PRE PROJETO DE RESOLUÇÃO 4823/2010

PROJETO DE RESOLUçãO Nº 4.823/2010

Susta os efeitos do Decreto nº 44.035, de 1º de junho de 2005, que disciplina a autorização para prestação de serviço fretado de transporte rodoviário intermunicipal de pessoas e altera o Decreto nº 32.656, de 14 de março de 1991.

A Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais aprova:

Art. 1º – Ficam sustados os efeitos do Decreto nº 44.035, de 1º de junho de 2005, que estabelece normas referentes a autorização para prestação de serviço fretado de trasporte rodoviário intermunicipal de pessoas e altera o Decreto nº 32.656, de 14 de março de 1991.

Art. 2º – Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Sala das Reuniões, 3 de agosto de 2010.

Doutor Ronaldo

Justificação: O Decreto nº 44.035, de 2005, que proíbe o transporte intermunicipal de passageiros por táxi, é ilegal e afronta o art. 5º, XV, da Constituição Federal, bem como os princípios constitucionais de respeito aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e, ainda, da dignidade da pessoa humana.

O decreto, como ato infralegal, tem a função de detalhar o conteúdo da lei a fim de dar-lhe aplicabilidade. Embora o poder regulamentar autorize o Executivo a expedir decretos, eles devem se ater aos limites da lei, conforme determina o art. 84, IV, da Constituição.

O STJ, em recente decisão de seu Presidente, Ministro Cesar Asfor Rocha, analisando situação semelhante à de Minas Gerais, manteve liminar favorável a um taxista de Nova Viçosa, no Estado da Bahia, que não aceitou se sujeitar à determinação do órgão responsável que restringia a atuação do taxista à área do Município em que sua licença foi expedida.

O Presidente do STJ, ao decidir, endossou os termos da liminar deferida pelo magistrado de primeiro grau, em especial quando afirmou que o táxi não é um veículo de transporte coletivo, mas individual, e o exercício dessa atividade não pode sofrer os mesmos regramentos do transporte coletivo de passageiros. O Ministro destacou também o fato, salientado na liminar, de que não existe lei que impeça o motorista de táxi de realizar transporte intermunicipal de clientes. Segundo Cesar Rocha, tal situação não impede, porém, que os taxistas cumpram todas as regras necessárias à sua atividade, o que implica dar proteção aos passageiros e trafegar com o devido licenciamento do veículo, porte da carteira de habilitação e licença de trabalho concedida pela municipalidade.

A Constituição Federal está no topo da ordem jurídica, conferindo fundamento e validade às demais normas, que lhe são subordinadas – leis, decretos, atos administrativos, regulamentos, portarias, etc. É, portanto, a norma fundamental e suprema do Estado brasileiro; todas as leis e atos infralegais lhe devem subordinação. Muito se diz sobre constitucionalidade ou inconstitucionalidade de determinadas medidas. Nesse sentido, algo é constitucional se estiver segundo a Constituição. É inconstitucional se apresentar dispositivo contrário à Constituição. Assim ocorre com as leis, com os atos infralegais, tais como decretos, portarias e demais atos administrativos.

O legislador infraconstitucional tem poderes para disciplinar e gerir a atividade profissional em sua área de competência, porém esses poderes são limitados. Quando uma norma jurídica não está em conformidade com a hierarquia superior, é porque está padecendo dos vícios de ilegalidade ou de inconstitucionalidade, ou de ambos.

O combatido decreto inibe o direito de ir e vir e cria uma injusta reserva de mercado, prejudicando o trabalhador taxista que tira do trabalho o sustento da família.

Os taxistas têm tido seus veículos parados nas rodovias e nas ruas de nosso Estado, e seus clientes são obrigados a abandonar o táxi, ficando entregues à própria sorte em locais que muitas vezes lhes são desconhecidos. Os veículos são apreendidos e impedidos de trafegar. Hoje os taxistas só podem trabalhar dentro do próprio Município.

O princípio da liberdade profissional, expresso no inciso XIII do art. 5° da Constituição Federal, garante a liberdade do exercício profissional, sendo essa prática um direito econômico fundamental.

Mesmo sendo tal exercício condicionado a uma reserva legal, que determina quais exigências e requisitos são necessários para o exercício da profissão, fica claro o direito de os taxistas exercerem o seu trabalho de forma digna e livre de limitações por legislação estadual.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, consagra o princípio segundo o qual toda pessoa tem direito ao trabalho. Cabe, então, ao Estado efetivar a proteção, e não a limitação, da atividade do taxista, a qual não é outra coisa senão trabalho.

Também da Declaração sobre Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 2000 resulta a obrigação do Estado de elevar no plano máximo possível a concretização dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

A liberdade de ação profissional é garantida pelo art. 5°, XIII, o qual confere liberdade de escolha de trabalho, ofício ou profissão, de acordo com as propensões de cada pessoa e na medida em que a sorte e o esforço próprio possam romper as barreiras que se antepõem à maioria do povo. Confere, igualmente, a liberdade para exercer o que fora escolhido, e o poder público não pode constranger nem limitar o seu exercício, se ele não é vedado por lei.

O conceito de liberdade humana deve ser expresso no sentido de um poder de atuação do homem em busca de sua realização pessoal. A liberdade consiste na possibilidade de coordenação consciente dos meios necessários à realização da felicidade e prosperidade pessoal.

A livre iniciativa não é só a expressão de liberdade da empresa, como também do trabalho; abrange todas as formas de produção, individuais ou coletivas, como, por exemplo, as iniciativas de cooperativa, autogestionária e pública. No que atente à iniciativa pública, cumpre esclarecer que a livre iniciativa não consistirá na livre atuação da empresa privada no serviço público, mas, sim, que o Estado não deverá opor empecilhos à liberdade humana.

A liberdade da pessoa física é a primeira forma de liberdade. É a possibilidade jurídica que se reconhece a todas as pessoas de serem senhoras de sua própria vontade e de se locomoverem desembaraçadamente dentro do território nacional. Nesse aspecto, temos duas variantes: a liberdade de locomoção e a liberdade de circulação. O direito à circulação é manifestação característica da liberdade de locomoção, consistindo no direito de ir, vir, ficar, parar, estacionar. O direito de circulação ou liberdade de circulação consiste na faculdade de deslocar-se de um ponto a outro por meio de uma via pública ou afetada ao uso público. Esse dispositivo constitucional não condiciona nem define a situação geográfica dessa via pública; o melhor entendimento infere que seja qualquer localidade do território nacional.

Ressalte-se que a livre iniciativa é atributo inalienável do ser humano. O que se protege por meio dela é a liberdade de trabalho, de todas as formas de produção, individuais ou coletivas, e, por conseguinte, a dignidade da pessoa humana.

Ademais, no tocante ao princípio da dignidade da pessoa humana, as consequências negativas do referido decreto são evidentes, uma vez que, em cidades menores e distantes, como em algumas cidades do Norte de Minas, que não contam com linhas de ônibus próprias, seus habitantes ficam à mercê dos horários desencontrados dos ônibus e, pela necessidade ou por falta de alternativa, recorrem aos táxis, às vezes o único existente na localidade, cujos motoristas, nas rodovias, são multados e humilhados, assim como os passageiros.

Outra situação são os ônibus regulares que não atendem as necessidades de certas pessoas que precisam de mais espaço para serem transportadas, como o caso de pacientes especiais que precisam vir à capital diariamente; portanto, dentro do direito de ir e vir, estão sendo impedidos de viajar com conforto e dignidade.

Não se pode admitir que direitos consagrados constitucionalmente sejam desrespeitados dessa maneira, com amparo na legalidade do referido decreto, pois que ele mesmo extrapolou os limites da competência do legislador infraconstitucional e deixa clara sua ofensa à Constituição.

Os direitos fundamentais devem ser observados obrigatoriamente em qualquer instância comportamental regida pela Constituição. Portanto, os direitos fundamentais, assim como as demais normas da Constituição Federal, são base de todo o ordenamento jurídico brasileiro.

É preciso travar essa luta pela dignidade no trabalho. Trata- se de um fenômeno social que deve ser levado em conta, porque a maioria dos taxistas do Estado estão em dificuldades, uma vez que não podem trabalhar fora de seus Municípios. Urge a avaliação de um novo modelo de legislação para que a justiça, enfim, seja instalada.

- Semelhante proposição foi apresentada anteriormente pelo Deputado Paulo Guedes. Anexe-se ao Projeto de Resolução nº 4.662/2010, nos termos do § 2º do art. 173 do Regimento Interno.