PL PROJETO DE LEI 4272/2013
Projeto de Lei nº 4.272/2013
Institui o Programa Estadual de Identificação e Controle da População de Cães e Gatos e dá outras providências.
A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais decreta:
Art 1º - O Poder Executivo incentivará a viabilização e o desenvolvimento de programas que visem ao controle reprodutivo de cães e de gatos e à promoção de medidas protetivas, por meio de identificação, registro, esterilização cirúrgica, adoção, e de campanhas educacionais para a conscientização pública da relevância de tais atividades, cujas regras básicas seguem descritas nesta lei.
Art 2º - Fica vedada a eliminação da vida de cães e de gatos pelos órgãos de controle de zoonoses, canis públicos e estabelecimentos oficiais congêneres, exceção feita à eutanásia, permitida nos casos de males, doenças graves ou enfermidades infectocontagiosas incuráveis que coloquem em risco a saúde de pessoas ou de outros animais.
§ 1º - A eutanásia será justificada por laudo do responsável técnico pelos órgãos e estabelecimentos referidos no “caput” deste artigo, precedido, quando for o caso, de exame laboratorial, facultado o acesso aos documentos por entidades de proteção dos animais.
§ 2º - Ressalvada a hipótese de doença infectocontagiosa incurável, que ofereça risco à saúde pública, o animal que se encontre na situação prevista no “caput” poderá ser disponibilizado para resgate por entidade de proteção dos animais, mediante assinatura de termo de integral responsabilidade.
Art. 3º - O animal com histórico de mordedura, injustificada e comprovada por laudo médico, será inserido em programa especial de adoção, de critérios diferenciados, prevendo assinatura de termo de compromisso pelo qual o adotante se obrigará a cumprir o estabelecido em legislação específica para cães bravios, a manter o animal em local seguro e em condições favoráveis ao seu processo de ressocialização.
Art. 4º - O recolhimento de animais observará procedimentos protetivos de manejo, de transporte e de averiguação da existência de proprietário, de responsável ou de cuidador em sua comunidade.
§ 1º - O animal reconhecido como comunitário será recolhido para fins de esterilização, registro e devolução à comunidade de origem, após identificação e assinatura de termo de compromisso de seu cuidador principal.
§ 2º - Para efeitos desta lei considera-se "animal comunitário" aquele que estabelece com a comunidade em que vive laços de dependência e de manutenção, embora não possua responsável único e definido.
Art. 5º - Não se encontrando nas hipóteses de eutanásia, nos termos do art. 2° desta lei, os animais permanecerão por 72 (setenta e duas) horas à disposição de seus responsáveis, oportunidade em que serão esterilizados.
Parágrafo único - Vencido o prazo previsto no “caput” deste artigo, os animais não resgatados serão disponibilizados para adoção e registro, após identificação.
Art. 6º - Para efetivação deste programa o poder público poderá viabilizar as seguintes medidas:
I - a destinação, por órgão público, de local para a manutenção e exposição dos animais disponibilizados para adoção, que será aberto à visitação pública, onde os animais serão separados conforme critério de compleição física, de idade e de temperamento;
II - campanhas que conscientizem o público da necessidade de esterilização, de vacinação periódica e de que o abandono, pelo padecimento infligido ao animal, configura, em tese, prática de crime ambiental;
III - orientação técnica aos adotantes e ao público em geral para os princípios da tutela responsável de animais, visando atender às suas necessidades físicas, psicológicas e ambientais.
Art. 7º - Fica o poder público autorizado a celebrar convênio e parcerias com Municípios, entidades de proteção animal e outras organizações não governamentais, universidades, estabelecimentos veterinários, empresas públicas ou privadas e entidades de classe, para a consecução dos objetivos desta lei.
Art. 8º - A infração aos dispositivos desta lei acarretará a aplicação de multa pecuniária no valor correspondente a 600 Ufemgs (seiscentas Unidades Fiscais do Estado de Minas Gerais) , aplicadas em dobro na hipótese de reincidência.
Art. 9º - As despesas decorrentes da execução desta lei correrão à conta de dotações orçamentárias próprias.
Art.10 - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Sala das Reuniões, 9 de julho de 2013.
Fred Costa
Justificação: Este projeto de lei atende às sugestões propostas por todo o segmento inerente à questão dos animais, bem como aos princípios constitucionais vigentes de proteção animal.
Da ultrapassada política de saúde decorre o crescente número de cães e de gatos que pelas ruas vagam, uma vez que muitas Municipalidades ainda pretendem controlar as zoonoses e a população de animais adotando para tal o método da captura seguida da eliminação de animais encontrados nas vias públicas.
Era o que recomendava o 6° Informe Técnico da Organização Mundial de Saúde – OMS –, de 1973, já em desuso na maior parte do mundo, uma vez que a OMS, com fulcro na aplicação desse método em vários países em desenvolvimento, concluiu por sua ineficácia, enunciando que não há prova alguma de que a eliminação de cães tenha gerado um impacto significativo na propagação da raiva ou na densidade das populações caninas, por ser rápida a renovação dessa população, cuja sobrevivência se sobrepõe facilmente à sua eliminação (item 9.4, p. 58, 8° Informe Técnico).
Além de ineficaz, o método é dispendioso, segundo expôs a OMS, no capítulo 9.3, p. 57, do referido informe.
Desde a edição de seu 8° Informe Técnico, de 1992, a OMS preconiza a educação da comunidade e o controle de natalidade de cães e de gatos, anunciando que todo programa de combate à raiva deve contemplar o controle da população canina, como elemento básico, ao lado da vigilância epidemiológica e da imunização (capítulo 9, p. 55, 8° Informe OMS).
Recente publicação da Organização Panamerina de Saúde – Opas – recomenda o método de esterilização e devolução dos animais à comunidade de origem, declarando que a eliminação de animais não só foi ineficaz para diminuir os casos de raiva, mas aumentou a incidência da doença. Trata-se da obra "Zoonosis y enfermidades transmisibles comunes al hombre y a los animales", de Pedro Acha, (pág. 370, Publicación Científica y Técnica nº 580, ORGANIZÁCION PANAMERICANA DE LA SALUD, Oficina Sanitária Panamericana, Oficina Regional de la ORGANIZACIÓN MUNDIAL DE LA SALUD, 3º edição, 2003).
Tendo em vista que uma só cadela pode originar, direta ou indiretamente, 67.000 cães num período de seis anos, e que um cão, antes de ser eliminado, já inseminou várias fêmeas, não é difícil deduzir que matar não soluciona o problema.
Muito embora a OMS tenha recomendado urgência às autoridades responsáveis em revisar a política adotada, o Brasil ainda segue o método da captura seguida de morte, a que denomina de eutanásia.
Longe da moral elevada que inspira a eutanásia, pratica-se um autêntico e indigno massacre sistemático de animais, que poderia ser evitado com medidas profiláticas, consistentes em campanhas educativas sobre guarda responsável, implantação de vacinação e de esterilização em massa de animais, ainda que não domiciliados, pois enquanto alguns são apreendidos, muitos permanecem nas ruas, procriando e disseminando doenças (segundo a OMS, a taxa mais elevada de apreensão, no mundo registrada, não ultrapassa os 15%).
No que tange ao controle da raiva, a vacinação sistemática de cães nas áreas de risco, o controle populacional, por meio da captura e esterilização, aliados à educação para a guarda responsável de animais são as estratégias aceitas mundialmente, segundo a Opas.
Argumenta-se que os animais não devem permanecer nas ruas, ao que cabe replicar que os animais estão nas ruas e ali permanecerão, enquanto se persistir no equivocado método da captura seguida de morte.
Convém lembrar que a proteção aos animais e a salubridade pública, longe de serem valores antagônicos ou inconciliáveis, são interesses que se vinculam e que se voltam a um mesmo fim, já que as medidas que protegem os animais são as mesmas preconizadas pela OMS, por atuarem na defesa da incolumidade pública. Dessa forma, é de natureza pública o interesse em implantar tais procedimentos.
Não se desconhece que a legislação vigente pune os atos de abuso e de maus-tratos aos animais, tipificados como crime ambiental pelo artigo 32 da Lei Federal nº 9.605, de 1998, e que a Constituição da República, em seu art. 225, § 1°, VII, declara que incumbe ao poder público vedar as práticas que submetam animais à crueldade. Poucos se dão conta, contudo, de que a eliminação sistemática e injustificada de animais destoa da legislação pátria, uma vez que a tutela jurídica conferida ao animal não se restringe à sua integridade física, mas também, e, sobretudo, à vida, por se constituir em pressuposto básico de sua própria existência.
E a Constituição da República também tem sido alvejada pela atual política de saúde pública, que viola princípios elencados em seu art. 37, relativos à administração pública como o princípio da eficiência, uma vez que a administração pública deveria utilizar-se de forma adequada e racional dos meios disponíveis para se obter o melhor resultado possível, o que não ocorre no tocante ao controle das zoonoses e da população animal. Diga-se o mesmo quanto ao princípio da moralidade, uma vez que a política de saúde pública, ao exterminar milhares de animais, revela descaso pela vida, repelindo qualquer obrigação moral diante de seres vivos.
Outros princípios, expressos ou implícitos no sistema constitucional, também estão sendo relegados, tais como o princípio da finalidade: as normas sanitárias têm por finalidade o controle das doenças. Ao insistir na adoção de método tido por ineficaz, e, portanto, incapaz de satisfazer o propósito da lei, frustra-se a finalidade postulada pela norma, o que equivale a desatendê-la; princípio da razoabilidade: impõe limitações à discricionariedade administrativa quanto à escolha dos meios, que deverão ser compatíveis e adequados à consecução da finalidade traçada pela norma. A matança indiscriminada de animais não é um meio justo, legítimo ou adequado para solucionar questões de saúde pública; princípio da motivação: é dever da administração justificar seus atos, apontando-lhes as razões de fato e de direito que os autorizam. O extermínio não encontra respaldo técnico, razão pela qual o ato carece de motivação; princípio constitucional da educação ambiental: incumbe ao poder público promover a conscientização pública para a preservação do meio ambiente, como exige o art. 225, “caput” e o § 1°, VI, da Carta Magna; princípio da precaução: compete ao poder público prevenir condutas lesivas ao meio ambiente. Não há prevenção do dano sem campanhas de vacinação e de esterilização em massa, aliadas à educação da população sobre os princípios da guarda responsável; princípio da indisponibilidade pela administração dos interesses públicos: a administração não tem disponibilidade sobre os interesses qualificados como coletivos, incumbindo-lhe apenas curá-los, o que não vem ocorrendo, uma vez que os animais são eliminados como se deles a administração pudesse dispor ao seu alvedrio.
Há que se repensar a postura que se tem diante dessa questão, editando leis inspiradas em padrões morais elevados e conhecimento técnico avançado, como fizeram países como Itália, França, Espanha, Argentina, Índia, além de muitas localidades da Rússia e dos EUA, como a Califórnia.
No Brasil, a esterilização e devolução à comunidade de origem já é recomendada pela Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo (Boletim Epidemiológico Paulista, da Secretaria Estadual de Saúde, agosto de 2005, ano 2, n° 20) e, no Rio de Janeiro, pelo Decreto Municipal nº 23.989, de 19 de fevereiro de 2004, que criou o conceito de cão comunitário. As medidas expressas pelos artigos 6° e 7° deste projeto também espelham essas recomendações.
Além das implicações morais e jurídicas já mencionadas, a anuência conferida à atual política de saúde faz com que o poder público não se interesse por encontrar soluções eficazes e dignas para a questão, acomodando-se à prática do extermínio sistemático. Nesse sentido, a eliminação de animais se presta a perpetuar uma política de saúde pública tão inclemente quanto ineficaz.
A necessidade de se repetir o exame laboratorial antes de se decidir pela eutanásia do animal, se deve principalmente ao fato dos exames usualmente feitos pelo poder público não serem 100% específicos nem 100% sensíveis.
Quanto ao envio de animais dos órgãos públicos para ensino e pesquisa ou entretenimento, sabemos que aos centros de controle de zoonoses e órgãos municipais afins cabe cuidar do controle de zoonoses e saúde pública e não fornecer animais para outras finalidades. Enquanto ao particular é lícito fazer tudo o que a lei não veda, à administração pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. É a observância da legalidade que a Constituição da República, no “caput” de seu artigo 37, traz como princípio limitador da atividade administrativa.
Assim, a administração pública, cujo objetivo principal é o controle das doenças desatende ao princípio da finalidade, e não lhe compete enviar animais capturados para outros fins. Desatende também ao princípio da indisponibilidade, como se assim pudesse agir ao seu alvedrio, ao disponibilizar interesses qualificados como coletivos.
O controle, por parte das prefeituras do nosso Estado, na comercialização legal dos animais irá ajudar as administrações públicas municipais no planejamento da população animal, uma vez que os comerciantes inescrupulosos de animais constituem uma das principais fontes de abandono de animais nas ruas. Para os comerciantes informais, se o cão ou gato não é vendido enquanto filhote, para não terem despesa com o animal, eles o abandona nas ruas.
Pelo exposto, esperamos contar com o apoio de nossos nobres pares para a aprovação deste projeto de lei.
- Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelo Deputado Alencar da Silveira Jr. Anexe-se ao Projeto de Lei nº 575/2011, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.