Pronunciamentos

JÚLIO SOARES DE MOURA NETO, Almirante de Esquadra. Comandante da Marinha.

Discurso

Homenagem à Marinha do Brasil.
Reunião 10ª reunião ESPECIAL
Legislatura 16ª legislatura, 2ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 09/04/2008
Página 42, Coluna 2
Assunto CALENDÁRIO. SEGURANÇA PÚBLICA.

10ª REUNIÃO ESPECIAL DA 2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 16ª LEGISLATURA, EM 4/4/2008 Palavras do Almirante-de-Esquadra Júlio Soares de Moura Neto Exmos. Srs. Deputado Doutor Viana, Presidente em exercício da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais; minha querida Arminda Soares de Moura Lins, em nome de quem saúdo toda a família originada do Dr. Raul, e seus irmãos, a família Soares de Moura, Chama, Solero, Cunha; Alte.-Esq. Álvaro Augusto Dias Monteiro, Comandante-Geral do Corpo de Fuzileiros Navais; V.-Alte. Gilberto Max Roffé Hischfeld, Comandante do Primeiro Distrito Naval; Gen.- Div. José Mário Facioli, Comandante da 4ª Região Militar do Exército; Maj.-Brig.-Ar Antônio Franciscangelis Neto, Comandante do Ciaar; Conselheiro Eduardo Carone Costa; Vereador Totó Teixeira; e, com muito prazer, o autor do requerimento que deu origem a esta solenidade, meu pleito de agradecimento ao Exmo. Sr. Deputado João Leite. Antes de iniciar o texto que preparei, gostaria de dizer duas palavras inicialmente ao Deputado João Leite e ao Presidente da Assembléia, que fizeram referências extremamente elogiosas à Marinha. A Marinha, que é do Brasil, passa por um momento muito virtuoso. Nossa luta tem sido um patamar orçamentário melhor, nossa luta tem sido a aprovação do Programa de Reaparelhamento nos aspectos citados aqui, nossa luta tem sido o término do Programa Nuclear da Marinha e, no futuro, a construção do submarino de propulsão nuclear. Digo que é um momento muito favorável porque, desde o ano passado - aliás, desde 2005 -, iniciamos a retomada dos patamares orçamentários. Isso ocorreu em 2006 e, em 2007, fez- se presente não só para a Marinha como também para o Exército e a Força Aérea. As Forças Armadas conseguiram produzir resultados melhores em face de seus orçamentos cada vez melhores. O nosso programa de reaparelhamento também está em discussão no governo. Já estamos autorizados a cumprir algumas metas. Com a ida do Presidente Lula a Aramar, ao nosso Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo, os ventos passaram a soprar favoravelmente, e o Programa Nuclear da Marinha terá continuação. Esse programa abre um espaço muito grande para o País, pois visa ao domínio da tecnologia nuclear, que produzirá um reator e uma planta nuclear de energia elétrica, que poderá servir tanto para defesa, movimentando um submarino, quanto poderá produzir energia elétrica para acender a luz de uma cidade. Então, é muito importante. Agradeço todas as citações feitas à Marinha, ao programa de reaparelhamento, ao orçamento e ao Programa Nuclear. A Marinha deseja apenas estar pronta para cumprir a sua missão, conforme dito aqui, que é garantir a soberania e os interesse do Brasil nas suas águas jurisdicionais, que não são pequenas - são 4.500.000m² a serem protegidos. Muito obrigado, Sr. Presidente e Deputado João Leite. É com emoção que compareço a esta Reunião Especial da Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais, dedicada a homenagear a Marinha do Brasil e a reverenciar a memória do Dr. Raul Soares de Moura, ex-Governador deste Estado e ex-Ministro da Marinha. É importante dizer a V. Exas. que à Marinha do Brasil e aos homens do mar é muito caro confluirmos para essas homenagens e elas se realizarem na Assembléia parlamentar das alterosas. As bordas de Minas não se deitam diretamente sobre o oceano, mas em tudo, e sempre, o mar se faz entre os mineiros. Quiçá haverá quem consiga desvendar a magia que leva os habitantes das Gerais, que um dia foram Mar Bambuí, aos sonhos e às nostalgias ligadas ao sal, às conchas, à areia e à imensidão do azul em águas, ou haverá quem busque as razões de a grande batalha da Guerra dos Emboabas, da qual resultou a autonomia da província, ter ocorrido ao longo do Rio das Mortes, no ponto de encontro dos dois caminhos para o mar: o Caminho Velho, que levava a Parati, e o Caminho Novo, que conduzia à Baia de Guanabara. O sentimento nacional pleno é que o mineiro ama o mar, que está na sua alma. Riobaldo, personagem de Guimarães Rosa, quando relata o falecimento trágico de Diadorim, tão-somente afirma: “Chapadão. Morreu o mar que foi”. Para os mineiros, mar é vida e ventura. Roberto Drummond, em texto memorável, escreveu que “a sina dos rios e dos homens de Minas é caminhar, ter um porto, um sonho e o mar, aonde chegar. Ah, Tiradentes, qual era teu porto, teu sonho, teu mar?”. Ainda, em Guimarães Rosa, recolho a profunda reflexão sobre o mar que se faz cenário para as perigosas travessias da vida: “ele é o meio de trajeção, instrumento incerto, distância que palpita; que faz lonjura”. Não podia, pois, a Marinha do Brasil, deixar de homenagear Minas Gerais, o que, aliás, o fez, batizando com o seu nome o primeiro porta-aviões da nossa esquadra. De igual forma, orgulha-nos que um dos nossos navios, partícipe do papel social desempenhado pela Força e que leva a esperança e a presença do Estado a nossas populações ribeirinhas da Amazônia, o Navio de Assistência Hospitalar U-19, porte o nome de Carlos Chagas, grande médico e cientista de Oliveira, nos Campos das Vertentes, e que também nomeia esta praça em que agora nos encontramos. Esta província busca, incessantemente, o mar. Como registra a canção, considera "natural" a estrada que a liga "ao porto, ao mar". Quem não tem o mar ao seu alcance, mais ainda estima o seu valor. Não bastasse o reconhecimento desse amor ao mar pelos mineiros, devemos nós, marinheiros, assinalar que, nesta honrada Casa Legislativa da província natal do Mártir da Independência, teve assento, como um de seus membros, eleito em 1911 e no exercício do mandato representativo até 1914, o primeiro civil que, em 1919, veio a ocupar a Pasta Ministerial da Marinha: o Dr. Raul Soares de Moura. Um filho de Coronel da Guarda Nacional, da Zona da Mata, nascido em Ubá, que também honrou o País em várias funções importantes, dentre as quais destaco: Líder da Câmara Mineira, Vereador e Presidente da Câmara Municipal de Visconde do Rio Branco; Secretário de Agricultura, Indústria, Terras, Viação e Obras Públicas, no governo Delfim Moreira; Secretário do Interior e Justiça no Estado de Minas Gerais; Deputado Estadual; Deputado Federal; Senador por Minas Gerais e, também, Governador do Estado de Minas Gerais, gestão em que veio a falecer. Apraz-me particularmente e, por que não dizer, orgulha-me muito participar desta homenagem como seu sobrinho-neto e no exercício do mesmo honroso cargo de comandar a Marinha de nossa pátria. O seu tempo à frente de nossa instituição ensejou algumas realizações, cabendo citar a construção da Fábrica de Piquete, especializada na produção de pólvora e a remodelação da Esquadra. É interessante que, 90 anos depois, encontramos a Marinha do Brasil também em processo de remodelação, de reaparelhamento. A vida se faz e se repete. Raul Soares já se preocupava com a remodelação da Esquadra. Cito ainda, entre suas realizações, a renovação dos meios aeronavais, quando foi incorporado grande número de aeronaves à então recém-criada Força Aeronaval, e o reaparelhamento do Arsenal da Ilha das Cobras, hoje Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro. À frente da Pasta da Marinha, demonstrou atributos que honram sua memória, quais sejam a correção, a probidade, a competência, a total dedicação aos interesses nacionais e aos objetivos fundamentais da Pátria. Além disso, fez valer a qualidade maior dos mineiros: a habilidade política. Assim, exerceu o seu cargo com equilíbrio, sobriedade, inteligência, sagacidade e lealdade. Dr. Raul Soares de Moura é um exemplo para nossa família e para mim, que hoje estou à frente da Marinha. No livro de autoria de Afrânio de Carvalho, intitulado "Raul Soares, Um Líder da República Velha", fica muito clara a marca de sua gestão à frente da Pasta da Marinha. Cito: "Raul Soares iniciava assim sua passagem pela Marinha, onde seu prestígio continuaria a crescer como uma bola de neve, menos por causa de realizações materiais, que, em razão da brevidade do tempo, só podiam ser modestas” - e não foram modestas -, “do que das suas virtudes pessoais, que se projetaram rapidamente, tanto em atos de justiça e de disciplina como em outros de descortino administrativo, tendentes a programar, equilibrada e ordenadamente, em face da consideração global dos problemas, o aparelhamento da Marinha”. Mais uma vez, vimos as histórias se repetirem em quase 90 anos. “Cercado de elementos de escol, o Ministro adaptou-se prontamente ao novo posto e, contando com a colaboração de pessoal deveras excelente, pela dedicação e patriotismo, depressa logrou obter uma visão panorâmica da Marinha. Antes de tudo, sabia perfeitamente separar a sua função política e administrativa da função técnica e de comando do Estado-Maior, que jamais absorveria, a fim de não quebrar a unidade de doutrina. Depois, estava disposto a dar prosseguimento a tudo quanto merecesse tê-lo, pois uma das coisas que mais impressionavam seu espírito era a descontinuidade da obra administrativa no Brasil". E continua o mesmo autor: "Aí está por que a oficialidade, em sua maioria, sentia-se orgulhosa de ter, à frente do Ministério, um homem que, embora afável e polido no convívio, era altivo, justo e bravo, encarnando assim as melhores virtudes militares". Soube muito bem conciliar os interesses políticos que as circunstâncias da época exigiam para o bem da Pátria. Acresce ter sido discípulo do grande nacionalista que foi o Presidente Arthur Bernardes. Lamentavelmente, a morte o colheu prematuramente, aos 47 anos, no meio de seu mandato governamental, como já tive a oportunidade de citar. Sr. Presidente, senhores parlamentares, senhoras e senhores, a Marinha do Brasil é grata pela homenagem que lhe é prestada. Como sobrinho-neto de Raul Soares de Moura, não tenho palavras para retribuir o reconhecimento e a exaltação da memória de tão honrado homem público. Para concluir, só me resta revisitar a poesia do saudoso jornalista e escritor Roberto Drummond, que, em sua elegia ao que remanesceu do Mar Bambuí - o Rio São Francisco, o Velho Chico, o Rio da Unidade Nacional -, escreveu: “Minas não tem mar, mas Minas chega ao mar, abraça o mar, beija o mar, confraterniza-se com o mar e diz ao ouvido do mar: este rio que mandamos, mar-oceano, com o nome de um santo, é uma lembrança de Minas”. Minas, "quem te conhece não te esquece jamais!” Obrigado.