PL PROJETO DE LEI 350/2023
Projeto de Lei nº 350/2023
Estabelece diretrizes para acolhimento e acomodação das mulheres em situação de abortamento.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Ficam instituídas diretrizes para acomodação às mulheres em situação de abortamento, no âmbito da rede de saúde pública e privada do Estado de Minas Gerais, com o objetivo de qualificar o atendimento, oferecer atenção humanizada e evitar a revitimização das mulheres nesta condição.
Art. 2º – A acomodação das mulheres em situação de abortamento, sem prejuízo de outras medidas para sua proteção e acolhimento, observará as seguintes diretrizes:
I – organização dos leitos de modo a preservar a intimidade e privacidade das mulheres em situação de abortamento, por meio de estratégias como enfermarias exclusivas;
II – não exposição das mulheres em situação de abortamento a sofrimento e discriminação;
III – garantia de espaços seguros e livres de julgamento;
IV – preservação das condições de saúde mental e social das mulheres nesta condição;
V – disponibilização de atenção específica conforme a necessidade de cada caso.
Art. 3º – A aplicação desta lei deve observar estratégias educativas, como formações permanentes para profissionais de saúde que atendem mulheres em processo de abortamento.
Art. 4º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 8 de março de 2023.
Bella Gonçalves
Justificação: Segundo estudo Maria Luiza Heilborn (2012) e Paula Rita Gonzaga (2015) os processos de interrupção voluntária da gravidez são uma realidade inerente às trajetórias reprodutivas de todas as sociedades. Justamente por isso, faz-se necessário desenvolver políticas de atenção e cuidado às mulheres que vivenciam tal experiência, para garantir a saúde e o bem viver destas mulheres, a continuidade saudável de suas vidas sexuais e reprodutivas e também desconstruir estereótipos e práticas repressoras e punitivistas desnecessárias.
O abortamento espontâneo é a mais comum intercorrência obstétrica e possui origem multifatorial, podendo ter causas genéticas ou não genéticas, destacando-se entre os fatores genéticos as anormalidades, polimorfismos e cromossômicas, e entre os fatores não genéticos pode ser causado por agentes infecciosos, causas ambientais, socioeconômicas, ocupacionais, estilo de vida, estado de saúde, hormonais, trombofílicos e distúrbios endócrinos (Azevedo, S. A. – 2021. Saúde mental da mulher frente ao aborto espontâneo: uma revisão integrativa. Revista Saúde e Meio Ambiente 12(1), 63-71).
No Brasil hoje, cerca de 30% das mulheres que engravidam vivem processos de aborto espontâneo, antes de 20 semanas, sendo que, destas, 80% são interrompidas até 12 semanas. O Sistema Único de Saúde (SUS) realizou entre 2016 até outubro de 2020, 8.665 abortos legais conforme dados do Ministério da Saúde – Sistema de Informações Hospitalares e Tabwin SIH. A cada aborto autorizado pelo Poder Judiciário o SUS realiza 100 procedimentos para socorrer mulheres que sofreram aborto espontâneo ou tentaram o procedimento de forma insegura fora dos hospitais.
A vivência de um aborto espontâneo ou provocado exige atenção específica à saúde física e mental das mulheres. A convivência entre mulheres que estão elaborando um luto tão complexo e mulheres que estão celebrando a vida e a chegada de seus filhos, pode resultar em violência institucional e tortura psicológica.
Estudos apontam que mulheres que passam pelo aborto espontâneo, apresentam transtornos psicólogos geralmente cerca de 1 mês após o ocorrido. Os principais transtornos são: depressão, ansiedade e estresse pós-traumático. A depressão onde a mulher manifesta perda ou ganho considerado de peso, sono e repouso prejudicado, falta de energia, raciocínio lento, pensamentos e tentativas suicidas, muitas vezes os sintomas possuem características duradouras, e requer atenção para reversão da mesma (Bernstein, C. A., Machado, M. H., Ribas, P. A., Jesus, P. H. V., Vasconcelos, T. B., Simões, A. B., & Savaris, R. F. (2022). Impacto psicológico no pós-aborto espontâneo: uma revisão narrativa. Promoção e proteção da saúde da mulher ATM 2024/2. p. 135-150).
Diante desse cenário, as enfermarias exclusivas para mulheres em situação/ processo de abortamento, no âmbito do SUS, e também na rede privada, garantem às mulheres a preservação de sua intimidade e privacidade, o direito de vivenciar o luto com o recolhimento necessários e principalmente as condições de saúde mental cabíveis diante desta condição.
Em casos de interrupção de gravidez decorrente de estupro, a complexidade desta experiência de múltiplas violências, torna imprescindível a existência de espaços específicos que garantam as condições para a recomposição da saúde e integridade física e psíquica destas mulheres.
Certa da importância e da conveniência do projeto de lei ora apresentado, conto com o apoio dos deputados e deputadas para a sua aprovação.
– Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pela deputada Ione Pinheiro. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 2.697/2021, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.