramenta de utilização de risco. Indústria é correr risco, lançar moda nova e produtos novos. Sempre que há um erro, quando um produto vende menos, quando não acertamos no modelo, o “megashopping” é nossa válvula de escape. Podemos, aí, sim, vender esse produto controlando o movimento da marca para que não haja uma deterioração da forma de vendê-lo. Portanto, evita que ele cause algum efeito nefasto na concepção da marca e a mantém sob controle.

Já houve vários motivos para pensarmos muito no varejo, e hoje temos uma área de varejo muito poderosa. Temos hoje, aproximadamente - porque crescemos em todas semanas em torno de mais 10, 12 pontos de venda -, 600 lojas e um pouco menos da metade no Hemisfério Norte. São lojas no Reino Unido, na França, na Itália, em Portugal, na Espanha, nos Estados Unidos, na Argentina e no Brasil. Todas essas lojas têm uma função muito importante, que é mostrar o posicionamento da marca Havaianas. Essas lojas são o único lugar a que chegamos e conseguimos encontrar todos os produtos Alpargatas. Fora isso, a participação delas, em termos de negócio, é pequena. Somando todas elas, é menos do que 1% do nosso negócio, mas há uma participação grande em termos de mostrar o que são as marcas da Alpargatas, especialmente, nesse caso, a marca Havaianas.

Há também as lojas da Timberland, lojas virtuais de todas as nossas marcas. Mas o principal mesmo no nosso negócio de varejo são as Lojas Havaianas e, agora, a Osklen, que tem uma rede de varejo muito consistente no Brasil, onde há um espaço grande para expandir um pouco mais no exterior.

Quero dividir alguns números com vocês, porque são importantes. Como disse o Deputado, no ano passado faturamos, em receita bruta, R$3.700.000.000,00. Digo que é receita bruta porque a forma de tributação internacional é diferente da local, portanto podemos ter os dois números, a receita bruta e a receita líquida, em torno desse valor.

No ano passado nossa produção chegou ao recorde de mais ou menos 11 pares por segundo. Não armazenamos produtos, portanto produzimos 11 pares por segundo e vendemos 11 pares por segundo, somando todas as nossas marcas. Se incluirmos peças de vestuário, como as meias, e não somente os tênis, chegaremos a quase 14 unidades por segundo. A produção é feita 24 horas por dia. Enquanto estamos falando aqui, mais produtos são produzidos, e temos que vendê-los.

Temos operação própria em nove países. Além do Brasil, estamos presentes no Hemisfério Norte, com uma grande operação em Nova York, nos Estados Unidos, e com uma área de distribuição em Columbia Ohio. Na Europa temos um grande escritório em Madri; uma área de distribuição em Marselha, na França; escritórios em Londres, em Paris, em Bolonha, em Madri e em Lisboa. Temos também lojas em várias cidades como Roma, Milão, Valência e outras.

Além disso, na Argentina e no Uruguai, temos também operações próprias, somando com o Brasil. Nos demais países onde estamos presentes, temos contratos com distribuidores locais. Fora do Brasil fazemos a gestão desses produtos com esses distribuidores.

A nossa grande distribuição no Brasil é feita por meio do segmento atacado. Geraldo Caixeta, um dos grandes distribuidores de Havaianas pelo Brasil afora e nosso amigo querido, veio nos prestigiar no dia de hoje.

No ano passado, a nossa receita foi de 68% em reais e 32% em outras moedas, especialmente dólar e euro - aliás, completando os 100% da nossa receita.

Quanto às fábricas que temos no Brasil e no exterior, basicamente a Argentina é um polo produtor muito forte. Possuímos plantas onde fazemos produção também na China, no Vietnã e na Indonésia. No entanto não são ativos nossos, mas alugados fora do Brasil. A nossa produção forte se encontra no Brasil, e agora está se iniciando em Minas Gerais.

É importante também notar a quantidade de empresas e negócios que fizemos. De 2007 para cá, compramos ou vendemos 17 empresas. Na verdade, vendemos a divisão Locomotiva, que era um pedaço da Alpargatas, as marcas Pampero e Palette. Agora compramos a Dupé, a nossa antiga mãe que originou a Alpargatas na Argentina - aliás, um tipo de incesto, pois a compramos de volta - e a Osklen. Obtivemos outras aquisições na Europa e nos EUA. Assim ocorreram 10 aquisições e 3 desinvestimentos, totalizando, portanto, 13 operações de compra e venda de empresas. Ganhamos certa musculatura para alçar voos mais altos, como os internacionais, que nos permitam obter, de fato, uma qualidade de receita e sustentabilidade maior.

Quanto à sustentabilidade, temos também o Instituto Alpargatas, que é o nosso braço social e hoje cuida de 416 mil crianças, adolescentes e jovens abaixo de 26 anos. Às vezes derrubamos ou só reformamos as escolas mais carentes - aliás, já são 309 escolas construídas ou reformadas por nós. A maioria delas está no Estado da Paraíba onde é a nossa grande base, mas há também no Rio Grande do Norte, em Pernambuco e em outros lugares. Além das 416 mil crianças assistidas, há 2 mil professores preparados e treinados. Nessas escolas entramos com dois programas. Um deles é o Topper de Educação por Meio do Esporte. A Topper é uma das nossas marcas e patrocina essa educação. Há também um programa pós-escola. Mesmo que a criança não esteja no horário escolar - pode ser de manhã, se estuda à noite; ou de noite, se estuda de manhã -, ela possui atividades na escola para que não fique à toa pela rua afora.

Pela Associação de Pais e Mestres nas cidades onde nos encontramos, há um trabalho grande de ocupação desses espaços, como nos finais de semana, usando-os para tornar a comunidade um pouco mais conhecida entre si e criando elos e vínculos mais fortes para que se desenvolva não só com as crianças nas escolas, mas também com os pais fora do período escolar.

Em Montes Claros, estamos entrando agora. A nossa produção básica será de havaianas. Na verdade, a fábrica possui uma tecnologia que denominamos de expansão de borracha, ou seja, ela expande borracha. Para que os senhores tenham uma ideia, pensem no pneu de um carro. Se pusermos nele mil libras, não aumentará de tamanho, apenas explodirá porque não tem flexibilidade alguma. Se calçarmos um sapato feito de borracha, ocorre o contrário, tanto encolhe quanto estica, pois tem flexibilidade total.

Então, por acréscimo de aditivos químicos, altera-se propriedade de expansão, retenção, cola, durabilidade. Esse processo recebe uma série de aditivos químicos até o seu final. É uma sandália absolutamente confortável. No caso de Havaianas, unimos esse conforto corporal - aliás, é confortável e gostosa de usar - com um conforto intelectual. É bom pensar que, quando a calçamos, estamos nos sentindo bem, está bacana e na moda. Pode-se passear no melhor “shopping” da cidade e no bairro mais bacana que estará bem-vestido, calçando bem um par de Havaianas. Certamente as pessoas hoje fazem coleção. Antigamente, se a deixássemos na praia, ninguém a roubava e, quando retornávamos, ela estava lá. Hoje, se a esquecermos, não mais a encontraremos, pois já foi roubada. Isso porque deixou de ser um produto “commodity” para ser um produto de desejo. Antigamente pensávamos assim: “Passa lá e compra para mim um par 36 ou 40 ou o tamanho que seja”. A pessoa a comprava porque era uma encomenda, um calçado utilitário. No entanto hoje ela quer ir à loja para experimentar, sentir a sensação de usá-la e ver a cor que combina, especialmente as mulheres, com o biquíni. De fato, houve uma evolução bastante grande do posicionamento da marca. Isso nos levou à necessidade de expandir a fabricação.

Eu pessoalmente fechei várias fábricas que tivemos pelo Brasil afora, para concentrar a produção nas nossas atuais, porque, quanto mais fábricas se tem, mais improdutivas elas são, mais custos fixos há para pagar. Então, por que estamos abrindo uma fábrica em Montes Claros? A resposta vem da seguinte questão: quanto mais se concentra a partir de um certo tamanho, mais se cria risco, seja ele de uma parada, seja de um acidente, seja de um incidente. Pode acontecer de uma enchente arrebentar a ponte e ninguém acessar a fábrica pela estrada, pode arrebentar o fornecimento de gás, pode acontecer a interrupção de energia elétrica, enfim, correm-se vários riscos ao se concentrar tudo em uma fábrica. Essa foi a razão que nos levou a pensar em outra fábrica.

A escolha do lugar de uma nova fábrica se iniciou por volta de 2010. Pesquisamos vários países. No final, tínhamos China, Índia, Romênia e Honduras como países mais candidatos à produção, onde havia um custo mais próximo ao do Brasil. Desses países, o mais apropriado seria a China, onde haveria uma redução de 8% no custo de produção em relação ao do Brasil. Obviamente não iríamos abrir uma fábrica na China por causa de 8% a menos no custo, bastaria o governo mudar a taxa de câmbio e esse custo passaria a ser 8% mais caro. Isso não fazia sentido. Então, resolvemos que a fábrica seria no Brasil. Para ser no Brasil, além do motivo financeiro e econômico, há também o motivo de percepção do valor da marca, que talvez seja um dos principais. Em uma pesquisa que fizemos fora do Brasil com sete países, havia uma restrição muito grande à Havaianas que não fossem “made in Brasil”, havia uma restrição à compra, que chegava até a 40% na França. Nesse país crescia a rejeição a uma Havaiana com “made in” que não fosse Brasil. De fato, as pessoas gostavam, como continuam a gostar - se Deus quiser, vai continuar ainda por muito tempo - e a valorizar muito o espírito do Brasil, a brasilidade, que não é só samba, futebol e carnaval. Temos de valorizar a criatividade e a inventividade do povo brasileiro e levar isso à frente através de um produto que é um símbolo disso. As pessoas elegeram, e nós trabalhamos para isso, a marca Havaianas. Além do motivo econômico e financeiro, havia também o motivo da aceitação do produto “made in Brasil” muito mais que “made in qualquer outro lugar”.

Decidido que a fábrica seria no Brasil, começamos então a analisar o melhor Estado para colocá-la. De fato, como disse o Deputado Arlen, o Governador Anastasia e a Secretária Dorothea Werneck foram fundamentais para que essa escolha recaísse sobre Minas Gerais. Não é porque nasci aqui, sou de Conceição do Mato Dentro, de onde gosto muito e sinto orgulho, embora vá lá muito menos do que gostaria. Foi por critérios absolutamente técnicos. Qualquer pessoa no meu lugar também teria escolhido Minas Gerais, independentemente de ter nascido ou não aqui. Mas fiquei muito feliz por ser uma escolha totalmente técnica, embora contasse com minha torcida no silêncio da noite. Não podia falar, mas torcia para que Minas Gerais fosse o Estado escolhido, acabou sendo, o que foi muito bom. Uma vez escolhida Minas Gerais, havia de ser escolhida a cidade onde se localizaria a fábrica. Em outra batalha muito grande, levou-se em consideração o tamanho dela, a mão de obra disponível, a formação das pessoas, o nível de capacidade de operação, de educação, educação motora. Viviane Sena dizia: “Há educação em que o povo sabe ler, mas não sabe o que fazer. Na educação motora, a pessoa lê e consegue interpretar. Infelizmente ainda há um grande contingente de pessoas que têm educação, mas não têm educação motora, leem, mas não sabem interpretar o que leram, não sabem executar as instruções a partir do que foi lido”. E Montes Claros reúne bem todas essas condições. Houve também uma receptividade muito grande por parte do poder público local, do Prefeito Ruy e do seu antecessor.

Estamos prestes a inaugurar a fábrica. Estou convicto de não há escolha melhor do que Montes Claros. A cidade é muito bacana, nossa recepção foi maravilhosa, tanto por parte da população quanto do poder público. De maneira geral, o ambiente que foi criado para a fábrica é um ambiente muito favorável, o que nos faz crer a toda a hora que, se tivéssemos pensado 10 vezes, a escolha teria recaído sobre Montes Claros, porque foi muito acertada. Montes Claros é uma cidade grande, comporta bem uma fábrica do nosso porte, já há outras indústrias na cidade. Também ela está em uma linha bastante interessante para nós: é a cidade mais ao sul da Sudene. A Sudene, vocês sabem, pega o Norte de Minas. E Montes Claros é a cidade mais ao sul ainda dentro da área da Sudene, o que nos favorece. Somos uma empresa lucrativa e queremos continuar sendo. E a Sudene concede um incentivo fiscal no Imposto de Renda às empresas que praticam inovação comprovada.

Então, para nós isso é muito “bacana”. Acho que formamos uma relação muito forte com a cidade, o Prefeito e todas as pessoas. Já aprendi que, quanto melhor o vínculo, maior a solução de conflitos. Se você falar mal de alguma coisa de que você não goste, de alguma marca, também dirá: isso não acontece com a marca que eu gosto. Se falarem mal de uma Havaianas, dirá que ela não dá defeito; se falarem mal de um Mercedes, dirá que Mercedes não quebra. Então, há, de fato, um vínculo muito forte. Quanto maior esse vínculo, melhor a solução de conflitos. Tenho a impressão de que estamos indo certo também nessa direção de criar vínculos fortes para que consigamos, de fato, ter em Montes Claros uma base não só para a instalação agora, mas também uma base para o futuro.

Penso que há uma questão muito importante. Devemos parar de ter só a crença e começar a pensar o que é verdade ou não. A crença é um paradigma. Você pode crer em Deus. Ou você acredita ou não. A crença é sua. Você pode crer ou não. Depende daquilo em que você acredita, mas a verdade não é assim. A verdade pode ser sim ou não. Então, estando em Montes Claros, creio que estamos pela verdade. É o sim, mesmo. Estamos lá não porque achamos que é bom nem porque sou mineiro. Estamos lá porque, de fato, a cidade reúne as condições necessárias para o crescimento e a expansão da nossa atividade. É muito “bacana” vermos uma fábrica como a que instalamos em Montes Claros, uma fábrica absolutamente moderna. Dizia, antes da reunião, que, se analisarmos a fábrica de Montes Claros comparando-a com a nossa fábrica atual, só reconhecemos que ela é uma fábrica de Havaianas em dois lugares: no almoxarifado, onde começa tudo, e no armazém de produtos acabados, onde termina tudo. O meio da fábrica é absolutamente diferente.

Creio muito no Instituto Alpargatas, que tem a preocupação social de educar as pessoas. Creio muito nisso, creio que apenas e tão somente a educação, em longo prazo, poderá resolver o problema das nações. Podemos ver isso no caso da Coreia do Sul e de países hiperdesenvolvidos, como a Alemanha. Nesses países a educação fala alto. Estamos fazendo a nossa parte ou tentando fazer com essas 416 mil pessoas atingidas pelo nosso instituto, mas também há de se pensar na parte ambiental. A nossa fábrica tem um viés ambiental muito forte. Temos preocupações, desde a captura de energia solar. Teremos lá um papa-vento enorme de energia eólica. Vamos capturar energia do vento e energia solar. Também vamos utilizar, de maneira consistente, a iluminação natural. A fábrica, durante o dia, não precisará ligar luz porque terá uma iluminação natural suficientemente forte para fazer frente às necessidades.

É uma fábrica que também tem soluções muito interessantes, pois é muito verticalizada. Há uma parte da fábrica com 28m de altura. Imaginem que 28m é um prédio de sete ou oito andares. Se quem mora no oitavo andar olhar para baixo verá que essa é a altura de uma parte da fábrica. Por quê? Porque, ao movimentar carga no sentido vertical, descendo, você consome muito menos energia do que sair andando com ela pelo chão afora. Então, o almoxarifado da fábrica solta o produto e ele sobe em elevadores de imã, onde haverá um imã do outro lado. Se você coloca 1.174kg de um lado, ele gera exatamente o mesmo peso em imã. Portanto, uma criança faz assim com o cabo, e o elevador sobe, é neutro. Então, essa matéria-prima chega ao alto e começa a descer por gravidade, em oito andares, até chegar embaixo, onde ela começa a andar um pouco mais. Então, esse galpão tem menos área de metragem quadrada, porém mais área cúbica, porque cresce bastante a fim de também utilizar o fator ambiental. Há um menor consumo de energia e água. Os circuitos são todos selados. Então, temos essa grande preocupação.

Também em Montes Claros teremos o museu dos calçados, na entrada da fábrica, para que a sociedade local possa conhecer um pouco a história das Alpargatas, de onde viemos, onde estamos e para onde queremos ir. Haverá também uma sala de aulas, onde queremos fomentar a ideia para que as pessoas e as escolas locais possam ir e dar três, quatro ou cinco dias de aulas dentro da fábrica. Também haverá na fábrica uma passarela por onde as pessoas poderão passar e ver a mulher, o marido, o filho, a filha, a amante, enfim, quem quiser. Ou seja, verão as pessoas trabalhando por essa passarela superior na fabrica. Também as crianças poderão participar, sair da escola com total segurança e andar sobre a fábrica, vendo o que se passa e como se faz o produto e se transforma borracha em estado bruto para um produto acabado.

Finalmente, quero dizer a vocês que para mim é uma honra muito grande, mais uma vez, estar aqui representando a Alpargatas e os nossos 20 mil empregados pelo Brasil afora. Creio muito que devemos nos preocupar com a formação das pessoas. Sinceramente, não tenho nenhuma ambição de deixar o mundo melhor para meus filhos, e isso pode parecer chocante. Prefiro deixar filhos melhores para o mundo. Então, nessa preocupação que tenho, acho que devemos mesmo trabalhar na educação, cuidando das pessoas para que, de fato, sejam cada vez melhores. Às vezes, não conseguimos tomar conta de tudo que devemos. Às vezes, as coisas saem da nossa mão e perdemos um pouco a direção. Aí não podemos desanimar nunca, porque, em uma indústria desse tamanho e envergadura e com toda essa pujança, é importante ter em mente que, ainda que as coisas não funcionem bem ao princípio, funcionarão bem ao final. Devemos manter sempre a mão firme. Não podemos controlar a direção do vento, não dá para controlar, mas podemos controlar a direção da vela e cuidar para fazer com que o nosso barco chegue ao lugar que queremos, ainda que o vento esteja contra.

Então são pontos importantes, e acho que devemos prezar e cuidar muito para que isso aconteça.

Nada vem de graça. Na Alpargatas temos por lema que, quanto mais se trabalha, mais sorte se dá, não existe sorte sem trabalho. Podemos até ter um pouco de sorte, mas ela precisa ser lastreada por um trabalho forte. Pablo Picasso foi o artista que mais produziu em todos os tempos - há de ter um que produza mais do que ele, mas ainda não houve até agora - e, ao ser entrevistado em Paris, a sua segunda terra natal, perguntaram-lhe por que produziu tanto, qual era o segredo. Ele respondeu que o segredo era a inspiração, pois era um artista, e que, quando a inspiração vem, ela tem que encontrar o artista trabalhando. Então, quando a inspiração chegar, se não estivermos trabalhando ou dispostos a trabalhar, ela passará e ficaremos esperando, sendo um grande inspirador e nada realizador. Isso é muito importante, precisamos estar sempre atentos a esse ensinamento do mestre Picasso, pois nos trouxe algumas coisas importantes e que até hoje fazem com que paremos e pensemos que esses princípios estão contidos na indústria.

Sempre procuramos construir a Alpargatas lastreada em três pilares muito importantes. Primeiro, ter um balanço forte. A empresa deve ter um balanço sustentável, não acredito em empresa que não gere caixa, não acredito em empresa que tenha medo de gerar caixa, não acredito em empresa que tenha vergonha de dizer que é lucrativa. A empresa tem de ter lucro e, cada vez mais, saber usar corretamente essa rentabilidade para reinvestir e crescer cada vez mais. O crescimento consistente no País é por investimento em estrutura e infraestrutura. Um crescimento gerado somente por algumas promoções e produtos, seja preço, seja imposto, certamente não levará o País para a frente. É preciso investir, e a opção de investir no Brasil passa por aí. E, para investir, a empresa precisa ter caixa, lucro. Uma empresa sem caixa não vai ter lucro.

A empresa precisa gerar resultado, e para isso tem de ter gente muito boa e brilhante. Pessoas brilhantes podem construir uma empresa brilhante, pessoas medíocres vão construir uma empresa medíocre. Então temos de fazer seleções muito boas de pessoas, cuidar para que essas pessoas cheguem e saibam o que tem de ser feito, entendam exatamente o que é para ser feito e que façam isso com motivação e alegria para poder construir essa empresa com balanço muito forte, com estrutura de capital bastante forte, permitindo fazer aquisições e crescer pelo mundo afora.

O segundo pilar em uma empresa como a Alpargatas é “marketing”, produto, comunicação. Se eu trabalhasse na CSN, talvez não fosse tão importante, mas em uma empresa como a Alpargatas, de bens de consumo, o “marketing”, o conhecimento das marcas e dos produtos é absolutamente relevante. Deve ser comunicado o que há de bom e de ruim, deve-se falar sempre a verdade para que as pessoas conheçam e tenham consistência do que sabem fazer. Esse é um segredo nosso, saber comunicar bem, e não só em termos de produtos, mas também internamente. Levamos a imagem daquilo que queremos fazer. Quando você coloca o pé em uma havaianas, está colocando o pé onde? Em um sapato? Não. A ideia é que esteja colocando no sonho, naquilo que você pensou que pode ser confortável, bonito, legal, e que as pessoas vão elogiá-lo, vão gostar de você, que você vai se sentir bem e seguro utilizando aquilo. Portanto o pilar de comunicação, produto e “marketing” é muito importante.

O terceiro pilar são as pessoas. Se tiver uma boa marca e um bom caixa, mas não tiver pessoas boas, vai perder as dois primeiros. Portanto o mais importante que tudo é ter gente boa, gente brilhante, gente que tenha muito brilho nos olhos, que possa trabalhar fortemente. E algumas coisas são importantes. Não contrato ninguém pensando no que faz, mas pelo brilho nos olhos. Se os olhos brilham, contrate e coloque para dentro, porque a pessoa vai dar certo em algum lugar. Às vezes é um grande técnico, mas os olhos não brilham, as atitudes não falam mais alto que as palavras. Pelo contrário, as atitudes têm de falar tão alto, a ponto de não conseguirmos ouvir as palavras do entrevistado. A pessoa sabe o que quer, sabe o que está fazendo, sabe para onde quer ir. É esse tipo de gente que queremos trazer para a Alpargatas, e isso não vamos encontrar no currículo. Eu nunca vi um currículo ruim, todos os que li até hoje são de pessoas que fizeram, lideraram, transformaram, aumentaram, cresceram, etc. Não tem um currículo que fale de alguma derrota, todos os currículos são de vencedores. Outro lugar onde só tem gente boa é no cemitério, onde não tem uma placa dizendo “aqui jaz um advogado ou um médico ruim”, mas só pessoas boas. Então, se procurar no currículo, só vamos encontrar pessoas boas, quando na verdade nem sempre o são, e do cemitério ninguém sai. Portanto precisamos ter muito talento para ir atrás dessas pessoas, para construir um time de 18 mil ou 20 mil pessoas que possam adicionar coisas que nem sempre quem não têm essa capacidade pode construir.

É importante ver uma empresa em que às vezes o sujeito trabalha na área de contabilidade e diz “eu sou da contabilidade, logo, não entendo de recursos humanos”, e o outro fala “sou da área de finanças, logo sou contra 'marketing'”. Se sou de vendas, logo sou contra produção. Para mim, essas são gigantescas bobagens, quase como se fosse uma ode à própria ignorância que a pessoa tem, porque, se você trabalha em “marketing” e não entende de gente, passe a entender de gente para saber sobre as duas coisas. Se você trabalha em recursos humanos e não entende de contabilidade, que tal entendê-la para tornar sua carreira mais flexível? Se você é de finanças e odeia “marketing”, que tal entender de “marketing”, ou vice-versa? Quanto mais holistas as pessoas forem, maior capacidade terão de crescer, e a empresa crescerá junto. Não tem jeito. Sempre que se contrata um profissional, é inexorável que a pessoa venha junto. Não dá para contratar um profissional e deixar a pessoa em casa. Os dois vêm juntos, um acompanha o outro. Às vezes a pessoa chega ao trabalho brava, chateada, ou chega em casa brava com a empresa, e isso é normal. Antigamente falávamos que, quando se chegava em casa, virava-se a chave. A chave do trabalho é essa, e a da vida pessoal, a outra. Isso não acontece. Antigamente, quando havia o vinil, tinha o lado A e o lado B. Comprava-se o disco do Roberto Carlos, o lado A tinha cinco ou seis músicas e o lado B outras cinco ou seis. Comprei muitos. Hoje isso não existe mais. As pessoas não são mais lado A ou lado B. As pessoas são lado único. Hoje é DVD, um lado só, e o “pen drive” nem se sabe de que lado se está colocando; onde encaixar funciona. Quanto mais pessoas conseguimos com esse perfil, com essa capacidade, melhor será a performance da empresa. São essas as pessoas que buscamos em Montes Claros. Boa parte já foi admitida, mas ainda faltam muitas para completar o nosso quadro. Portanto a empresa lastreada com bom caixa, boa capacidade de balanço e boa capacidade de “marketing”, produto e comunicação e com um time de pessoas brilhantes crescerá cada vez mais. Que nossos 106 anos de vida e os 100 anos de capital aberto que trouxemos até aqui sejam a base para outros ainda melhores. Não sei se estarei aqui em 100 anos, talvez não, mas espero que sim. Se não estiver, espero que quem estiver pense que alguém veio aqui e construiu uma companhia, uma empresa que de fato cresceu. Esse alguém não sou eu; esse alguém são nossos quase 20 mil empregados.

Obrigado a todos. Desculpem a longa exposição, mas achei oportuno falar da empresa e de como pensamos, uma vez que chegamos agora em Montes Claros e em Minas Gerais com uma nova planta, o que torna importante informar dados e a forma de ver e gerir a empresa. Obrigadíssimo a vocês todos.