DEPUTADO LELECO PIMENTEL (PT)
Discurso
Legislatura 20ª legislatura, 3ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 15/05/2025
Página 25, Coluna 1
Indexação
Normas citadas LEI nº 24535, de 2023
27ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 13/5/2025
Palavras do deputado Leleco Pimentel
O deputado Leleco Pimentel – Deputada Leninha, que está como presidente no Plenário neste 13 de maio, que não é dia de negro. Saio com que essa provocação porque o 13 de maio de 1888 deveria ter sido, de fato, o dia da libertação da humanidade da escravidão, não fosse a encenação, a fachada, produzida a partir da assinatura daquela que, mais tarde, por muitos reinados e em muitos espaços da cultura, tentaram fazer parecer a responsável pela abolição da escravidão no Brasil. Infelizmente não foi assim. Repito: o 13 de maio não é dia de negro.
Deputado Betão, sob a sua presidência na Comissão do Trabalho, nós verificamos, ainda mais, que a escravidão é uma agenda incompleta, imoral, altamente cruel, presente em nosso país e, mais lamentavelmente, no Estado, que lidera a lista suja das empresas que escravizam e que trazem seres humanos para uma analogia ao trabalho escravo. Hoje é o dia em que a lista, que deveria, por lei, estar sendo publicada pelo governador Zema, segue sem divulgação porque ele mesmo, Zema, faz questão de não cumprir a lei, talvez porque esteja contido nela, na lista suja do Estado, que lidera no ranking de trabalhadores humanos submetidos à escravidão ou a condições análogas à escravidão. Nós ouvimos, na semana passada, aquele triste depoimento de trabalhadores aliciados pelas redes virtuais, mantidos em cativeiro por mais de nove anos e submetidos a toda forma de violência sexual e emocional. Esses trabalhadores tiveram seus corpos tatuados com as iniciais daqueles que se intitularam donos desses corpos mutilados.
É, com essa imagem, que o 13 de maio se consolida na certeza de que a história não corrigiu mais um capítulo do colonialismo cultural e de poder implementado a partir da invasão portuguesa nas terras dos povos originários e na terra do pau-brasil. O que sobrou foi o nome emprestado de um país erguido sob a força da violência. Este 13 de maio, lamentavelmente, não pode ser dia de negro.
O trabalho escravo é denunciado no mundo. E esse trabalho é recorrente há décadas nos Vales do Jequitinhonha e do Mucuri, que não devem ser confundidos como lugares da escravidão, porque, deputado Cristiano, se lhe arrancam à força do lugar de seu pertencimento e o levam para um lugar onde vai ser explorado à exaustão e ao sofrimento, o lugar de onde vem não é o lugar da escravidão. O lugar da escravidão é para onde levaram você. Então a África não é o lugar da escravidão. O Brasil tornou-se o celeiro da exploração humana. Dessa forma, não se pode confundir, em Minas Gerais, os Vales do Mucuri e do Jequitinhonha – nem o Norte de Minas – com esse terrível capítulo da exploração do trabalho humano. Entretanto é possível dizer que as lavouras do Sul de Minas e do Triângulo talvez sejam o destino e o lugar que a gente poderia e deveria enxergar como lugares de escravidão. Ali convivem grandes latifundiários, donos hoje do capital e dos modos de produção, os mesmos que retiraram de lá populações inteiras, que mataram rios e florestas e hoje bradam como donos do agronegócio. Ainda têm a cara de pau de dizer que o agro é pop, que o agro é tech. O agro mata. Ouvi de um deputado da Casa uma pausa poética, e, no final, disse que o agro produz alimento. Não, deputado cara de pau. O agro é tóxico, mata. E é por isso que a escravidão submete as pessoas e os trabalhadores a toda forma de violência e à contaminação das águas, do solo e da terra. Essa situação configura tráfico de pessoas e exploração grave, especialmente no setor agrícola.
Eu quero chamar a atenção das pessoas que bebem café. Eu trouxe hoje um bom pó de café, feminino e agroecológico, para fazer com que essas pessoas compreendam que esse café, a preço de ouro, que colocam hoje no mercado, é lamentavelmente o mesmo café que causa câncer e que é responsável pelo trabalho escravo. Minas Gerais lidera a lista suja do governo federal com o maior número de casos de trabalho escravo, especialmente em lavouras de café e carvoarias. O Sul e o Sudoeste do Estado concentram a maior parte das denúncias, especialmente na cafeicultura. São mais de 165 empregadores envolvidos, o que representa 22% do total nacional das denúncias. Há essa gravidade, e o Estado ainda enfrenta uma grave deficiência no quadro de auditores fiscais do Ministério do Trabalho: são apenas 225 auditores para fiscalizar 853 municípios, o que dá, em média, 1 auditor para cada 4 municípios.
É também fruto da nossa audiência na Assembleia Legislativa, deputado Betão, a citação de alguns casos. Diante de tudo isto, só em 2023, foram 670 trabalhadores resgatados, sendo 324 nas lavouras de café. E, ainda assim, houve apenas uma prisão em Minas Gerais, em 11 anos, por trabalho escravo. Especialistas apontam que o crime ainda vale a pena. Há uma outra escravizadora moderna: a Vale, pela baixa punição. Nós pedimos como encaminhamento uma manifestação de repúdio ao deputado federal Emídio Madeira, aquele que usa a tribuna e o dinheiro público para fazer campanhas protegendo os que escravizam e que incentiva a violência e a continuidade das práticas de cerceamento e fiscalização das punições.
Pedimos uma comunicação dos resultados da audiência às empresas compradoras de café produzido pelo trabalho escravo: a Jacobs Douwe Egberts Br Comercialização – JDE –; a Starbucks; a Nestlé; o McDonald's; a Illy; a Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé – Cooxupé –; o Grupo Tristão; a Louis Dreyfus Company; a NKG Stockler Ltda.; a Sucafina Brasil, em Varginha; a Cocatrel, em Três Pontas; a Terra Forte Café; e a Cooperativa Regional Agropecuária de Santa Rita do Sapucaí – Cooperita. Nós também pedimos comunicação à Organização Internacional do Trabalho – OIT – e ao Ministério do Trabalho e Emprego, com as denúncias de situações de possível trabalho escravo, ameaça e perseguição a auditores fiscais no Sul do Estado de Minas Gerais.
Foi expedido um ofício da Mesa diretora da Assembleia à Secretaria do Conselho Monetário Nacional, em Brasília, para que se possa fazer a execução da dívida do crédito rural concedido a produtores rurais que forem condenados por utilização de mão de obra em condições de trabalho análogas à escravidão. Além disso, fizemos um pedido de providência para a restituição do direito de voto dos órgãos federais que compõem o Comitê Estadual de Atenção ao Migrante, Refugiado e Apátrida, Enfrentamento do Tráfico de Pessoas e Erradicação do Trabalho Escravo em Minas Gerais – Comitrate –, que infelizmente foi desmontado por Zema. Nós também expedimos um ofício, pedindo providências ao Ministério do Trabalho e Emprego, para tornar permanente o cadastro de empregadores que submeteram trabalhadores a condições análogas à escravidão, conhecido como Lista Suja. Deputado Betão, V. Exa. é o autor da lei que é sumariamente desrespeitada e ignorada pelo governador Zema. Por essa razão, dirijo-lhe essas palavras e repito que seu papel vai além da história, porque, ao denunciar isso e apresentar essa lei, deu a oportunidade de que o Estado de Minas Gerais de fato acolha, fiscalize e puna os que ainda permanecem sob a égide da escravidão.
Nós também expedimos um ofício, pedindo providências à Secretaria Estadual de Meio Ambiente para a suspensão das licenças ambientais dos imóveis rurais onde houver constatação do uso da mão de obra de pessoas em condição de trabalho análogo à escravidão, assim como pedimos ao Instituto Mineiro de Gestão das Águas – Igam – a suspensão da outorga de uso da água dos imóveis rurais onde se utilizaram de trabalho escravos. Expedimos um ofício ao Instituto Mineiro, pedindo que haja também, junto à Procuradoria do Ministério do Trabalho, a possibilidade de suspensão das outorgas concedidas aos empregadores. Fizemos também um pedido de ofício para que a Seapa, a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, apresente esclarecimentos acerca dos critérios de certificação do café, da abrangência da avaliação da exigência de que aqueles que usaram de trabalho escravo não possam ser certificados no Programa Certifica Minas Mais Café nem atendam aos critérios para poder fazer suas propagandas pelo mundo. Pedimos, então, para que se cumpram os eixos previstos, como a responsabilidade social, que consta no item D. Trabalho escravo não pode certificar os que exploram e ganham economicamente, inclusive trazendo da tortura o café com agrotóxico, que mata a gente. E ainda: o programa mantém estreita parceria, porque a fiscalização do trabalho pelo Ministério do Trabalho e Emprego não pode ocorrer de forma solitária, como aquele que, sozinho, corre pelo deserto.
Este é, sem dúvida, um dia para se refletir e reafirmar que 13 de maio não é dia de negro. Por isso, parabenizamos também o Movimento dos Atingidos por Barragens, que está com mais de mil pessoas, neste dia, no alto da Afonso Pena. Eu e a deputada Bella estivemos onde se exigiu que a Justiça fizesse com que a Vale trouxesse recursos para a manutenção do auxílio, que foi cortado pela metade pelas instituições de Justiça. Mais de mil pessoas estão reclamando que não conseguem sua subsistência ou sequer pagar pelos medicamentos, porque o crime da Vale lhes fez entrar numa condição de adoecimento mental coletivo.
Parabéns ao Movimento dos Atingidos por Barragens, que continua no alto da Afonso Pena, lá no Incra, e também com importantes reuniões nesta tarde, demonstrando que a gente só vai se libertar da escravidão, sobretudo da escravidão moderna a que a Vale e as mineradoras submetem o Estado, assim como os produtores de café, que também escravizam, se a gente permanecer de pé na luta. Força aos trabalhadores e às trabalhadoras rumo à libertação, de fato, da escravidão no Brasil! Por isso, o 20 de novembro continuará sendo uma data a ser lembrada para que nós, ainda em memória de Zumbi dos Palmares, tenhamos motivo para continuar a luta pela libertação do nosso povo. Escravidão nunca mais! É nosso dever vir ao Plenário falar da lista suja das empresas que infelizmente colocam Minas Gerais como recordista, como o estado detentor do maior número de empregadores que mais escravizam seres humanos.
Obrigado, deputada Leninha. Gratidão! Faço com que essas palavras ecoem também as defesas que V. Exa. tem feito pelo Estado de Minas Gerais.