DEPUTADO CRISTIANO SILVEIRA (PT)
Discurso
Legislatura 18ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 03/05/2018
Página 22, Coluna 1
Assunto ELEIÇÃO. EXECUTIVO.
28ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 18ª LEGISLATURA, EM 24/4/2018
Palavras do deputado Cristiano Silveira
O deputado Cristiano Silveira* – Inicialmente, presidente, quero dizer do estarrecimento de que fui tomado nesta semana ao ver, pelas redes socais, já que, nos grandes veículos, não sei por que, a imprensa não se interessou em dar ampla divulgação, a imagem do frei Leonardo Boff e de Adolfo Pérez, vencedor do Prêmio Nobel da Paz, sendo impedidos de fazer uma visita ao presidente Lula, que está preso há algo em torno de 15 dias na Polícia Federal, em Curitiba. De qualquer maneira, foi algo muito forte essa decisão de uma juíza em Curitiba, na minha opinião força auxiliar do juiz Sérgio Moro, que travou uma cruzada política de perseguição ao ex-presidente Lula.
Como já dissemos por várias vezes, Lula é inocente, porque não foi apresentada nenhuma prova de que ele seja realmente o proprietário do famoso triplex. Nenhuma prova: não tem escritura, não tem recibo, não tem contrato de gaveta, não tem sequer testemunhas. Por falar nisso, há um testemunho do porteiro do prédio, amplamente divulgado na imprensa – e dessa feita as manchetes dos jornais foram utilizadas como subsídio para a decisão do juiz –, que dizia que havia interesse de D. Marisa naquele imóvel, que ela visitou várias vezes, e que, a seu pedido, uma empresa havia sido contratada para fazer a reforma dele e a instalação de um elevador. Ora, há alguns dias, o Movimento dos Trabalhadores sem Teto ocupou o triplex, dizendo que, como o juízo entende que ele pertence ao Lula, só o Lula poderia solicitar a sua retirada e a reintegração da posse do imóvel. Bem, a justiça não levou isso em consideração, mas o que os militantes encontram no imóvel? Nada. Nenhuma reforma relevante e nenhum dos móveis planejados e sofisticados cuja existência vários veículos de imprensa divulgaram à época da denúncia dessa reforma. Trata-se de um imóvel extremamente simples, com escada e sem elevador. Penso que isso tem que ser levado em consideração pelas instâncias que hão de julgar o mérito dessa ação contra o presidente Lula.
Há também a palavra do Léo Pinheiro, dono da OAS, que em seu primeiro depoimento disse ao juiz Sérgio Moro que não tinha provas de que o presidente Lula fosse o beneficiário dessa propina em forma de imóvel e da sua reforma. Quando o juiz Moro perguntou se ele tinha provas, ele respondeu que não, porque, por orientação do próprio Lula, havia destruído as provas. O engraçado é que ele não teve o zelo de destruir as provas contra si mesmo; destruiu as provas que incriminavam o Lula, mas não destruiu as provas que o incriminavam. Depois, tentou um acordo de delação, que foi negado pelo Ministério Público, mas, ainda assim, trouxe nova versão, na esperança de fazer outro acordo de delação, dizendo que o Lula era realmente o beneficiário desse imóvel. Ora, até onde entendo, no Brasil, quem não registra não é dono. Não é assim que falamos? Na capinha dos documentos que os cartórios nos entregam quando vamos fazer a escritura de um imóvel, vem escrito: quem não registra não é dono. Então, diferentemente da situação de outros políticos, contra os quais há gravações, imagens, documentos e dinheiro em malas, no caso do ex-presidente Lula, não há nada disso. Há apenas a palavra do delator, que mudou a sua versão, em busca de benefícios na Justiça. Aliás, já falamos sobre isso e agora o Supremo está discutindo esse instituto da delação premiada, que acabou se tornando, de alguma maneira, um instrumento para que os delatores falem aquilo que os acusadores querem ouvir. Por falar nisso, ainda há que se esclarecer a indústria de delação que se instalou em Curitiba, como acusa Rodrigo Tacla Duran, que está na Espanha. Na CPI do Congresso Nacional, Rodrigo disse que há uma grande rede de oferta de acordos de delação contra o pagamento de multas vultosas. Um dia o povo brasileiro vai entender tudo isso, porque, falando assim, parece muito complexo para que as pessoas entendam o que está por trás disso.
Mas quero voltar à minha fala inicial sobre a imagem emblemática de Leonardo Boff, um senhor já de muita idade, sentado na porta da Polícia Federal, tentando fazer uma visita a um amigo e levar-lhe um abraço fraterno e, claro, as palavras do Evangelho, como é direito dos presos em nosso país, segundo o nosso Código Penal. Também o argentino Adolfo Pérez, ganhador do Prêmio Nobel, reconhecido internacionalmente por sua luta, foi barrado e impedido de visitar o presidente Lula.
Alguém tenta dizer que a imprensa tentou trazer essa imagem de que o ex-presidente Lula teria um tratamento diferenciado dos demais presos, e é verdade. Não porque a cela dele seria maior e porque ele pode, por exemplo, assistir à TV, mas porque ele está numa solitária. Uma pena que se aplica a presos que cometem erros graves dentro do sistema é colocá-los em solitária. E nada pior do que a solidão, não é verdade? Como se não bastasse a privação da liberdade, ainda a condição de uma solitária.
Então é isso que hoje, lamentavelmente, parte do nosso Judiciário faz com um ex-presidente da República da envergadura do ex-presidente Lula. Não faço, como muitos companheiros, a defesa do ex-presidente Lula porque tirou 30 milhões da miséria, em que pese isso fosse motivo suficiente para eu fazê-lo. Não porque entregou mais de três milhões de moradias no Minha Casa, Minha Vida, ou pelos milhares de jovens que tiveram direito a estudar, pela estabilidade econômica, pelo ganho real no salário mínimo, pela distribuição de renda. Isso tudo seria motivo suficiente para fazer a defesa do ex-presidente Lula. Mas quero que possamos fazer uma discussão extremamente técnica sobre os fatos. Eles tentam dizer que, se o Lula não for preso, é porque ele está acima da lei, e que querem criar agora um clima no nosso país de que ninguém estará mais acima da lei. Não é verdade, porque estão tentando colocar o ex-presidente Lula abaixo da lei. Ele não pode estar acima, mas, de maneira alguma, pode estar abaixo. Nenhum de nós pode estar abaixo da lei. E é por isso que nos preocupa o comportamento de parte do Judiciário, que, sem pudor algum, faz uma cruzada de caçada ao ex-presidente Lula.
Percebo que, na minha opinião, ainda há em torno de cinco, seis processos que o presidente ainda há de responder e que poderão ter maior complexidade do que a questão do triplex. Então por que essa velocidade toda no julgamento do caso do triplex? Por que, de uma maneira recorde, esse processo passou na frente de mais de 260 processos na 4ª Turma do Tribunal em Curitiba? Por que essa excepcionalidade? É muito simples. Porque esse seria o processo que teria condição de ser analisado, inclusive futuramente sendo a justificativa ou a razão para impedir o registro da candidatura do ex-presidente Lula nas próximas eleições. Esse é o pano de fundo. O processo mais frágil, tão frágil que poderá ser o objeto do impedimento da candidatura do presidente Lula.
Por que isso tudo? O golpe que a ex-presidenta Dilma viveu. Acho que hoje está mais claro para as pessoas que tudo isso foi um grande golpe. É aquele grande acordo nacional do Romero Jucá; é o mercado financeiro ditando regras no nosso país; é a influência de setores da política externa também em nosso país. É isso tudo combinado. E esse esforço para o golpe; e um esforço milionário, vamos lembrar, porque trouxe custos altíssimos para o orçamento público, como o pagamento de emendas a parlamentares que votaram congelamento de gastos por 20 anos, reforma trabalhista, parlamentares que salvaram Michel Temer por duas vezes. O governo mais desaprovado da história, um governo envolvido em grandes corrupções, e o nosso Congresso, com o apoio de parlamentares de Minas Gerais, salvou Michel Temer por duas vezes. E isso foi caro do ponto de vista orçamentário para o nosso país. Esse golpe, caro do ponto de vista político, econômico, social, para ter o seu desfecho, tem que ser concluído de maneira que as forças populares não voltem a presidir o Brasil. E o objeto, então, dessa perseguição, dessa caçada, é o ex-presidente Lula.
Não somente isso. Talvez o mais estarrecedor tenha sido o impedimento de membros do Senado e da Câmara dos Deputados visitarem o presidente Lula. É importante lembrar que o Congresso Nacional tem prerrogativa constitucional de fazer a fiscalização também dos estabelecimentos prisionais onde se encontram os nossos presos, e essa prerrogativa, de certa maneira, que é constitucional, foi burlada por uma decisão da juíza em Curitiba. Então é uma série de erros, de bizarrices, de coisas estranhas ao nosso processo democrático.
Presidente, também é importante lembrarmos que há um documento escrito por mais de 120 juristas renomados, que fazem toda análise do processo contra o ex-presidente Lula. Ali eles conseguem apontar as fragilidades do processo, desde o vazamento de gravações de uma presidente da República, a condução coercitiva quando o acusado não se recusa a prestar depoimento e, agora, esse conjunto de erros cometidos no processo, inclusive, retirando do ex-presidente Lula a possibilidade de todas as instâncias recursais, como o julgamento dos embargos infringentes e declaratórios na 4ª Turma, a que ele não teve direito.
Vale lembrar também que o Supremo se nega a discutir e a votar novamente a prisão em 2ª instância. No Supremo há ministros que são decanos, antigos na Casa, grandes juristas, que veem ali uma violação ao direito constitucional, porque a prisão só pode acontecer com o trânsito em julgado dos processos. Então, esses ministros colocam, de maneira muito clara, que há uma violação de um preceito constitucional. Essa inovação que parte do Judiciário tenta fazer, a que vamos chamar de campo cinzento da Justiça, em que cabe a interpretação do magistrado e coloca-se em risco a estabilidade do Estado Democrático de Direito. Penso eu que, se o magistrado quiser legislar – porque não se trata de interpretar, mas quase que se estabelece uma nova legislação –, deveria então se colocar ao julgamento popular, ao julgamento do eleitorado e disputar eleições, porque o poder emana do povo e em nome do povo tem de ser exercido. E cabe ao Poder Legislativo criar as leis. Então, se é o desejo que se façam mudanças em nosso regramento jurídico e também constitucional, que os membros do Judiciário ou do Ministério Público façam a disputa de mandato legislativo, que tem de ser concedido pelo povo. Portanto, é isso tudo que vivemos, é esse processo que está em curso em nosso Brasil.
Digo lideranças renomadas não só no campo jurídico, mas no campo político mundial. Falei ao Adolfo Pérez, indicado ao Nobel da Paz, que indicasse o ex-presidente Lula para receber o mesmo prêmio. Quero lembrar que o Brasil nunca teve um ganhador do Prêmio Nobel, diferente de alguns vizinhos na América Latina. Quero também lembrar que José Sócrates, ex-presidente de Portugal, em entrevista a TV portuguesa, fez uma defesa muito clara do ex-presidente Lula e do processo que ocorre aqui, em nosso país. Evo Morales também fez o mesmo depoimento. Não diferente, Pepe Mujica, que foi presidente do Uruguai. Ou seja, forças progressistas, não só no Brasil mas em todo o mundo, têm se levantado para declarar e denunciar o que ocorre nessa perseguição ao ex-presidente Lula e a quebra do regramento democrático no Brasil. Infelizmente é o que vivemos.
Lamentavelmente, setores da imprensa que recebem vultosos recursos públicos para fazer a defesa do governo Temer, para defender a reforma da previdência e para defender um governo de desmando, extremamente contaminado pela corrupção, não têm o mesmo zelo em dar a repercussão que a imprensa internacional dá em decorrência do que está acontecendo no Brasil.
Um país que vinha consolidando a sua democracia, com a 5ª maior economia, respeitado mundialmente, hoje se compara a republiquetas de bananas, a republiquetas de instabilidade, a regiões governadas por tribos. É isso que parece o nosso Brasil hoje. Há retirada de direitos, de maneira virulenta, e ainda do nosso poder de escolha. Como falar em uma democracia onde a maioria do povo brasileiro deseja votar no ex-presidente Lula e não pode porque o Judiciário entende que não deve? E não pode por ele ter cometido crime, porque isso não conseguiram provar. Espero ainda – há um fio de esperança – que o Supremo e o STJ tenham juízo e restabeleçam a normalidade do processo jurídico e político no Brasil. Essa conta será muito cara e teremos de debatê-la no futuro.
Para encerrar, presidente, vejo que também é um momento de a esquerda se reencontrar com a sua história, com as forças progressistas, com os trabalhadores. Por diversas vezes, nesse pouco mais de três anos de mandato, percebi colegas anunciarem, desta tribuna, o fim do Partido dos Trabalhadores, o fim da esquerda, o encerramento da nossa caminhada, especialmente naquele fatídico 2015, no mês de abril, quando iniciou todo o drama com a ex-presidente Dilma.
Vejam vocês, Lula lidera todas as pesquisas. O PT é o partido predileto daqueles que têm preferência partidária no Brasil. Nesses 15 dias de prisão do ex-presidente Lula, mais de 3 mil pessoas filiaram-se ao PT. Portanto, ainda há esperança. Obrigado, presidente.
* – Sem revisão do orador.