DEPUTADO EDSON REZENDE (PT)
Discurso
Comenta a situação da merenda escolar nas escolas do Estado. Comenta
Projeto de Lei Complementar que trata da dívida do Estado com o Instituto
de Previdência dos Servidores do Estado - IPSEMG.
Reunião
98ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 15ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 21/12/2005
Página 134, Coluna 1
Assunto EDUCAÇÃO. PREVIDÊNCIA SOCIAL. ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL.
Proposições citadas PLC 59 de 2005
Legislatura 15ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 21/12/2005
Página 134, Coluna 1
Assunto EDUCAÇÃO. PREVIDÊNCIA SOCIAL. ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL.
Proposições citadas PLC 59 de 2005
98ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 15ª
LEGISLATURA, EM 14/12/2005
Palavras do Deputado Edson Rezende
O Deputado Edson Rezende* - Sr. Presidente, Sras. Deputadas e
Srs. Deputados, público presente; para que as coisas aconteçam, é
importante a presença de vocês, especialmente em relação à
valorização dos servidores, que são aqueles que tocam este Estado
para a frente. Parabéns pela presença!
Antes de fazer meu pronunciamento, gostaria de falar sobre uma
propaganda do governo do Estado relacionada à alimentação escolar.
O governo mostra a imagem de crianças se alimentando, como se tudo
estivesse correndo bem e como se a alimentação fosse excepcional.
Como membro do Conselho Estadual da Alimentação Escolar, gostaria
de dizer que recentemente, na semana passada, foi apresentada uma
pesquisa feita com 500 escolas deste Estado. Essa pesquisa
demonstrou exatamente o contrário. Ou seja, há problemas sérios em
relação à estrutura física das cantinas, das cozinhas e do
refeitório. Espaços exíguos contêm centenas de crianças e de
jovens, que, na maioria das vezes, alimentam-se de pé. Eles nem
sequer possuem um espaço adequado para se alimentarem.
Quero dizer ainda da constatação de desnutrição, de anemias
ferroprivas, de hipovitaminose A e, por outro lado, da obesidade
nas escolas freqüentadas pela classe média, em contraposição às
escolas cursadas pela população mais pobre das periferias. Esse é
o retrato da alimentação escolar de Minas Gerais, cuja mostra
demonstra, com clareza, que há problemas sérios em relação à
alimentação.
Além disso, no 2º grau, são 800 mil alunos da rede pública em
Minas Gerais. Alunos esses adolescentes e em fase de crescimento,
que não têm sequer o repasse de um centavo do governo do Estado.
Mas a propaganda do governo do Estado omite esse problema. O
Estado de Minas deveria colocar a mão na chaga para buscar uma
solução para esses jovens, que crescem, que precisam aprender, e
sobre os quais o Estado necessita ter responsabilidade. No
entanto, ele não possui responsabilidade perante a nossa
juventude, nem mesmo com os seus servidores públicos que aqui se
encontram para lutar por melhores condições de trabalho e de
salário.
Parabéns pela presença, mas não poderia deixar de falar desse
problema que vivemos. São quase 2 milhões de alunos do ensino
fundamental e do ensino médio, e boa parte deles possui problemas
sérios, que nos preocupam muito.
Sr. Presidente, caros telespectadores, senhoras e senhores, quero
discutir uma outra questão, sobre a qual temo-nos debruçado
durante anos: o Ipsemg. Preocupamo-nos com a assistência à saúde e
com a previdência.
Tenho em mãos o Projeto de Lei Complementar nº 59/2005, que trata
da dívida do Estado de Minas Gerais com o Ipsemg. Eis aí uma
questão da maior gravidade, sobre a qual pairam as mais severas
dúvidas. E é nesse contexto de complexidade, risco e incerteza que
a maioria governista nesta Casa se propõe a aprovar, sem
discussão, sem informação, esse Projeto de Lei Complementar nº 59,
que nada mais é senão o perdão da dívida do Estado com o Ipsemg; é
um cheque em branco dado ao Governador Aécio Neves, por meio do
qual o Executivo, instantaneamente, não terá que honrar seus
compromissos com os regimes de previdência social e de assistência
à saúde de seus servidores públicos.
O art. 80 do Projeto de Lei Complementar nº 59 diz o seguinte:
“Fica quitada a dívida do Tesouro do Estado para com o Ipsemg,
decorrente do atraso no recolhimento das contribuições
previdenciárias e das consignações facultativas, por meio de
pagamento mensal, no valor equivalente à diferença entre a receita
das contribuições estabelecidas até a data de publicação desta lei
complementar, destinadas ao custeio dos benefícios a que se refere
o inciso II do art. 6º, cobradas dos segurados que ingressaram no
Estado até 31/12/2001, e o pagamento dos benefícios previstos
nesse inciso para esses mesmos segurados”.
Quem lê esse texto não entende nada, porque construiu-se uma lei
para que não a entendêssemos.
No substitutivo apresentado na Comissão de Constituição e
Justiça, o perdão usará a estratégia de obrigar o Estado a uma
contrapartida de pagamento de precatórios alimentares devidos pelo
Ipsemg.
Isso significa que o Ipsemg deve, em pensões e dívidas com os
pensionistas, um quantitativo de recursos, e essa será a dívida
que pagará. Entretanto, não sabemos que quantitativo de recursos é
esse, mesmo porque o Governador do Estado não remeteu à Comissão
Especial que estudou o Ipsemg o montante da dívida do Estado com
essa instituição, e ela chega a cerca de R$2.000.000.000,00.
Tanto num caso quanto noutro, prevalece a irresponsabilidade
fiscal e os interesses de ocasião, em detrimento do interesse
público.
Especificamente, queremos estabelecer o seguinte: estamos-nos
referindo a recursos de duas ordens - dado que é ignorado pelo
projeto -: uma questão é previdenciária, e a outra refere-se à
assistência à saúde.
Não temos informações do quantitativo de recursos do fundo
previdenciário nem dos recursos destinados para a assistência à
saúde. Não temos isso discriminado, porque essa informação não nos
foi enviada pelo Presidente do Ipsemg.
Estamo-nos referindo a valores desconhecidos. Não sabemos qual é
o quantitativo desses precatórios.
Estamos discutindo matéria que sofre forte regulação a partir da
Constituição da República e das normas federais que estabelecem
normas gerais sobre direito financeiro e previdenciário.
De antemão, podemos dizer que, do ponto de vista político, não
podemos votar, nem mesmo discutir, algo que desconhecemos.
Do ponto de vista jurídico-político, não podemos, como Poder
Legislativo, entregar um cheque em branco ao Poder Executivo, em
se tratando de matéria sobre a qual a apreciação da Casa do povo é
indispensável.
Do ponto de vista financeiro, não podemos contribuir ainda mais
com a fragilização e depauperação do patrimônio público mineiro,
lesando novamente o Ipsemg, que já se encontra em difíceis
condições de funcionamento; o servidor público, pois esses
R$2.000.000.000,00 lhe pertencem, dinheiro que os governos
passados pegaram; e o povo mineiro, já que uma gestão temerária
das finanças públicas acaba por afetar negativamente o Estado como
um todo.
Do ponto de vista jurídico, não podemos afrontar a Constituição
da República e a legislação federal que rege o assunto.
Notem, caros colegas e prezados visitantes, que a proposta em
questão, não fossem todos os óbices que são colocados em seu
caminho, não poderia, em qualquer hipótese, prosperar no ponto de
discussão em que se encontra.
É isso aí meus companheiros. Temos de nos manter firmes nessa
defesa, afinal, esta Casa não tem qualquer informação a respeito
da dívida que se pretende perdoar. A Lei de Responsabilidade
Fiscal dispõe que, para assegurar transparência fiscal, é preciso
garantir ao segurado o acesso às informações relativas à gestão do
regime. Essas informações, que a lei bem detalha, nunca são
prestadas no caso do Estado e nunca chegaram a nós, apesar de a
nossa Comissão Especial ter encaminhado vários requerimentos ao
governo do Estado.
Mais que isso, há o descaso do Poder Executivo, especialmente do
Ipsemg, com esta Casa, no campo da prestação de informações.
Exatamente sobre essa matéria, dívida do Estado com o Ipsemg,
apresentamos, na Comissão Especial do Ipsemg, que funcionou neste
ano, um requerimento, em que se solicitava ao Presidente da
autarquia informações sobre o montante da dívida do Estado com o
Instituto, com discriminação das parcelas referentes aos créditos
previdenciários e aos relacionados à saúde.
Esse requerimento foi aprovado pela Comissão e recebeu parecer
favorável da Mesa, exarado pelo nobre Deputado Rêmolo Aloise, que
afirmou, então, que “faz-se necessário o conhecimento real da
situação dos direitos creditícios que o Ipsemg detém junto ao
Estado”. Sábias palavras!!!
Ocorre que esse requerimento foi aprovado em Plenário no dia 17
de agosto e remetido em 22 do mesmo mês. Quatro meses depois, ou
seja, até este momento, ainda não foi atendido. Por isso fomos
obrigados a apresentar outro requerimento, reivindicando que esta
Casa tome as medidas judiciais cabíveis, por meio de sua
procuradoria, para resguardar suas prerrogativas constitucionais.
Se o Executivo não atende aos pedidos de informações que fazemos,
pedidos claros, específicos e certos, não podemos falar em
tripartição de Poderes e em regime constitucional.
Então, eminentes pares, não fosse por outro motivo, não
poderíamos, por uma razão lógica, votar esse Projeto de Lei
Complementar nº 59, já que não o conhecemos.
Além disso, devemos observar o gravidade desse tema, que se
arrasta há cerca de 10 anos sem uma solução adequada. Desde que os
Governadores Hélio Garcia e Eduardo Azeredo deixaram de repassar
ao Ipsemg os recursos que lhe eram devidos, essa situação
permanece. Este último, o hoje Senador Azeredo, cometeu o que é
tipificado no art. 168-A do Código Penal Brasileiro como sendo a
“apropriação indébita previdenciária”, cujo fato típico é “deixar
de repassar à previdência social as contribuições recolhidas dos
contribuintes, no prazo e forma legal ou convencional”, sujeitando
o agente à pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa.
Com essa postura, aqueles governantes e o atual governo, por meio
do Projeto de Lei Complementar nº 59, ofendem o princípio do
equilíbrio financeiro-atuarial, estabelecido na Constituição da
República, que tem por objetivo exatamente evitar uma relação
promíscua entre previdência e outras esferas de governo, sendo
certo que, nesta área, a orientação política cede à técnica.
Estatui, ainda, a Constituição do Brasil, em seu art. 40, que o
regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo
efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios
fixados para o regime geral de previdência social. E que fica
vedada a existência de mais de um regime próprio de previdência
social para os servidores titulares de cargos efetivos e de mais
de uma unidade gestora do respectivo regime em cada ente estatal,
ressalvado o disposto no art. 142, § 3º, inciso X.
Ora, se o Executivo – administração direta - for incumbido de
pagar compromissos previdenciários do Ipsemg, não estará ele
investido da condição de gestor parcial do sistema? Não é
exatamente isso que a Constituição veda?
A mesma Constituição, obra cuja leitura recomendo, estabelece, já
no art. 167, inciso XI, que é vedada a utilização dos recursos
provenientes das contribuições sociais de que trata o art. 195,
inciso I, “a”, e inciso II, para a realização de despesas
distintas do pagamento de benefícios do regime geral de
previdência social de que trata o art. 201, sendo essa uma regra
geral incorporada ao regime jurídico dos regimes próprios de
previdência.
Ora, o que se pretende aqui é exatamente consagrar a ineficácia
desse dispositivo, por meio do qual o legislador impediu que o
dinheiro previdenciário vá parar em cofres estranhos a seu
objetivo. O perdão que ora se pretende, por meio do já aludido
“cheque em branco”, nada mais faz que, por via oblíqua, consagrar
a possibilidade vedada pela ordem jurídica de se utilizarem
recursos previdenciários para outros fins. Perde a previdência,
perde o servidor e perde o povo mineiro.
O art. 29 deixa claro que as disponibilidades de caixa relativas
aos recursos vinculados ao pagamento de benefícios dos regimes de
previdência social, geral e próprio dos servidores titulares de
cargo efetivo, ainda que vinculados a fundos específicos, a que se
referem os arts. 249 e 250 da Constituição Federal, serão:
I - depositadas em conta separada na mesma instituição;
II - aplicadas com observância dos limites e condições de
proteção e prudência financeira estabelecidos pelo Conselho
Monetário Nacional.
Ou seja, esse dinheiro tem destinação e tratamento específicos.
Não está à disposição do legislador estadual tratar dessa matéria
como bem quiser. Ora, pode-se tergiversar o quanto quiser, mas a
verdade é que o dinheiro previdenciário estará - como já está de
fato - repassado para outras contas, antes criminosamente
“emprestado”, agora “doado” ao Tesouro Estadual, comprometendo as
finanças do Estado.
Em 1998, dados do Tribunal de Contas evidenciavam que havia,
somente na condição de Obrigações Liquidadas a Pagar, um débito de
R$640.000.000,00 do Estado com o Ipsemg, decorrente de
contribuições previdenciárias não repassadas.
Estima-se, hoje, conforme dados apresentados em juízo pela
Auditoria-Geral do Estado, que esses valores estejam em cerca de
R$1.600.000.000,00, valores estes que temos a intenção de
averiguar, através de requerimentos ainda não respondidos e que
nos parecem subestimados, se analisados sob a ótica do princípio
do equilíbrio financeiro-atuarial.
Houve uma CPI nesta Casa, em 1997, e uma comissão especial, este
ano, que se dedicaram a analisar a situação do Ipsemg sob vários
aspectos. Existem dez requerimentos aprovados nesta Casa, enviados
há mais de quatro meses, pedindo a autoridades do Poder Executivo,
especialmente ao Presidente do Ipsemg, informações sobre a
situação do órgão. Ainda não foram respondidos. Por isso mesmo é
que votamos, na comissão especial, contra o relatório do Deputado
Carlos Pimenta, que pouco contribuiu para trabalharmos os
problemas do Ipsemg - aliás, não contribuiu sequer para conhecê-
los.
Por isso é que requeremos sua remessa para apreciação do
Plenário. Por isso, entre outras razões, afirmamos que esta Casa
não pode aprovar o Projeto de Lei Complementar nº 59 sem saber do
que se trata, sem debatê-lo, sem confrontar suas pretensões com
dispositivos superiores e vinculantes de ordem jurídico-
constitucional. Esperamos que a razão prevaleça e que esta Casa
tenha sensibilidade política bastante para dar ao Projeto de Lei
Complementar nº 59 um tratamento mais zeloso e menos apressado,
sendo certa a impossibilidade de sua aprovação na sessão
legislativa de 2005. Muito obrigado.
* - Sem revisão do orador.