Atingidos pela tragédia de Brumadinho cobram manutenção de ATIs
Redução no orçamento das assessorias técnicas institucionais pode comprometer negociação de reparação de danos com a Vale.
Em reunião da Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada nesta terça-feira (9/5/23), os atingidos pela tragédia de Brumadinho reivindicaram a manutenção do orçamento das assessorias técnicas interinstitucionais (ATIs).
A Política Estadual dos Atingidos por Barragens garante o direito à assessoria técnica independente, escolhida pelos atingidos e custeada pelo empreendedor, para orientá-los no processo de reparação integral dos danos provocados por esses empreendimentos. Mas a anunciada redução de recursos destinados às ATIs, por decisão das instituições de Justiça, pode inviabilizar a sua atuação.
Os atingidos pela tragédia de Brumadinho alegam que o trabalho das ATIs é fundamental para reduzir a assimetria de poder nas negociações que vêm sendo feitas com a Vale para reparação dos danos provocados pelo rompimento da barragem da mina de Córrego do Feijão, ocorrido em 2019.
“Falar em corte da ATI é falar em desconstrução da reparação”, afirmou a produtora rural Mona Lisa Cardoso Mota, de Paraopeba (Região Central do Estado). Ela disse que os atingidos têm que lidar com falta de moradia, água contaminada e grandes extensões de terra inutilizadas para a agricultura. “Temos que ter o acompanhamento da ATIs até a reparação total dos danos”, defendeu.
O trabalho das ATIs é importante especialmente para as pessoas que não têm sequer acesso à internet, como os pescadores da Comunidade Santa Cecília, de Pompéu (Região Central do Estado). Segundo Quésia Martins dos Santos, as pessoas que viviam da pesca no Rio Paraopeba perderam sua renda e precisam negociar a mitigação de seus prejuízos com a Vale.
João Carlos Pio de Souza, que representa os povos de religião de matriz africana, acrescentou que nem todos os atingidos pelo rompimento da barragem da Vale entendem a linguagem dos documentos do processo de negociação com a mineradora. “As ATIs precisam permanecer enquanto a reparação não for feita efetivamente”, afirmou.
ATIs enfrentam instabilidade e incertezas
As três ATIs que atuam na Bacia do Rio Paraopeba reclamam que a redução dos recursos pactuados inicialmente pode comprometer o seu trabalho de assessoramento dos atingidos pelo rompimento da barragem da Vale nas negociações com a mineradora.
Para a coordenadora institucional da Associação Estadual de Defesa Ambiental (Aedas), Flávia Maria de Oliveira Gondim, o corte orçamentário soma-se à instabilidade financeira provocada por outros atrasos em pagamentos. Ela reclamou que vai ter que desmobilizar equipes e ainda não sabe o valor global que a entidade vai receber por seu trabalho.
A coordenadora do Núcleo de Assessoria às Pessoas Atingidas por Barragens (Nacab), Marília Andrade Fontes, reforçou que o papel das ATIs é estimular as pessoas a lutarem por seus direitos e defendeu a definição de valores, escopo de atuação e duração do trabalho dessas entidades.
Já o coordenador do Instituto Guaicuy, Marcus Vinícius Polignano, lembrou que a entidade tem contas a pagar e é responsável pelos salários de seus funcionários, e a redução de recursos precariza o seu funcionamento. “Como uma instituição pode ser independente sem um mínimo de planejamento financeiro?”, questionou.
A defensora pública Carolina Morishita Mota Ferreira explicou que, na prática, a redução no orçamento das ATIs gira entre R$ 3 milhões e R$ 4 milhões, dentro de um valor semestral de R$ 50 milhões. Ela acrescentou que as instituições de Justiça já solicitaram a liberação de R$ 3,8 milhões para recompor esse orçamento.
Parlamentares destacam importância das ATIs
As deputadas que solicitaram a realização da audiência pública foram unânimes em defender a importância da atuação das ATIs. A deputada Beatriz Cerqueira (PT) reclamou da decisão das instituições de Justiça que determinou a redução dos recursos para as ATIs. “Esse acordo foi feito a portas fechadas. Sem escuta, qualquer repactuação se torna ilegítima”, afirmou.
A deputada Bella Gonçalves (Psol) lembrou que as ATIs são um direito garantido em lei e sua atuação é fundamental para a reparação dos danos do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. “Esse corte de recursos aconteceu de forma intempestiva; por isso é tão danoso”, disse.
A presidenta em exercício da ALMG, deputada Leninha (PT), lamentou a falta de transparência nos acordos firmados pelas instituições de Justiça e defendeu mais diálogo para que os projetos elaborados pelas ATIs sejam implementados e façam a diferença na vida dos atingidos pelo rompimento da barragem da Vale.
Por sua vez, o deputado Leleco Pimentel (PT) acusou o Ministério Público Federal de conluio com as mineradoras.
