Pronunciamentos

FU MENGZI, Diretor do China Institute of Contemporary International Relations

Discurso

Comenta o tema "A China chega ao futuro".
Reunião 48ª reunião ESPECIAL
Legislatura 14ª legislatura, 1ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 12/11/1999
Página 25, Coluna 4
Evento V Fórum Técnico Políticas Macroeconômicas: Alternativas para o Brasil
Assunto ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA.
Observação Participantes dos debates: Eliane Starling Bechekani, José Costa, Nelson Prata, Nivaldo Pascoareli, Iara, Sabrina, Ana Paula, Gérson, Vânia Santana, Nilton Figueiredo, David Oliveira Pinto, Camila Gomes Lopes.

48ª REUNIÃO ESPECIAL DA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 14ª LEGISLATURA, EM 21/10/1999

Palavras do Sr. Fu Mengzi

Sr. Presidente, senhoras e senhores, é uma grande honra estar aqui para lhes falar sobre a situação econômica da China hoje. Como todos sabemos, a Ásia acabou quebrando, separando-se. A crise financeira de julho de 1997 foi, na verdade, o seu início. Há um impacto muito além da nossa compreensão, da nossa limitação. Essa é a razão pela qual a Ásia tem sustentado o crescimento nessa crise. Muitos pesquisadores já fizeram análises em relação à causa dessa crise. Temos a teoria da sobreespeculação, a teoria da recessão durante o crescimento, a teoria das desvantagens do sistema e também a teoria de uma especulação conspiratória. Hoje, não quero repetir essa análise, pois não a acho significante. Gostaria, apenas, de deixar com vocês algumas idéias em relação a essa crise. É insignificante para o desenvolvimento futuro da China e de outros países ficar falando de crise. O grande promotor da crise foi esse ambiente quente de competição, de concorrência que ocorre durante a globalização. Todos os países estão, na verdade, enfrentando uma concorrência cada vez mais aquecida e acirrada nesse ambiente de globalização. A globalização forneceu novas e boas oportunidades para todas as nações, ou seja, tornaram-se capazes de usar todos os recursos externos para promover crescimento econômico. Entretanto, em época de desenvolvimento, ainda vemos concorrência muito acirrada.

As áreas de concorrência de cada país estão diretamente abertas para o globo como um todo. Os mercados domésticos de qualquer Estado estão cheios de concorrentes externos, muito mais do que já houve em sua história. Existem mais rivais com poder maior no mercado. As corporações transnacionais se garantem no seu poder e aceleraram a velocidade das estratégias globais, tentando, na verdade, tomar territórios de todos os países. Também podemos dizer que as áreas de concorrência estão muito concentradas em termos de produção industrial. Obviamente, os países mais fracos e menores têm sofrido pressões cada vez maiores. Eles exportam cada vez com mais dificuldade. Em algum momento, esse crescimento econômico rápido encoraja o sentimento de especulação. Por um lado, a fundação de uma economia física foi enfraquecida; e, por outro lado, essa economia explosiva causada pelo grande investimento está inflacionando, aumentando o desequilíbrio existente entre a economia física e a economia não física, que vai criar então essa condição de crise não econômica.

As conseqüências imediatas da crise asiática foram muito sérias. Na verdade, seu impacto é muito amplo e abrangente e merece mais atenção e mais observação. Podemos dizer que, primeiro, é a quebra dos canais financeiros; segundo, esse fluxo escondido de produtos. Isso gera um problema social importante, porque muitas pessoas estão perdendo seus empregos e caindo na pobreza. Gostaria de falar sobre o resultado mais sério dessa crise, que está levando a uma grande dependência da Ásia, dos países europeus e dos Estados Unidos. Por um lado, toda essa economia está levando a um poder maior dos Estados Unidos sobre a Ásia, o que é muito perigoso.

Vou falar um pouco mais sobre a situação da China. Sob grande pressão, a China finalmente alcançou um crescimento econômico rápido. Sabemos que, enfrentando a desvalorização da moeda asiática, a moeda chinesa encontrou uma pressão muito grande. Entretanto, o Governo chinês suportou a pressão e manteve sua promessa de não deixar ocorrer a desvalorização do remibi (?), que ajudou a deteriorar ainda mais a situação. Portanto, a China é considerada um membro responsável da comunidade internacional.

A China não é apenas um fator importante para a estabilidade da Ásia, mas é a chave dessa estabilidade econômica na região. As pessoas podem estar preocupadas por que a China teve todo esse problema, sofreu tanto na crise. Existem várias razões. Sabemos que formamos, na verdade, uma tensão econômica. O Governo chinês prestou muito mais atenção e, na verdade, adotou uma estratégia macroeconômica que levou a todo esse desequilíbrio da estrutura, acarretando a queda das ações e uma economia conturbada. Então, ajustamos nossa economia mais precocemente do que outros países da Ásia. Pode até ter sido bom para nós resistir a essa crise da Ásia.

Em segundo lugar, acho que o remibi (?) ainda não está comprometido. A especulação internacional pode ficar afastada desse ataque à moeda chinesa. Juntamente com esse crescimento econômico rápido, o poder econômico legendário da China está se tornando cada vez mais forte. Essa é a parte mais importante. Eu também tenho que dizer que temos um poder financeiro ancorado. A China tem um superávit da balança comercial de 1.150 bilhões para reserva de moeda estrangeira. Ainda há muito lastro para resistirmos a esse risco externo e a esse jogo que vem dessas crises econômicas externas. Apesar de a China não ter entrado direto na crise, não significa que não tenha problema. A China sofreu muito, principalmente em 1998. Podemos dizer que, em 1998 e na primeira metade de 1999, a exportação da China teve um crescimento negativo, e a economia chinesa ainda não atingiu seu objetivo predeterminado, além de ter caído também o investimento estrangeiro na China.

Se eu quisesse falar sobre os efeitos da crise na China, acho que mais importante é nossa perspectiva sobre o ambiente externo com relação ao desenvolvimento econômico da China. Achamos que o ambiente externo e o interno têm sido muito mais rígidos que antes. Na década de 90, a economia mundial entrou em um novo período de crescimento sustentado. As pessoas tendem a ser mais otimistas com relação ao crescimento sustentado futuro da economia global. Cada país formula planos de desenvolvimento. Na China, também foi feito um planejamento para o desenvolvimento em longo prazo, de 1995 até 2010. Entretanto, com o desencadeamento da turbulência econômica asiática de 1997, assim como da crise financeira da Rússia e do Brasil, em graus variados, as preocupações sempre se ligaram muito a uma perspectiva econômica mundial. Acreditamos que esse ambiente externo futuro não será tão favorável quanto o previsto, mas, mesmo assim, o Governo chinês já antecipou um crescimento menor para a economia, indo de mais ou menos 8% em 1998 para 7%. Em segundo plano, obtivemos uma compreensão melhor com relação às vantagens e às desvantagens. Como todos devem saber, a globalização pode ajudar a otimizar a distribuição de fatores de produção como trabalho, capital e tecnologia.

Tendo passado pela crise financeira asiática, temos que ter a mente mais sóbria e mais objetiva quando observamos essa questão da globalização. Ela é justa ao desenvolvimento econômico de cada país. Entretanto, não significa justeza em substância. Todos os Estados do mundo têm diferentes poderes econômicos, diferentes estruturas industriais, diferente competitividade industrial, assim como são diferentes em níveis tecnológicos. A base é diferente. Então, o resultado da concorrência também será diferente. Nesta era da globalização, a ordem econômica mundial ainda é injusta. Os países em desenvolvimento, principalmente os pequenos e fracos, terão de enfrentar desafios mais sérios. Nos países desenvolvidos, os méritos da globalização superarão os deméritos. Entretanto, para as nações em desenvolvimento, o caso é oposto. Mesmo sendo útil para os países, a globalização ainda é, muito mais, danosa para os países em desenvolvimento. Certamente, o risco externo tem de ser acompanhado bem de perto por ocasião da abertura econômica.

A segurança econômica é muito importante para a segurança nesta era de aberturas e liberalização. Todo e qualquer país vai ficar completamente sozinho se as portas forem fechadas. Entretanto, a política de abertura exige consideração das condições nacionais de cada país, assim como da capacidade da economia de superar pressões. A abertura deve ser gradual. Os pesquisadores da China, hoje, já chegaram a um certo consenso de que as medidas de abertura devem ser implementadas cuidadosamente, com considerações adequadas com relação aos riscos. Pode ser ainda mais perigoso abrir tudo de uma só vez, para acatar as necessidades dessa liberalização, sem se prestar atenção às condições nacionais. É importante procurar essa oportunidade, mas temos de acompanhar a velocidade do desenvolvimento e, para isso, temos de ter coragem para dar o primeiro passo à frente. Isso não significa, entretanto, que não tenha que ser baseado nessas melhores condições, ao invés de ser nessa velocidade rápida.

Concordo que uma outra causa da crise asiática é que um poder tão grande quanto o dos Estados Unidos entrou para promover essa liberalização tirando vantagem do processo de globalização. O “New York Times” publicou um artigo dizendo que essa liberalização muito rápida e sem reflexão pode levar à crise financeira e ao caos bancário.

A crise também nos alertou para o fato de que, na globalização, as preocupações com relação à segurança do Estado devem ser mais amplas. Em termos de segurança econômica, o Governo chinês já considerou a segurança financeira como sendo um conteúdo chave. Mas a segurança financeira não pode ser garantida, e tudo o que a construção econômica pode alcançar será destruído de uma só vez.

Com relação à situação econômica da China, posso dizer que ela está melhorando desde o início deste ano, mesmo tendo sofrido muito em 1997. No início deste ano, o PIB da China cresceu quase 8%. A exportação também está aumentando, assim como o investimento estrangeiro no país.

Vocês sabem que a República da China foi fundada em 1949. Neste ano estamos comemorando os 50 anos da República da China. O país passou por uma revolução cultural de 1956 a 1976. Passamos por uma revolução industrial muito grande, um período de muita turbulência, de muita confusão no país. Quando passamos por esse período, vimos que o mundo estava mudando muito rapidamente. Mas estamos tentando desenvolver o nosso país da melhor maneira possível. Em 1970, a China começou a implementar uma política de reforma e abertura para o mercado mundial. De 1979 para cá, já alcançamos muito em termos econômicos. Uma estatística que posso mostrar a vocês é que, de 1979 a 1999, a China alcançou altíssimo crescimento econômico. O crescimento médio anual do Produto Doméstico Bruto, o PDB, foi de 9,8%. Agora, a China está se tornando cada vez mais forte. O padrão de vida das pessoas tem melhorado muito e rapidamente.

Sabemos que a China já é ou está se tornando a 7ª economia do mundo. O Brasil é a 8ª. Como país em desenvolvimento, o que a China já alcançou é pior. Muitos países prestam muito mais atenção ao milagre econômico chinês, mas tenho de dizer aqui qual é a razão de a China alcançá-lo.

Em primeiro lugar, a China está explorando uma nova concepção para construir o país, à qual chamamos de socialismo chinês, para falar de uma maneira geral. Na verdade, estamos combinando a teoria do socialismo com a realidade chinesa, com as condições do país. A China é um país enorme e tem 1.200.000.000 de habitantes. As condições são diversas em diferentes lugares, em diferentes províncias da China. Cada província precisa ter a sua própria política, baseada nas condições locais de sua população. A China está entrando nesse delineamento de leis e desenvolvimento econômico, mas estamos enfatizando que podemos ter diferentes políticas para desenvolver nossa economia.

O segundo fator é que as pessoas achavam que a China era um país muito fraco, principalmente no final de 1970. Então, começaram a prestar mais atenção ao mundo. O país precisava se desenvolver. Chamamos a isso de arquitetura chinesa, pensada por aquele que foi o pai da reforma chinesa. Foi uma pessoa que se tornou uma lenda na China. Ele falou que poesia não é socialismo. O desenvolvimento é uma necessidade obsoleta para a China. Em todo o país, as pessoas estão concentrando suas economias e seus recursos no desenvolvimento da economia chinesa, tentando fazê-lo da melhor maneira possível, trabalhando e investindo muito. E estão prestando muita atenção na educação, para poder progredir tecnologicamente. Esse é o segundo fator.

O terceiro, eu diria, também relacionado a um desenvolvimento tão rápido, é que buscamos políticas de uniformidade e de abertura para o mercado global de maneira gradual e pensada. Não tínhamos experiência alguma com essa política de reformas e de abertura para o mercado. Precisávamos de tempo para criar essas políticas, para pensar.

A reforma, que se iniciou em 1979, começou na verdade no interior do país. Nós alocamos a terra às pessoas. Na China atual, como no passado, a terra pertence ao governo. As pessoas não têm a propriedade da terra. Assim, são mais incentivadas a engajar na produção industrial, porque ganham a terra. Como a pessoa recebe um pedaço de terra do governo, ela trabalha muito, porque a terra é dela. A reforma começou no interior, nas fazendas. Continuamos a expandi-la para as áreas urbanas do país, passo a passo, atingindo empresas de porte médio e também de grande porte.

Com relação à abertura, prosseguimos de maneira gradual e bem ordenada. Vocês sabem que a China passou por um período muito fechado, não tínhamos abertura para o mundo, não tínhamos conhecimento do mundo externo. Precisávamos pensar sobre o que poderíamos e deveríamos fazer, de tal sorte que a abertura foi gradual e de dentro para fora, começando pelo interior. A abertura industrial também foi feita etapa por etapa. Prestamos mais atenção no exemplo dos russos. A Rússia está em transição, passando de uma economia socialista para uma economia de mercado. Isso começou no início da década de 90.

Um grande economista americano fez, certa vez, uma sugestão para a China. Ele falou que o país tinha de abrir a economia de uma só vez, da noite para o dia. Foi o que esse americano falou para a Rússia. Mas a Rússia ainda não alcançou uma reforma econômica bem sucedida e nem uma abertura completa. O PIB agora é metade, é 50% do que já foi.

O quarto fator responsável pelo crescimento da China atual é que o país precisava da globalização. Ela precisa de capital e de tecnologia estrangeira. É impossível para nós desenvolvermos a nossa economia baseados apenas em capital e tecnologia estrangeira. Temos que desenvolver a nossa economia e todo o país baseados no nosso próprio esforço. Esse é o fator mais importante de todos.

Na minha opinião, é improvável esperar que outros países nos apóiem todo o tempo durante esse processo de globalização. Tudo tem de ser feito pelo próprio país. Essa é uma política excelente: voar com as próprias asas. Temos de tentar da melhor maneira possível coordenar essa certa dependência que ocorre na globalização e essa integração à comunidade internacional. Muito obrigado a todos pela atenção.