PL PROJETO DE LEI 3910/2016
Projeto de Lei nº 3.910/2016
Dispõe sobre a obrigatoriedade de as empresas que fabricam e comercializam bebidas alcoólicas no Estado incluírem nos rótulos fotografias de veículos em colisão e estatística de acidentes de trânsito e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art. 1º – Ficam as empresas que fabricam e comercializam bebidas alcoólicas no âmbito do Estado obrigadas a incluírem em seus rótulos fotografias de veículos em colisão, decorrentes de acidente em que o motorista encontrava-se embriagado por ingestão de bebida alcoólicas, e estatística de acidente de trânsito.
§ 1º – As fotografias dos veículos citados no caput deverão ser acompanhadas do termo “Se Beber, Não Dirija”, indicando-se ainda dados estatísticos de mortes e lesões graves sofridas no trânsito, decorrentes do consumo de bebidas alcoólicas.
§ 2º – As ilustrações de que trata o caput do art. 1º devem ser confeccionadas em mídia colorida, em quatro cores, com fontes legíveis e de fácil visualização, de forma a permitir sua imediata identificação pelo consumidor.
Art. 2º – O descumprimento da presente lei acarretará aos infratores multa de valor de 3.000 Ufemgs (três mil Unidades Fiscais do Estado de Minas Gerais), convertida.
Art. 3º – Em caso de reincidência a multa deverá ser dobrada.
Art. 4º – São responsáveis pela confecção e pela colocação da advertência de que trata o caput do artigo 1º:
I – o produtor;
II – o importador com sede no Estado;
III – o comerciante que adquirir bebida alcoólica produzida em outro Estado.
Art. 5º – Além da multa prevista no art. 2º, o descumprimento do disposto nesta lei sujeita o infrator às penalidades previstas no art. 56 da Lei Federal nº 8.078, de 11 de setembro de 1990.
Art. 6º – Os responsáveis pela confecção e pela colocação da advertência de que trata o caput do art. 1º terão o prazo de cento e oitenta dias contados da data da publicação desta lei para se adaptarem a suas disposições.
Art. 7º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 22 de novembro de 2016.
Deputado Antônio Jorge (PPS)
Justificação: O objetivo do referido diploma é conscientizar os consumidores das bebidas sobre o risco de misturar álcool e direção.
Este projeto de lei visa a chamar a atenção para o fato de que álcool e direção não combinam, e sua associação transforma o veículo numa arma e mostra os estragos feitos pela combinação de direção e bebida alcoólica.
A vida deve prevalecer sobre a livre iniciativa comercial, sob pena de perdemos a briga onde jovens, cada vez mais, se envolvem em acidentes, por dirigirem embriagados.
O referido projeto prevê a sujeição às penalidades previstas no art. 56 do Código de Defesa do Consumidor.
O artigo da citada norma federal (Lei nº 8.078, de 1990), referido no projeto, assim dispõe:
"Art. 56 – As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas:
I – multa;
II – apreensão do produto;
III – inutilização do produto;
IV – cassação do registro do produto junto ao órgão competente;
V – proibição de fabricação do produto;
VI – suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;
VII – suspensão temporária de atividade;
VIII – revogação de concessão ou permissão de uso;
IX – cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;
X – interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade;
XI – intervenção administrativa;
XII – imposição de contrapropaganda.
Parágrafo único – As sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar, antecedente ou incidente de procedimento administrativo."
Em primeiro lugar, deve-se observar que a questão ora abordada – possibilidade de uma lei estadual informar seu consumidor sobre os riscos e consequências de dirigir embriagado, encontra-se dentro do chamado poder de polícia administrativa, que, conforme leciona Hely Lopes Meirelles, consiste na “faculdade de que dispõe a Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado” (Em: Direito Administrativo, Ed. Revista dos Tribunais, 16ª Edição, p. 110.)
Este conceito doutrinário já foi definido na legislação brasileira. Podemos citar o art. 78 do Código Tributário Nacional – CTN –, que dispõe:
“Art. 78 – Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.”
O poder de polícia administrativa manifesta-se tanto através de atos normativos e de alcance geral quanto em atos concretos e específicos, aptos a condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais em benefício da coletividade.
Citamos a lição do professor Celso Antônio Bandeira de Mello, constante do seu Curso de Direito Administrativo, 13ª Edição, Editora Malheiros, páginas 695 e 696:
“A polícia administrativa manifesta-se tanto através de atos normativos e de alcance geral quanto de atos concretos e específicos. Regulamentos ou portarias – como as que regulam o uso de fogos de artifício ou proíbem soltar balões em épocas de festas juninas, bem como as normas administrativas que disciplinem horário e condições de venda de bebidas alcoólicas em certos locais, são disposições genéricas próprias da atividade de polícia administrativa”.
Esse poder de polícia é inerente a toda administração pública e deve ser repartido entre a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal.
De plano, constata-se que a lei estadual está a impor regras de efeitos concretos inerentes ao direito do consumidor, à defesa da saúde, da vida e à segurança dos cidadãos, bem como política de educação do trânsito.
Não há dúvidas, então, de que se legisla sobre assunto de competência concorrente da União, dos estados membros e do Distrito Federal.
Entendemos que o tema, tal como tratado na propositura, está, sim, compreendido na competência legiferante dos estados membros, como se passa a demonstrar.
Em primeiro lugar, é importante que se diga que a União detém, privativamente, a competência para legislar sobre a grande maioria das matérias de natureza legislativa.
No entanto, se interpretado o art. 22 da Constituição Federal de maneira extensiva, poder-se-ia concluir que não resta aos estados membros, praticamente, competência alguma, já que é muito fácil acontecer de uma norma que versa sobre um assunto de competência concorrente produzir efeitos que se relacionam com outras matérias, essas de iniciativa privativa.
Por outro lado, não se pode deixar de asseverar, conforme as regras da boa hermenêutica jurídica, que as normas de cunho restritivo, inclusive as constitucionais, devem ser interpretadas restritivamente. No caso das competências privativas da União, esse expediente se mostra ainda mais obrigatório, pois, do contrário, estar-se-ia enfraquecendo de modo demasiado o sistema federativo de Estado, insculpido no art. 1° da Constituição Federal, e cláusula pétrea, por força do art. 60, § 4°, inciso I, do mesmo diploma político.
Isso posto, devemos concluir que o projeto ora em discussão representa uma dessas matérias que, se enxergadas sob o prisma das competências estaduais, fortalece-se a Federação e o estado membro sem derrogar de maneira substancial uma competência, em princípio, privativa da União.
Se analisadas sob o prisma da competência privativa da União, que de algum modo – tal como costumeiramente acontece – é inevitavelmente tangenciada pelo projeto em tela, prostra-se o estado membro à força normativa quase que exclusiva do poder central, ao arrepio do já aludido art. 1º da Constituição Federal.
Mas entendemos que não se trata de matéria privativa da União, como seria legislar sobre propaganda comercial.
Com efeito, preceituam os incisos V, XII e XV do art. 24 da Lei Maior:
“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
(...)
V – produção e consumo;
(...)
XII – previdência social, proteção e defesa da saúde;”
Como se vê, o constituinte reservou aos estados membros a participação, de modo concorrente, na elaboração de leis que tratem de consumo, proteção e defesa da saúde dos cidadãos. Por outro lado, já estabeleceu como privativa da União a competência para legislar sobre propaganda comercial, como já aludido.
Necessário salientar que este legislador estadual, em momento algum, se propôs a legislar sobre propaganda comercial. Antes, pretendeu unicamente atingir aqueles bens jurídicos cuja salvaguarda estão também a cargo do Estado, nos moldes das competências a ele atribuídas pelo art. 24 supratranscrito.
A temática da propaganda comercial, que é tangenciada pelas medidas preconizadas pelo projeto, não é abordada de modo exauriente, taxativo, ou contrário à Constituição ou à legislação federal.
Tampouco o objeto do projeto é a regulamentação da propaganda de maneira precípua ou genérica, isso é, em abstrato. Sendo assim, não há que se falar em inconstitucionalidade de tal norma ser arguida judicialmente e reconhecida.
Busca-se ainda a defesa do consumidor.
Nessa linha, aliás, já decidiu o Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.832, cuja ementa transcrevemos, acerca de suposta invasão da competência privativa da União para legislar sobre comércio, quando da elaboração de lei paranaense sobre informações a serem inscritas nos rótulos de embalagens de café, como demonstra a ementa abaixo transcrita.
“EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ADI CONTRA LEI PARANAENSE 13.519, DE 8 DE ABRIL DE 2002, QUE ESTABELECE OBRIGATORIEDADE DE INFORMAÇÃO, CONFORME ESPECIFICA, NOS RÓTULOS DE EMBALAGENS DE CAFÉ COMERCIALIZADO NO PARANÁ. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 22, I e VIII, 170, CAPUT, IV, E PARÁGRAFO ÚNICO, E 174 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROTEÇÃO AO CONSUMIDOR. OFENSA INDIRETA. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. I – Não há usurpação de competência da União para legislar sobre direito comercial e comércio interestadual porque o ato normativo impugnado buscou, tão-somente, assegurar a proteção ao consumidor. II – Precedente deste Tribunal (ADI 1.980, Rel. Min. Sydney Sanches) no sentido de que não invade esfera de competência da União, para legislar sobre normas gerais, lei paranaense que assegura ao consumidor o direito de obter informações sobre produtos combustíveis. III – Afronta ao texto constitucional indireta na medida em que se mostra indispensável o exame de conteúdo de outras normas infraconstitucionais, no caso, o Código do Consumidor. IV – Incorre delegação de poder de fiscalização a particulares quando se verifica que a norma impugnada estabelece que os selos de qualidade serão emitidos por entidades vinculadas à Administração Pública estadual. V – Ação julgada parcialmente procedente apenas no ponto em que a lei impugnada estende os seus efeitos a outras unidades da Federação.” (Grifos nossos.)
Assim, outra questão a ser levantada dentro do campo do direito do consumidor é o acesso à informação clara e precisa nos termos do Código de Defesa do consumidor.
(...)
“III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem.”
De plano constata-se que a lei estadual está a impor regras de efeitos concretos inerentes ao direito do consumidor, à defesa e proteção da saúde. Não há dúvidas, então, de que legisla sobre assunto de competência concorrente da União, dos estados membros e do Distrito Federal.
Devemos assim observar a técnica de repartição de competências adotada pela Constituição Federal de 1988, onde podem ser deferidas com exclusividade a determinada unidade federativa ou de forma concorrente entre elas.
A matéria ora tratada situa-se entre aquelas cuja competência, em razão do simultâneo interesse, pode ser exercida concorrentemente entre as unidades da federação, ou seja, os Estados e o Distrito Federal.
Como a maioria da doutrina entende, ela concentra nas áreas de saúde pública, direito do consumidor e segurança pública.
Devemos observar o princípio da predominância do interesse, sendo que a União trata de questões onde predominam o interesse nacional e da generalidade dos cidadãos; aos Estados cabe o tratamento das matérias relativas a interesses essencialmente regionais; e, por fim, aos municípios competem os assuntos de interesse predominantemente locais.
No presente caso, o interesse em jogo trata de assuntos onde predomina o interesse regional, responsável pela saúde, segurança e consumo de seus cidadãos, matérias que devem ser uniformizadas em todo o território estadual pertencente a ele.
Isso deve ser visto como uma questão de saúde pública e mais, de segurança, pois cada vez mais vemos noticiados acidentes automobilísticos causados por consumidores embriagadas, e as consequências decorrentes na área de tratamento da saúde, etc.
Assim, ao debatermos o assunto tratamos de matérias de competência concorrente – da União, dos Estados e do Distrito Federal, em alusão aos incisos V (produção e consumo), XII (proteção e defesa da saúde) do art. 24 da Constituição Federal.
De fato, como assinala José Afonso da Silva, “há, contudo, uma repartição de competências nessa matéria (organização da segurança pública) entre a União e os Estados, de tal sorte que o princípio que rege é o de que o problema da segurança pública é de competência e responsabilidade de cada unidade da Federação, tendo em vista as peculiaridades regionais e o fortalecimento do princípio federativo, como, aliás, é da tradição do sistema brasileiro” (In: Curso de Direito Constitucional Positivo, 9ª ed., 1994, Malheiros Editores).
E ainda competência prevista no art. 23 da Constituição, quando se preocupa com a política de educação para segurança do trânsito.
“Art. 23 – É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
(...)
XII – estabelecer e implantar política de educação para a segurança do trânsito.”
Este é o entendimento do STF demonstrado no julgamento da ADI 2.407, que ao julgar a constitucionalidade de uma lei catarinense que dizia respeito à segurança pública e à educação do trânsito, entendeu tratar de competência comum dos entes federados, assim ementada:
“Os arts. 1º e 2º da Lei catarinense nº 11.223, de 17/11/1998, que cuidam da obrigatoriedade de identificação telefônica da sede da empresa ou do proprietário nos veículos licenciados no Estado de Santa Catarina e destinados ao transporte de carga e de passageiros, a ser disponibilizada na parte traseira do veículo, por meio de adesivo ou pintura, em lugar visível, constando o código de discagem direta à distância, seguido do número do telefone, não contrariam o inciso XII do art. 5º da CR.
O art. 1º da lei catarinense contempla matéria afeita à competência administrativa comum da União, dos estados membros, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme previsto no inciso XII do art. 23 da CR, pelo que nele podem estar fixadas obrigações, desde que tenham pertinência com as competências que são próprias do Estado federado e que digam respeito à segurança pública e à educação para o trânsito. (ADI 2.407, rel. min. Cármen Lúcia, j. 31-5-2007, P, DJ de 29-6-2007.)”
Cuida do respeito à pessoa, da preservação da vida (caput do art. 5º da CF/88) – “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.
Em suma, entendemos que o projeto é louvável, porquanto adequado e necessário aos objetivos que se pretende alcançar, que são aqueles atinentes à competência legiferante estadual, especialmente a proteção da vida, da saúde e política de educação para a segurança do trânsito. Logo, não faria sentido rotulá-lo como inconstitucional apenas por assemelhar-se à temática da propaganda comercial, que em nenhum momento é objeto da proposição.
Dispõe o art. 144 da Constituição Federal:
"Art. 144 – A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
(...)"
Dessa forma, indiscutível a possibilidade de regulamentação da questão mediante a edição de lei estadual.
É que, em matéria de competência legislativa, rege o princípio da predominância do interesse, sendo da União o tratamento de questões nas quais predominam o interesse nacional e da generalidade dos cidadãos, dos Estados o tratamento das matérias relativas a interesses essencialmente regionais e, por fim, aos Municípios competem os assuntos de interesse predominantemente locais.
Confira-se, a respeito, a lição de José Afonso da Silva e Hely Lopes Meirelles, in verbis:
"O princípio geral que norteia a repartição de competência entre as entidades componentes do Estado Federal é o da predominância do interesse, segundo o qual à União caberão aquelas matérias e questões de predominante interesse geral, nacional, ao passo que aos Estados tocarão as matérias e assuntos de predominante interesse regional, e aos Municípios conhecerem os assuntos de interesse local, tendo a Constituição vigente desprezado o velho conceito do peculiar interesse local que não lograra conceituação satisfatória num século de vigência." (José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 9ª ed., São Paulo, Malheiros, 1993, p.418)
"O interesse local caracteriza-se pela predominância (e não pela exclusividade) do interesse para o Município, em relação ao do Estado a da União. Isso porque não há assunto municipal que não seja reflexamente de interesse estadual e nacional. A diferença é apenas de grau e não de substância". (Hely Lopes Meirelles, Direito de Construir, 6ª ed., Malheiros, 1993, p. 120)
Portanto, se o interesse ultrapassar os limites do município, afastada estará sua competência privativa, legitimando-se, assim, a edição de normas estaduais e federais sobre a questão, conforme estejam em jogo, respectivamente, necessidades regionais ou nacionais.
No caso presente, o interesse em jogo (melhoria da segurança pública mediante a restrição da venda de bebidas alcoólicas) não pode ser considerado predominante no âmbito municipal. Trata-se, na verdade, de assunto onde predomina o interesse regional, em face da necessidade de disciplinamento uniforme da questão em todo o território estadual.
A vida deve prevalecer sobre a livre iniciativa comercial.
Inexiste violação aos princípios constitucionais do livre exercício da atividade econômica e da livre iniciativa, previstos nos arts. 1º, 4º e 170, parágrafo único, da Constituição Federal. Essas liberdades constitucionais não afastam a possibilidade regramento restritivo estatal com o objetivo de assegurar o bem-estar da coletividade, uma vez que não escapa ao crivo fiscalizador e normativo do Estado (art. 174 da CF/88).
Se é certo que o Estado brasileiro adotou um modelo econômico baseado na propriedade privada dos meios de produção, na iniciativa privada e na livre concorrência, não menos correto é concluir que isto não implica dizer que não cabe ao Estado intervir nos casos em que seja necessária sua atuação na defesa dos interesses públicos.
Neste sentido, as seguintes decisões do Tribunal de Justiça do Distrito Federal:
"DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO – SINDICATO – LEGITIMIDADE – MEDIDA PROVISÓRIA N. 2.180-35, DE 24/08/2001 – ESTABELECIMENTO COMERCIAL – VENDA DE BEBIDAS ALCOÓLICAS – HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO – LIMITAÇÃO – LEGALIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO – MANDAMUS DENEGADO. I – PRELIMINARES: O "MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO É DESTINADO TÃO-SÓ À PROTEÇÃO DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO E INCONTESTÁVEL DE TODA UMA CATEGORIA – OU DA MAIORIA DOS MEMBROS DESSA CATEGORIA" (JOSÉ CRETELLA JÚNIOR). NESSA ESTEIRA, NÃO SE DESNATURA ESSA ESPÉCIE DE AÇÃO MANDAMENTAL APENAS PORQUE, EVENTUALMENTE, EM SEU ÂMBITO DE TUTELA NÃO SE ALCANÇARÁ TODA A COMUNIDADE RESPECTIVA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. II – PRESENTES OS REQUISITOS INCLUÍDOS PELA MEDIDA PROVISÓRIA N. 2.180-35, DE 24/08/2001, AO ART. 2º DA LEI N. 9.494/97, QUAIS SEJAM, A ATA DA ASSEMBLÉIA QUE AUTORIZOU A INICIATIVA POSTULATÓRIA DO IMPETRANTE, COMO TAMBÉM A IDENTIFICAÇÃO DOS SINDICALIZADOS, INCLUSIVE, COM A INDICAÇÃO DO ENDEREÇO, HÁ DE SE CONCLUIR POR SATISFEITO O PRESSUPOSTO LEGAL PARA A REGULAR IMPETRAÇÃO DO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. III – MÉRITO: SE É CERTO QUE A ATIVIDADE ECONÔMICA É ASSEGURADA A TODOS, INDEPENDENTEMENTE DE AUTORIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS PÚBLICOS, SALVO OS CASOS PREVISTOS EM LEI, NÃO MENOS CORRETO É QUE TAL ATUAÇÃO NÃO ESCAPA AO CRIVO FISCALIZADOR E NORMATIVO DO ESTADO. SOB ESSA ÓTICA, AS AUTORIDADES COATORAS, ESCORADAS EM BASE LEGAL, E NO EXERCÍCIO DO PODER DE POLÍCIA, LEGITIMAMENTE EXPEDIRAM A PORTARIA CONJUNTA DE N. 06/SESP/SUCAR, DE 14 DE MARÇO DE 2002, PARA ESTABELECER, CONFORME CERTOS CRITÉRIOS, OS HORÁRIOS DE PERMISSÃO DE VENDA DE BEBIDAS ALCOÓLICAS PELOS ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS E SIMILARES DE BRASÍLIA. IV – SALIENTE-SE QUE O PODER PÚBLICO À VISTA DO INTERESSE PÚBLICO E DIANTE DE IRREGULARIDADES, OU ATÉ MESMO ILÍCITO, POR VEZES, PENAL, NO EXERCÍCIO, POR EXEMPLO, DO COMÉRCIO, DA INDÚSTRIA, EM ÁREAS SANITÁRIAS, PODE, NA DESINCUMBÊNCIA DO SEU PODER DE POLÍCIA, INTERDITAR, SUSPENDER E, INCLUSIVE, FECHAR O ESTABELECIMENTO COM O ENCERRAMENTO DAS ATIVIDADES, COMO NÃO PODERIA, O MENOS, DISCIPLINAR O HORÁRIO DE FUNCIONAMENTO DE TAIS ATIVIDADES? V – MANDADO DE SEGURANÇA DENEGADO." (TJDF, Conselho Especial, Mandado de Segurança nº 2002.00.2.0039261, rel. Des. Jeronymo de Souza, pub. no DJ de 09.07.2003)
"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENSÃO DO APELANTE DE VER CASSADA A SENTENÇA POR FATO SUPERVENIENTE OCORRIDO A CONFIRMAR A TESE ESPOSADA POR ELE NA PRESENTE DEMANDA, CONSISTENTE NA DECISÃO PROFERIDA EM QUE SE CONCEDEU LIMINAR EM AÇÃO PROPOSTA PELO SINDICATO DOS HOTÉIS, BARES E RESTAURANTES DO DISTRITO FEDERAL. INACOLHIMENTO. MÉRITO: A) NÃO PODERIA A ADMINISTRAÇÃO SE VALER DAS PORTARIAS CONJUNTAS N. 2 E 3 OU POSTERIORES POSTARIAS, POR NÃO SEREM LEIS EM SENTIDO FORMAL, QUE NÃO TÊM O CONDÃO DE OBSTAR A VENDA DE BEBIDAS APÓS DETERMINADO HORÁRIO, SOB PENA DE MALFERIR O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. B) A PROIBIÇÃO RESULTOU EM OFENSA AO PRINCÍPIO DO LIVRE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA E DA LIVRE INICIATIVA. C) AS PORTARIAS SÃO DESPROPORCIONAIS, POIS NÃO FAZEM QUAISQUER ACEPÇÕES NO TOCANTE AO TIPO DE TRAILLERS E QUIOSQUES, LOCALIZAÇÃO....
1 – Não é razão bastante para se cassar a r. sentença, o fato de em processo similar ter sido deferida liminar, já que o julgador é livre para expressar o seu posicionamento, desde que fundamente a decisão.
2 – As portarias, uma vez que exprimem a vontade e o comando da lei, são também instrumentos legítimos através dos quais os agentes públicos podem atuar no cumprimento de seus deveres e obrigações.
A autorização para a utilização da área pública não exime o autorizado do cumprimento das normas de postura, saúde pública, segurança pública, trânsito e outras estipuladas para cada tipo de atividade a ser exercida.
3 – A Administração encontra-se em situação de supremacia sobre os administrados sempre que impuser uma limitação em benefício do interesse público. Não havendo abuso, arbitrariedade ou ilegalidade, suas ordens devem ser acolhidas pelos administrados.
4 – A segurança pública deve prevalecer sobre o interesse econômico.
5 – Recurso improvido." (TJDF, Segunda Turma Cível, Apelação Cível nº 2002.01.1.011054-2, rel. Des. Mário-Zam Belmiro, julg. em 26.06.2003)
"AGRAVO REGIMENTAL. LIMINAR INDEFERIDA EM MANDADO DE SEGURANÇA. PODER DE POLÍCIA. Não se mostra plausível suspender, em liminar, as portarias que determinam o fechamento em horários determinados de estabelecimentos comerciais que vendem bebidas alcoólicas se não demonstrado amplamente o fumus boni iuris e o periculum in mora, até porque tal ato encontra-se dentre aqueles que se encaixam no poder de polícia da Administração Pública." (TJDF, Conselho Especial, Agravo Regimental no Mandado de Segurança nº 2002.00.2.001592-2, rel. Des. Edson Alfredo Smaniotto, julg. Em 04/6/2002)
Podemos ainda argumentar a necessidade da aprovação desta legislação com o entendimento já definido pelos tribunais acerca da proibição de comercialização de bebidas alcoólicas às margens das rodovias localizadas no território estadual, que entenderam não existir nenhuma inconstitucionalidade nesta medida, conforme citado no artigo “A constitucionalidade de leis estaduais restritivas do consumo de bebidas alcoólicas” de Paulo Roberto Fernandes Pinto Júnior, publicado na internet em 4/2005.
De fato, o STF já declarou a constitucionalidade de norma com tal objetivo, afirmando que não se trata de matéria de direito comercial, mas sim de direito administrativo, para cuja disciplina têm competência os estados membros. Eis as ementas das seguintes decisões:
"CONSTITUCIONAL. TRÂNSITO. RODOVIAS ESTADUAIS: ACESSO DIRETO. Lei nº 4.885, de 1985, do Estado de São Paulo. I. – A Lei 4.885, de 1985, do Estado de São Paulo, art. 1º, não dispõe sobre matéria de direito comercial. Dispõe, sim, sobre matéria de direito administrativo, já que disciplina a autorização para dispor de acesso direto à rodovia estadual. A lei estadual apenas estabelece que os estabelecimentos comerciais situados nos terrenos contíguos às faixas de domínio do DER somente poderão obter autorização de acesso direto às estradas estaduais se se comprometerem a não vender ou servir bebida alcoólica. II. – Inocorrência de ofensa ao princípio da irretroatividade das leis ou do respeito ao direito adquirido. III. – Constitucionalidade do art. 1º da Lei paulista 4.855, de 1985, regulamentado pelo art. 1º do Decreto estadual 28.761, de 26.08.88. IV. – R.E. não conhecido." (STF, Tribunal Pleno, RE nº 148.260/SP, rel. Min. Carlos Velloso, pub. no DJ de 14/11/1996)
"ESTADO DE SÃO PAULO. ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS COM ACESSO DIRETO ÀS RODOVIAS ESTADUAIS. LEI Nº 4.885, DE 1985. Hipótese em que, na forma do diploma legal em referência, estão eles proibidos de vender e de servir bebidas alcoólicas. Recurso extraordinário conhecido, mas improvido." (STF, 1ª T., RE nº 183.882/SP, rel. Min. Ilmar Galvão, pub. no DJ de 25/6/1999)
De plano constata-se que a lei estadual está a impor regras de efeitos concretos inerentes ao direito do consumidor, à defesa da vida e da saúde. Não há dúvidas, então, de que legisla sobre assunto de competência concorrente da União, dos estados membros e do Distrito Federal.
A matéria ora tratada situa-se entre aquelas cuja competência, em razão do simultâneo interesse, pode ser exercida concorrentemente entre as unidades da federação, ou seja, os Estados e o Distrito Federal.
A exibição dessas imagens deve reduzir os números de acidentes de trânsito, pois trará a conscientização do perigo e de que pode haver consequências graves. Essa conscientização viria com o rótulo.
Não cabe nem falar que já exista proibição de fazermos uma legislação estadual sobre o assunto, pois a Lei Federal nº 8.918, de 14 de julho de 1994, que dispõe sobre a padronização, a classificação, o registro, a inspeção, a produção e a fiscalização de bebidas, autoriza a criação da Comissão Intersetorial de Bebidas e dá outras providências que tratam da obrigatoriedade do registro, da padronização, da classificação, da inspeção e da fiscalização da produção e do comércio de bebidas no seu regulamento anexo; no seu art. 11, permite que o rótulo da bebida contenha alguns dizeres determinados, sem prejuízo de outras disposições de lei (Decreto nº 6.871, de 4 de junho de 2009).
No Brasil, mais de 50% das mortes no trânsito (o álcool está presente no sangue de quase metade das vítimas fatais dos acidentes de trânsito – Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), no site www.naofoiacidente.org), anualmente, têm relação direta com motoristas alcoolizados. Isso representa, a cada ano, 26 mil pessoas perdendo a vida em consequência da bebida. O álcool reduz a percepção do motorista, assim como reduz a sua habilidade para dirigir. Um motorista embriagado tem muitas chances de colocar em risco sua vida e a vida de pessoas inocentes.
O consumo de bebidas alcoólicas é uma das principais causas de acidentes automobilísticos no país, segundo estatística da Polícia Rodoviária Federal e do Ministério da Saúde. O Brasil ostenta o triste título de detentor de um dos mais altos índices de mortes no trânsito por habitante. Na última década, o número de fatalidades subiu mais de 30%.
Dados da OMS apontam que aproximadamente 1,2 milhão de pessoas morrem anualmente no mundo em consequência de acidentes de trânsito. No Brasil a morte por acidente ocupa o terceiro lugar. Temos uma morte para cada 690 veículos. Os acidentes de trânsito com vítimas também são responsáveis por alto impacto econômico no Brasil. Um acidente com vítima custa 11 vezes mais do que um acidente sem vítimas, podendo custar 44 vezes mais se houver morte.
Apesar do advento do Código de Trânsito Brasileiro – CTB –, em 1998, ainda há um número assustador de mortes no trânsito. Posteriormente foi imputado como crime dirigir alcoolizado; todavia, o que se nota é a necessidade de ir além da punição. É necessária uma grande conscientização e educação da sociedade como um todo nesse quesito, para se diminuir o número alarmante de acidentes e mortes.
Por todo o exposto, contamos com os nobres colegas para aprovação desta matéria, por se tratar de medida de inteira justiça.
– Publicado, vai o projeto às Comissões de Justiça, de Segurança Pública, de Transporte e de Desenvolvimento Econômico para parecer, nos termos do art. 188, c/c o art. 102, do Regimento Interno.