Pronunciamentos

DEPUTADA BELLA GONÇALVES (PSOL)

Discurso

Comenta o início do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro de generais e de outros acusados pelos atos de 8 de janeiro pelo Supremo Tribunal Federal - STF -, destacando a relevância histórica do processo. Critica a atuação do crime organizado no Brasil e em Minas Gerais, menciona supostos indícios de ligação com a família de deputado federal Nikolas Ferreira e defende que os “colarinhos-brancos” também respondam por crimes. Destaca a entrega de certidões de óbito retificadas de vítimas da ditadura militar, cita a atuação da Comissão da Verdade e elogia o governo federal por respeitar e fortalecer as instituições democráticas.
Reunião 54ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 20ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 04/09/2025
Página 66, Coluna 1
Aparteante Betão
Indexação

54ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 2/9/2025

Palavras da deputada Bella Gonçalves

A deputada Bella Gonçalves – Boa tarde a todos nesta terça-feira, com um saborzinho de sexta-feira. Mas não nos animemos muito. Hoje apenas começou o julgamento de Jair Bolsonaro, dos generais e dos responsáveis por uma tentativa de abolição democrática do Estado de Direito no Brasil. Como todo devido processo legal, está sendo cumprido com rigor e bastante cautela. Afinal de contas, este é um processo que está sendo acompanhado internacionalmente inclusive. O julgamento mesmo, a sentença deve sair na sexta-feira da outra semana, dia 12, para um “sextou” com sabor de justiça, com alegria do povo brasileiro, que percebe que as instituições conseguiram fazer frente a tamanha impunidade daqueles que acharam que podiam dar um golpe contra a democracia brasileira e sair absolutamente impunes, vociferando por democracia e liberdade. Liberdade mesmo, Betão, eles querem só para si mesmos, porque querem amordaçar o povo brasileiro em uma tentativa de golpe, amordaçar a democracia.

O deputado Bruno Engler, que me antecedeu, fala sobre a tentativa de golpe no Brasil como se fosse um bando de velhinhas na porta dos quartéis, orando, e uma mãe de família escrevendo algo em uma estátua, com batom. Mas não foi isso o que aconteceu. Nós sabemos muito bem, e há evidências robustas do julgamento hoje sobre a existência dos “kids pretos”, de minutas de golpes, de reuniões interministeriais e de uma conspiração que envolveu muitas pessoas, para tentar destruir o que temos de mais precioso desde de 1985, quando saímos daquele período nefasto da ditadura militar. Período que, aliás, Bolsonaro já homenageou em discursos públicos, mas que foi superado, graças à luta do povo brasileiro, e não voltará. O papel central que o STF exerce agora, ao não permitir que a nossa democracia seja novamente violada e que isso fique impune, é histórico. É a primeira vez que um ex-presidente da República está sendo julgado pelo crime de golpe de Estado. É a primeira vez que nós temos vários generais cinco estrelas sentados no banco dos réus e no banco de uma instituição tão respeitável como é o STF.

Então, para não falar que se trata de velhinhas na porta dos quartéis, eu gostaria de relembrar os cinco crimes que, somados, podem levar Bolsonaro a uma pena de mais de quarenta e seis anos de prisão. São eles: tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito – pena de 4 a 8 anos; tentativa de golpe de Estado – pena de 4 a 12 anos; participação em organização criminosa armada – pena de 3 a 8 anos, podendo chegar a 17 anos com as agravantes do uso de arma de fogo e participação de agentes públicos; dano qualificado – pena de 6 meses a 3 anos. Nesse caso, é o dano qualificado ao patrimônio nacional, que está ali, em Brasília, e que foi completamente destruído no último 8 de janeiro. E continua: deterioração do patrimônio tombado – pena de 1 a 3 anos. Então essas penas, somadas, são as razões pelas quais o Bolsonaro foi acusado e está sendo julgado. Aliás, tenho bastante convicção de que ele será condenado na sexta-feira, dia 12.

Acho importante lembrar que esse julgamento tem uma importância histórica para o Brasil. Durante muito tempo, a gente viu o sistema penal brasileiro funcionar apenas para uma camada da população, deixando livres aqueles que, de fato, promovem mortes, ascensão do crime organizado, lavagem de dinheiro, narcotráfico. Eu não posso deixar de relembrar a recente investigação da Polícia Federal, que mostra toda a fake news gerada em cima da pretensa taxação do Pix, o Pix que agora está sendo atacado pelo Trump, mas que, lá atrás, ia ser taxado, segundo eles, pelo presidente Lula. Toda essa discussão impediu que mecanismos de transparência incidissem sobre o Pix, facilitando a lavagem de dinheiro do PCC, que também é envolvido com postos de gasolina pelo Brasil, não apenas com pequenos postos de gasolina, mas com grandes postos de gasolina que adulteram combustíveis e que participam de um esquema de lavagem de dinheiro com o crime organizado. Esse crime organizado, hoje, é um dos grandes responsáveis, segundo o Atlas da Violência, pelo aumento dos homicídios no Brasil e em Minas Gerais.

Nós vemos que hoje, no nosso estado, que antes tinha uma associação um pouco mais fluida com o crime organizado, com o Comando Vermelho e com o PCC, os estudos já mostram que grande parte das pessoas estão associadas ao crime organizado. E aí, gente, há muitos indícios de vinculação da família do deputado federal Nikolas Ferreira com esse crime organizado. Será coincidência que atacar a regulamentação da transparência do Pix, o que facilitou o crime organizado, seja mera coincidência, Betão? Eu tenho dúvidas. Eu tenho sérias dúvidas.

É por procedimentos como esses, que precisam avançar, que nós lutamos. Nós só vamos combater a verdadeira criminalidade no Brasil quando, de fato, chegarmos até quem financia esse crime: os colarinhos-brancos, que, muitas vezes, são deputados e estão lá em Brasília; os juízes, promotores e auditores fiscais que facilitam esses esquemas e tantos outros; os super-ricos que precisam ser não apenas taxados, mas também precisam responder pelos crimes que cometem.

Um ex-presidente da República no banco dos réus e uma série de militares no banco dos réus é um fato que está dizendo para o Brasil que o primeiro escalão não é intocável, que a Justiça não vai seguir só amordaçando aquela população mais pobre, e isso tem uma importância histórica que eu gostaria de destacar. Hoje é um dia importante para a democracia brasileira. É uma terça-feira, como eu disse, com sabor de sexta, que prenuncia a sexta do dia 12, que vai ser uma grande festa da democracia. Podem esperar, o Brasil vai parar de alegria. Betão, com a palavra.

O deputado Betão (em aparte) – Obrigado, deputada Bella. Deputada, eu fico impressionado com os discursos que escuto aqui dentro daqueles que defendem Bolsonaro. São discursos assim impressionantes. Como que eles acreditam nessa história? Para mim, estão no mesmo nível daqueles que bateram continência para o pneu militar, daqueles que ficaram fazendo dos muros dos quartéis o muro de lamentações, daqueles que ficaram pedindo ajuda de Ovnis, daqueles que fizeram tantas outras bobagens a que nós assistimos naquele período. Não é possível que um país, como o Brasil, que historicamente vive de golpes em golpes da elite civil, armada, armada pelas Forças Armadas, tenha que viver uma situação dessa novamente. O povo brasileiro não tolera isso mais, tanto que há resistências. Só no período do meu nascimento para cá, vivemos o Golpe de 64, vivemos o golpe contra a Dilma Rousseff e vivemos agora mais uma tentativa de golpe com o Jair Bolsonaro, o que não começou no dia 8 de janeiro, pois veio antes disso. Então esse pessoal tem de tomar uma lição. O senhor tem toda razão. É a primeira vez que nós temos tantos generais no banco dos réus, que vão ser julgados durante esta e a próxima semana.

Então, Bela, é aquele velho refrão que estão cantando: É sem anistia. Cadeia para Bolsonaro e seus generais.

A deputada Bella Gonçalves – É isso mesmo, Betão. Betão, nós presenciamos, na Comissão de Direitos Humanos, na última semana, a entrega das mais de vinte certidões de óbito retificadas daquelas pessoas que foram vítimas do regime militar, como família de Zuzu Angel, família de Osvaldão, família de Rubens Paiva e de tantas pessoas que lutaram a vida inteira para ver a democracia acontecer. Falam que o direito de memória é fundamental para restaurar essa democracia, o que reforça a importância do momento que estamos vivendo. Não seria outro governo, senão o governo Lula a de fato dar andamento à Comissão da Verdade, das pessoas mortas, desaparecidas e torturadas pela ditadura militar.

Também é um governo que hoje respeita as instituições, que caminha ao lado das instituições para que essa democracia seja defendida. Então é fazer o link histórico entre o que se passa aqui na Assembleia Legislativa, esse momento histórico que nós vivemos na última semana, e toda a luta que tem sido feita lá em Brasília para dizer que o nosso país não vai aceitar nenhum tipo de foro privilegiado, anistia, “passação de pano” ou qualquer outro tipo de alívio para aqueles que tentaram nos fazer retornar ao período mais sombrio da nossa história.

Em respeito aos colegas que vão falar, eu não vou pedir a verificação de quórum, apesar de a gente estar aqui com o quórum bastante esvaziado no Plenário.