PL PROJETO DE LEI 2180/2020
Projeto de Lei nº 2.180/2020
Autoriza o Poder Executivo a doar à União o imóvel que especifica.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Fica o Poder Executivo autorizado a doar à União o imóvel com área de 600.000 m² (seiscentos mil metros quadrados), situado na Estrada Rio Verde, s/n, no Município de Caldas, e registrado sob o n° 6.251, a fls. 20 do Livro 2-AH, no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Caldas, cadastrado no Incra sob o n° 441.040.011.681.
Parágrafo único – O imóvel a que se refere o caput deste artigo destina-se à regularização de território indígena de ocupação tradicional da aldeia Kiriri.
Art. 2º – O imóvel de que trata esta lei reverterá ao patrimônio do Estado se, findo o prazo de 10 anos contados da lavratura da escritura pública de doação, não lhe tiver sido dada a destinação prevista no parágrafo único do art. 1°.
Art. 3º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 16 de setembro de 2020.
Andréia de Jesus (PSOL) – André Quintão (PT) – Beatriz Cerqueira (PT) – Betão (PT) – Doutor Jean Freire (PT) – Leninha (PT) – Ulysses Gomes (PT).
Justificação: Com o presente projeto de lei pretende-se autorizar doação recíproca de terras entre o Estado de Minas Gerais e a União a fim de garantir que o território hoje ocupado pela aldeia indígena Kiriri, no município de Caldas, seja regularizado pelos órgãos federais competentes, garantindo assim a dignidade e os direitos constitucionais que historicamente lhes foram negados.
A história da população indígena em nosso país é marcada pela perseguição e pelas diferentes ondas migratórias para tentar se afirmar em territórios onde pudessem viver com dignidade. A história dos Kiriri não é diferente. Originais do nordeste brasileiro, viveram diferentes ondas de migração. Até o fim do século passado, localizavam no oeste baiano, quando, devidos as secas recorrentes e dificuldades com a plantação, migraram por volta de 2001 ao Sul de Minas, inicialmente compartilhando território com os Xucuru Kariri. Depois de alguns anos, voltaram novamente ao nordeste baiano.
Em 2017, retornaram a Caldas, atraídos pela possibilidade de trabalho com as colheitas de batata da região e a fim de encontrar definitivamente um território onde pudessem prosperar, garantindo seus direitos e mantendo a riqueza cultural que os envolve enquanto povo originário e tradicional. Quando então se estabeleceram no território que hoje é objetivo deste projeto de lei, um terreno do estado, com cerca de 60 hectares. Nesta onda migratória, foram cerca de 12 núcleos familiares com quase 50 pessoas que se estabeleceram neste território.
Contudo, neste mesmo ano, deixaram o terreno com receio da execução da reintegração de posse por parte das forças de segurança pública. Mas devido ao apelo da comunidade do entorno e das diversas parcerias com entidades sociais que desenvolveram ao longo de sua inserção no município de Caldas, retornaram a mesma área, onde se encontram até hoje, com posse de terras consolidada, casas construídas, produção agrícola estabilizada e uma vida cultural ativa, além de amplo reconhecimento de diversas entidades do estado, como Ministério Público, Defensoria Pública, a Universidade Estadual de Minas Gerais, o poder público municipal de Caldas, FUNAI e entre outras entidades sociais.
Destaca-se, ainda, que hoje os Kiriri são atendidos pela rede de atenção à saúde municipal de Caldas e possuem também escola estadual em seu território, mantida pela secretaria estadual de educação, dentro da modalidade especial de ensino da educação indígena. E que agora, com o presente projeto de lei, necessitam da regularização definitiva de seu território para acessarem demais direitos, como o acesso formal ao abastecimento de água, ao fornecimento de luz, ao transporte, entre outros.
Frisa-se que o terreno onde se estabeleceram em 2017 estava cedido pelo estado de Minas Gerais a Universidade Estadual de Minas Gerais – UEMG que logo se prontificou a negociar em prol da garantia dos direitos dos Kiriri, promovendo inclusive, diferentes projetos pedagógicos e de extensão junto à comunidade indígena. Mas, posteriormente a tutela da área foi retomada pela secretaria estadual de fazenda e hoje está sob o condão da secretaria de planejamento e gestão, através de sua diretoria central de gestão de imóveis.
Desde de maio de 2019 a partir de representação apresentada pelos próprios Kiriri, foi instaurado procedimento pelo Ministério Público Federal que, por sua vez, motivou abertura de processo administrativo em sede da Superintendência de Patrimônio da União de n° 04926.000859/2019-56 com fins a garantir a regularização definitiva da posse dos indígenas.
Após um ano de tramitação destes dois procedimentos e de diligências por parte dos órgãos envolvidos, a saber MPF, SPU e Secretária de Estado de Fazenda e Secretaria de Planejamento e Gestão, concluiu-se pela realização da chamada da doação recíproca de terras entre estes entes federativos, o estado de Minas Gerais e a União, para que o terreno de propriedade do Estado, hoje sobre a posse pacífica dos Kiriri, fosse destinado à União e na volta, esta última destinasse terreno equivalente em termos territoriais e financeiros ao estado, para que esse não restasse em prejuízo, assim garantindo a destinação do território Kiriri a regularização definitiva com a sua consequente garantia de direitos.
Por isso a importância decisiva deste presente projeto de lei que como narrado no histórico anterior pretende dar prosseguimento como primeiro ato formal para a autorização do Estado para a doação de terreno à união que já está previamente acordado em procedimento administrativo e por parte do Ministério Público. E que além de garantir a dignidade merecida ao povo indígena que historicamente sofreu com a exclusão social e territorial não deixa o erário público de Minas Gerais em prejuízo ao receber terreno equivalente através da doação recíproca com a União.
Está no curso nos autos do processo administrativo n° 04926.000859/2019-56 que a União dispôs do imóvel sob seu domínio localizado no município de Passos denominado fazenda São Francisco e Boa Vista de 40,77 hectares e de valor informado de R$ 614.978,16 para a doação recíproca com o estado. Sendo que o terreno objeto deste projeto de lei possui 60 hectares, valor mensurado menor do que o imóvel disposto pela União e está hoje cedido ao usufruto da Universidade Estadual de Minas Gerais.
Segundo ofício contido no processo administrativo supracitado a Secretaria de Fazenda manifestou se favorável a possibilidade de doação recíproca de terras de imóveis estadual e federal (ofício SEF/SCGA/DCI nº 374/2019).
É indispensável notar, mais uma vez, que a doação recíproca não acarretará prejuízo financeiro ao Estado, regulamentará também a situação do imóvel da União que está cedido ao uso da Universidade Estadual de Minas Gerais e acarretará ganho imensurável a qualidade de vida da comunidade indígena Kiriri.
Por fim, importante registrar que o avanço na regularização fundiária é um marco para a luta dos povos indígenas e dos movimentos que lutam pela garantia de direitos, mas também um marco para a instituição no caso a ALMG ao contribuir com esse processo de regularização consagrando uma conquista humanitário no marco dos 300 anos.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça e de Administração Pública para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.