PL PROJETO DE LEI 352/2023
Projeto de Lei nº 352/2023
Dispõe sobre a implantação de medidas de proteção e de inclusão da pessoa gorda nos espaços públicos e privados do estado de Minas Gerais e institui o Dia Estadual do Combate à Gordofobia.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – A presente lei tem por objeto a implantação de medidas de proteção e de inclusão da pessoa gorda, bem como medidas de informação e combate à gordofobia no âmbito do estado de Minas Gerais.
Art. 2º – Para fins desta lei, pessoa gorda é aquela que possui excesso de peso pelo acúmulo excessivo de gordura corporal.
Art. 3º – Gordofobia é toda ação ou omissão que ofenda de forma verbal, física ou emocional, na forma de chacotas, falas preconceituosas, atos de repulsa ou de discriminação social, piadas, gestos ou outros, que provoquem constrangimentos, ataques cruéis e desumanos, a pessoa gorda.
Art. 4º – Considera-se ofensa verbal, emocional ou física, dentre outras, as seguintes condutas:
I – tratar a pessoa gorda de forma agressiva, grosseira, zombeteira, ou de qualquer outra forma que a faça sentir-se mal pelo tratamento recebido;
II – fazer graça ou recriminar a pessoa gorda por qualquer característica física relacionada ao seu peso corporal;
III – recusar atendimento médico em decorrência de a pessoa ser gorda;
IV – fazer gestos ou falas específicas na forma de chacota referindo-se à pessoa gorda, causando-lhe constrangimento;
V – usar da característica física para identificar a pessoa gorda em qualquer ambiente;
VI – ato que se traduza em preconceito, desmerecimento, ou que faça com que a pessoa com excesso de gordura corporal se sinta inferiorizada.
Parágrafo único – O combate à gordofobia tem por objetivo viabilizar direitos, garantia de ir e vir, o combate ao bullying, o acesso a todos os espaços e aos direitos de cidadania, garantindo tratamento digno e, sobretudo, sem preconceitos.
Art. 5º – O tratamento abusivo e discriminatório em razão de condição da pessoa gorda poderá ser enquadrado como discriminação.
Parágrafo único – Considera-se discriminação em razão da condição pessoal toda forma de distinção, restrição ou exclusão, por ação ou omissão, que tenha o propósito ou o efeito de prejudicar, impedir ou anular o reconhecimento ou o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais de pessoa gorda, incluindo a recusa de adaptações razoáveis e de fornecimento de tecnologias assistivas.
Art. 6º – As pessoas gordas poderão adotar toda e qualquer providência quando se sentirem discriminadas por conta do seu peso, denunciando:
I – no Ministério Público do Trabalho Estadual ou Ministério do Trabalho e Emprego, se o constrangimento se der no ambiente do trabalho, podendo ainda recorrer ao sindicato para obter proteção e representação em caso de futuro processo judicial.
II – no Conselho Regional de Medicina – CRM –, para abertura de sindicância para averiguação do fato, se o constrangimento se der na consulta médica;
III – na Delegacia da Polícia Civil ou na Delegacia Especializada em Crimes Cibernéticos, quando se tratar de discriminação direta e ofensiva, assim como de uso indevido de imagem para propagação de conteúdos comparativos em páginas de saúde e de humor, ou ainda de discurso de ódio realizado na internet;
IV – no Ministério Público Estadual, nos demais casos.
§ 1º – Todas as provas para comprovação da discriminação sofrida serão admitidas, como prints de conversas, gravações, e-mails, mensagens, imagens compartilhadas, cartas testemunhais, compilação de documentos das reclamações feitas, ata notarial de fé pública relativa à discriminações sofridas constando todas as informações quando crimes cibernéticos, entre outras que a vítima achar necessárias.
§ 2º – A denúncia da prática de qualquer discriminação relativa à pessoa gorda também poderá ser feita de forma anônima.
Art. 7º – É assegurado a cada indivíduo o direito à autodeterminação, construindo sua própria imagem com autonomia, nos termos da Constituição Federal.
Art. 8º – Para efeito de inclusão, os estabelecimentos públicos e privados localizados no Estado de Minas Gerais deverão disponibilizar condições adequadas de acesso à pessoa gorda, garantindo o livre acesso e coibindo a discriminação ou as práticas gordofobicas.
Art. 9º – Todos os espaços públicos e privados devem conter cadeiras destinadas às pessoas gordas, no objetivo de gerar conforto e acesso e nenhum constrangimento nos termos da Lei Federal nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000.
§ 1º – Os espaços e assentos a que se refere o caput deverão ser situados em locais com boa visibilidade, sinalizados, garantindo sua acomodação.
§ 2º – Para garantia da acessibilidade das pessoas gordas s, devem ser providenciadas a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação.
§ 3º – As medidas de proteção e de inclusão da pessoa gorda estabelecidas nesta lei devem ser seguidas pelos estabelecimentos de lazer, cinemas, restaurantes, escolas, clínicas médicas, hospitais, lojas, igrejas, supermercados, shoppings, repartições públicas, e similares.
§ 4º – No mínimo 5% (cinco por cento) de cada brinquedo e equipamento de lazer existentes nos locais referidos no caput devem ser adaptados e identificados, tanto quanto tecnicamente possível para possibilitar sua utilização por pessoas com mobilidade reduzida nos termos da Lei Federal nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000.
Art. 10 – Os estabelecimentos de ensino públicos e privados, da educação básica e do ensino superior, localizados no estado de Minas Gerais, deverão disponibilizar carteiras escolares adequadas à pessoa gorda e garantir o ensino livre de discriminação ou práticas gordofóbicas.
Art. 11 – A pessoa gorda que por qualquer motivo, por conta de sua condição, tenha dificuldade de movimentar-se, em caráter permanente ou temporário, gerando redução efetiva de sua mobilidade, flexibilidade, coordenação motora e percepção, e que tenha renda familiar mensal inferior a 2 (dois) salários-mínimos, fica assegurada a gratuidade no transporte rodoviário intermunicipal, nos termos da Lei Federal nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000.
Art. 12 – Toda pessoa obesa ou gorda tem direito a atendimento prioritário, diferenciado e imediato.
Art. 13 – Fica instituída a partir desta lei o dia 10 de setembro como o Dia de Combate à Gordofobia com objetivo de debate e discussão de políticas públicas que promovam a inclusão social, conscientização e combate à discriminação, passando a integrar o Calendário Oficial de Eventos do Estado de Minas Gerais.
Parágrafo único – Os estabelecimentos de ensino públicos e privados da educação básica e do ensino superior deverão realizar, na data, atividades de sensibilização e de formação.
Art. 14 – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 8 de março de 2023.
Andréia de Jesus, Presidenta da Comissão de Direitos Humanos (PT).
Justificação: Em janeiro desse ano, Vitor Augusto Marcos de Oliveira, um jovem de 25 anos, que pesava 190 quilos, morreu após ter o atendimento negado por seis unidades de saúde de São Paulo. O motivo alegado pelas unidades foi que não tinham macas que suportassem o peso do rapaz. Após aguardar por várias horas, Vitor teve três paradas cardíacas e faleceu.
O caso tão trágico teve grande visibilidade, mas é preciso estarmos atentos ao fato de que ele não é uma exceção. Nossa sociedade nega, sistematicamente, os direitos básicos de cidadania e, via de regra, dispensa tratamento humilhante e degradante às pessoas gordas. Nisso consiste a gordofobia. Segundo Maria Luísa Jimenez-Jimenez, pesquisadora do tema há mais de uma década, a gordofobia é um preconceito contra pessoas gordas que está disseminado por toda a sociedade, levando à exclusão social e interditando o acesso de tais pessoas a vários direitos básicos de cidadania.
O que está em jogo quando propomos um projeto de lei para a proteção dessas pessoas é algo elementar: queremos assegurar que elas tenham direito à vida e à dignidade. Não se trata de uma pretensa “romantização da obesidade”. O que defendemos é que essas pessoas, por estarem fora de determinado padrão corporal, não podem ser tratadas como “menos humanas”. Nossa sociedade não pode atribuir ou não direitos básicos, dignidade e valor às pessoas tomando como base o encaixe ou não delas em determinado padrão corporal.
Cada ser humano tem uma série de peculiaridades que o tornam singular, diferenciado de todos os demais da espécie. A diversidade é uma condição humana. Por isso, a ativista pelos direitos humanos, Cláudia Werneck, nos lembra que temos o dever de construir uma sociedade em que todos os modos humanos de se existir sejam respeitados como legitimamente humanos. Nosso paradigma deve ser o da sociedade inclusiva. Os ambientes e os processos da vida social, da educação e do trabalho devem dar conta das pessoas do jeito que elas são, “posto que são para humanos/as e não podemos escolher humanos/as, porque este é um ato criminoso”, defende Werneck. Os mais variados espaços e instituições – como as da educação regular, da formação profissional e do trabalho – devem, assim, “ser desenhados para todas as pessoas, independentemente de suas características, sem 'poréns', sem exceções, sem modelos 'especiais' ou excludentes”, assinala Cláudia Werneck.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos afirma esse ideal inclusivo ao definir, em seu primeiro artigo, que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos”. É preciso considerarmos, ainda, que a Lei Federal nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, determina que cabe aos Estados, Municípios e ao Distrito Federal, no âmbito de suas competências, criarem os instrumentos para a efetiva implantação e o controle do atendimento prioritário, inclusive da pessoa gorda ou obesa.
Necessário adotar medidas de equidade, para que todas as pessoas possam acessar os direitos, tendo em vista as suas especificidades. Por isso, temos que construir meios de assegurar a elas direitos relacionados a algumas de suas necessidade específicas, tais como: assentos mais largos e resistentes, equipamentos médicos capazes de suportar o seu peso e a sua largura, carteiras escolares em que caibam, transporte público que não as exponha ao constrangimento de não passar em roletas, oferta de roupas nos tamanhos de seus corpos, atendimento preferencial por conta de problemas ortopédicos – para citar alguns exemplos de situações cotidianas.
É preciso destacar, ainda, que é preciso garantir que sejam assegurados direitos específicos dos quais tais pessoas já dispõem, como cadeiras especiais, filas preferenciais, gratuidade nos assentos nas viagens intermunicipais, atendimento médico digno – direitos que boa parte delas desconhece.
Cabe destacar, por fim, a proposição do dia 10 de setembro como Dia de Combate à Gordofobia, data para denunciar o preconceito e reivindicar os direitos das pessoas gordas.
Ante o exposto, contamos com a aprovação da presente proposição.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Ione Pinheiro. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 4.063/2022, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.