EDUARDO CERQUEIRA BATITUCCI, Pesquisador do Núcleo de Estudos em Segurança Pública do Centro de Estudos Econômicos e Sociais da Fundação João Pinheiro.
Discurso
Comenta o tema: "Panorama da violência e da criminalidade no Estado de
Minas Gerais".
Reunião
30ª reunião ESPECIAL
Legislatura 15ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 13/09/2006
Página 26, Coluna 3
Evento Seminário Legislativo: "Segurança para todos - Propostas para uma Sociedade mais segura".
Assunto SEGURANÇA PÚBLICA.
Legislatura 15ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 13/09/2006
Página 26, Coluna 3
Evento Seminário Legislativo: "Segurança para todos - Propostas para uma Sociedade mais segura".
Assunto SEGURANÇA PÚBLICA.
30ª REUNIÃO ESPECIAL DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 15ª
LEGISLATURA, EM 21/8/2006
Palavras do Sr. Eduardo Cerqueira Batitucci
Obrigado, Deputado Edson Rezende. Bom-dia. Acredito que o vídeo
da Assembléia foi muito feliz, porque, num certo sentido, mostrou
que a realidade de Minas Gerais é muito complexa; portanto, os
problemas e as soluções de segurança pública para o Estado de
Minas não podem ser analisados de forma assistemática e
assistêmica. Tentarei esclarecer o que entendo por essas palavras.
Na minha reflexão, tentarei trazer algumas questões que têm que
ver com a conjuntura dos crimes em Minas Gerais, ou seja, que
mostrem a quantas anda a criminalidade no Estado de Minas Gerais.
Tentarei também apresentar algumas considerações a respeito da
questão institucional do Sistema de Justiça Criminal no Estado de
Minas Gerais.
O que são crimes violentos? São os crimes que mais incomodam a
população mineira. São considerados crimes violentos: homicídio,
tentativa de homicídio, roubo, roubo à mão armada e estupro. Nessa
análise, tratarei apenas desses crimes.
Entre 1995 e 2003, Minas Gerais vivenciou um explosivo aumento
desses crimes, em torno de 300%, o que trouxe ao Estado de Minas
Gerais e ao aparelho de segurança pública uma série de problemas;
mostrou especialmente à cidadania deste Estado e ao governo a
necessidade urgente de lidar com a questão de segurança pública de
uma forma mais profissional, sistêmica, levando em conta todas as
instituições e todos os problemas do Estado.
Ao mesmo tempo, esse aumento trouxe uma mudança do perfil dessa
criminalidade. Se, na década de 80, a maioria dos crimes violentos
que aconteciam neste Estado eram contra a pessoa - homicídio e
tentativa de homicídio -, hoje 85% dos crimes violentos são contra
o patrimônio - roubo, roubo à mão armada. Isso traz uma série de
conseqüências aos atores do Sistema de Justiça Criminal, que lidam
com a criminalidade.
Nos últimos três anos, observamos uma estabilização e o início da
reversão dos indicadores de violência no Estado de Minas Gerais.
Mais à frente, terei oportunidade de falar disso.
Esta linha que estão observando refere-se às taxas de crimes
violentos. É a soma dos cinco crimes violentos ocorridos no Estado
de Minas Gerais de 1986 a 2005. O que é taxa? Taxa é um indicador
que usamos para comparar o que ocorre em um Município grande com o
que ocorre em um Município pequeno.
Um crime em um Município pequeno terá impacto, força muito maior
do que um crime em um Município grande. Então, usamos esse
indicador, que torna essa realidade comparável entre Municípios
diferentes.
Vocês podem ver que, a partir de 1997, a criminalidade no Estado
de Minas Gerais, conforme disse, explodiu de forma quase
exponencial. A partir de 2003, observamos uma certa estabilização,
com uma pequena redução em 2004 e 2005.
Vamos considerar o bolo da criminalidade como esse quadrado
grande. A parte de cima, a vermelha, refere-se aos crimes
violentos contra pessoa; já a parte de baixo, a azul, refere-se
aos crimes violentos contra o patrimônio. Podemos observar, que
essa parte de baixo, que, em 1986, era minoria e representava
alguma coisa em torno de 40% do total da criminalidade, hoje é
maioria absoluta e chega a 85% do total dos crimes violentos.
Os crimes violentos contra o patrimônio aumentam num ritmo maior
do que qualquer outro tipo de criminalidade em Minas Gerais. Entre
1995 e 2003, aumentaram quase 500%, o que é um número absurdo. Por
outro lado, os homicídios, apesar de terem menor ritmo de aumento,
causam impacto mais violento na população e na segurança pública.
Nesse período, os homicídios cresceram 106%. Esse índice é muito
significativo, é o maior do Brasil.
Essa é a mesma linha dos crimes violentos contra o patrimônio; a
outra, a dos homicídios. Podem ver que, desde 1995, os homicídios
vêm crescendo de forma mais ou menos regular, no Estado de Minas
Gerais.
Ao mesmo tempo, a criminalidade violenta distribui-se de forma
desigual, em Minas Gerais. Os grandes Municípios, especialmente
aqueles que têm mais de 100 mil habitantes, sofrem com a
criminalidade de forma muito mais intensa do que os pequenos
Municípios de Minas Gerais. Então, se somarmos as ocorrências dos
19 Municípios, entre os 853 Municípios de todo o Estado de Minas
Gerais, que têm mais de 100 mil habitantes, encontraremos 73% de
todas as ocorrências. Ao mesmo tempo, cada tipo de criminalidade
terá uma distribuição específica no Estado, correspondente a
diferentes fatores socioeconômicos, demográficos e de capacidade
institucional do Estado.
A linha marrom representa a evolução da criminalidade nos
Municípios que têm mais de 250 mil habitantes. São nove
Municípios, dos quais quatro estão na Região Metropolitana de Belo
Horizonte. A linha azul clara ou roxa refere-se aos Municípios com
mais de 100 mil habitantes. Essas duas categorias de Municípios, a
partir de 2003, apresentam queda ou estabilização da
criminalidade.
As outras linhas, começando com a linha azul clara, são as linhas
de Municípios que têm menos de 100 mil habitantes. Percebemos que
a criminalidade nesses Municípios continua aumentando. Em Minas
Gerais, a criminalidade nos grandes Municípios está estabilizando-
se ou decaindo e, nos pequenos Municípios, está aumentando. Há o
fenômeno de migração da criminalidade dos grandes para os pequenos
Municípios do Estado.
Este é o mapa de Minas Gerais: a maior intensidade da cor
vermelha significa maior criminalidade. Este é o mapa dos crimes
violentos contra o patrimônio, que são típicos dos grandes
Municípios do Estado. A região central do Estado, onde está a
Região Metropolitana e os grandes Municípios, compreendendo o
Triângulo: Uberaba; Uberlândia; Juiz de Fora, na Zona da Mata;
Teófilo Otôni; Governador Valadares; Montes Claros; Paracatu e
Unaí, no Noroeste do Estado, e seu entorno, contém os Municípios
mais atingidos pelos crimes violentos contra o patrimônio.
Este é o mapa do homicídio em Minas Gerais. É um mapa muito
diferente. O homicídio atinge os grandes Municípios, como aqueles
que estão no entorno de Belo Horizonte e na Região Metropolitana
de Belo Horizonte, como Teófilo Otôni, Governador Valadares e
outros grandes Municípios. Mas também atinge, de forma muito
intensa, pequenos Municípios, especialmente aqueles que estão na
região do Rio Doce e do Vale do Mucuri. Só a Região Metropolitana
de Belo Horizonte compreende mais de 50% dos crimes violentos em
todo o Estado de Minas Gerais. A criminalidade violenta em Minas é
um fenômeno bastante concentrado. Como já disse, essa distribuição
vem caindo. Percebemos o fenômeno de migração da criminalidade
violenta para os pequenos Municípios do Estado.
Esta linha mostra o percentual do total dos crimes violentos
ocorridos nos Municípios acima de 100 mil habitantes, nos últimos
três anos. Nos meses de fevereiro e março, época do carnaval, há
uma queda da criminalidade violenta nos grandes Municípios do
Estado, pois ela migra para os pequenos Municípios, onde existe a
tradição do carnaval, visível nesta pequena linha, referente aos
Municípios abaixo de 100 mil habitantes. Algo em torno de 7% a 8%
de toda a criminalidade violenta de Minas Gerais migra, na época
do carnaval, para os pequenos Municípios.
A questão prisional é muito importante. O que observamos no
Estado de São Paulo, neste momento, é uma das questões mais
importantes que temos que enfrentar em relação à segurança
pública. A situação prisional em Minas Gerais ainda é muito grave,
apesar do investimento feito nos últimos anos, com a abertura de
muitas unidades penitenciárias. A participação da Superintendência
da Subsecretaria de Administração Penitenciária aumentou de 20%
para 33% do total de presos nos últimos quatro anos. Hoje a
Subsecretaria de Administração Penitenciária administra de 35% a
quase 40% dos presos no Estado de Minas Gerais.
Cerca de 60% dos presos de Minas estão sob o controle da Polícia
Civil, o que representa um desastre para a Polícia Civil e para o
Estado de Minas Gerais. É preciso que continuem sendo destinados
investimentos maciços para a área prisional do Estado.
Este gráfico mostra a evolução do número de presos conforme a
instituição que os está administrando. A diferença, em dezembro de
2005, entre os presos que eram administrados pela Subsecretaria de
Administração Penitenciária e os que eram administrados pela
Polícia Civil ainda era muito grande. Podemos perceber também que
o número de presos em Minas Gerais está crescendo de forma
significativa nos últimos anos.
Outro grande problema é a questão processual no Estado. Ao
falarmos sobre sistema de justiça criminal estamos falando não
apenas sobre polícias e administração prisional, mas também sobre
o Ministério Público e o Judiciário, que são fatores
indissociáveis desse sistema.
Trago alguns dados preliminares de uma pesquisa que ainda estamos
terminando. O número que vemos ali é o tempo médio decorrido, em
dias, a partir do fato - homicídio -, para que os passos de um
processo ocorram. A abertura de um inquérito policial demora, em
média, 2,48 dias, depois que determinado homicídio ocorreu. O
primeiro documento do Judiciário somente aparece no dia 278. A
denúncia oferecida pelo Ministério Público ocorrerá após um ano e
três meses do fato decorrido. A audiência de júri, após cinco
anos. Se houver recurso, a decisão final de segunda instância
ocorrerá quase seis anos a partir do fato decorrido. Pode parecer
muito tempo - de fato é -, mas, se compararmos com outros Estados,
Minas está numa posição confortável no que diz respeito à
celeridade processual. Na minha concepção, seis anos é bastante
tempo para chegarmos a uma conclusão, principalmente de um
homicídio, crime que mais causa impacto na sociedade.
Percebemos alguns avanços institucionais nos últimos três ou
quatro anos em Minas. A criação da Secretaria de Estado de Defesa
Social foi um grande avanço, porque representa a organização
racional das atividades a serem desenvolvidas entre as
instituições do sistema. Propicia a emergência e a consolidação de
uma abordagem técnica voltada para a produção sistemática de
políticas públicas na área de segurança pública, que o Estado de
Minas não possuía. Temos quatro ou cinco anos de políticas
públicas sistemáticas, racionais, com monitoria e avaliação na
área de segurança pública.
A emergência da Secretaria propicia uma perspectiva sistêmica
adotada para o enfrentamento dos problemas de segurança, que nos
permite definir prioridades para as necessidades políticas,
logísticas, operacionais e de prevenção à criminalidade. Há pouco
tempo, a logística era a única necessidade que, aparentemente, os
governos definiam para a segurança pública. Hoje em dia repartimos
isso com outras questões também muito importantes.
A criação da Subsecretaria de Administração Penitenciária - Suape
- foi muito importante, porque adequou organizacional e
tecnicamente a questão prisional em Minas Gerais, que sempre ficou
à margem das questões políticas adotadas.
Emergência de políticas públicas voltadas para a integração entre
as organizações policiais, não apenas quanto à atividade
operacional e à integração de dados e informações, mas também
quanto ao treinamento e à capacitação. Essas quatro questões são
as mais importantes para a segurança pública em Minas.
Consolidação das políticas de prevenção à criminalidade por meio
de investimentos na organicidade institucional e na priorização de
recursos.
Finalmente, passa a haver recursos sistemáticos para a prevenção
à criminalidade em Minas Gerais.
O primeiro avanço é o reconhecimento, por parte das autoridades
competentes, da importância da questão e a conseqüente alocação de
recursos sistemáticos para a área de segurança pública. Parece uma
coisa óbvia, mas também é uma novidade no Estado.
Outro avanço é o aumento e a qualificação dos instrumentos de
controle social. É importantíssimo o controle social das políticas
de segurança pública, por meio da divulgação dos indicadores de
conjuntura criminal e da emergência de políticas específicas de
gestão do sistema, tais como o Sistema Integrado de Defesa Social
e o Igesp, que são políticas da Secretaria de Defesa Social que
têm por objetivo aumentar a capacidade de gestão do sistema e das
políticas que estão alocadas para a prevenção e o combate à
criminalidade.
Por outro lado, que desafios ainda devem ser enfrentados no que
se refere à política governamental de criminalidade no Estado? Os
primeiros pontos são a consolidação e a manutenção do investimento
financeiro. É muito importante que a população seja capaz de
controlar a manutenção do investimento financeiro e a
disponibilização dos recursos que hoje estão alocados na área de
segurança pública em Minas Gerais. Em segundo lugar, a maturação
do aparato institucional, por meio do investimento na contratação,
na formação e na qualificação de quadros técnicos. A Secretaria de
Defesa Social tem muito poucos quadros técnicos alocados. É vital
que seja feito um investimento na contratação, na formação e na
qualificação de pessoas.
Outro desafio é o aprofundamento dos instrumentos de controle
social para a qualificação do debate público. Este tipo de
eventos, por exemplo, é muito importante.
No que se refere a políticas públicas implementadas ou em
implementação, também devemos ressaltar a continuidade do
investimento financeiro, além do desenvolvimento e da consolidação
de instrumentos institucionais de avaliação e monitoramento. É
importante que sejamos capazes de avaliar nossas políticas e de
monitorar seu desenvolvimento, para que, se necessário, possamos
alterar o rumo e corrigi-las, a fim de que acertemos mais.
Outro desafio nesse aspecto é a manutenção do fluxo de recursos
atualmente alocados na institucionalização do sistema prisional.
Isso é fundamental, porque o sistema prisional ainda é um dos
grandes problemas do sistema de segurança pública em Minas Gerais.
No que tange à integração sistêmica, o desafio é o aprofundamento
das políticas de integração e dos seus instrumentos de gestão e
acompanhamento, seja entre as polícias, seja entre elas e o
sistema prisional. E por último, e principalmente, maior
participação e responsabilização do Ministério Público e do
Judiciário nas políticas estaduais de segurança pública. Muito
obrigado.
- No decorrer da apresentação, procede-se à exibição de “slides”.