DEPUTADO DOUTOR WILSON BATISTA (PSD), Presidente "ad hoc"
Discurso
Legislatura 18ª legislatura, 1ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 03/10/2015
Página 93, Coluna 1
Evento Ciclo de Debates: Judicialização da Saúde.
Assunto SAÚDE PÚBLICA.
Observação Participantes dos debates: Sra. Patrícia Mendes, deputado Antônio Jorge, Sr. Mário Cavaca, Sra. Ana Raquel Rabelo, Sr. Vítor Augusto Vieira, Sr. Marco Aurélio Cozzi, Sr. Thiago Americano, Sra. Elizaine Reis, Sr. Roges Carvalho, Sra. Liliane Arouca. Sr. Jacinto Alves, Sr. Renato Luís Dresch, Sra. Patrícia Paim.
72ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 18ª LEGISLATURA, EM 15/9/2015
Palavras do presidente (deputado Doutor Wilson Batista)
O presidente – Inicialmente, serão feitas perguntas orais. Vou anunciar o nome de cada pessoa inscrita para fazer a intervenção. Peço que essas pessoas se dirijam aos microfones. Inicialmente, começaremos com a Patrícia Mendes, da Associação Mineira dos Portadores de Doenças Inflamatórias Intestinais – Amdii. Por favor, dirija a pergunta ao membro da Mesa.
A Sra. Patrícia Mendes – Boa tarde, doutores. Dizer que os assustadores números da judicialização acontecem porque os pacientes estão pleiteando medicamentos sem necessidade equivale a afirmar que todos os políticos estão envolvidos em atividades reprováveis. As duas afirmativas são inverdades. Sejamos sensatos então. Não podemos generalizar e deixar que os justos paguem pelos pecadores. Hoje estou aqui como presidente da Amdii, mas também como cidadã. Eu também tenho uma doença inflamatória intestinal e não estaria aqui se não fosse por um medicamento que consegui judicialmente.
Feita essa consideração – é uma pena que o Dr. Felipe Dutra já tenha saído -, cumpre-me prestar aos senhores presentes um esclarecimento. Ele disse que os medicamentos estão sendo revendidos. Na Secretaria de Saúde de Minas Gerais, a cada três meses, o paciente precisa renovar a receita, comprovando que efetivamente continua fazendo uso do medicamento. Se sairmos daqui, hoje, sem as respostas às nossas angústias, nós, representantes de associações de portadores de doenças de Crohn e de Menkes, teremos perdido dois dias de trabalho com nossos portadores.
A questão para todos os senhores é: nossos pacientes fazem uso de medicamentos de uso excepcional distribuídos pela Secretaria de Saúde, que constam nos respectivos PCDTs. Um desses medicamentos já é distribuído há anos, genérico, que sempre ganha nas licitações. Esse medicamento não faz efeito, sai inteiro nas fezes; não faz efeito nenhum, e os pacientes continuam adoecendo, apesar de estarem recebendo o remédio da secretaria, apesar de a secretaria estar pagando por ele ao laboratório.
Há alguns anos, o Ministério Público conseguiu o recolhimento do lote adquirido pela SES. No ano seguinte, houve nova licitação, e o mesmo laboratório ganhou. Todo ano ganha, e o não efeito continua, o adoecimento dos portadores continua. É uma constante. O laboratório já teve vários medicamentos recolhidos pela Anvisa. Já foi punido, interditado e teve seu certificado de boas práticas negado.
A questão é o que fazer, se nem o Ministério Público conseguiu conter essa licitação, que todo ano ganha. É um absurdo a Secretaria de Saúde, o Ministério da Saúde gastarem um dinheiro que é inócuo, que não produz efeito. Em relação ao medicamento, os pacientes não conseguem a finalidade esperada. Eles não conseguem se manter em remissão com esse remédio. O Estado está jogando esse dinheiro água abaixo. O que faremos? Essa é a questão posta para todos os senhores da Mesa. Obrigada.
O presidente – Com a palavra o deputado Antônio Jorge, que também foi secretário de Saúde, para que possa dar a resposta.
O deputado Antônio Jorge – Escutei atentamente o que disse a Sra. Patrícia, cuja fala é muito importante. O nosso ciclo de debates, em seu formato previsto regimentalmente, necessariamente não tem de ser propositivo em termos legislativos, mas obviamente deve – afinal, estamos aqui nos esforçando – fazer diligências após seu término. Pode haver um conjunto de diligências a partir do relatório final, daquilo que ouvimos e cotejamos aqui nas diversas falas. Essa situação que a ilustre convidada nos traz é muito relevante. Talvez pudéssemos formular, a partir da Comissão de Saúde, até mesmo em razão do resultado desse ciclo, alguma diligência em relação a isso. Até já imagino as complexidades do assunto. O próprio Ministério Público já tratou do problema, e a empresa está constituída e ganhando licitações. A situação não deve ser simples, mas, dada a gravidade da denúncia e da ausência de efeitos, talvez pudéssemos fazer alguma diligência maior junto à Anvisa ou a algum laboratório que estudasse questões de bioequivalência ou seja lá o que for.
De qualquer forma, o caso chamou muito minha atenção. A responsabilidade da presidência, que conhece o assunto, é muito grande. Deveríamos dar tratativas a esse caso. Pediria à Sra. Patrícia que nos informasse, por escrito, o nome do medicamento ou do laboratório. Assumo – tenho certeza de que o farão também os membros da Comissão de Saúde – o compromisso público com a entidade de fazermos diligência e darmos alguma resposta quanto a esse assunto.
O presidente – Apesar de o foco deste fórum não ser basicamente dar respostas para alguns casos pontuais, entendo a angústia, a importância e a gravidade do relato da senhora. Se isso continua, realmente tem de ser sanado porque é inaceitável fornecer um medicamento que não tem efeito nenhum. Isso é gravíssimo não só para o próprio paciente, como também para quem é responsável por deixar esse medicamento ser consumido por pessoas com doença crônica, alguma doença extremamente séria, uma doença que, se não tratada corretamente, faça com que o estado de saúde do paciente seja agravado a cada dia. Estamos aqui à disposição, nosso gabinete está à disposição. Se quiser voltar aqui nesta mesma semana, junto à Comissão de Saúde, poderemos agendar uma audiência na Secretaria de Saúde. Precisamos verificar onde está sendo fornecido esse medicamento. Se realmente isso está acontecendo, alguma providência tem de ser tomada. Estamos à disposição.
Em razão do adiantado da hora, encerramos as inscrições para as perguntas orais. Passo a palavra ao próximo participante, Sr. Mário Cavaca.
O Sr. Mário Cavaca – Boa tarde. Nesses dois dias de debates, muitas coisas importantes nos foram trazidas. Acredito, como cidadão, que as coisas vão evoluir. Há uma tendência muito grande de melhora a partir do que vimos aqui. Hoje tivemos a fala do Dr. Felipe sobre antecipação de tutela. O Dr. Maurício falou que determinação judicial não se discute, cumpre-se.
E aí, uma questão que foi muito lembrada nesses dois dias: se os juízes não têm o conhecimento técnico médico, então por que, de repente, esse grande número de antecipação de tutela, se os juízes não têm esse conhecimento técnico? Uma vez dada essa antecipação de tutela, ela é reversível? Pode-se fazer alguma coisa? Será que qualquer um dos doutores do saber, os advogados, pode me responder isso?
Gostaria de parabenizar o evento e sugerir à Drª Patrícia que rasgue a passagem e implante o Camed aqui no nosso estado.
O presidente – Vamos fazer o seguinte: todos os que estão inscritos farão suas perguntas, depois cada membro da Mesa dará a resposta a todos ao mesmo tempo. Os inscritos são Ana Raquel Rabelo Cortes, Marco Aurélio Cozzi e Víctor Augusto Vieira. Com a palavra, Ana Raquel Rabelo.
A Sra. Ana Raquel Rabelo – Boa tarde a todos. Primeiramente, gostaria de parabenizá-los pela iniciativa. Estou aqui para representar a Secretaria de Saúde. Sou assistente social de formação e passei por um problema muito sério. Há nove meses, descobri que a pessoa que mais amo está com câncer. Aprendi a ver o usuário com outros olhos, porque quando passamos por questões de saúde a gente se desestabiliza. Não é só o paciente que fica doente, mas a família também.
Muitas vezes pedimos ao juiz o que as políticas públicas não estão fazendo. Posso até estar fora da questão da judicialização do debate, mas ficou muito claro na palavra de todos os palestrantes que o que falta é política pública que nos atenda com eficácia, porque, infelizmente, trabalhamos cinco meses no ano para pagarmos impostos, para ligarmos o Jornal Nacional e para vermos que nosso dinheiro está em escândalos, que nosso dinheiro está pagando farras e viagens para deputados. Felizmente, existem pessoas boas. Não podemos direcionar isso a todos os políticos, não podemos falar que todos os políticos são corruptos porque não são, mas uma boa parte deles acaba deixando nossa política a desejar. O que precisamos hoje, senhores, é de orçamento, é de eficácia, é de conselhos ativos, com a participação da população.
Quem aqui é do conselho? Quem está aqui como usuário? Sou presidente do meu conselho. Como vou me fiscalizar? Muitas vezes levanto pautas, mas o usuário não tem conhecimento disso. Como vamos usar uma linguagem técnica para queimar o assina o nome? São questões que a gente precisa pensar porque, quando precisei do serviço de saúde para minha mãe, eu consegui, não porque eu trabalhasse na Secretaria de Saúde, mas porque Barretos me ajudou. Hoje lá é referência. Eles fornecem toda a medicação. Ela toma vacina de R$7.000,00, de 21 em 21 dias. Então por que todo o Brasil não tem esse atendimento? Por que todas as famílias não têm esse atendimento de excelência nas diversas formas de doenças? Deixo aqui, senhoras e senhores, a minha pergunta: de quem e como vamos cobrar esse orçamento? Ficou bem claro que para a atenção primária há o recurso, mas há recurso para média e alta complexidades?
Quando nos chega um paciente precisando de ressonância magnética ou biopsia, não sabemos para onde encaminhá-lo. Pegamos a regulação sem saber o que fazer porque os municípios de referência não estão conseguindo atender sequer a demanda local. Precisamos reformular a tabela do SUS. Como podemos pagar por um procedimento R$68,00 se a agulha custa R$100,00? Como um município pode fornecer um medicamento que não está na relação da Rename? Ele vai esbarrar no Tribunal de Contas. É por isso que ocorre a judicialização. Para onde encaminhar os pacientes? O que fazer? Quem é o responsável? Precisamos cobrar mais. Ficou muito claro que o problema não é a judicialização, e sim a falta de eficácia das políticas públicas. Obrigada.
O presidente – Com a palavra, o Sr. Vítor Augusto Vieira.
O Sr. Vítor Augusto Vieira – Minha pergunta é para o Dr. Renato Dresch. Eu gostaria de saber qual o posicionamento do Tribunal de Justiça diante dos arts. 19-C e 35, inciso VII, da Lei nº 8.080. O primeiro diz que são vedados a todas as esferas de gestão o pagamento, o ressarcimento, o reembolso de medicamentos, produtos e procedimentos clínicos ou cirúrgicos experimentais não autorizados pela Anvisa. O segundo trata das ações regressivas de um ente quando cumpre a obrigação de outro. Muito obrigado.
O presidente – Com a palavra, o Sr. Tiago Americano, advogado. Com a palavra, o Sr. Marco Aurélio.
O Sr. Marco Aurélio Cozzi – Boa tarde a todos. Saúdo a Assembleia por este evento. A sua nota é 10. Em vez da hora de Brasil, essa pode ser a hora de Minas Gerais, pelo alto nível deste debate.
Como integrante deste evento, represento aqui a Frente Parlamentar em Defesa das Práticas Integrativas da Saúde, em nome dos deputados Adelmo Carneiro Leão e das ex-deputadas Liza Prado e Luzia Ferreira. Alguns aspectos importantes não foram citados neste evento. Uma pessoa que é financiada pelo SUS e pela Justiça não consegue entender por que o paciente não aprende com a própria doença, como diz São Tomás de Aquino. Ele não aprende, continua com aquele modus vivendi deteriorado, e o SUS não tem condições de ampará-lo. Assim, continua com a vida sucateada, alimentação sucateada, falta de harmonia no ambiente familiar, desarmonia em termos patológicos, excesso de droga, status morbidus – a pessoa se sente honrada com a morbidez. A população que recebe recursos do SUS acaba desenvolvendo um processo patológico. É preciso consciência para fazer com que a alma se recupere, como diz François Rabelais. Temos de realmente usar a profundidade da nossa alma para ter uma visão da saúde de forma mais ampla.
Finalmente, a Constituição fala da integridade da saúde. Ontem, o professor de medicina da USP, Fernando Aith, abriu um ligeiro parêntese dizendo que poderíamos ter alternativas na assistência à saúde e no abatimento do custo-saúde, mas não falou realmente que temos, no SUS, as práticas integrativas de saúde, que curam qualquer tipo de doença ou tratam delas amenizando os custos. Então, acho que temos de atentar para isso, pois acho que a coisa já existe, mas ela está sendo omitida e substituída por uma consciência científica, muitas vezes, sem consciência. Com isso, então, temos acupuntura, homeopatia, tudo. Podemos fazer qualquer tipo de outra intervenção só com acupuntura, como tenho experiência. Aliás, a minha experiência vem da época do Tancredo Neves no Incor, quando o atendi lá. Então, foi uma luta muito grande, e que estou tentando colocar aqui como conclusão do evento, que foi maravilhoso, mas pautou por esse tipo de afastamento dessas coisas que já existem no SUS.
Por fim, o valor da vida. O Dpvat dá o valor da vida humana, da invalidez: R$3.500,00. Então, o custo da vida realmente já existe pelo próprio governo, institucionalizado pelo Dpvat. Muito obrigado. Felicidades a todos.
O presidente – Com a palavra, Thiago Americano.
O Sr. Thiago Americano – Boa tarde, senhores. A minha pergunta é dirigida ao desembargador Renato Luís Dresch. Desembargador, na sua exposição, V. Exa. bem colocou todas as especializações, os cursos necessários para que o senhor obtivesse a expertise hoje na área da saúde dentro do Poder Judiciário. Como bem expôs também, sabemos da dificuldade que é para todo o Poder Judiciário, todas as varas cíveis da Fazenda estadual e municipal, obter tal especialização, até porque tem de atender a temas diversos e de difícil manutenção dessa mesma expertise para todos. Eu diria que é impossível. Nesse sentido, conforme também foi aqui exposto nas outras palestras, há a importância dos estudos do Nats, Ccates, Ibedess e todas essas questões que estão sendo feitas para auxiliar o Poder Judiciário nesse sentido. Realmente, acho que são de grande valia. Por fim, foi observada também a existência das máfias de próteses, órteses e medicamentos, e a necessidade humana daquele paciente do caso concreto que está sendo analisado no Poder Judiciário. Então, a minha pergunta, e de fato o é, não é uma exposição sobre tudo que foi feito aqui, mas realmente relativa já ao caso judicializado, e não às questões preventivas em relação à judicialização. Nesse sentido, excelência, entendo que o contraditório, todas as provas a serem produzidas caso a caso, para que não haja nenhuma injustiça de lado a lado, são essenciais nesse tipo de processo relativo à saúde. Assim, a minha pergunta vem ao encontro do novo Código de Processo Civil, que já foi aprovado e, se não houver nenhuma alteração, a partir do dia 18/3/2016, entrará em vigência, que é a questão relativa à uniformização vinculante das jurisprudências para os chamados processos de massa, nos quais, por óbvio, se enquadram os casos da saúde. Então, a minha preocupação e a pergunta que faço a V. Exa. é a seguinte: com toda essa preocupação de maior especialização, de estudos em cima dos casos da saúde, tanto pública como suplementar, não corremos o risco de, rapidamente, ou seja, ser um dos primeiros casos a uniformizar a jurisprudência, de forma a colocar todos esses casos assistenciais numa vala comum e perdermos grande parte desse excepcional trabalho técnico que tem sido realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, pelo CNJ e por todos os envolvidos? Parabéns pelo evento. Obrigado a todos.
O presidente – Com a palavra, a Sra. Elizaine Reis, da Prefeitura de Campo Belo.
A Sra. Elizaine Reis – Boa tarde a todos aqui presentes. Inicialmente quero parabenizar a todos pela organização e pela magnitude do evento. Tivemos oportunidade de ouvir e expor, e isso só tem a engrandecer a construção desse momento democrático que estamos vivendo e a colaborar ainda mais para a construção desse cenário da saúde.
A minha pergunta será direcionada aos deputados Doutor Wilson Batista e Antônio Jorge, representantes desta Casa. Nesses dois dias de evento, ouvimos posicionamentos do Judiciário, da Defensoria Pública, do Ministério Público e de associações, que também tiveram vez para falar. O direito à saúde – ontem também falei dessa forma – aqui não se discute. É constitucional, como bem expôs o desembargador; o art. 196 é claro. Então, até que se mude esse artigo, até que se altere ou que ele seja suprimido, a saúde é um direito de todos. Só que levanto a bandeira do município, enquanto servidora municipal. Debatemos e tivemos anseio de vir aqui foi por uma solução para o município, porque hoje é ele quem paga a conta da judicialização da saúde. Temos processos lá em que chamamos à lide a União, o Estado, e o Judiciário da 1ª instância não aceita, com o consentimento do Ministério Público, que também se opõe a que sejam chamados o Estado e a União nessas demandas, porque elas se prolongariam muito no Judiciário. Se pensarmos que atender o pedido administrativamente é a solução para a não judicialização, vamos ficar no mesmo impasse, porque o município vai pagar a conta da mesma forma. Ou o município paga a conta, atendendo os pedidos administrativamente por meio de câmaras, como expôs aqui a palestrante, ou o município paga a conta por meio das sentenças judiciais. Mas é o município quem paga.
Ouvimos aqui que o Judiciário interfere nessa questão da administração na falta de políticas públicas. Então, pergunto a V. Exas., diante de tudo o que aqui foi exposto e diante do posicionamento de várias entidades – Ministério Público, Judiciário, Defensoria: depois, com a conclusão deste ciclo de debates, qual será a proposta do Legislativo na questão dos municípios que estão pagando a conta? Obrigada a todos pela oportunidade.
O presidente – Com a palavra, Roges Carvalho, último inscrito, do Sindicato dos Psicólogos de Minas Gerais.
O Sr. Roges Carvalho – Boa tarde a todas e a todos. Mais uma vez, fico muito feliz em participar deste evento, confesso que aprendi muito. Deputado Antônio Jorge, foi muito bom. Vocês estão de parabéns, deputado Doutor Wilson Batista, foi muito bom. Mas fica sempre alguma dúvida. Por exemplo, discutimos muito a judicialização, mas ela ficou bastante centrada no que o médico diz como deve, e como o Judiciário diz que deve cumprir. É claro que houve uma série de considerações que encheram, permearam toda a discussão. Por exemplo, acho que o Dresch foi muito feliz – e acho que todos estão de parabéns – ao falar claramente da importância do controle social, ao dizer que os conselhos são importantes nessa discussão. Mas vi o Maurício, de Santa Catarina, não é, Maurício? De repente, no fluxograma não aparece nada do controle social. Trabalhamos aqui muito sobre o SUS, deputado Doutor Wilson Batista, e, de repente, vemos que é como se a participação social ficasse alijada do processo, não tivesse esse grande envolvimento. Com isso, saio um pouco frustrado.
Nós que batalhamos muito no SUS e lutamos muito pelo fortalecimento da atenção primária e da estratégia da saúde da família, que é a maior porta de entrada do SUS, não vemos alguma coisa acontecer para que haja prevenção. Acho que o Dresch disse também que são poucos os casos nessa área. Então, fica, sim, alguma coisa, como se pudéssemos estar o tempo todo trabalhando não para a medicação, mas para a “medicamentalização” da vida, da sociedade. Ou seja, o medicamento seria a própria terapêutica final, a salvação para o SUS; e, muitas vezes, estamos relegando a atenção primária, a atenção básica, o lugar de encontro, o lugar de diálogo, que foi muito trocado aqui, ouvindo as pessoas. Seria bom se pudéssemos até puxar a regulação para que ela se aproximasse mais da atenção primária. Com essa proximidade, haveria o cuidado com o outro. Muitas vezes vemos que ela está muito na média complexidade, como se houvesse realmente uma cisão do SUS, e isso não é verdade.
Então, fica aqui a minha proposta de remontarmos mais o conceito da equidade, trabalhar com políticas públicas mais eficazes e, assim, contribuir com a humanização do SUS, a humanização da saúde. Assim nos chamariam a atenção para que fortalecêssemos o antes, estivéssemos tomando mais conta da prevenção, da escuta, do cuidado com o outro, antes de cairmos na judicialização. Realmente a arena do Judiciário não é a melhor, embora ela seja um mal necessário. Estou dizendo mal necessário porque essa discussão deveria ficar estritamente no campo da saúde. Nós, profissionais e usuários da saúde, em diálogo com os gestores e o Ministério Público, que é um grande parceiro do controle social, deveríamos poder definir essas questões. Contudo, acho que este evento valeu. Aprendemos muito e esperamos levar algo para frente e dar uma resposta positiva a essa disputa cruel, quando a pessoa precisa da judicialização para, muitas vezes, ser assistida. Acho que esse não é o melhor caminho. Podemos fazer melhor. Obrigado.
O presidente – Temos dois novos inscritos: Liliane Arouca, da sociedade civil, e Jacinto Alves.
A Sra. Liliane Arouca – Boa tarde a todos da Casa, da Mesa, nobre deputado e V. Exas. do Judiciário. Estando aqui como sociedade civil, quero fazer tanto uma pergunta quanto uma provocação: será que se deve judicializar todas essas questões de saúde que foram comentadas? Acredito que já existe lei para isso, mas por que não levarmos isso às classes de ensino médio de todo o País? Muitos alunos sabem sobre o ECA, mas às vezes, nas suas casas não se conhece o Estatuto do Idoso. Sabemos que a televisão tem denegrido completamente os valores de uma família, que são os principais e têm tentado manter nossa sociedade. Por que não levar ou provocar esses assuntos nas classes de ensino médio? Quem sabe talvez por lá possamos diminuir isso ou trazer mais a conscientização a esses jovens do País, cuja meninada está tão deturpada. Assim diminuiríamos isso para o futuro. Será que o informar e o educar do brasileiro poderá causar mais outras CPIs investigativas? Muito obrigada e boa tarde.
O presidente – Com a palavra, o Sr. Jacinto Alves.
O Sr. Jacinto Alves – Boa tarde, meu nome é Jacinto. Cumprimento todos os presentes e a bancada de deputados.
Gostaria de falar sobre alguns pensamentos que a gente tem. Muitas vezes, não somos estudados o suficiente para falar, mas temos as experiências do dia a dia e a da vida, convivendo com o pessoal que tem problema. Eu vejo o problema das pessoas que têm hipertensão. O governo dá remédio sempre, mas sempre os mais baratos, nunca os remédios positivos, e as pessoas sofrem para comprar os mais caros. Os exames para um hipertenso ficam muito caros, e eles também não recebem ajuda nisso aí. Eles vão fazer um exame e descobrem que fica em torno de R$1.000,00, R$1.200,00 apenas um exame. Estamos preocupados com o pessoal que a gente convive que tem esse tipo de problema.
Outro problema, outra espécie de coisa que a gente vê: a nossa cidade é fraca e, em Itamarandiba, infelizmente não temos aparelhagem para fazer exame. Infelizmente não temos a capacidade de ter essas aparelhagens. Há bons médicos, mas não temos os aparelhos. Então, é preciso que os doentes saiam para outra cidade, para fazerem os exames, pagando. Muitas vezes o SUS demora a atender. Então, as pessoas fracas têm de pagar para sair da cidade para fazer aquele exame, com muita dificuldade. A questão da saúde, infelizmente, é difícil, porque não temos a aparelhagem correta. Pessoas que quebram membros, quebram braço, quebram perna, e ainda têm de andar numa ambulância, sofrendo, para irem para outra cidade, para fazerem o tratamento. Isso é um sofrimento para toda a nossa cidade. Eu, como vereador, toda vez vejo isso e sinto na pele o sofrimento de uma pessoa que está com um braço quebrado, com uma bacia quebrada, com os membros quebrados e ainda sofre na ambulância para ir buscar recurso. Muitas vezes, demora três dias, quatro dias, com o membro quebrado, para surgir uma vaga. É difícil demais.
Então, a gente dá esse parabéns para todos que estão presentes aqui. Esta é uma aprendizagem muito grande, com pessoas experientes, que estão trabalhando em prol da saúde. Às vezes, temos as ferramentas, mas não temos o dinheiro e nem como trabalhar com elas. Isso é uma tristeza para o Brasil, para a gente que é fraco, pacato, que mora no interior, e que anda vendo as dificuldades. Agradeço muito a todos vocês que estão empenhados para resolver essa situação, porque a saúde, para nós, está em primeiríssimo lugar, junto à segurança pública. O que mais está faltando no Brasil para nós são estas duas coisas: segurança pública e saúde. Muito obrigado, desculpe a interpretação, porque sou do interior, não sou bem estudado, vão me desculpar.
O deputado Antônio Jorge – Pela ordem, Sr. Presidente. Gostaria somente de saber a cidade do Jacinto.
O Sr. Jacinto Alves – Eu moro em Itamarandiba, no Vale do Jequitinhonha.
O deputado Antônio Jorge – Maravilhoso. Obrigado.
O Sr. Jacinto Alves – Por nada. Muito obrigado.
O presidente – Vamos passar a uma pergunta que está sendo dirigida à Mesa, que pode ser respondida imediatamente.
O Sr. Gleidison Ferreira de Oliveira, do Município do São João do Manteninha: “Sendo o SUS um sistema único e nacional, por que existe tanta dificuldade em encaminhar o paciente, quando é necessário realizar tratamento em outra localidade, bem como a obtenção de medicamentos de uso contínuo? Quais exames são realizados gratuitamente pelo SUS e quais não são gratuitos e quais os parcialmente gratuitos?”.
Vou iniciar algumas respostas, depois passo para cada um de vocês responderem. Achei interessante a intervenção da Ana Raquel, que falou do atendimento no hospital de Barretos. Barretos fez parte da minha formação também, fiz residência médica lá, e conheço todo o tratamento. Mas, em Minas Gerais, há centros de referência não só para Minas como também para outros estados.
Nós temos o Hospital do Câncer de Muriaé, da Fundação Cristiano Varella, onde trabalho há 15 anos. Também fazemos um trabalho extensivo ao que o SUS garante. Atendemos o paciente na sua necessidade de tratamento, mas também na reabilitação, com uma casa de apoio, onde os familiares que moram distante são acolhidos; onde pacientes que estão em tratamento diário e não têm indicação de internação também ficam, recebendo todo o tratamento, medicação, refeições diárias, entretenimento – tudo isso de forma gratuita, porque o SUS não dá essa cobertura, esses outros cuidados exclusivos fora do tratamento. É um hospital que está servindo mais de trezentos municípios em Minas Gerais, assim como a municípios do Espírito Santo e do Rio de Janeiro.
É claro que as coisas melhoram dentro do SUS em níveis de excelência. De uma forma geral, acabamos discutindo neste fórum não só os aspectos da judicialização, mas também as mazelas do SUS, as suas dificuldades. Hoje, discutir o SUS é montar o cenário de um muro de lamentações, porque todos têm uma história de dificuldades dentro do SUS.
Aproveitando a última pergunta – sobre quais exames são realizados gratuitamente, quais não são gratuitos e quais são parcialmente gratuitos –, não há nada que o SUS praticamente não atenda. Quase tudo é garantido pelo SUS. As exceções são alguns medicamentos que ainda não foram incorporados, alguns procedimentos inovadores. O que ocorre, a negativa do SUS hoje não é porque a tabela do SUS não contemple. O que é parcialmente gratuito é quando o paciente vai a um hospital e o médico diz que o SUS não paga. O SUS paga, sim, mas paga muito abaixo do custo. Hoje, tomografia, ressonância, internações, redução de mama, todos os procedimentos constam da tabela do SUS. Mas ninguém consegue fazer redução de mama pelo SUS. As pessoas convivem com mamas gigantescas, com um desconforto ortopédico tremendo, causando danos graves. A cirurgia plástica é contemplada pelo SUS, mas não há nenhum profissional disponível para realizar esse procedimento. Esse parcialmente gratuito é porque o paciente é atendido, é feito um diagnóstico, solicitado um exame, mas muitos exames não contam com profissionais que os façam pela tabela do SUS. O profissional fala que só faz esse exame na sua clínica particular. Isso acontece todos os dias. Esse é o parcialmente contemplado pelo SUS. De uma forma geral, o SUS garante a grande maioria dos atendimentos, mas paga muito abaixo do custo, o que causa as grandes filas e angústia dos pacientes.
Gostaria de passar a palavra aos demais da Mesa para que respondam as questões formuladas. Com a palavra, o deputado Antônio Jorge.
O deputado Antônio Jorge – Muito obrigado, deputado Doutor Wilson Batista. Farei comentários gerais. Tenho uma imensa satisfação e um sentimento de dever cumprido por esses dois dias muito produtivos de trabalho. Pode parecer um paradoxo, a nossa amiga de Campo Belo externou com muita sinceridade a sua angústia, mas tenha certeza de que não é uma angústia imobilizante, muito menos foram dias sem desdobramentos.
Para completar a questão colocada pelo Doutor Wilson Batista antes da minha reflexão final, devemos ter muito cuidado com essa questão colocada pelo participante do fórum em relação aos exames. O Doutor Wilson Batista foi muito preciso. Na realidade, o SUS cobre tudo, de mentirinha. Esse é o problema. Temos de encarar. Tenho dito muito isso. Vou me permitir uma reflexão com vocês de um assunto que todos conhecem.
Um congressista iluminado – não sei quem foi, mas tenho feito essa reflexão em público e preciso me inteirar disso – propôs um projeto de lei de ficha limpa, pelo qual ninguém que tinha problemas com a Justiça poderia almejar cargos públicos ou eletivos. Era mais ou menos isso. O projeto foi derrotado pelo Congresso. Mas temos o Ficha Limpa. Por quê? Por que hoje temos uma lei de ficha limpa? Porque a sociedade se mobilizou, colheu 1.500.000 de assinaturas e enviou ao Congresso um projeto de propositura popular com uma fortaleza moral muito grande – aliás, acho que essa é uma questão nuclear, já que a vida pública exige muitas coisas, mas, em primeiro lugar, moralidade –, e o Congresso não pôde se constranger votando contra essa iniciativa popular. Aliás, reputo a Lei do Ficha Limpa e a Lei de Responsabilidade Fiscal como dois imensos avanços na nossa vida republicana e democrática.
Mas tivemos essa traição da presidente Dilma em relação à regulamentação da emenda à Constituição. Muitos aqui militam na saúde pública há tempos, como eu, que agora em julho completei 30 anos de formado, tendo, dede o início, optado pela saúde pública. Sou psiquiatra de formação, mas sempre exerci a visão sanitária na minha atividade clínica ou na gestão. Nesse período, pudemos assistir à expectativa inicial do SUS e os enormes avanços que teve. Acho que ninguém contesta a fortaleza ética e moral desse modelo, de que todos temos certeza – e temos avançado muito nas discussões do modelo de atenção, uma discussão fundamental. Mas chegamos em um limite: não existe possibilidade de consagrarmos os preceitos constitucionais sem avançarmos na questão do financiamento. Para isso apresentamos uma emenda à Constituição, cuja regulamentação tramitou por 12 anos, a qual tratava da questão dos limites constitucionais por esfera de governo. À última hora, aos 47 minutos do segundo tempo, o atual governo orientou a sua base política – quando a tinha, o que já não tem mais – a votar contra a regulamentação dos 10% e a aprovar uma regra esdrúxula, já modificada por nova emenda à Constituição, mas que subtraiu da expectativa de orçamento da saúde algo em torno de R$50.000.000.000,00. Sempre digo aos parceiros de Minas que podemos ver o impacto disso apenas fazendo uma regra de três. A Minas cabem sempre mais ou menos 10% de tudo: de cotas, de orçamento federal, etc. Imaginem os colegas de Campo Belo, R$5.000.000.000,00 a mais para Minas Gerais: isso dobraria o nosso Teto MAC. Talvez não resolvêssemos tudo, mas em quantas coisas avançaríamos com mais recursos!
Pois bem, fomos traídos; a Nação perdeu. Acho que a presidente manchou sua reputação com a frustração dessa expectativa do movimento social. Mas a sociedade reagiu. Reagiram a CNBB, a OAB, as casas legislativas, como esta Casa, que colheu 700 mil assinaturas. E também enviamos ao Congresso Nacional um projeto de lei de iniciativa popular, mas nesse caso com mais de 3 milhões de assinaturas! E o que aconteceu? Absolutamente nada. Parece que ninguém se envergonha com a questão do financiamento da saúde. Parece que o financiamento da saúde é uma questão superada no Brasil. Por isso que tenho insistido muito nisso, a despeito das maravilhosas contribuições que tivemos nesses dois dias, com muita coisa a nosso alcance, como o exemplo de Brasília, a centralização de juntas em Minas Gerais – questão em que também insistimos – e várias outras coisas que podem melhorar o perfil da saúde. Sempre cito a questão da via administrativa ao Estado: ao município não pode caber mais nada. Os prefeitos já gastam de 25% a 30% do seu orçamento, e não cabe mais nada ao município. O Estado tinha de ser automaticamente solidário; ele tem de pensar em uma iniciativa dessa ordem porque realmente o ente mais onerado é o município.
Mas, meus amigos e minhas amigas, vou falar como um sanitarista convicto que se dedica há 30 anos à saúde pública.
Fui gestor estadual, municipal e regional por meio de um consórcio de saúde. Sou médico efetivo da Secretaria de Estado de Saúde e há quase trinta anos presto serviço ao Estado. Além disso, sou médico efetivo da minha Prefeitura de Juiz de Fora. Digo com muito conhecimento, muita carga emotiva e sinceridade: nós estamos reféns de um momento histórico ou criamos uma ruptura no nosso discurso. Estamos cansados de ouvir a nossa própria voz e as nossas próprias queixas. Essa é a verdade. Tudo o que foi dito aqui é válido. Os desafios de gestão existem, e temos de avançar muito nela. No entanto, deputado Wilson, até ela, neste momento, é afetada pela precariedade financeira. Faltam também recursos para treinar, capacitar, informatizar e melhorá-la. A falta de recurso afeta a qualidade da gestão.
Não quero transformar esta minha reflexão num libélulo ideológico e panfletário, mas convocar a reflexão de nossos amigos e amigas aqui. Estamos numa encruzilhada. Ou politizamos o debate novamente da saúde na questão do financiamento ou continuaremos enxugando gelo a despeito dos enormes avanços inquestionáveis, mas que foram civilizatórios decorrentes da melhoria socioeconômica do País, e não só do SUS. Sou um sanitarista que está um pouco cansado desse discurso ufanista do SUS. É preciso reconhecer que estamos estagnados e que, depois de 10 anos sem reajuste na tabela, não há prestador que queira fazer o procedimento pelo SUS porque não há remuneração. Dizer que o SUS oferece tudo é mentira. O sistema é baseado numa tabela, numa tabela de remuneração ao prestador. Temos a saúde complementar como previsão constitucional. Em Minas Gerais, só para se ter ideia, mais de 60% das internações acontecem no componente complementar, no privado e, principalmente, no filantrópico. Não pagamos essa turma. Como queremos que o sistema funcione?
Portanto, é preciso encarar a discussão definitivamente do financiamento. Toda a sociedade tem de fazer essa reflexão. Cabe às lideranças políticas e aos governantes obviamente o processo de maior responsabilidade e liderança nessa discussão. Só para se ver a nossa anestesia geral, a presidente cortou, no malfadado ajuste – usando um eufemismo para falar do ajuste da economia –, R$11.000.000.000,00, quase R$12.000.000.000,00, depois mais R$2.000.000.000,00 ou R$3.000.000.000,00; e ontem anunciou mais um corte de R$4.000.000.000,00 na saúde. O que adianta discutir o resto? A sociedade brasileira está cada vez mais participativa, indo às ruas para brigar por vale-transporte, passagem gratuita de ônibus e um monte de coisas. No entanto, não nos mobilizamos em relação à questão financeira.
Agradecemos muito a todos a participação. Foi uma satisfação aprender tanto nesses dois dias de debate. Participo da angústia dos gestores. É preciso avançar mais. E avançar significa haver mais recursos. Existem espaços e avanços na agenda da judicialização, distorções a serem coibidas, avanços civilizatórios na parte da judicialização, porque incorpora o direito a segmentos, doenças raras e outras situações que precisam ser acolhidas nas suas vicissitudes e singularidades, mas, acima de tudo, estamos judicializando o feijão com arroz – a falta da tomografia, a biópsia que não acontece. Quer dizer, estamos judicializando aquilo que já tem previsão na tabela e no modelo de atenção. Isso só se resolverá se tivermos coragem e estratégicas corretas. Estamos errando na comunicação com a sociedade. Não é possível que o SUS não arrumará aliados na sociedade para defender o legado que já existe pós-1988. De fato, falta algo para nós, movimentos sociais da saúde, que contamine a sociedade na parceira em relação ao grito necessário por mais recurso para a saúde.
Quero parabenizar todos e dizer que não existe procedimento parcialmente pago no SUS, pois é gratuito. Se há algum profissional dizendo que faz com uma diferença e principalmente se ele está atendendo pelo SUS, está cometendo um crime e precisa ser denunciado. Quando falo sobre discutir integralidade depois desses 30 anos, muita gente me interpreta mal dizendo: “Antônio Jorge quer rasgar direito”. Não se trata disso.
Gostaria muito de ter uma discussão verdadeira sobre a saúde, porque continuar no faz de conta significa que, cada vez mais, teremos um sistema único dos pobres, excluídos, sem vocalização da classe média. Precisamos que toda a sociedade use o SUS. Aí, sim, ela vai ter defesa. Parabéns a todos os participantes.
O presidente – Com a palavra, o desembargador Martin Schulze.
O Sr. Martin Schulze – Queria agradecer ao deputado Doutor Wilson Batista, assim como ao deputado Antônio Jorge pela iniciativa de desenvolver esse ciclo de debates sobre a judicialização da saúde. Um agradecimento especial ao desembargador Renato Dresch. Certamente partiu dele a ideia de me convidar para este evento. Sinto-me muito honrado de participar de, então, seleta nominata de painelistas.
De tudo que foi questionado e dito hoje aqui, devo dizer aos senhores que, como foi referido, a nossa cultura lida muito mal com a morte. O pressuposto de um desembargador quando pega uma ação de saúde é: “Não quero que morra na minha mão. Vou dar a liminar, não questiono nada”. Então, esse é o pressuposto básico. O que isso entra em contato com a realidade? Quem tem algum recurso, se desconfia do médico, pode fazer uma nova consulta com um outro para fazer o que chamamos de contraprova, ou seja, ter a segunda opinião no mundo médico. Se não estou satisfeito com o que o médico me disse, posso ir em outro. Mas, em geral, um cidadão que procura o SUS mal consegue a primeira consulta e não vai conseguir nunca a segunda. Então, dentro do Judiciário – e aqui, Minas Gerais está de parabéns –, a questão da câmara técnica é muito boa porque dá oportunidade dessa segunda opinião. No Rio Grande do Sul a Justiça Federal usa muito a prova pericial antes de dar a liminar. É uma outra visão.
Também falando da questão do financiamento, que foi bem referido aqui, preocupa-me muito, na questão da medicina suplementar, a Agência Nacional de Saúde. Ela fiscaliza os planos de saúde, mas não fiscaliza, até onde eu sei, os prestadores. Então, congela o preço numa ponta e não congela na outra. Assim, isso está inviabilizando os planos de saúde. Parece que a política pública de saúde é uma contrapolítica de saúde. Como não sabemos lidar com a morte, fazemos com que o povo morra por si. É uma reflexão meio dura de se ver, mas me parece que é esse lado. E o Judiciário tenta de alguma forma suprir isso.
Fico muito grato pelo povo brasileiro ser muito cordato, porque o que chega aos tribunais é o mínimo daquilo que não é prestado à cidade em termos de tratamento de saúde. Se todos tivessem o seu tratamento de saúde negado ou não dado a tempo possível, os tribunais estariam naufragados em processos judiciais. Mas o povo está acordando. Vemos manifestações públicas já de alguns anos atrás para agora, vemos que o povo está acordando. Então, nós que exercemos o poder político de alguma forma – o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário – temos de estar atentos a isso, pois o País vai sucumbir se não estivermos estruturados para prestar um serviço público a contento. Porque nós, do Judiciário, estamos cientes – não é, desembargador Dresch? – de que uma decisão judicial, se não for eficaz, é igual a nada, é só frustração para a sociedade.
Parece-me que a sociedade tem no Judiciário ainda o último baluarte. Se não conseguirmos fazer a nossa parte, que é dar efetividade à decisão judicial, então não vai sobrar nada para o nosso povo. Então, com essa ótica, o nosso esforço é tentar pelo menos que a gestão seja eficaz. Só dar mais dinheiro para a saúde não resolve se ela não for melhor administrada e atender às necessidades do cidadão.
Agradeço, mais uma vez, a gentileza do convite. Sinto-me muito honrado em ter sido recepcionado aqui, nas Minas Gerais, que até então não conhecia. Muito obrigado.
O presidente – Com a palavra, o desembargador Renato Dresch, para suas considerações finais e para responder às perguntas que lhe foram encaminhadas.
O Sr. Renato Luís Dresch – Responderei à primeira pergunta, que falaram que não precisaria ser respondida, só para refletir. Da Juliana Oliveira, que está dizendo o seguinte: “Falar sobre tempo de vida estando na posição vertical é fácil. Mantermos os mesmos pensamentos na posição horizontal seria possível?”. Juliana, é possível. Há cinco anos, fiquei na posição horizontal por aproximadamente 30 dias. Fiquei tão tranquilo; por 60 dias. Pensei: se a morte chegasse agora, eu iria com a maior tranquilidade. Tive 11 fraturas nas costelas, e mais outra fratura. Pneumotórax bilateral, embolia subcutânea, o que podia haver de ruim. Fiquei muito tranquilo; por 60 dias. Se falassem que eu morreria, eu estava pronto para morrer. Não sei por que, nunca fui suicida, não tenho a menor ideia disso, mas tenho o mesmo pensamento da experiência que tive. Fiquei por 60 dias na posição de 45 graus. Dormia assim, e acharia bom morrer naquela época. Mas tudo bem. Então não haveria problema algum. Farei meu testamento vital, que já era para ter feito, porque não quero nunca ficar pendurado no CTI.
O Vítor Augusto Vieira cita o art. 19T, que fala dos procedimentos não autorizados e experimentais. Sou absolutamente contra os experimentais. É obrigação do laboratório pagar se for experimental. Não podemos gastar dinheiro público com medicamentos experimentais. Quanto aos não registrados na Anvisa, o Supremo entende que, excepcionalmente, é possível – também entendo que excepcionalmente. Isso não é coisa para se dar imediatamente em liminar. Tem que haver evidência, deve ter registro no país de origem, para dizer que havia eficácia, efetividade, eficiência e segurança. Então, sim, poderia. Até porque off label é uma situação que está registrada na Anvisa.
Quanto à questão do ressarcimento, art. 35, VII, ele existe. Pode usar. “Mas coitados dos municípios, eles nunca conseguirão esse ressarcimento.” Houve uma demanda que conheço de Minas Gerais, do Município de Varginha, que tentou ressarcimento com o Estado ou a União - não sei. Esses ganharam a demanda, e não sei se receberam o dinheiro. É uma luta inglória pela demora. Mas tem previsão sim.
O Tiago falou aqui sobre expertise, sobre cursos. O Dr. João Paulo está aqui ainda; e estavam aqui também as Dras. Giovana e Marina, promotoras de justiça. Fizemos o curso de direito sanitário. São 8 a 10 promotores e 8 magistrados. Se queremos nos especializar numa área, conseguimos nos especializar sim. Tem que haver vontade de fazer. Todos devem ser comprometidos com a coisa pública, e ter comprometimento é um plus a mais. Se queremos, podemos.
Ele fala da uniformização, novo CPC. Luto realmente para que criemos varas de competência especializada em saúde. Esse procedimento está em andamento no Tribunal de Justiça. Já fiz três pareceres a favor, e estou empenhado que tenhamos varas especializadas em Minas Gerais. Podemos ter um paradigma negativo? Sim. Mas é muito melhor termos segurança jurídica. É importante que tenhamos. Então que o Judiciário decida de algum modo. Hoje há decisões em todas as linhas, e não há especialização. É uma pena. Mesmo que tenhamos uma uniformização contrária, ela dá segurança jurídica. Mas, afinal de contas, tudo acabará sendo definido pelo Supremo Tribunal Federal.
A Patrícia Mendes fala: “os senhores têm ciência de que o Sies exige, dos pacientes, receita atualizada a cada três meses?”. Acho que deve exigir mesmo. É para realmente evitar o fornecimento de medicamentos quando não é necessário, sem renovação trimestral. É importante, tenho conhecimento sim.
Nas decisões judiciais, eu recomendo, decidimos isso num enunciado do CNJ, na 2ª Jornada da Saúde, que haja renovação periódica. Não colocamos prazos para a renovação da receita porque depende de cada enfermidade para que haja renovação. Discutimos isso em São Paulo. Então não fixamos prazos, falamos que deveria ser renovada. E tem de ver a enfermidade para saber qual período, para que haja renovação das receitas.
Pergunta de Mateus Aranha: “Há judicialização em países mais desenvolvidos? Como ela é tratada nesses países?”. A judicialização é maior no Brasil por causa do inciso II do art. 198 da Constituição Federal, que fala em integralidade. Há em outros países, mas ela é menor, bem menor, porque eles não têm essa garantia como um direito social na Constituição Federal. Na Colômbia, sei que há bastante. A saúde na Colômbia não está ruim, há bastante judicialização também, mas não é como o Brasil. Na Inglaterra e Canadá ela é muito pouca, praticamente não existe porque eles definem, lá você tem acesso à política pública, diferentemente do Brasil. Esses países não entendem por que temos tanta judicialização no Brasil.
Dia 30 vou ao México participar do evento do Banco Mundial. Vou fazer uma apresentação pelo Brasil, falando exatamente da judicialização, tentar explicar como é a judicialização no Brasil, como ela funciona e por que funciona.
Cristiane Duarte, procuradora do Município de São José, solicitando informação sobre Nats e câmara de mediação. Sobre o Nats, os planos de saúde tinham uma parceria com o Estado, com o Ibedess, e isso tem um custo. Esse acesso é apenas para o Poder Judiciário, mas se quiser ter acesso às notas técnicas já apresentadas, nós as incluímos numa página do Tribunal de Justiça, na biblioteca digital. Entre na página do Tribunal de Justiça, biblioteca, biblioteca digital, judicialização da saúde, e lá estão as notas técnicas já fornecidas. Elas servem de algum paradigma, de algum apoio.
As câmaras de mediação e conciliação ainda as estamos construindo. Estamos formatando-as com a 3ª-vice-presidência do Tribunal de Justiça.
“Gostaria que o senhor falasse mais sobre a disponibilização de fraudas, dietas, leites pela Secretaria de Saúde, uma vez que recebemos diariamente decisões judiciais determinando o fornecimento desses produtos. Gentileza falar mais sobre o nutracêutico”. Frauda não é produto de saúde, seria uma questão assistencial. Há política em Belo Horizonte? Há. Há política de fornecimento de fraudas, mas ela tem de entrar como natureza assistencial e não social. Essa é uma posição minha, entendo que não deveria.
Ela pede para falar também dos nutracêuticos. Nutracêutico é definido como sendo suplemento alimentar, que é fornecido, mas depende de acompanhamento médico. É alimento, não medicamento, mas ele depende de acompanhamento médico. Isso é definido como nutracêutico. Então entendo que esses entram como produto de saúde, porque depende de acompanhamento médico; os demais, não.
Gílson Gomes Rodrigues, da Santa Casa de Boa Esperança: “Sobre a implantação das câmaras de conciliação e sua obrigatoriedade, como fica o art. 5º, inafastabilidade da jurisdição?”. A câmara de conciliação não afasta jurisdição. Não estamos propondo câmara de conciliação pré-processual, seria pré-decisão liminar. Vamos criar a câmara para que o juiz, antes de decidir a liminar, tente a conciliação. Aliás, o juiz deve tentar a conciliação sempre que possível. O novo Código de Processo Civil, que é o cooperativo, mais ainda. Então o juiz, antes de decidir a liminar, tem de ver se há acordo, manda para a câmara de conciliação. Ela pode fornecer administrativamente aquele medicamento. Não estamos afastando a jurisdição. Se não houver acordo, o processo continua.
Aline Camargo, de Betim: “Não seria necessário um julgamento mais criterioso do Poder Judiciário para atender as prescrições médicas, já que a OMS considera que 50% dessas recomendações, prescrições são duvidosas?”. Sim. Trabalhamos muito com a nota técnica exatamente pensando nisso. Mas primeiro a nota técnica vai avaliar, ou mesmo a câmara de conciliação, se há evidência científica daquilo.
Se não tiver a nota técnica, a câmara de conciliação pode apresentar elementos: “olha, juiz, há outro medicamento com a mesma eficácia terapêutica; há outro medicamento que pode ser utilizado e faz parte do SUS”. Então, nesse caso sim.
O que o CNJ recomenda é que haja prévia oitiva da parte contrária. Acho isso razoável e ponderado. Não é em 30 ou 60 dias, o juiz pode citar o estado, o município, a União e falar: “para essa informação, são 24 horas, 48 horas, vou decidir a liminar”. Você fala e depois contesta. Então poderia, isso sim seria razoável e ponderado para que o estado e o município pudessem. Eu sempre recomendo que haja uma oitiva prévia, sim, dos agentes. Aliás, a liminar inaudita altera a parte. Sem ouvir a parte contrária, deve ser uma exceção à regra, só quando não tiver jeito mesmo. É agora, se tiver 24 horas, 48 horas, vamos dar esse espaço de tempo para que a outra parte possa se manifestar.
Edson Araújo Rios, da Prefeitura de Itapecerica: “Como o município pode cumprir uma decisão de fornecimento de medicamento no prazo de 48 horas se o prazo da empresa fornecedora ao município para entrega é de 72 horas. Não seria o caso de o tribunal uniformizar esses prazos?”. Não, o tribunal não pode uniformizar. Façam o seguinte: se há mesmo a obrigação de fazer, a lei fixa prazo de 10 dias no Código de Processo Civil, mas depende de situação de urgência.
O prazo de 48 horas é curto? Sim. Vou dar um exemplo a vocês. Há poucos dias, o juiz deferiu um procedimento complexo em sua cidade, deputado, um procedimento renal com a sonda flexível, procedimento complexo. O juiz deu 48 horas, e o município recorreu. No procedimento, ele não indicou falando que não era sua obrigação, e não falou que tinha outro com a mesma eficácia. Ele não falou nada, não falou que o prazo de 48 horas era pouco. Chegou a minha mão, então falei: o procedimento é necessário? É, tudo indica que é necessário, já em grau de apelação. Então é necessário. Você falou que não era seu, mas não falou que não tinha outro com a mesma eficácia e que não era necessário. Você não falou nada disso. E também não falou que 48 horas era muito pouco. Falei: até acho que é pouco, mas você não falou nada. No recurso, cabe a mim decidir naquilo que foi pedido.
Então os advogados públicos têm de saber pedir. O advogado público nunca deve fazer uma defesa sem apresentar uma nota técnica ao juiz. Mostre ao juiz que há uma nota técnica que não tem eficácia, eficiência, efetividade, segurança. “Há outro procedimento. O SUS fornece esse”. Nós não recebemos isso. Se ele me falasse que 48 horas era pouco, eu daria mais, pois meu motorista demorou 60 dias para esse mesmo procedimento no plano de saúde. O meu motorista fez isso no plano de saúde. Eu daria 48 horas? Tudo bem, é muito curto sim.
Gustavo Almeira: “A assistência integral à saúde, expressa na Lei nº 8.080/1990, vale para a saúde suplementar? Qual é o limite da saúde suplementar?”. O limite da saúde suplementar é o contrato. Lá é um contrato de seguro, vai cobrir o que estiver no meu contrato. Não posso igualá-lo ao SUS. Aí interpreto o contrato de acordo com o Código do Consumidor.
Michel de Oliveira Lima, do Centro Universitário de Sete Lagoas: “Gostaria de saber se o Poder Judiciário é verdadeiramente legitimado a controlar e intervir quando há omissão do poder público na efetivação das políticas públicas?”. É de chorar se o Poder Judiciário não puder. Se a política pública não funciona, alguém tem de falar para dar garantia constitucional. O Poder Judiciário tem a obrigação, de acordo com o art. 5º, 35, sempre que tiver defeito.
Há uma outra pergunta, mas que não tem nome: “Aquelas contas apresentadas pelo Dr. Sebastião Helvécio pela manhã podem não estar corretas, porque a SES até agora ainda está pagando conta de 2014? Então não sei se os dados estão completos”. Bom, já questionei isso com o conselheiro. O conselheiro é uma das muitas pessoas sérias. Ele é uma das pessoas sérias, com comprometimento com a coisa pública. Esse dado, contabilmente, está correto. Pode ter alguma coisa, mas ele falou que fez levantamentos deste ano, dos últimos seis meses, e que houve redução sim, está tendo redução. Então está se demostrando que pode haver, sim, algumas contas a pagar nesse valor.
Sempre suspeitei disso, mas está havendo uma redução nos gastos com a judicialização da saúde. Essa é uma informação do Tribunal de Contas. Eu a considero muito séria, tem valor. Houve redução, mas talvez não tanto.
Agradeço os deputados Doutor Wilson Batista e Antônio Jorge, organizadores desse evento, que foi muito importante, sobretudo esse final, esse debate, essa discussão. Era imprescindível para que o evento tivesse sucesso dar oportunidade para que as pessoas se manifestassem. De nada adianta a pessoa chegar aqui, com sua autoridade, falar o que pensa, e ir embora sem responder. Esse modelo é importante. Os senhores estão de parabéns. O evento foi muito produtivo. Temos muito a aprender em todos os eventos dos quais participamos. Muito obrigado.
O presidente – Obrigado, Sr. Renato, que participou conosco da construção dos painéis e das reuniões preparatórias para que esse evento ocorresse. Ele é sempre disponível, sempre estudioso, sempre dedicado, a fim de tomar as melhores decisões nessa complexidade da judicialização.
Passo a palavra, por último, ao Sr. Maurício Machado, para suas considerações finais e resposta à pergunta.
O Sr. Maurício Batalha Machado – Primeiramente, se o Dr. Renato me permitir, informo que, no núcleo de medicamentos, quando tínhamos ações com liminares com tempo de 24, 48 e 72 horas, tomávamos a liberdade de enviar um ofício ao juiz informando que aquele medicamento não estava disponível e que levaria “x” dias ou “x” horas para ser entregue ao paciente, até porque ele teria de chegar à capital, para só então ser enviado ao município. No período de dois anos e meio, em que estive à frente do núcleo, nunca tive problemas por descumprimento. Quando a parte reclamava que a decisão não havia sido cumprida, o juiz analisava o processo e via que já havia uma contracautela do município. Informávamos também quando o medicamento estaria disponível: “Olha, eu tenho estoque e tal dia o medicamento estará disponível para o paciente na regional”. Desculpe atravessar sua resposta, mas essa é uma questão prática que exercíamos e nunca deu problema.
Disseram aqui que decisão se cumpre; e não se discute. Decisão se discute, sim. Não se discute no momento de uma liminar. Não adianta o técnico dizer que isso não pode. O juiz deu a decisão, o Tribunal a confirmou, então é feita a entrega. A decisão é cumprida. Depois a decisão pode ser discutida. Daí a importância dos núcleos, das câmaras técnicas, dos pareceres técnicos, para que o defensor tenha um bom argumento para a defesa.
A representante do município saiu, mas você também perguntou o porquê de tanta liminar. Antes dos núcleos, antes dessa discussão que tem ocorrido no Brasil, a prescrição era uma verdade absoluta. Quem seria um advogado, ou um juiz, ou um desembargador para questionar o que o médico estava prescrevendo? Já vimos a redução de valores apresentados, como a de Minas Gerais. Já vimos uma redução de liminares. Naquele momento, a prescrição médica era uma verdade absoluta.
Em relação ao que foi colocado de que a carga vai ficar com o município, que vai ter de dar tudo. Não, o que é obrigação do Estado e da União, o núcleo não compõe; compomos o que o município tem de competência. Se o medicamento está dentro de uma esfera que se atribui à farmácia básica, que é responsabilidade do município, mesmo que não esteja padronizado como farmácia básica, mas se é um componente que iria ser padronizado, o município está dando. O município tem de arcar com sua responsabilidade, e não transferi-la para o Estado e para a União.
Em relação à participação dos conselhos nos núcleos, como foi colocado, discordo, mas defendo seu direito de pleitear. Não vejo, nesse momento da discussão, uma inserção do conselho. Acho que o papel dele é importante e preponderante, mas antes, que é exigir do prefeito, do secretário municipal de saúde, a implantação do medicamento, a padronização daquele medicamente. Mas na discussão judicial não vejo onde caberia a articulação e participação do conselho, num primeiro momento. Porém, se demonstrado, curvo-me a seu posicionamento.
Não sei se é Júlio ou Júnior, da Fundação Hospitalar de Montes Claros, colocou: “A competência para julgar eventual ação de ressarcimento dos municípios, em razão do fornecimento de medicamentos da competência da União, não seria das varas federais, e não do STF, como dito?”.
Eu tinha o entendimento e o estudo da Procuradoria-Geral do Estado de Santa Catariana dos anos de 2007, 2008 e 2009, à frente do NAJ, de que seria uma ação originária no STF. Não aprofundei mais porque o estudo era da procuradoria. Eu o acatei, inclusive, peço-lhes desculpas porque vocês me viram mexendo no celular. Eu fui procurar no nosso amigo Dr. Google. Descobri que existe uma decisão de Uberaba, inclusive, em apelação cível do TRF, que, provavelmente, a pessoa a tenha ajuizado na vara federal de Uberaba, perdeu, e o município recorreu e perdeu também.
Não cabe ação de ressarcimento meramente contra a União. Independente de ser vara local, verifica-se que o ressarcimento não cabe. Posso até passar o nome aqui: TRF-1 - Apelação Cível nº 95822012401380-3. Ela foi julgada improcedente, em virtude de não caber ação de ressarcimento entre os entes. Provavelmente, o entendimento da Procuradoria do Estado, na época, foi de que era uma ação originária, diretamente, no STF, certo?
Mais uma vez, agradeço o convite aos deputados Arlen, Batista e Jorge, colocando-me à disposição no que puder. Esse convite me reanimou novamente – redundante mesmo o “novamente” - a participar desses eventos. Coloco-me à disposição, tanto da Assembleia quanto dos senhores no que eu puder contribuir. Agradeço a estada em Belo Horizonte e a acolhida de vocês todos. Agradeço também aos senhores, participantes do evento. Muito obrigado.
O presidente – Agradeço ao Maurício. Agora, passo a palavra à Patrícia Paim para suas considerações finais.
A Sra. Patrícia Paim – Gostaria muito de agradecer a presença de todos os que estão aqui até agora, aos deputados, a toda a Mesa, aos desembargadores e ao Maurício. Gostaria de dizer também que a judicialização é um fato, sim. Ele fez o comentário de que não entende como ela caiu, se a gente ainda paga despesas de 2013.
Vou falar um pouco da saúde do DF, que acaba sendo referência para os outros estados. No ano de 2014, pagou despesas de 2013, e o orçamento de 2015 é menor que o de 2014. Por isso que está devendo 2014, porque, se for honrar com os compromissos de 2014, não vai conseguir fazer nada em 2015. Isso responde um pouquinho o porquê de, mesmo caindo a judicialização, a gente continuar devendo.
Estando na mediação, fico a defendê-la, porque trazer o paciente para as políticas públicas é conscientizá-lo de que devemos olhar não só para a gente, mas para o todo, que é o SUS. Cada vez que economizamos com o paciente não comprando um medicamento que não é padronizado, que é importado, de altíssimo custo, com certeza, conseguimos assistir, cada vez mais e melhor, os outros pacientes. Não que não tenhamos de melhorar tecnologias e incorporações de novas técnicas em medicamentos, mas devemos conscientizar de que, talvez, não faça tanta diferença ou não faça diferença alguma o outro medicamento e que a gente pode dividir a fatia, a gente pode assistir mais e melhor todos, e não apenas um indivíduo. A coletividade tem, sim, de ficar acima do individual, porque temos de oferecer o SUS para todos, e não para uma minoria que tem acesso ao Judiciário.
Por isso que a mediação é importante, porque a gente traz o paciente para dentro das políticas públicas do SUS. Eu não o trato de forma desigual, muito pelo contrário, eu o trato dentro da igualdade que o SUS tem de ofertar a todos os pacientes que querem ser assistidos. Como a gente estava conversando aqui com o deputado, as pessoas estão cheias de direitos. Todos acham que seus medicamentos têm de ser daquela forma, mas são poucos os que lembram quais são os deveres que têm com o SUS. Um deles é defender essa bandeira, para que ele continue existindo daqui a 20, 30, 100 anos. A gente tem de se conscientizar exatamente diminuindo a judicialização, fazendo parte das políticas, para que ele continue assistindo toda a população, caso contrário, não vamos conseguir isso.
Agradeço novamente a oportunidade. O evento foi muito rico para todos. A cada encontro aprendemos um pouco mais e percebemos o público de cada estado. Vamos lutar por um SUS melhor. Muito obrigada.
O presidente – Agradecemos à Patrícia Paim e passamos para o encerramento. Saio daqui otimista em relação ao objetivo deste ciclo de debates. A nossa proposta era exatamente entender as dificuldades, as limitações do Judiciário e fazer uma simbiose entre esse poder, as políticas públicas, os gestores da saúde e os usuários do SUS. O papel da Assembleia Legislativa foi exatamente esse, ou seja, intermediar o diálogo entre as três esferas: o médico, a medicina, o atendimento médico. Muitas vezes, as políticas públicas são equivocadas e ineficientes, dada a limitação de recursos financeiros. Quando o paciente não alcança o que postula, inevitável e legitimamente, acaba acionando a via judicial. O que buscamos foi qualificar as decisões judiciais, e não condená-las ou impedir o direito de acesso à Justiça. Também queremos resolver a maioria dos problemas na principal esfera de tratamento de saúde, que são os hospitais, incluindo os médicos, as equipes. Quando uma pessoa procura um hospital, quer conseguir seu tratamento, seu exame, quer resolver seu problema de doença. Se alcança isso, ela fica contente. Mas, se não alcança, precisa sim ativar as vias judiciais.
Temos de lutar para que o SUS, as secretarias de saúde, os gestores e o Ministério da Saúde garantam todos os atendimentos necessários. Às vezes, o ministério tem sido o grande empecilho para que o SUS funcione melhor devido ao imenso número de portarias e resoluções. Nós, médicos, sabemos que se há muitas técnicas para resolver determinado procedimento é porque nenhuma delas é eficaz. Então, precisamos mudar, buscar a solução para o problema. Infelizmente, com toda essa complexidade técnica, o Ministério da Saúde não está conseguindo atender as necessidades dos pacientes. A Assembleia Legislativa não trará as soluções. Vamos propor debates, ouvir as convergências, expor as mazelas do SUS e as políticas públicas, de forma a aprimorar o atendimento.
Desde o início, fizemos quatro reuniões preparatórias, convidando conselhos de saúde, entidades judiciárias, OAB, associação médica, representantes de movimentos populares, representantes da Associação Mineira de Municípios. Então, procuramos ouvir a todos. Esses painéis foram construídos de forma consensual. Todos deram suas opiniões de temas a serem abordados. É claro, é o primeiro ciclo que estamos organizando, por isso pode ter ocorrido, sim, alguma imperfeição, pode não ter atendido a todas as pessoas em seus anseios, mas tenho certeza de que o que buscamos aqui é um passo para que as pessoas tenham um atendimento de saúde com mais qualidade. O nosso objetivo é melhorar o atendimento de cada cidadão, e espero tê-lo alcançado.
Gostaria de agradecer a toda a equipe de apoio da Assembleia, ao presidente da Casa, deputado Adalclever Lopes, que foi sempre solícito e demonstrou todo o apoio a este evento, aos deputados Antônio Jorge, Arlen Santiago, presidente da Comissão de Saúde, à equipe de apoio e assessoria do Plenário e das comissões, a todas as entidades que participaram da organização do evento. Enfim, agradecemos a todos que participaram, foram mais de quinhentas pessoas inscritas. Agradecemos a todos que também participaram dos debates e que, de forma muito objetiva, muito clara e muito pertinente, puderam contribuir com o desfecho deste evento. Agradecemos principalmente aos palestrantes que vieram de outros estados nos prestigiar, como o desembargador Martin, que veio do Rio Grande do Sul, e o Prof. Atallah, da Universidade de São Paulo. Várias pessoas contribuíram com este evento. Então os meus agradecimentos.
Informamos que a publicação da ata deste ciclo de debates estará disponível na versão eletrônica do Diário do Legislativo, na edição do dia 03 de outubro, e poderá ser acessada pelo portal da Assembleia Legislativa: www.almg.gov.br. Informamos também que as gravações da tarde de hoje poderão ser vistas, em reprise pela TV Assembleia, no dia 27 de setembro, às 9 horas.