PL PROJETO DE LEI 1109/2023
Projeto de Lei nº 1.109/2023
Institui a Política Estadual de Saúde Funcional, baseada na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Esta Lei institui a Política de Saúde Funcional, baseada na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF.
Art. 2º – Fica instituída a Política Estadual de Saúde Funcional, desenvolvida com base na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF –, com os objetivos de geração e gestão de informações sobre funcionalidade para o planejamento, monitoramento, controle e avaliação da situação de saúde funcional dos indivíduos.
Art. 3º – A Política Estadual de Saúde Funcional observará os seguintes princípios:
I – transversalidade: interligação entre políticas e programas do setor de saúde e os outros setores;
II – visibilidade: conhecimento do estado de funcionalidade da população do Estado de Minas Gerais por meio da versão atualizada da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF –, de um modo intersetorial, em especial entre as áreas da saúde, da assistência social, da educação, da habitação, da previdência social, do trabalho, do emprego, do transporte e da mobilidade urbana;
III – sustentabilidade: proteção e potencialização da funcionalidade humana e prevenção da incapacidade gerada pelo aumento da expectativa de vida.
Art. 4º – Considera-se estado de funcionalidade a descrição proveniente da avaliação do estado anatômico e fisiológico, das atividades e da participação social da pessoa.
§ 1º – A determinação do estado de funcionalidade será efetuada após avaliação biopsicossocial, centrada na pessoa, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, que considerará:
I – as alterações nas funções e nas estruturas do corpo;
II – os fatores ambientais;
III – a capacidade e o desempenho.
§ 2º – Para emissão de laudos e pareceres técnicos multiprofissionais, é permitido o uso de instrumento de avaliação baseados na CIF, não excluindo a possibilidade de uso da classificação sem intermediação de instrumentos.
Art. 5º – A Política Estadual de Saúde Funcional será desenvolvida de forma intersetorial, tendo como objetivos:
I – inclusão nos sistemas de informação sobre a situação de funcionalidade de cada indivíduo e sobre a influência dos fatores ambientais na saúde por meio da CIF;
II – garantia de prioridade na prevenção de incapacidades em qualquer circunstância ou situação de saúde;
III – capacitação de profissionais e trabalhadores de saúde acerca da CIF;
IV – estabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações de caráter educativo sobre aspectos ligados a funcionalidade humana;
V – garantia de acesso direto às ações e serviços da rede de atenção à saúde funcional.
Art. 6º – A Política Estadual de Saúde Funcional será aplicada no Sistema Único de Saúde, na saúde suplementar e na assistência social, com as seguintes funções, entre outras:
I – investigação a respeito do bem-estar, da qualidade de vida, do acesso a serviços e do impacto dos fatores ambientais (estruturais e atitudinais) na saúde dos indivíduos;
II – criação e manutenção de ferramenta estatística para coleta e registro de dados (em estudos da população e inquéritos na população ou em sistemas de informação para a gestão);
III – criação e manutenção de ferramenta clínica para avaliar necessidades, compatibilizar os tratamentos com as condições específicas, ampliando a linha de cuidado;
IV – avaliação dos processos de trabalho com os respectivos impactos reais das ações dos profissionais de saúde, que atuam diretamente com a funcionalidade humana;
V – dimensionamento e redimensionamento de serviços visando qualificar e quantificar as informações relativas ao tratamento e recuperação da saúde no processo de recuperação da funcionalidade e os respectivos resultados;
VI – planejamento de sistemas de seguridade social, de sistemas de compensação e nos projetos e no desenvolvimento de políticas;
VII – elaboração de programas educacionais, para aumentar a conscientização e a realização de ações sociais;
VIII – geração de informações padronizadas para alimentação de bases de dados da saúde, para instrumentalizar a gestão da funcionalidade nas ações e serviços de saúde em todos os seus níveis de atenção; e
IX – geração de indicadores de saúde referentes à funcionalidade humana.
Art. 7º – Nenhuma pessoa poderá ser objeto de discriminação ou de exclusão social diante da identificação de sua situação de saúde pela CIF.
Art. 8º – Na execução da Política Estadual de Saúde Funcional, o Poder Público integrará ações realizadas pelos entes federativos, e poderá estabelecer convênios com Organizações da Sociedade Civil sem fins lucrativos.
Art. 9º – O Poder Executivo regulamentará a presente Lei no que couber à criação de um sistema de informação próprio para tratar estatisticamente dados provenientes do uso multiprofissional da CIF.
Art. 10 – Esta lei entra em vigor após decorridos cento e vinte dias de sua publicação.
Sala das Reuniões, 18 de julho de 2023.
Lucas Lasmar, vice-líder do Bloco Democracia e Luta (Rede).
Justificação: Há mais de 20 anos, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD –, realizada de 1998 a 2003 indicou uma distribuição de doenças crônicas que, consequentemente, impactou de forma negativa a funcionalidade humana. Essas pessoas necessitam dos serviços de saúde e os utilizam quando conseguem ter acesso a eles.
Contudo, os modelos vigentes de atenção estão voltados principalmente à detecção e ao tratamento das doenças, sem, no entanto, levar em alta consideração, os aspectos biopsicossociais. Desse modo, entendemos que a agenda de políticas públicas do Estado de Minas Gerais e do Brasil devem converter-se para a manutenção da funcionalidade e sua proteção, com monitoramento das condições de saúde, ações preventivas específicas de saúde e educação, buscando uma atenção multidimensional e integral, centrada nas pessoas e não centrada nas doenças. A Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – CID –, amplamente utilizada, é insuficiente para classificar e descrever o contexto em que esses problemas acontecem, o que dificulta e compromete o planejamento e a resolubilidade das ações e serviços em saúde.
Nesse contexto, a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF – foi criada para ser um instrumento capaz de gerar dados mais compatíveis com a realidade do indivíduo, uma mudança de um olhar centrado na doença para um olhar centrado na pessoa. A Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015, conhecida como Lei Brasileira de Inclusão, foi a primeira lei que instituiu, em seu art. 2º, um modelo que abrange conteúdos da CIF, o que pode e deve ser extrapolado para todo e qualquer cidadão, visto que esta técnica é aplicável a todas as pessoas e não apenas a grupos populacionais determinados.
Funcionalidade, de acordo com a CIF, é um macro termo que designa os elementos do corpo, suas funções, as atividades humanas e a participação, indicando os aspectos positivos da interação dos indivíduos com o contexto em que vive, especialmente no que diz respeito aos fatores pessoais e ambientais. Portanto, o sistema de informação em saúde no Brasil resta-se incompleto, visto que aborda dados de morbidade, de mortalidade e de procedimentos, mas não aborda dados de funcionalidade.
Desse modo, políticas intersetoriais perdem capacidade de diagnóstico, já que limitações, restrições e barreiras ambientais não têm um formato de descrição padrão, o que a CIF pode oferecer. Para prevenir ou tratar incapacidades, é necessário conhecer o grau de funcionalidade da população. Porém, atualmente temos uma situação de invisibilidade e de falta de informações completas sobre a funcionalidade e sobre a incapacidade, algo que somente pode ser corrigido com as informações geradas a partir da CIF. Essa invisibilidade atual do processo é a limitação dos sistemas de informação em explicitar ou processar os diagnósticos de funcionalidade, comprometendo a eficiência do planejamento, controle, avaliação e regulação das ações e serviços de saúde.
Ademais, os problemas de saúde ligados às alterações de funcionalidade acarretam prejuízos não só aos cidadãos, mas também ao Estado, fato que onera a seguridade social (saúde, assistência social e previdência), gerando a diminuição da qualidade de vida e falha nas avaliações, podendo levar à liberação de benefícios para pessoas que não precisam, em detrimento daquelas que efetivamente necessitam deles.
Apesar da constatação de fatos como os grandes gastos com média e alta complexidade na saúde, auxílio-doença e aposentadorias precoces que poderiam ter sido evitadas, nota-se uma ausência de ações específicas e corretamente planejadas, cuja implementação depende de ações no campo político-administrativo e mudança de paradigma no que tange ao foco ampliado na etiologia de todos esses problemas de saúde. Diante dessa realidade, entende-se que é necessária uma mudança de direção nos caminhos das políticas públicas no nosso Estado e no Brasil, deixando de ver a doença apenas como aspecto biológico, e sim como problema de saúde produzido pela interação com os fatores ambientais.
Portanto, é preciso desenvolver informações que registrem não só a doença, mas também os demais aspectos da situação de saúde dos indivíduos, fazendo-os parte das decisões que afetam benefícios previdenciários e os de outra origem.
Esse projeto de lei pretende criar uma Política Estadual de Saúde Funcional, que visa registrar e potencializar a funcionalidade dos sujeitos, diminuindo suas limitações e evitando a restrição de sua participação social, principalmente no que tange as estruturas públicas de saúde. Isso ocorreria por meio de abordagens do cuidado que ampliam a visão do ser humano como um ser biopsicossocial.
Pelo exposto, pedimos o apoio dos nobres colegas parlamentares para a aprovação deste projeto, promovendo um grande avanço para uma abordagem mais justa e sensata dos problemas de saúde e das eventuais limitações existentes no nosso Estado.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, de Saúde e de Fiscalização Financeira para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.