EDUARDO COSTA, Jornalista. Apresentador do programa "Chamada Geral", da Rádio Itatiaia.
Discurso
Comenta o tema do evento, dentro do 2º painel.
Reunião
61ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 16ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 04/09/2010
Página 107, Coluna 3
Evento Fórum Técnico: "Segurança Pública: Drogas, Criminalidade e Violência".
Assunto SEGURANÇA PÚBLICA. DROGA.
Legislatura 16ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 04/09/2010
Página 107, Coluna 3
Evento Fórum Técnico: "Segurança Pública: Drogas, Criminalidade e Violência".
Assunto SEGURANÇA PÚBLICA. DROGA.
61ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 16ª
LEGISLATURA, EM 11/8/2010
Palavras do Sr. Eduardo Costa
Prepare a campainha, Presidente. Senhoras e senhores, boa tarde a
todos. Preciso muito agradecer às 167 entidades que construíram
este fórum, pela honra e responsabilidade. Essa responsabilidade
foi tão grande, que afetou o labirinto: está uma “zonzeira” só. Eu
tinha que vir por alguns motivos, principalmente para dizer que,
quando o Secretário Balestreri falou a respeito do Prof. Robert
Putnam, de Harvard, sobre o estudo de décadas a respeito das
diferenças de pujança econômica e de crescimento entre o norte e o
sul da Itália, chamou-me a atenção, quando li esses estudos, o
fato de que, na parte desenvolvida, quando há um incêndio, todos
os vizinhos correm para acudir, mas, na parte historicamente mais
pobre, quando começa a ferver um incêndio na casa do vizinho, o
outro corre em busca de água para defender a sua própria casa.
Felizmente, este encontro está mostrando, como também mostrou o
comício a que assistimos ontem, na Praça da Estação, que tudo está
muito tranquilo, sem estresse e sem ofensas, o que demostra que o
País está realmente mudando e que estamos construindo um capital
social, que é a única coisa capaz de, de fato, fazer com que
sejamos a 5ª ou 6ª economia do mundo, com igualdade de renda, com
mais humanidade e com real combate à violência. É justamente por
isso que saúdo este encontro.
Ainda sonho com o dia - sei que isso é difícil para o Secretário
Balestreri e para o Secretário Moacyr - em que, depois desse
esforço hercúleo, próprio de uma Assembleia que quer representar
os anseios de uma sociedade, o Deputado João Leite e os seus
companheiros da Comissão de Segurança Pública possam trazer todos
novamente até aqui, os Secretários e suas equipes, bem como os
profissionais de segurança pública e as comunidades terapêuticas,
para falar do seu sufoco, dos seus desassossegos, das suas
angústias e das suas aflições.
Faz 32 anos que acompanho a imprensa e é sempre assim. É sempre a
autoridade que fala que isso é muito bom, e quem faz só fica
ouvindo. Eu sonho com o dia em que vamos inverter isso. Quero
dizer ao Secretário Balestreri que conheço alguns dos programas da
sua Secretaria Nacional de Segurança Pública. O fato de ele ter
realizado a Conferência Nacional de Segurança, e eu estive lá
acompanhando, já o credencia a merecer o nosso respeito. Aliás,
entre outras coisas, adveio dessa conferência um Conselho Nacional
de Segurança Pública mais condizente com a realidade nacional,
tanto é que um praça da nossa PM tem assento lá como Conselheiro,
o que é muito bom.
Quero dizer para o Secretário Moacyr que o trabalho iniciado pelo
Lúcio Urbano e desenvolvido também pelo próprio Anastasia, que
continuou depois do Maurício Campos, se resumiria na integração
das polícias e no maior investimento, o que inegavelmente também
merece o nosso respeito. Mas, como não viemos aqui apenas para
dizer que eles são maravilhosos - atentando para as instruções do
mestre Armando Nogueira para a gente sempre vigiar, para elogiar
sem bajular e criticar sem ofender -, é hora de aproveitarmos a
ocasião para destacar alguns aspectos.
Secretário Balestreri, a primeira coisa - e deve ser uma
constatação nacional -, que esse repórter de rádio, há trinta e
tantos anos, quer dizer ao senhor, no tocante a Minas Gerais, é o
seguinte: esses números que são sempre apresentados não incluem a
insegurança subjetiva, ou seja, a sensação subjetiva de
insegurança. Não aparecem por exemplo os números da pesquisa de
vitimização que eu mais conheço, que é a de 2003, do Centro de
Estudos em Criminalidade e Segurança Pública da UFMG - Crisp -,
que é muito respeitado. Esses números indicam que cerca de 73% das
pessoas que são vítimas de furto ou roubo não registram queixa.
Isso ocorre porque as pessoas estão convictas de que isso não dará
em nada, embora o rádio e a autoridade as aconselhem a não agir
assim. Na última quinta-feira, às 3 horas da tarde, em um dos
cruzamentos mais nobres da cidade, Afonso Pena com Getúlio Vargas,
eu vi uma moça ser assaltada por dois rapazes, que levaram a sua
bolsa. Eles foram caminhando para um lado e ela, para outro,
absolutamente desprovida de interesse em pedir socorro. Ninguém
tampouco a socorreu.
Senhores Secretários, além do que acontece e não é registrado e
do sufoco que vivemos todos os dias no rádio, com as pessoas nos
procurando, pedindo socorro de todas as formas, os índices de
homicídios provam que as drogas têm um componente assustador. A
situação nas escolas é desesperadora. Os professores perderam a
autoridade e não podem sequer questionar um aluno indisciplinado,
porque sofrem ameaça. Primeiro, sofrem a ameaça legal, do Conselho
Tutelar, depois é a da mãe ou de um namorado, de um amigo ou de um
traficante, que avisa que, se ele não se comportar, apanhará e
morrerá.
Sr. Secretário, até pouco tempo, não tínhamos - e agora virou
rotina - o toque de recolher. Felizmente, na última vez, as duas
polícias agiram bem. Mas essa situação estava virando rotina. Na
Região Metropolitana de Belo Horizonte, temos uma outra prática
inacreditável que é a expulsão da família. O cidadão acha aquele
barraco interessante e fala: “Eu ocuparei esse barraco com a minha
turma. Cai fora daí”. Via de regra, o que faz a nossa polícia? Vai
lá para dar cobertura para a pessoa que sairá e se mudará. Isso
enlouquece. Onde é que vamos parar?
Sr. Secretário, ainda no âmbito das drogas, no Brasil, que viveu
tempos muitos duros até 1988, de lá para cá, tudo é motivo para se
ter compreensão com a miséria. O morador de rua merece, sim, a
nossa amizade, o nosso respeito, a nossa consideração, a nossa
caridade e a nossa solidariedade. Mas, de repente, na porta do
nosso prédio - quando digo “nosso”, estou me referindo aos
ouvintes que me pedem socorro o tempo todo -, surge um grupo de
pessoas, começam sentando na praça, no outro dia usam “crack”, no
outro dia cozinham, no outro, fazem cocô e sexo. Quando nos
dirigimos à Prefeitura para reclamar, dizem que não podem fazer
nada. Se procuramos a Polícia Militar, somos informados sobre o
direito de ir e vir. Eu pergunto: e o direito de quem mora ali?
Srs. Secretários, em nosso Estado, as drogas apresentam uma
característica especial, que é a da diferença entre o discursar e
o fazer. Aliás, essa questão é nacional. Em 1990, indicado pelo
adido cultural dos Estados Unidos e aqui ratificado pela
Embaixada, eu representei o Brasil em um dos fóruns que o governo
americano fez na “Voz da América”, levando sempre 21 jornalistas
dos mais diversos continentes. No meu grupo, havia pessoas do Laos
e do Afeganistão. Ouvimos do Procurador-Geral, equivalente ao
Ministro da Justiça dos Estados Unidos, a advertência de que
aquela grande nação era a única àquela ocasião que não dera conta
do combate às drogas. E que o que nos esperava era muito grave.
Sr. Balestreri, até hoje, não por sua culpa ou de Minas, eu não
vi uma mobilização efetiva do governo federal com o objetivo de
combater isso, com a energia que eu sinto que as pessoas precisam.
Agora houve algum anúncio de combate ao “crack”, e era hora porque
uma reportagem da Globo News hoje mesmo mostrou que números já
disponíveis dão conta de que já há 1 milhão de usuários só de
“crack” no País, droga que sabemos - isso está provado - levar o
cidadão cedo para os três cês: cadeia, cadeira de rodas ou
cemitério.
Sr. Secretário Moacyr, se não estou enganado, porque não pensei
direito, há apenas três negros no segundo escalão do governo de
Minas. Parece que no primeiro não há nenhum. São três que passaram
pelo segundo: o primeiro na Subsecretária de Assuntos
Penitenciários, egresso da Polícia Federal, muito prestigiado. Na
sequência dele, o Zeferino. Os dois fazem um trabalho
inegavelmente brilhante. Acabaram aquelas rebeliões, aquelas
farras de churrasco nas penitenciárias. É claro que todos os dias
eles enfrentam problemas. Há até advogado de cliente famoso
querendo introduzir celular lá dentro; é difícil, sem falar nas
modernidades do tráfico. Outro dia um cidadão entrou com dois
celulares e vários pacotinhos de drogas introduzidos no ânus. Isso
é inimaginável, até mesmo do ponto de vista da física e da
estrutura humana, mas há de tudo. Eles estão brilhando, porque têm
dinheiro, recurso e prestígio. Pegaram outro escurinho, da minha
raça, o Cloves Benevides, e, talvez pelo fato de sua origem ser a
favela, colocaram-no na Secretaria de Políticas Antidrogas, sem
dinheiro, sem prestígio nas grandes reuniões. Eu é que estou
falando, não foi ele quem reclamou, mas não o percebo nas grandes
reuniões. O pouco que ele consegue fazer é graças a essas
comunidades terapêuticas que Deus protege. Pede socorro daqui e
dali.
Há uma Juíza da Vara Infracional pedindo: “Vamos arrumar leito”.
Mas sobre isso falarei daqui a pouco com o Secretário.
Secretários, vamos pontuar algumas questões para os senhores nos
ajudarem respondendo-as nesta tarde única em Minas Gerais.
Secretário Balestreri, inicialmente queria dizer que todas as
vezes em que o senhor vem aqui o cercam de carinho, como hoje,
mas, quando o senhor vira as costas - e perguntamos sobre
segurança -, Aécio Neves e Anastasia dizem que o governo federal
não manda dinheiro algum. Reclamam do senhor que é uma beleza.
Justiça seja feita. O Secretário Genedempsey Bicalho reconhece a
ajuda federal, mas o governo estadual não. E ainda há uma
informação. É pena que o Maurício Campos não esteja aqui, pois é
uma pessoa que respeito muito. A informação é que um dos maiores
programas de mudança da realidade brasileira, aquele que mais
emociona, o Vila Viva, verdadeira transformação da vila, da
favela, teria uma verba do governo federal para a construção de
uma polícia comunitária. Isso aconteceria nos 11 Vilas Vivas de
Belo Horizonte. A informação que tenho é que o Secretário anterior
recusou a verba, provavelmente por questões políticas. Esta é uma
boa oportunidade para o senhor esclarecer isso.
Segundo, já falei ao senhor, mas queria reiterar. Por que o
governo federal demorou e demora tanto para fazer uma mobilização
nacional? Sei, e não podemos negar isso, que o Lula está mexendo
nas estruturas. Ele não dá conta de impedir um lucro de
R$3.000.000.000,00 de um banco. Ele não dá conta de impedir que
uma mineradora lucre R$6.000.000.000,00, uma só, enquanto Minas
Gerais recebe de “royalties” do minério no ano inteiro
R$67.000.000,00. Mas o Lula está fazendo o Bolsa-Família, está
fazendo algumas coisas. Não deu conta da reforma sindical,
trabalhista, previdenciária, tributária. Outro dia ele falou que
seriam criados leitos, mas cadê?
Sr. Secretário, não consigo entender esse negócio de que a missão
constitucional do Exército seja outra. A guerra real que temos é a
do tráfico, é a da violência. Então, por que aquele monte de
homens no quartel não está nos ajudando? Eu não consigo entender.
Sr. Secretário, à direita do Secretário de Desenvolvimento Social
está o Promotor Joaquim, que está denunciando frequentemente, há
meses, que existem pelo menos 300 cidadãos vivendo como presos
comuns em presídios de Minas, colocando em risco a própria vida.
Precisa-se de leitos urgentemente. A Secretaria de Saúde reúne,
mas a comunidade é antimanicomial. Antes não existiam manicômios
porque eram a porta do inferno, mas hoje temos aversão total à
internação. Então, sobra para as famílias e para as ruas. Essa é
apenas uma das questões para abordarmos dentro daquela promessa do
governo federal de criar leitos especiais para portadores de
sofrimento mental e sobretudo para usuários de drogas, pois há
muita ligação de um grupo com o outro.
Já há muita cobrança ao Secretário Balestreri, que é visitante.
Então vamos cobrar do Secretário de Desenvolvimento Social, que é
da casa.
Secretário Moacyr, a Rede Record mostrou ontem que, uma semana
após fazer a primeira matéria, retornou ao mesmo lugar para
documentar a venda de cheques roubados na Praça Rio Branco, em
frente ao Comando das duas polícias. Quer dizer, a televisão
denunciou e uma semana depois retornou para dizer: continua. Por
exemplo, quero ludibriar o comércio com um documento e um cheque
roubados. Pega-se um cheque roubado de alguém que tem ficha limpa.
Quando se vai consultar no SPC, vê-se que está tudo certo, mas a
loja leva o prejuízo.
Secretário Moacyr, a grande moeda de divulgação do governo Lula é
a integração, que é um ganho irreversível. Na verdade, esse era um
sonho meu, portanto me sinto muito feliz. No entanto, ela tem de
ser vigiada, pois é uma plantinha que está muito tenra e precisa
crescer. Aliás, ela existe entre os senhores e os chefes das
polícias e entre a maioria dos Delegados e Coronéis, mas como é
difícil na base! Estão aqui, pertinho um do outro, o Gonzaga e o
Denílson. No entanto, um vem à Assembleia num dia, e o outro num
outro. O Denílson quer carreira jurídica para os Delegados, o
Gonzaga para os Coronéis. O Gonzaga traz pessoal da Polícia
Militar de todos os quartéis para pressionar os Deputados. No
outro dia, ligam para a rádio dizendo que há veículo da Polícia
Civil em cima do passeio e do sinal. Numa entrevista com a nossa
repórter Alessandra Mendes, dizem: “A Polícia Militar fez, por que
não podemos fazer?” Quer dizer, vale tudo, como ocupar calçada e
sinal.
Secretário Moacyr, poderia citar mil exemplos sobre essa
integração. Citarei um de ontem. A nossa repórter Camila Dias foi
à Pedro II, que é uma avenida muito movimentada da cidade, para
entrevistar um Delegado que trabalha na delegacia de uma Área
Integrada de Segurança Pública - Aisp. Então ele está aqui e a
Polícia Militar ali. A repórter estacionou o veículo e entrou na
delegacia. Aproximou-se um guarda, com uma protuberante barriga,
como a minha - aliás, deve trabalhar há muitos anos na área
administrativa, pois correr atrás de bandido é difícil -, que
disse ao motorista da rádio: “O senhor poderia estacionar o
veículo do lado de lá?”. O motorista respondeu: “Sim. O senhor me
desculpe por tê-lo estacionado aqui, pois pensei que poderia”. O
guarda disse: “Aqui não pode” e, com a mão, avisou: “Aqui é área
integrada. Estacionamento para quem visita a Polícia Civil é daqui
para cá; a Polícia Militar, daqui para lá”. É preciso dizer ao
guarda que a integração é real. É preciso treiná-lo.
Secretários Moacyr e Balestreri, falarei sobre um assunto que
contrariará muitas pessoas, mas que me incomoda profundamente. É
necessário haver um diálogo mais franco com os que fazem a polícia
e os profissionais de segurança pública e da defesa social para
dizer-lhes o que é possível dar e para que a sociedade possa
compreender. Há dois assuntos que me incomodam profundamente,
sobre os quais não há uma discussão correta. Por exemplo, acaba de
ser aprovada nesta Casa, por orientação do governo do Estado, a
aposentadoria para as mulheres policiais aos 25 anos de efetivo
exercício. Não que elas não mereçam, mas como entenderei que, num
país que tem fator previdenciário, uma gari, ou seja, uma
formiguinha ou profissional que limpa a cidade, só conseguirá
aposentar-se - aliás, se viva estiver - aos 60 anos, enquanto uma
policial se aposentará aos 25 anos? Dizem: “Eduardo, você está se
esquecendo da natureza do serviço”. Será que estou?
Há um caso concreto em Minas, Sr. Balestreri, de uma oficial cujo
nome não citarei - aliás, já o citei muito na rádio, mas aqui não
- que passou pelo menos três terços da sua vida militar carregando
pastas para um sedutor que foi Governador, que depois se tornou
Embaixador em Roma e que foi Presidente. Ela acaba de aposentar-se
com menos de 50 anos com R$13.000,00, R$16.000,00 por mês. Isso é
justo e correto do ponto de vista da segurança ou é contramão da
história? Será que o que se paga a mais a ela falta no salário de
um Soldado que está nas ruas trabalhando?
Outra coisa que me incomoda desde a Conferência Nacional de
Segurança Pública é o salário de R$4.500,00 para o Soldado.
“Gente, mas ele merece”. Agora, alguém precisa dizer que as
professoras ganharão pelo menos R$3.000,00. Neste Estado, se tudo
der certo, só a partir do ano que vem ganharão R$900,00. O salário
atual delas é de trezentos e poucos reais. Com um médico do
serviço público ganhando R$1.000,00 e um engenheiro R$700,00, como
podem prometer que pagarão R$4.500,00 a um Soldado? Não que o
Soldado não mereça, mas o engenheiro e o médico também merecem. E
o Estado dá conta de pagar esse valor? Queria aproveitar este
seminário para propor essa transparência da discussão.
Queria dizer mais coisas, mas estou com medo da campainha.
Secretários, estamos cansados de autoritarismo e de violência e
carentes de autoridade.
Sinto isso pessoalmente. Digo aos senhores que, pelos “e-mails” e
telefonemas recebidos, as pessoas estão com a sensação, com o
sentimento de que se está podendo fazer de tudo no Brasil, porque
a punição provavelmente não virá e, se vier, será branda. Há
poucos dias, Secretário, o motorista, que estava com sintomas de
embriaguez, de um caminhão carregado com carga pesando três vezes
mais que o permitido desceu a avenida mais complicada de Belo
Horizonte em um lugar que é proibido há algum tempo. Mais uma vez
a mão de Nossa Senhora do Carmo evitou uma tragédia, mas uma hora
ela precisará beber água e, quando isso acontecer, morrerá muita
gente. Sabe por que um cidadão faz isso? Porque a multa por esse
tipo de infração é de R$85,00. Dependendo da carga, da empresa e
da pressa, vale a pena.
Sr. Secretário Balestreri, o governo Lula trouxe muita coisa para
Minas Gerais - pelo menos ele veio mais que o FHC, vamos
reconhecer -, mas não vemos uma obra de porte do governo federal,
sobretudo na Região Metropolitana. Estamos brigando pelo metrô. De
repente o senhor pode até dizer que a culpa é nossa, e
concordarei, mas não há metrô, não há anel rodoviário decente.
Antes que eu me esqueça, Secretário - esse número é fresco, peguei
ontem -, se contarmos o efetivo principal mais o pessoal
administrativo e dividirmos férias, folgas - considerando que são
quatro turnos - para 6.500km de rodovias federais em Minas, a
Polícia Rodoviária Federal, que já se desobrigou de 9.000km,
passados para o Estado, tem 100 homens por turno. É mentira
dizerem que estão fiscalizando, Sr. Secretário. Eles estão vivendo
um drama, porque o guarda que fica sozinho no posto enquanto os
outros atendem aos acidentes é assaltado para o bandido levar a
arma. Quando acontece um acidente mais grave, como na semana
passada aconteceu na Rodovia da Morte, que é uma vergonha para
nós, mineiros, e para o Brasil - ela liga todo o Leste do Estado e
nos liga à praia, que é nossa paixão -, ficamos 40 horas sem poder
passar. Não havia um policial federal na frente que dissesse:
“Infeliz, faça o desvio por aqui”. Colocaram um cavalete com uma
placa improvisada em que estava escrito “desvio”. É uma coisa
inacreditável.
Sr. Secretário, o senhor terá acesso ao resumo dessas ocorrências
regionais, dessas 20 audiências, e verá a situação de Uberlândia,
que está com tráfico internacional de drogas fora de controle; de
Teófilo Otôni; de Valadares, que sofre com os coiotes. Falta
Polícia Federal e Polícia Rodoviária Estadual. Cada vez mais
acredito no Hobbes, o inglês do século XVII, segundo o qual a
consciência social é a caneta do guarda. Precisamos nos reeducar,
mas, enquanto isso não acontece, precisamos da caneta do guarda.
Entretanto, não a temos. O sentimento de impunidade é muito
grande. Em Belo Horizonte, Secretário, estamos vivendo um vácuo,
porque a BHTRANS não pode multar, a Guarda não tem efetivo, a PM
não vai. Virou moda avançar sinal vermelho; quando param em fila
dupla, acendem o pisca alerta, só para dizerem que acenderam;
fecham cruzamentos. Permitam-me, mas tenho de fazer o gesto; ou
melhor, não farei aquele gesto famoso que fazem com o dedo e que
antes era exclusivo dos homens. Agora uma senhora para o carro em
fila dupla e, quando você buzina, mostra o dedo.
A campainha vai tocar, Secretário. Contarei para o senhor a
notícia mais fresca de todas: recebi um telefonema ontem à noite
de uma moça, que convidei para ir à rádio. Ela ficou com medo de
falar e de dar seu nome e, por isso, um amigo falou por ela.
Felizmente, antes de eu sair da rádio, havia duas equipes: uma da
Corregedoria e outra do serviço secreto da Polícia Militar para
checar. Uma moça de 23 anos estava esperando ônibus ontem na Rua
São Paulo, esquina com Tupis. Para quem é de fora, ela estava em
frente ao shopping mais central da cidade - os shoppings já não
são mais aqueles antros de tranquilidade, aqueles recintos são
também vítimas de assaltantes - quando se aproximou um cidadão que
a agarrou por trás. Ela só conseguiu ver que ele estava fardado,
armado e com algemas. Ele pediu a ela que entregasse tudo, e ela
deu a ele a carteira e o celular. Eu disse no rádio, às 13h50min,
pouco antes de vir para cá, que o fato é grave de todo jeito. Se
for um Soldado, é inacreditável; se for alguém que roubou ou
comprou uma farda da PM e a está usando, é muito grave. Essa moça
fez uma ocorrência na delegacia e não tem a menor esperança de que
tomem alguma providência. Por isso ela foi nos pedir socorro. O
senhor sabe por que ela o fez?
A Polícia Civil de Minas Gerais defrontou-se com os casos mais
graves da história policial do Estado recentemente e brilhou em
todos, mas no bom desempenho final, pois, quando vemos os
detalhes... Vejamos o caso Bruno: além de algumas derrapadas na
investigação, como liberar uma casa e depois voltar lá, ela nos
ofereceu algo trágico, até hoje não explicado. Duas Delegadas e
dois Agentes, dentro de um avião, fizeram uma filmagem ilegal e
indecente e venderam para uma rede de televisão. Dias depois, um
Agente Penitenciário fez a mesma coisa com o Bruno, dentro da
cadeia.
Houve o outro caso de um maníaco que estava atuando na Região
Metropolitana, preso por latrocínio e outros crimes, mas que, em
momento algum, figurou como suspeito até que o acaso ajudou. E,
quando isso aconteceu, descobrimos que uma de suas vítimas havia
morrido nas mesmas circunstâncias em que outras quatro. O corpo
ficara três meses na geladeira do IML, vinculado à Polícia Civil,
e foi enterrada como indigente, sem que ninguém fosse lá ver se
era a moça que estavam procurando.
Houve o caso da gangue que cortava cabeças, em que uma das
envolvidas, já em liberdade por ordem de Brasília, fora flagrada
aviando receitas de remédios de uso psiquiátrico. À época, ela era
estagiária de Medicina e roubou o receituário de uma profissional
que a orientava e receitou remédios psiquiátricos para uma moça
que não precisava, irmã do principal chefe da quadrilha. Não foram
tomadas providências pelo Conselho Regional de Medicina nem pela
polícia. Oito meses depois, descobriu-se que estavam cortando
cabeças das pessoas.
Há outro caso de uma falha gritante da polícia, mas depois lembro
e conto. Quero agradecer ao Secretário Balestreri e ao Sr. Moacyr
essa oportunidade única, mas agradeço principalmente a cada um dos
senhores que me permitiram desabafar. Meu problema no labirinto
até melhorou.
O Sr. Presidente - Esse jornalista está com labirintite. Imaginem
se estivesse bom.