Pronunciamentos

JOSÉ CAMPOS TAITSON

Discurso

Agradece a reunião comemorativa pelos seu 94º aniversário.
Reunião 96ª reunião ESPECIAL
Legislatura 14ª legislatura, 2ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 11/08/2000
Página 26, Coluna 4
Assunto HOMENAGEM.

96ª REUNIÃO ESPECIAL DA 2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 14ª LEGISLATURA, EM 7/8/2000 Palavras do Padre José Campos Taitson Meus amigos, cumprimento quem preside a nossa reunião, o Deputado Aílton Vilela, que representa o Presidente da Assembléia, Deputado Anderson Adauto. Antes das minhas palavras, faço um agradecimento ao Secretário da Cultura, Dr. Ângelo Oswaldo, grande amigo de Ibirité. As suas palavras nos dão a segurança de que aquela relíquia, que é o altar da antiga matriz de Curral del-Rei, será preservada, recuperada e enriquecida. Meus caros amigos, peço-lhes perdão, porque as pessoas idosas vivem de recordações. Como dizia Virgílio, o tempo foge inapelavelmente e não volta mais. Nestas alturas da vida, quase centenários, recordamos muitas coisas. O Deputado Dinis Pinheiro falou sobre a missão sacerdotal. Contarei um fato, de que participei. Na década de 40, D. Cabral teria de fazer uma cirurgia muito delicada e foi para São Paulo. Lá, foi abrigado pelo Arcebispo daquele Estado, D. José Gaspar, mineiro de Araxá, que passou toda a sua vida em São Paulo. Então, D. Cabral quis agradecer ao Arcebispo de São Paulo as finezas recebidas e deu um banquete no Palácio Cristo Rei, encarregando-me de saudar o Arcebispo D. José Gaspar da Fonseca e Silva. Fiz a saudação e gravei profundamente a resposta de D. José Gaspar da Fonseca e Silva. Ele disse que às vezes, nas reuniões do pleno, em São Paulo, reunia o clero, quando se falava nas virtudes do sacerdócio mineiro. Havendo falecido um padre de São Paulo, em sua oração fúnebre disseram que foi santo como um padre mineiro, qualificando o sacerdócio mineiro como modelo de ministério. Pois bem. Nessa viagem, D. José Gaspar foi visitar a Serra da Piedade, que não conhecia. Foi a cavalo, pois naquele tempo não havia aquele fenômeno de estrada asfaltada que o engenheiro Israel Pinheiro conseguiu levar até os pés do santuário. Lá do alto, a 1.800m de altitude, olhava as campinas de Minas e, em cada lugar, via as setas de uma torre de igreja. Dizia ele que cada uma daquelas cidadezinhas tinha um sacerdote para guiar a comunidade, um Ministro de Deus para administrar os sacramentos. Então falava da felicidade de Minas Gerais. É claro que aquilo nos comoveu muito. Meus irmãos, não há Padre se não houver Bispo. Então, lembrei-me também dos Bispos que Minas sempre teve. Certa vez, no Rio de Janeiro, também na década de 40, tive a felicidade de almoçar com o Pe. Leonel Franca. Em conversa com ele, disse-me que a esperança da Igreja está em Minas. Perguntei por quê. Ele, fundador da PUC do Rio de Janeiro, publicou muitos livros, alguns até traduzidos. Ele disse que nossa esperança é Minas porque sempre teve Bispos santos. Conhecia bem história e foi citando desde o primeiro Bispo. Frei Manoel da Cruz foi transferido do Maranhão para Mariana, Vila do Carmo, primeira a ser elevada a cidade em Minas Gerais, porque, de acordo com as leis do reino, um Bispo não podia morar numa vila. Levou um ano do Maranhão a Mariana, viajando a cavalo e depois de barco pelo rio das Velhas. Foi ele quem lançou as bases da cultura religiosa em Minas, fundando o seminário de Nossa Senhora da Boa Morte em Mariana, o qual forneceu numerosos Padres para nossas comunidades. Depois, o Pe. Leonel Franca se referia a D. Viçoso, que viveu 90 anos, um homem extraordinário. Manteve o seminário do Caraça em Mariana, trouxe os Padres lazaristas para o seminário e para o Caraça. Dessas duas casas de educação, de instrução religiosa, saíram Presidentes da República, Governadores de Estado, como Afonso Pena, Arthur Bernardes, Olegário Maciel. Muitos eram sacerdotes, e outros encaminhavam-se para as carreiras liberais, como João Pinheiro, que também foi aluno do seminário de Mariana e Governador de Minas. O reitor da Universidade Católica do Rio de Janeiro falava sobre esses homens. Então, fui rememorando e concluindo, também. Tivemos outros Bispos santos. D. Viçoso percorreu toda Minas Gerais a cavalo, levando a palavra de Deus para as populações, e conseguiu criar uma diocese, que é a de Diamantina. Conseguiu a nomeação de quem para lá? De um Bispo santo, também: D. João Antônio dos Santos, irmão de Joaquim Felício dos Santos, que escreveu aquele livro “Memórias do Distrito Diamantino da Comarca de Serro do Frio”. O primeiro cuidado dele, imitando D. Viçoso, foi fundar um seminário do qual saiu muita gente, muitos sacerdotes santos e muitas pessoas para a vida civil, entre as quais vamos citar: Juscelino Kubitschek. Da escola de D. Viçoso saiu também D. Luiz Antônio dos Santos, o primeiro Bispo do Ceará, homem extraordinário, que criou o seminário, criou o colégio das irmãs de caridade e, depois, terminou como Arcebispo Primaz do Brasil, na Bahia. A nossa felicidade, como dizia o Pe. Franca, é que tivemos Bispos santos. Depois, vamos lembrar D. Silvério. Em 1920, quando D. Silvério partia para o Rio de Janeiro, para tomar posse na Academia Brasileira de Letras, parou em Lafaiete, onde eu estudava. Sabendo que queria ir para o seminário, chamou-me dentro do vagão de estrada de ferro e sabatinou-me em português, em latim e deu-me o cartão encaminhando-me para o seminário. Um Bispo santo. Quando morreu, eu estava presente, em Mariana. Antes de falecer, exigiu que todos os seminaristas comparecessem à sua cama de enfermo para receberem a última benção. Todos beijamos o anel daquele sábio e santo Arcebispo de Mariana. Estamos falando sobre esses marianenses, prelados de Mariana. Não me posso esquecer também de um, que tinha as mesmas virtudes desses bispos originários de Mariana: Dom Cabral. Aquele que me ordenou, que me fez sacerdote. Logo depois de padre, levou-me à sua terra, Sergipe, onde passei dois meses - durante a Revolução de 30 - e pude apreciar as suas virtudes. Depois, voltando a Minas, nomeou-me Vigário de Santa Tereza, onde não havia nenhuma igreja, não havia recursos. Era a 7ª seção suburbana. Todos os lotes haviam sido vendidos, só havia uma praça, onde se ia construir um mercado. E D. Cabral queria que fosse construída uma igreja colonial. Era nordestino, mas tinha espírito mineiro. Queria uma igreja colonial, caríssima! E fui encarregado de construí-la. Não a concluí porque tive de ir para Nova Lima. Mas, e o terreno? Foi com a cara e a coragem que compareci, com uma comissão, ao Palácio da Liberdade, e pedi a Olegário Maciel que nos fornecesse um terreno para a igreja. Autorizou, imediatamente, que se passasse a escritura. Naquele tempo, isso era permitido. Deu dez lotes para a igreja e um para a casa paroquial. Quero manifestar aqui publicamente, neste cenáculo que representa Minas Gerais, a minha gratidão a esse homem extraordinário. Pessoalmente, foi lançar a primeira pedra da igreja, que hoje ainda está lá, perpetuando a memória de tanta gente. Ainda sobre Dom Cabral: o seu espírito mineiro herdou-o, certamente, de um padre mineiro chamado Pe. Santos, originário da Fazenda do Cipó, que foi seu professor no seminário da Bahia. Era um padre muito santo e certamente levou Dom Cabral a adquirir as virtudes de mineiro. Quando preparava o II Congresso Eucarístico Nacional, em Belo Horizonte, em 1936, levou-me ao Rio de Janeiro, para obter do Ministro da Fazenda ouro e prata de Minas Gerais para confeccionar aquele ostensório belíssimo, que está na Catedral da Boa Viagem. Queria ouro e prata de Minas Gerais. Como isso não era permitido sem uma ordem do Ministro da Fazenda - todo ouro era recolhido ao Banco do Brasil -, Dom Cabral foi lá. Fui com ele. Conseguiu do Ministro da Fazenda, no tempo de Getúlio, ordem para conseguir a prata e o ouro necessário de Morro Velho, para serem perpetuados naquele ostensório da Boa Viagem. E o espírito de mineiridade de Dom Cabral foi tanto que quis que aquela obra de arte tivesse todos os sinais de Minas Gerais. A porta onde fica o Santíssimo Sacramento é o portal da Igreja de São Francisco de Ouro Preto. Isso mostra que Dom Cabral, mesmo não sendo mineiro, mostrou o seu espírito de mineiridade e quis viver a vida como os mineiros. Guardo essa grande lembrança dele. Fui ordenado por ele, fomos grandes amigos, e ele foi um benfeitor. Caros amigos, devemos agradecer a Deus pelos bispos e pelos sacerdotes que concedeu a Minas Gerais. Vou lembrar-me de alguns nomes, como, por exemplo, o Monsenhor Horta. Homem santo, exorcista, deixou-nos a lembrança de uma vida santa. Comemoramos muitas vezes o gesto de São Francisco de Assis, beijando um leproso. Monsenhor Horta dava banho nos leprosos. O Pe. Vítor, vigário de Três Pontas ordenado por Dom Viçoso, tão venerado no Sul de Minas, que ali muitos têm o nome de Vítor, em sua homenagem. O seu nome era Francisco de Paula Vítor. Era descendente de escravos, preto, pretinho, mas era santo. A Diocese de Campanha encaminhou a Roma um processo para a sua beatificação e canonização. O Pe. Libério, de Pará de Minas, falecido há pouco tempo. Que nome aquele homem deixou no Oeste de Minas, pela sua santidade! Não era culto, mas era santo. Temos, então, essa felicidade de ter bispos santos e padres virtuosos, que formaram nossas famílias. Para terminar, vamos pedir a Deus que continue abençoando nossa terra. O Governador Bias Fortes declarou Nossa Senhora da Piedade padroeira de Minas Gerais. É venerada por todo o Estado de Minas Gerais, e há um episódio interessante de Afonso Arinos, autor dos “Sertões”: ele era diplomata e, nas suas férias, vinha a cavalo - não havia estrada asfaltada - para visitar Nossa Senhora, na serra da Piedade para manter o seu espírito de mineiro, que sempre ama Nossa Senhora. Assim, tantos e tantos outros. O Pe. Pinto, de Urucânia, deixou uma fama imensa também. Gostaria de lembrar de um padre mineiro, um bispo, um cardeal: Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Mota, descendente do primeiro Governador de Minas, Visconde de Caeté. Dom Carlos, que foi meu professor no seminário, era um homem extraordinário. Quando ele era Reitor do seminário, em 1930, fui ordenado padre. Só pastoreou em Minas, em uma pequena parte de sua vida, quando foi bispo auxiliar em Diamantina. Depois foi para o Maranhão e para São Paulo, onde foi elevado a Cardeal e onde realizou coisas maravilhosas: a catedral estava sendo construída havia 30 anos, e o Cardeal Mota a terminou; fundou a Universidade Católica de São Paulo; fundou a Rádio 9 de Julho; fundou dois seminários. E, completando toda a sua vida de Padre e de Bispo santo, projetou, construiu e inaugurou a maior Basílica do mundo depois da de São Pedro - a Basílica de Nossa Aparecida. E era um Padre mineiro, simples, muito simples. Para terminar, vou contar-lhes uma história acontecida com ele e o Papa João XXIII. Durante o Concílio, o inverno chegou muito cedo, e ele precisava voltar a São Paulo, onde tinha uns problemas para resolver. Mas era Padre conciliado e só podia sair com a licença do Papa. Então, procurou o Papa João XXIII e lhe disse que tinha compromissos em São Paulo e precisava deixar o Concílio. João XXIII imediatamente lhe disse para ir e também cuidar de sua saúde. Na hora da despedida, o Papa chamou o Cardeal em particular, na biblioteca, e lhe disse: vamos dar o último abraço neste mundo. O Cardeal ficou intrigado e lhe indagou a razão daquilo. O Papa lhe disse: estou com câncer no estômago e, como sou governante da Igreja, pedi aos médicos que me dissessem quanto tempo de vida me dariam, e me deram seis meses. Isso foi em fins de novembro. Passaram-se os meses e, em maio, o mundo todo estava emocionado com a doença do Papa. Os feiticeiros da África lhe mandaram várias receitas de remédios para curar o câncer... Mas, voltando, o Papa disse ao Cardeal que estava com câncer. E o Cardeal lhe disse: Santidade, o senhor com todo esse problema, e essa tranqüilidade; isso bem mostra que o senhor é providencialista, que se entrega à providência de Deus. E a última palavra do Papa foi “providencialista”. Mas que bela palavra! Meus caros irmãos, isso mostra a santidade de um e de outro. Vamos, então, agradecer ao Nosso Senhor todas as lições que aprendemos com os padres e os bispos santos de Minas Gerais. Vamos pedir-lhe que esse trabalho de santificação do nosso clero continue. E, nesta Assembléia, que é a síntese de toda Minas Gerais, vamos pedir que, do alto da Serra da Piedade, daquela montanha de ferro, Nossa Senhora mande uma benção para todos os padres e todos os bispos mineiros, para o nosso Governador, para os membros desta Assembléia. Deixo uma benção muito copiosa também para todos nós que somos devotos de Nossa Senhora. Que Nossa Senhora, protetora de Minas Gerais, nos dê sua graça e sua benção. Assim seja. Gostaria de agradecer ao Dinis pelo seu gesto tão cavalheiro para com este velho padre, amigo também de sua família. Meus irmãos, tive a felicidade de casar Tonico e Irene, pais de Dinis, batizar todos os seus filhos, celebrar suas bodas de prata e de ouro, de batizar também seus netos. Ao Dinis, toda a minha gratidão pela gentileza desta promoção. Meus caros amigos, senhoras e senhores, componentes da Mesa, senhor representante do Presidente da Assembléia Legislativa, depois de tantas homenagens a um sacerdote não podemos encerrar senão com uma oração, pedindo a benção de Deus para esta Assembléia, seus Deputados e funcionários, para nosso Governo, do Estado e da União, e uma benção, meus caros amigos, para todos os que aqui compareceram para homenagear este velho sacerdote, reconhecendo o seu trabalho pela glória de Deus e pela salvação das almas. Vamos rezar, juntos, o Pai-Nosso. - Reza-se o Pai-Nosso. O Pe. José Campos Taitson - Vamos rezar também uma Ave-Maria à Nossa Senhora da Piedade, pedindo-lhe sua benção. - Reza-se a Ave-Maria.