Moradores querem aumentar proteção ambiental em Lapinha da Serra
Além do tombamento municipal, comunidade defende projeto estadual que reconhece a área como de relevante interesse.
A fim de ressaltar a importância ambiental, cultural, turística e econômica da Lapinha da Serra, a Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou visita técnica ao Distrito de Santana do Riacho (Região Central). Durante o encontro, realizado na segunda-feira (10/11/25), a comunidade expressou preocupação com impactos da atividade empresarial na região.
“Este rio está a cada dia ficando mais raso”, lamentou o morador Bruno Davi Prudêncio. Ele se referiu ao encontro dos Córregos Raízes e Lapinha, que formam a Lagoa da Lapinha da Serra. Até 2017, o nível da água permanecia estável, permitindo a pesca e a prática de esportes náuticos, como remo, canoagem e vela durante todo o ano.
Mas desde que a Pequena Central Hidrelétrica Coronel Américo Teixeira conseguiu renovar a outorga, a água da lagoa passou a ser direcionada para o reservatório privado. Há oito anos, empreendedores locais têm testemunhado a diminuição do período em que a lagoa permanece cheia.
O esvaziamento prejudica as atividades econômicas, diminuindo o fluxo de turistas interessados em ver as cachoeiras, andar de pedalinho e apreciar a paisagem. “Antes, trabalhávamos durante 12 meses. Agora, trabalhamos só quatro”, desabafou Prudêncio.
Conforme a presidente interina da Associação Comunitária da Lapinha da Serra (Ascom), Eliane Pires, em torno de 4 mil pessoas frequentam a região entre os meses de fevereiro e junho, na chamada alta temporada. Em eventos como o arraial, esse número chega a 6 mil. Essa movimentação fica impactada pela falta de água na lagoa.
O condutor ambiental Vanderlei Sabino relatou também que a empresa restringe o acesso ao Grande Abrigo de Santana, sítio arqueológico com arte rupestre, onde foram encontradas 48 ossadas humanas e fragmentos de ferramentas com cerca de 4 mil anos. Além disso, a retirada de água enfraquece a preservação ambiental e as atividades de subsistência, causando assoreamento e mortes de peixes, entre outros animais.
Pendurados na parede do restaurante, dois porta-retratos registram o momento em que Laudelina de Jesus, fundadora do empreendimento, percorre a lagoa com o neto Rafael Árabe. Ele tinha em torno de dez anos na época. Costumava nadar e pescar nas águas que hoje só estão em suas lembranças. “É muito triste: isso aqui está irreconhecível”, descreveu.
Segundo a deputada Beatriz Cerqueira (PT), responsável por solicitar a visita, o problema é agravado porque a empresa não gera energia para o município, nem se dispõe ao diálogo com representantes da comunidade. “Isso é um problema que não é natural: foi causado pela ação humana”, afirmou.
Projeto de lei busca reconhecer interesse do Complexo Lagoa da Lapinha e Serra
Empreendedora e moradora da localidade, Simone Lucy Coelho contou que a comunidade participa de cursos de brigadista para aprender a combater incêndios, prestar primeiros socorros, recuperar nascentes e manejar serpentes. Muitas pessoas, de acordo com ela, estão se dedicando a projetos de revitalização.
Um exemplo é Sítio Entoá, mantido pelo casal Christiane Netto e Gustavo Carvalho. Após comprarem um terreno com fama de infértil, dedicaram-se a implementar ações de sustentabilidade. Hoje, tratam o próprio esgoto, transformando as fezes em fertilizantes para plantio de árvores por meio do banheiro seco.
Captam água da chuva e garantem a segurança alimentar no quintal de casa, desenvolvendo a permacultura (sistema de ambientes humanos sustentáveis). Recebem estudantes e realizam visitas guiadas pela área, a fim de promover a reflexão sobre educação patrimonial e manutenção climática. “Existe possibilidade, aqui é um lugar de esperança”, enfatizou Christiane Netto.
Presente no início da visita, o prefeito Fernando Burgarelli (Republicanos) ressaltou o andamento do processo de tombamento municipal, com previsão de término dos estudos em março de 2026. No nível estadual, está tramitando o Projeto de Lei (PL) 2.478/24, que reconhece como de relevante interesse ambiental, cultural e paisagístico o Complexo Lagoa da Lapinha e Serra.
“Quando a gente vai aos territórios, a gente vê que a comunidade se organiza e vive bem sem esses grandes empreendimentos”, observou Beatriz Cerqueira. Ao elogiar as ações de preservação já desenvolvidas pela população, a parlamentar reconheceu: “Estamos somando esforços ao que vocês já estão fazendo”.
Além de se comprometer com a mobilização pela aprovação do PL de sua autoria, a deputada anunciou como encaminhamento uma visita ao Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) para verificar os termos de renovação da outorga. Também pretende agendar visita técnica para conferir a condição dos sítios arqueológicos da região.