Pronunciamentos

DEPUTADA BEATRIZ CERQUEIRA (PT)

Discurso

Comenta o Projeto de Lei nº 3.734/2025, que autoriza o Poder Executivo a transferir, para a União ou para entidade por ela controlada, a participação societária do Estado na Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais e dá outras providências. Destaca a importância de garantir que o projeto do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados – Propag – seja usado exclusivamente para enfrentar a dívida do Estado, sem abrir brechas para privatizações disfarçadas. Comemora a decisão do conselheiro Agostinho Patrus, do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais – TCEMG –, de suspender novas adesões ao projeto Mãos Dadas. Apresenta críticas ao projeto e apelo por mais escuta e respeito às famílias atípicas, criticando o desmonte de políticas educacionais inclusivas promovido pelo governo estadual.

15ª REUNIÃO EXTRAORDINÁRIA DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 2/7/2025

Palavras da deputada Beatriz Cerqueira

A deputada Beatriz Cerqueira – Bom dia. Presidente, eu serei breve. Já aviso aos colegas que não é obstrução. Eu sei que a minha boa fama na Casa requer que informe isso aos colegas. É uma rápida discussão. Eu queria aproveitar para tecer rápidas considerações.

Na primeira consideração, quero dizer que fizemos debates importantes a respeito dos projetos do Propag e fizemos audiência pública. Quero lamentar este fato: o governo poderia ter tratado desse assunto com mais transparência, levando informações à audiência pública, porém não foi o que aconteceu. Mas nós tivemos condições de fazer um bom debate na Comissão de Administração Pública vinculando o bom trabalho que fizemos ao que deve ser esse projeto de lei relacionado ao Propag, a fim de que a federalização cumpra a função relacionada ao Propag e não sejam utilizados subterfúgios, sob a justificativa do Propag, para se avançar no portfólio de privatizações. Acredito que o texto que votaremos na sequência vai cumprir essa função da vinculação ao Propag e, portanto, cumpriremos o nosso real objetivo, que é enfrentar a dívida de Minas com a União. Essa é a minha primeira observação.

Na minha segunda consideração, quero deixar os meus cumprimentos ao conselheiro do Tribunal de Contas do Estado. Imagino que o Tribunal de Contas seja um assunto que nós discutiremos muito neste ano, na Casa. O conselheiro Agostinho Patrus proferiu uma decisão, que foi votada e acatada por unanimidade na câmara, ontem à tarde, a respeito de um assunto que eu já trouxe a esta Casa muitas vezes. Eu me espanto por haver tantos colegas que defendem a pauta das crianças com espectro autista, tantos colegas que defendem a pauta da criança com deficiência – inclusive nós temos a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência... Eu me espanto por essa ser uma pauta relevante para tantos colegas e, mesmo assim, muitos deles não terem compreendido que o projeto Mãos Dadas, do governo do Estado, estava tirando das famílias o direito a um atendimento educacional especializado para essas crianças.

Eu vou citar um exemplo: Município de Raul Soares. Raul Soares tem sete escolas estaduais, deputado Cristiano Silveira. Sei que V. Exa. defende essa pauta e sei que V. Exa. é contra o projeto Mãos Dadas. Das sete escolas estaduais, o governo municipal quis municipalizar seis que têm sala de recurso e professor de apoio para quase, deputada Ana Paula Siqueira, cem crianças atendidas na rede estadual, com excelência. As escolas de Raul Soares prestam serviço de tanta excelência para as crianças com deficiência, que têm reconhecimento do Ministério Público, e não uma nem duas, mas várias vezes foram chamadas a Belo Horizonte para contar sobre sua experiência de inclusão e de atendimento educacional especializado.

Recentemente, o prefeito enviou para a câmara um projeto de adesão ao Mãos Dadas. Vão trocar a professora de apoio, a sala de recurso, todo um atendimento especializado, com professora, com tudo isso, por monitores de meio salário mínimo, um salário mínimo. A sala de recurso que há em cada escola estadual vai ser trocada por nada. É um exemplo bem concreto o do Município de Raul Soares. As mães atípicas... Sei que essa é uma pauta de que a deputada Lohanna tratou em vários dos seus projetos de lei e sei que também a deputada Lohanna é contra o projeto Mãos Dadas. As mães não são escutadas, são ignoradas no debate sobre o Mãos Dadas. E esse foi um dos pontos que eu levei ao Tribunal de Contas do Estado. Como é possível desmontar uma política de atendimento educacional especializado, que está dando certo, por nada ou quase nada, que é a adesão ao Mãos Dadas, do projeto Zema?

Eu quero convidar os colegas deputados... Eu não vou fazer a leitura porque, quando há uma dinâmica de votação, a gente quer cumpri-la. Portanto, eu não vou gastar todo o tempo, mas quero convidar os colegas a fazerem a leitura da decisão. Eu vou colocar no grupo dos deputados a decisão do conselheiro Agostinho Patrus, a aula que o conselheiro deu ao governo do Estado sobre planejamento; sobre a necessidade da transparência; sobre a necessidade do cumprimento da legislação estadual, que o governo Zema não está cumprindo, e eu já denunciava isso há bastante tempo; sobre a necessidade de compreender a realidade dos municípios; sobre a necessidade de se ter critérios claros, transparentes e objetivos.

O que me espantou muito... Eu vou ler, presidente, um pequeno trecho dessa decisão, que suspendeu o projeto Mãos Dadas, projeto de municipalização do governo Zema.(– Lê:) “Em despacho, determinei a intimação do Sr. Romeu Zema Neto, governador de Minas, e do Sr. Igor de Alvarenga, secretário de Estado, para que apresentassem esclarecimentos ou justificativa no prazo de cinco dias. O governo não prestou esclarecimentos, pediu prorrogação de prazo por mais 15 dias”. E, aí, o governo falou para o Tribunal de Contas pedir informações aos municípios. O governo do Estado não esclareceu um programa que até o momento já movimentou mais de R$2.000.000.000,00, não esclareceu as irregularidades que eu apontei e disse ao Tribunal de Contas: “Solicite informações aos municípios”.

Espero que isso sirva de lição aos municípios que embarcaram na furada de um projeto que não tem um decreto do governador. Como se lida com dinheiro público, recursos na casa de bilhões... Há município que... Ribeirão das Neves está na lista. Recebeu R$99.000.000,00, e, hoje, Ribeirão das Neves não consegue manter transporte escolar para os seus alunos. Está aqui, na lista, Mateus Leme com R$85.000.000,00. Lembro-me de que, em Mateus Leme, até outro dia, os meninos tinham que andar, ou seja, atravessar a rua e a avenida para irem à quadra, porque foram estudar em escolas onde sequer quadra tinha. Em Ribeirão das Neves, cujas obras não finalizaram, os meninos estão em situação precária em várias escolas. E aí o governo do Estado, a respeito de situações graves de irregularidades como a do Fundeb, disse: “Peça informação aos municípios”. Por quê? Porque o Estado transfere o Fundeb para o município como Fundeb e o município o recebe como dinheiro de convênio. Os municípios responderão por isso. Nós já estamos atuando nos mais de cento e sessenta municípios, deputado Leleco, que toparam entrar nessa furada por alguns milhões e não se importaram em cumprir a legislação estadual e, no caso, estou citando, a legislação federal, que é a legislação do Fundeb.

Então tenho alertado sobre esse projeto há bastante tempo aqui, na Casa, e falado sobre os problemas e as irregularidades. A última semana foi uma semana de vergonha para muitas câmaras municipais, Doutor Jean Freire. Foram correndo aprovar a adesão ao Mãos Dadas porque a nossa representação já estava no Tribunal de Contas do Estado e já tinha sido aceita, e o conselheiro Agostinho Patrus já havia determinado que o governo não realizasse novas adesões. Mesmo com essa determinação, correram para aprovar a adesão. Houve municípios que aprovaram a municipalização sem a escola ficar sabendo. Concordamos com isso? Com a mudança da escola sem que...

Santa Luzia. Santa Luzia aprovou “a jato” uma municipalização sem uma audiência pública. Eu queria entender como uma câmara municipal recusa a realização, deputado Betão, de uma audiência pública. Que Poder Legislativo é esse? Que abismo é esse? O deputado Professor Cleiton está me lembrando de Três Corações. Que abismo é esse entre o Parlamento e a população, em que o Parlamento nega o direito de uma audiência pública porque os vereadores não teriam paciência de escutar a população por 1, 2 horas? Há câmaras municipais em que o prazo regimental é de 2 horas de audiência pública. Que medo de povo foi esse no último período? Que corrida insana para aprovar adesão a um projeto sem conhecê-lo e sem entendê-lo? Santa Luzia é um exemplo de município ao qual encaminhei essas informações sobre o Tribunal de Contas. Eu disse: “Olha, há uma representação, uma determinação ao governo do Estado para não se fazerem novas adesões. É temerário aprovar algo que está sob investigação do órgão externo”. E, ainda assim, correram e aprovaram. Passaram essa vergonha porque essa votação que nem as escolas estaduais nem as comunidades escolares esquecem...

Vamo-nos lembrar de Sericita, deputado Betão? Em Sericita a situação foi muito vergonhosa, porque o prefeito encaminhou à câmara um projeto de municipalização dos anos iniciais. Mas o município já era responsável pelos anos iniciais! O prefeito nem sabe o que ele administra e, por consequência, o governo do Estado também não está se importando. Aí teve que mandar outro projeto. O projeto teve erro. Até onde acompanhamos – eu e o deputado Betão –, já estava num terceiro projeto de lei. É um desconhecimento da legislação, um desrespeito à comunidade. Então é algo muito grave, muito grave!

Eu vou repetir, presidente. Não vou ler o voto do conselheiro Agostinho Patrus, relator, mas sugiro a leitura porque foi uma aula, uma aula sobre como se deve respeitar a educação pública e como gestores precisam aprender a fazer planejamento. A educação não é algo que você toca e joga, e aí, a cada quatro anos, você toca e joga de novo. Esse projeto é um escândalo. Que bom que agora está suspenso!

E aí só quero mostrar para quem está nos acompanhando os meus próximos passos. Vamos ver todos os 163 municípios que fizeram a adesão como receberam o dinheiro do Fundeb, o que fizeram, em que condições os alunos estão. Coabitação, gente. Vocês colocariam os seus filhos numa escola coabitada, numa escola que tem duas administrações? Vocês não colocariam os seus filhos lá. Digo “os seus” porque eu não tenho filhos, mas tenho sobrinhas, primas, e não lhes desejo uma escola pública coabitada, que é o que está acontecendo no projeto Mãos Dadas. Porque é tudo de uma vez, não se respeita nenhum planejamento.

Então, presidente, quero agradecer a generosidade a todos que me escutaram. Eu não quis fazer essa intervenção em projeto de lei de nenhum colega; quis fazê-la num projeto de autoria do governo do Estado, porque o autor dessa lambança, dessa bagunça, na educação, é o governador do Estado. Entretanto houve uma interrupção importante: a decisão do Tribunal de Contas de suspender novas adesões.

Quero lamentar o fato de as câmaras municipais e as prefeituras, nos últimos 10 dias, correrem achando que receberiam os milhões prometidos. Quantas escolas de distrito estão sendo municipalizadas para serem fechadas depois? A população está perdendo, em pleno ano de 2025, o direito de ter uma escola perto de casa. Vergonha. Fizemos audiências sobre a municipalização em Manhuaçu. Das 10 escolas, deputado João Magalhães – V. Exa. acompanhou o debate –, das 10 escolas ofertadas, o número que circulava era R$100.000.000,00. Os números circulam assim, não é? Na nuvem. Não está no papel, não há registro, não há informação, não há transparência. Seis escolas estavam em distritos, acabando-se com o direito de comunidades inteiras terem acesso a uma escola.

Por isso quero parabenizar a decisão do Tribunal de Contas. Trabalhamos de maneira muito séria e técnica, enviando as informações. E vou continuar as enviando ao Tribunal de Contas, pois vamos fiscalizar esses mais de 160 municípios que fizeram a adesão e verificar os resultados para suas comunidades e seus profissionais da educação.

Por ora, presidente, é isso. Ao compartilhar essas informações, espero que as famílias atípicas sejam escutadas e que essa pauta, que foi invisibilizada no projeto Mãos Dadas, ou seja, o destino das crianças com deficiência e das crianças autistas, não continue esquecida. Há muitos colegas que defendem essa pauta, mas, em relação ao projeto Mãos Dadas, as famílias foram muito abandonadas, desestruturando-se um atendimento importantíssimo prestado pelo Estado, que foi sendo reduzido ou simplesmente retirado das famílias e das comunidades. Obrigada, presidente.

O presidente – Obrigado, deputada Beatriz.