AMAURI VALLE DO AMARAL JÚNIOR, Professor.
Discurso
Legislatura 14ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 17/01/2002
Página 23, Coluna 2
Evento Ciclo de debates: "A Educação que nós, surdos, queremos".
Assunto EDUCAÇÃO. DIREITOS HUMANOS. PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
164ª REUNIÃO ESPECIAL DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 14ª LEGISLATURA, EM 10/12/2001
Palavras do Sr. Amauri Valle do Amaral Júnior
Boa-noite, senhoras e senhores. Estou muito satisfeito com o convite que recebi. É muito importante haver sido convidado pela Assembléia Legislativa, por tudo que representa. Agradeço a presença de minha mãe e de minha avó. É uma satisfação muito grande estar aqui com a comunidade dos surdos de Belo Horizonte.
Em todas as palestras feitas por ouvintes e por surdos se falou muito sobre a inclusão social. É importante salientar que a inclusão social é diferente da inclusão educacional. As pessoas que trabalham na área da educação precisam entender que são coisas separadas e que uma será causa e conseqüência da outra. É muito importante falarmos em inclusão. Não podemos deixar de mencioná-la. Mas, antes de qualquer coisa, antes de falar em inclusão, teremos de falar sobre respeito. A inclusão possui raízes, depende de alguns pré-requisitos, como o respeito às diferenças dos surdos, dos cegos, dos portadores de síndromes, como a síndrome de Down, das pessoas que usam o oralismo, dos paraplégicos. Enfim, é preciso respeitar as diferenças. Temos de pensar nessas diferenças quando se trata de inclusão, porque, se essa inclusão for feita como uma normatização, estará fadada ao fracasso. A inclusão tem de ser feita de acordo com as diferenças.
A Secretaria da Educação tem um papel muito importante na discussão desse tema. É fundamental discuti-lo também nesta Casa. Precisamos trabalhar juntos. Acredito que teremos uma escolaridade muito melhor para os surdos no Estado de Minas. A comunidade dos surdos deve ser ouvida. Devemos saber qual é a educação que o surdo quer. Muitos profissionais surdos e ouvintes - já formados - estão muito próximos da comunidade. Esses profissionais devem ser escutados, tantos os surdos, quanto os ouvintes.
É muito importante que o trabalho seja feito em parceria entre a escola, a secretaria municipal, a secretaria estadual e a comunidade. Os sinais são difíceis de ser aprendidos pelos ouvintes. É muito importante que haja um modelo de surdo dentro dessa escola, para que as pessoas convivam com esse modelo e entendam o que é cultura para aprender a língua que o surdo usa.
Algumas pessoas tentam freqüentar cursos de línguas de sinais, mas não aprendem. Há surdos que não têm acesso à língua de sinais e, se tiverem alguma dificuldade emocional, não aprenderão a língua de sinais, que é muito mais que uma língua, é um anseio.
Às vezes, a escola não sabe o que traz felicidade e satisfação para o surdo. O que o surdo quer? Ele quer ser incluído educacionalmente. Ele já experimenta tantas dificuldades na sua família ou experimenta uma insatisfação tão grande, que se permitirá participar de uma escola em que esteja entre iguais. Às vezes, experimenta uma frustração muito grande na família, e outras vezes essa frustração se dá na escola.
Gostaria que os ouvintes, que a minha família, que a Secretaria Municipal da Educação, que a Secretaria de Estado da Educação não ficassem resistentes ao que estou falando. Estou falando sobre diferenças, estou falando sobre dois mundos.
Apresentarei à Assembléia Legislativa a proposta da comunidade surda, que está fundamentada em aparatos legais nacionais. Esse é o primeiro passo para o reconhecimento oficial da LIBRAS no Brasil. Sabemos que as coisas vão mudar. Em Minas, há a Lei nº 10.379, de 10/1/91. O Brasil precisa reconhecer oficialmente a língua de sinais para respeitar a comunidade surda com seus valores, sua história e a sua cultura.
Gostaria que vocês entendessem que nós, surdos, somos brasileiros e é obrigação da sociedade, do ouvinte e do surdo aprenderem o português, porque somos cidadãos brasileiros. Os professores de escola especial precisam respeitar a língua de sinais e precisam ensinar bem, através dela. Ensinar bem ao surdo a escrever português corretamente.
A luta existe, mas os bons resultados ainda não chegaram. Infelizmente, essa é a realidade dos surdos em Minas Gerais. Às vezes as pessoas não se interessam por política, acham que isso cabe a outra pessoa, mas não é bem assim. Cabe a cada um de nós, cabe à sociedade discutir a educação e a inclusão.
Gostaria de falar um pouco sobre a formação dos professores. Existem surdos formados em faculdades em Minas Gerais que já cursaram disciplina de educação especial, mas, infelizmente, não estão atuando na sociedade, estão sendo discriminados. Privilegia-se um professor ouvinte para ensinar uma determinada disciplina, em vez de um professor surdo. Precisamos estimular a entrada de instrutores nas escolas para que haja uma troca de cultura, troca de línguas de sinais, troca da LIBRAS. Precisamos aumentar os cursos de formação de instrutores e de professores que aprendam língua de sinais para melhorar a educação de surdos em Minas Gerais.
Ansiamos por uma proposta de reconhecimento do intérprete como profissional, para que exista qualidade nessa tradução e o conteúdo seja realmente repassado. Precisamos de intérpretes em repartições públicas, aeroportos, rodoviárias, hospitais, fóruns, ministérios e órgãos públicos.
Os profissionais ouvintes da área de educação às vezes aprendem a língua de sinais, mas não a usam. Os ouvintes devem usar a língua de sinais e entender que a língua é muito mais que gestos, muitos mais que sinais. É importante que os ouvintes sejam influenciados pela língua de sinais e sintam interiormente o que ela seja. Quero agradecer a atenção de todos.