Processo de vistorias veiculares e novas regras para CNH são criticados
Representantes de empresas credenciadas de vistoria veicular, autoescolas e clínicas alegam que haverá prejuízos se as novas medidas seguirem em vigor.
Processo de baixa de veículos, falta de equidade na distribuição de vistorias em regionais de Belo Horizonte, instabilidade no sistema digital da Prodemge e as novas regras para tirar carteira de habilitação foram alvos de críticas na reunião da Comissão de Desenvolvimento Econômico da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) desta quinta-feira (18/12/25).
Solicitada pelo presidente da comissão, deputado Leonídio Bouças (PSDB), a reunião congregou assuntos distintos em função do pouco tempo para tratar as questões no final do ano. O deputado explicou que a primeira parte da reunião seria dedicada às vistorias e a segunda à questão das autoescolas.
Sobre as vistorias de trânsito realizadas pelas empresas credenciadas de vistoria veicular (ECVs), Natália Cazarini, presidente do Sindicato das Empresas de Vistorias de Identificação Veicular, apresentou alguns entraves do setor. Citou que as vistorias de baixa de veículo não conseguem chegar às ECVs quando envolvem veículos de baixa circulação.
Outra demanda da representante foi a unificação dos procedimentos nas Unidades de Atendimento Integrado (Uais), pois uma unidade não aceita um laudo de veículo que tenha sido emplacado em outro município. “Infelizmente, o sistema da Prodemge não permite que as ECVs trabalhem, nem os despachantes. É insustentável que uma empresa que recebe R$ 127,20 por vistoria não consiga enviar uma solicitação sem que o sisterma caia”, reclamou.
Bruno Matos, diretor do Sindicato das empresas de Vistorias de Identificação Veicular e Motores de Minas Gerais, denunciou que Belo Horizonte é a única capital em que empresas com a mesma infraestrutura recebam demandas de trabalho muito diferentes apenas por estarem em regionais distintas.
"Há variação de até 160% de demanda entre prestadores das regionais Leste e Oeste, por exemplo. Isso é contrário à legislação, pois não permite a equidade na prestação dos serviços, deixando empresas com altos lucros e algumas com prejuízos", disse. Ele sugeriu que a distribuição das demandas por vistorias funcionassem como as clínicas para habilitação funcionam hoje, permitindo que os usuários escolham a regional, mas distribuindo de forma equilibrada em caso de sobrecarga.
A situação dos despachantes foi apresentada por Crispim José da Silva, do Sindicato dos Despachantes de Trânsito, que trabalha há 60 anos na função. Para ele, a realidade de Belo Horizonte não corresponde à de Minas Gerais, e em muitos municípios não existem Uais. “Os despachantes estão sofrendo, porque ninguém entende que nós funcionamos como um servidor gratuito do estado. Há situações em que a vistoria ultrapassa 60 dias, pois falta estrutura. Minas Gerais é o único estado que não chama os despachantes para discutir questões de trânsito”, desabafou.
Fim das autoescolas
As mudanças no processo para tirar habilitação, após publicação da Medida Provisória nº 1.327/2025 e da Resolução Contran nº 1.020/2025, geraram muitas críticas de participantes da reunião. Em linhas gerais, as normas reduzem os custos e a burocracia para obtenção da carteira nacional de habilitação (CNH), na medida em que acabam com a exigência da formação teórica nas autoescolas (isso seria feito de forma on-line e gratuita) e reduzem as horas de aulas práticas. Para os convidados da reunião, no entanto, as modificações implementadas poderiam colocar as autoescolas em risco.
“Estamos falando de um mercado formado 100% por empresas familiares. Essa medida impacta a vida de muitas famílias que perderão seu sustento da noite para o dia”, disse, emocionado, Alessandro Dias, presidente do Sindicato dos Centros de Formação de Condutores de Minas Gerais. Ele também cobrou posicionamento da Coordenadoria Estadual de Gestão de Trânsito (CET) sobre o futuro das autoescolas, sobre a adequação do número mínimo de aulas e pediu apoio para flexibilização da estrutura exigida na legislação para esses espaços.
Do mesmo modo, Adalgisa Pereira, presidente da Associação de Clínicas de Trânsito de Minas Gerais, destacou os riscos a que a sociedade estará exposta após a medida, em um País em que os acidentes de trânsito são recorrentes. Para ela, haverá sobrecarga para o próprio Sistema Único de Sáude (SUS), pois grande parte das vítimas de acidentes são atendidas em hospitais públicos. “Quando fazemos uma avaliação médica ou psicológica, também estamos prevenindo acidentes. São feitos pelo menos seis exames em cada candidato, e conseguimos avaliar questões comportamentais como ansiedade ou agressividade excessiva”, apontou.
O deputado Antonio Carlos Arantes (PL) defendeu a importância da discussão e da urgência de providências. “A autoescola é fundamental, pois garante a segurança. Além de envolver vidas, também mexe com empregos de muita gente”, afirmou.
O presidente do Sindicato dos Instrutores de Minas Gerais (Seame/MG), Fernando Soares Lima, criticou o governo federal por não dialogar previamente com os representantes dos CFCs antes de implementar uma medida com tantos impactos econômicos e sociais. “Não somos contra diminuir os custos da CNH, mas estão brincando com coisa séria só por causa de votos e causando desemprego em massa. Precisamos nos unir contra essa visão manipulada de que as autoescolas são vilãs”, ponderou.
Na mesma linha, o presidente da Associação Brasileira das Empresas Formadoras para o Trânsito e Transporte (Abraffortt), Maurício Roberto Pontello, apontou que, assim como as autoescolas, o setor que representa, que forma mão-de-obra especializada para centros de formação de condutores (CFCs) e clínicas, está num “vazio normativo”. “Nossa atividade simplesmente deixou de existir. A Coordenadoria Estadual de Gestão de Trânsito (CET) de Minas Gerais precisa se posicionar assim como os outros estados já fizeram. O Estado precisa acionar a justiça porque nós não temos fôlego para isso”, cobrou.
Lucas Pacheco, chefe de trânsito da CET, explicou que, embora a Prodemge seja a responsável por gerir o sistema de vistorias e autoescolas em Minas, o sistema é ligado diretamente à CET, e que nenhuma mudança pode ser feita sem aprovação.
Lembrou ainda que o sistema de vistorias foi implementado de forma muita rápida em todo o Estado, mas que melhorias estão sendo feitas periodicamente. “Em 2023, foram 30 mil vistorias e, neste ano, esse número passou de 3 milhões. Existem problemas no sistema e precisam ser solucionados, mas tem funcionado”, afirmou.
Lucas também apresentou os três motivos mais recorrentes para a parada do sistema: ataque de cibernéticos, integração de dados com as bases nacionais e atualização e migrações de sistemas. De acordo com ele, os sistemas ficaram obsoletos por muito tempo, sem receber investimentos, mas já estão sendo atualizados.
O gestor afirmou também que a CET está trabalhando para melhorar o que não estava funcionando para as empresas credenciadas de vistoria veicular, mas que é possível maior equilíbrio dentro das regionais de Belo Horizonte, sendo o modelo das clínicas um bom exemplo a ser seguido. Durante a reunião, ele falou que já está disponível no site da CET uma página com as atualizações do processo.
Ainda na reunião, Leonídio Bouças informou que a renovação das ECVs foi prorrogada automaticamente por 180 dias, sem necessidades de qualquer medida das empresas. A novidade foi comemorada pelos presentes.
O deputado Grego da Fundação (Mobiliza) prestou solidariedade aos participantes da audiência pública. “Tenham certeza que nossa preocupação é a mesma de vocês, com o fechamento de autoescolas e o desemprego. Além disso, por mais que estejamos em uma era cada vez mais digital, corremos o risco de formar condutores sem prática”, advertiu.
Durante a reunião, foi aprovado requerimento direcionado a diversos órgãos estaduais para que Minas Gerais entre com liminar contra a medida provisória federal, a exemplo do que fez o Mato Grosso.
