DEPUTADO CRISTIANO SILVEIRA (PT)
Discurso
Legislatura 20ª legislatura, 2ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 12/12/2024
Página 92, Coluna 1
Indexação
54ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 20ª LEGISLATURA, EM 10/12/2024
Palavras do deputado Cristiano Silveira
O deputado Cristiano Silveira – Presidenta, eu queria começar aqui a minha fala. Eu havia me preparado para iniciar este meu diálogo de outra forma, porque queria muito falar também dessa data de 10 de dezembro, dia dos direitos humanos e também dia do aniversário do meu filho, que é autista. Ver uma parlamentar subir aqui, na tribuna, no Dia Internacional dos Direitos Humanos, e tratar um colega como lelé da cuca, fazendo uma analogia às doenças mentais, aos transtornos mentais, tentando trazer a postura de um colega, a fala dele como se fosse algo pejorativo, porque ele seria alguém que sofre de transtorno mental, é um absurdo neste Parlamento. Inclusive há de se verificar a conduta ética nesse sentido. Isso não pode ser admitido aqui, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Chamar o parlamentar de lelé da cuca? Isso não cabe para cidadão nenhum neste país e neste estado, quanto mais para um colega de Parlamento, que está aqui no direito democrático de fazer a sua fala sem atacar quem quer que seja, apenas expressando a sua opinião e sofrendo um ataque dessa maneira. Esta Mesa precisa discutir esse caso, presidenta. Isso é sério, isso é grave, porque abre precedentes para que atos de intolerância travestidos de inocência… “São palavras de efeito para a minha rede social, para depois ver se posto lá no meu TikTok para ver se eu dou uma viralizadazinha.” E aí começam a banalizar aquilo que é a decência, o respeito e o decoro aqui, nesta Casa. Então isso não cabe. Falo como parlamentar, falo como pai de uma criança autista, falo como defensor das pessoas com deficiência, falo como quem faz a defesa da inclusão nesta Casa. Então é lamentável, no dia 10 de dezembro, quando deveríamos falar da importância dos direitos humanos, termos aqui um ataque a um colega parlamentar fazendo um trocadilho com o nome: Leleco Pimentel, lelé da cuca. Olha, sinceramente… Espero que a TV Assembleia não esteja tendo audiência neste momento, porque agora virou vale-tudo. É vale-tudo para jogar para a minha galera; é vale-tudo para poder jogar para o meu nicho, para os meus pequenos seguidores. Essa data 10 de dezembro é importante. A luta pelos direitos humanos foi uma luta importante e precede o que aconteceu na Alemanha, durante a Segunda Guerra Mundial, com a morte de todos aqueles judeus, com o Holocausto. Então, o mundo se reúne e fala o seguinte: “Nós precisamos adotar medidas, protocolos; precisamos ter pactos civilizatórios, porque em qualquer lugar deste mundo a pessoa humana tem que ter sua dignidade garantida, e qualquer cidadão, inclusive o cidadão que venha a cometer um crime, tem que pagar pelo que fez com o rigor da pena, mas na legislação, na Lei de Execução Penal, na Constituição, não está escrito que tem que ser com violação dos direitos, que tem que ser retirada a alimentação, a água, o banho, o cobertor, o sono”. Onde está escrito isso? Eu calo a minha boca quando o Congresso Nacional mudar e disser que aquele que estiver cumprindo pena o fará sob tortura, sob condições de tortura. A tortura não é aceitável neste país. Inclusive nós vivemos a tortura na época da ditadura, da qual a direita de Minas Gerais é saudosista, é saudosista. No dia do golpe contra a presidenta Dilma, o ex-presidente, o inominável, o inelegível, aquele que ajudou a planejar a morte do presidente Lula fez homenagem a Carlos Alberto Brilhante Ustra, o torturador que cometeu os maiores crimes contra a dignidade humana. Então esses que sobem aqui para dizer “olha, quem cometeu crime não tem essa de ter direito humano, não” são os mesmos que defendem os maiores violadores de direitos humanos, que foram aqueles que atuaram na época da ditadura neste país e que este país não pode esquecer. Por isso é que não pode haver anistia; por isso é que não pode haver anistia para os golpistas que estiveram em Brasília, aqueles que tentaram dar o golpe, aqueles que tentaram explodir bomba no aeroporto, aqueles que tramaram a morte do Alexandre de Moraes, a morte do Geraldo Alckmin, a morte do presidente Lula, aqueles que vilipendiaram todo o patrimônio público dos Três Poderes naquela data. Não pode haver anistia, não pode. Ter tolerância com isso é abrir precedentes de forma que nós não teremos como lidar com eles no futuro. Sem anistia, sem anistia! Nós queremos que essas pessoas respondam com o vigor da lei e que este país seja um país sério para tratar aqueles que tentam dar golpe.
Então eu quero aqui trazer estas palavras. Nós temos que dizer que direitos humanos é algo muito mais amplo do que apenas esse debatezinho reducionista de dizer o seguinte: “Olha, quem defende os direitos humanos é o povo da esquerda, que gosta de passar a mão na cabeça de bandido”. É reducionismo! Tem que ler, gente, a Declaração dos Direitos Humanos; tem que ler a Constituição; tem que estudar um pouquinho. Estudar não faz mal. Não dá para ser negacionista. “Ah, porque a terra é plana, porque eu vou levantar o celular para ver se o extraterrestre salva a gente, porque eu vou fazer uma oração para pneu”. Essas coisas são ruins; tem que ler, fazer leitura, pesquisar, duvidar, questionar; tem que ter inteligência. A gente tem que ter inteligência para as coisas. E falar de direitos humanos é isso. Quando eu falo de direito à moradia, que é uma luta que o deputado Leleco faz aqui, eu estou falando de direitos humanos.
Quando a gente fala do direito e do acesso à saúde… E, por falar em saúde, Leleco, eu não sei se vocês sabem que o presidente Lula – que está agora cuidando da saúde – é o presidente que mais criou programas na área da saúde neste país, no sistema público de saúde. Vocês sabem que a rede Samu foi criada pelo presidente Lula? Deus me livre e guarde, se alguém passar mal aqui agora e ligar para o 192, vão vir socorrer sem que se pague nada, com serviço de UTI Móvel. O senhor sabe, deputado Leleco, que o Farmácia Popular foi um programa do presidente Lula e que o Mais Médicos, que colocou médicos onde muita gente não queria atender, é do presidente Lula? As UPAs – hoje, de responsabilidade tripartite, de estados, União e municípios – são também do governo do presidente Lula. Sabia, deputado Leleco?
Pois é, tem gente que ataca, às vezes, o Partido dos Trabalhadores, o investimento na saúde, mas temos um presidente que criou tantos programas de saúde – diferentemente daquele que permitiu que mais de 700 mil pessoas morressem na negligência à época da pandemia, no descuido, naquela bizarrice de imitar as pessoas tossindo, imitar as pessoas sem fôlego, com aquele negócio de dizer: “Eu não sou coveiro, e daí, você quer que eu faça o quê? Eu não sou coveiro”. E havia tanta gente morrendo. Vejam a diferença entre dois presidentes: um que é preocupado com a vida humana, investiu tanto na saúde, no SUS, e outro que banalizou o sofrimento das pessoas, deixou as pessoas sem oxigênio, deixou as pessoas sem vacina. É uma diferença gritante. É uma diferença de quilômetros, não há comparação.
Então, a gente quer, realmente, a recuperação do presidente Lula. E, de fato, eles agora falam: “Olha, nós também queremos a recuperação do presidente Lula, diferente do que quiseram na época do Bolsonaro, quando ele tomou a ‘fakeada’”. Gostaria de dizer que é engraçado, porque são as mesmas pessoas que têm o pensamento político pelo qual o próprio Bolsonaro agora é investigado, por uma tentativa de extermínio de Alexandre de Moraes, de Geraldo Alckmin e do próprio presidente Lula; é o que está sendo investigado.
Então, gente, é hipocrisia, uma hipocrisia. O bom é que hipocrisia não fica de pé nem dois segundos conosco aqui, porque nós somos vigilantes, nós conseguimos fazer um bom debate, conseguimos fazer a discussão, conseguimos desconstruir os factoides, as falácias, as palavrinhas de ordem do “joga para a galera”. Nós temos que falar que o Brasil tem problemas graves ainda de violação de direitos humanos. E nós temos que fazer com que este país volte a dar dignidade para as pessoas, especialmente as que mais precisam.
Como eu disse, o direito de acesso à saúde, o direito à terra, ao alimento, ao teto, isso tudo está no escopo de direitos humanos. Não é só o reducionismo de falar da questão prisional, por exemplo, sobre a qual cabe até uma discussão, deputado Jean, porque nós vivemos num país que tem a 3ª maior comunidade carcerária do mundo. Nós vivemos num país em que o preso custa mais de R$3.000,00 para os cofres públicos e 70% reincidem, em um sistema que não funciona. Ou nós não queremos fazer esse debate? Adianta eu dizer que não quero enxergar isso, que eu quero que sejam esquecidos numas cadeias que são falidas, no sistema prisional falido como o do nosso país, que pune, mas não recupera?
Há violação de direitos humanos dentro desses ambientes; o custo do preso é altíssimo; há 70% de reincidência. Temos que fazer essa discussão também, ela é válida. Mais de 40% dos que estão lá são presos provisórios, que ainda não têm sentença de condenação, e boa parte deles cometeram crimes de baixa ofensividade – vamos chamar assim –, boa parte deles cometeram crimes leve; a maioria, crimes capitais, crimes contra o patrimônio. Eles entram lá dentro por um crime leve e voltam escolados, vão ser recrutados pelo crime organizado, porque o Estado não se faz presente para haver um sistema prisional decente, a exemplo do que ocorre em outros países.
O Brasil gosta tanto de copiar as coisas de outros lugares do mundo e poderia, então, copiar também outros modelos, as penas alternativas, não é verdade? Se você é preso provisório, não tem condenação, você pode aguardar com pena alternativa, tornozeleira, prisão domiciliar, por exemplo. Por que você tem que estrangular o já tão falido sistema prisional, como é o caso do sistema prisional no nosso país? Então são coisas sobre as quais a gente precisa discutir.
Eu repito: fazer debate raso, pequenininho, ler só um paragrafozinho no WhatsApp, na internet, palavrinha de ordem – isso não resolve; tem que ter profundidade, leitura, estudo, conversa, escuta de opiniões diferentes. Isso constrói conceitos novos. Todo conceito que você forma sobre alguma coisa está condicionado ao tanto de informação que você tem sobre isso. E, quando você não tem muita informação, ou não tem uma informação correta, acaba falando coisas que são bobagens, aí as pessoas sentem. Então a gente vai ter que fazer toda essa conversa aqui.
Mas eu vou dar o desconto da falta de maturidade ainda de entender como é o Parlamento mineiro, porque esta Casa é uma casa muito séria. Estou aqui há 10 anos. Já fiz bons debates com quem pensa divergentemente, sempre de maneira respeitosa. Nunca precisei chamar ninguém aqui de lelé da cuca. Lelé da cuca, deputado Betão, você precisar chamar um colega de lelé da cuca? Capacitismo, preconceito, analogia com as pessoas com transtorno de sofrimento mental. É um absurdo, é um absurdo.
Eu gostaria de não ser interrompido, presidenta, porque eu ainda estou dentro do meu tempo. Gostaria de não ser interrompido, porque o Regimento é muito claro: caso eu não conceda aparte, eu não posso ser interrompido. Eu não estou concedendo aparte a ninguém. Então eu quero terminar e concluir a minha fala, dentro do meu tempo.
Quero dizer que nós vamos ter uma votação importante no dia de hoje. Agora estou mudando um pouco de assunto, porque era algo que eu tinha preparado, mas eu tive que mudar toda a minha fala, em decorrência do que aconteceu. Nós teremos uma votação importante, no dia de hoje, que trata do IPVA em Minas Gerais. Nós estamos propondo uma alteração no IPVA, a pedido da Fecomércio. A Fecomércio tem-nos dito o seguinte: “Começo do ano é muito difícil para o trabalhador, e isso acaba impactando também o comércio”. O que ocorre no começo do ano? Você tem que pagar matrícula do menino se tiver menino na escola privada; você tem que pagar o IPVA; você tem que pagar o IPTU; você tem uma despesa muito alta no início do ano. Isso acaba, de certa maneira, também afetando a capacidade de consumo das famílias no comércio. O que eles nos pediram? Que tirássemos a data do início do pagamento do IPVA do mês de janeiro e, se possível, que parcelássemos em mais vezes. Tentamos chegar a um acordo com o governo, e olha que é um projeto que está aqui, nesta Casa, desde 2015. Nós apresentamos também outro projeto que foi apensado. Eu trabalhei com o deputado Roberto, na comissão dele, com o deputado Arnaldo, na Comissão de Constituição e Justiça, com o deputado Zé Guilherme, na Comissão de Fiscalização Financeira, e conseguimos achar uma proposta intermediária. De forma que, se o projeto for aprovado e o governo sancionar, o início do pagamento do IPVA deixará de ser janeiro e passará a ser fevereiro, mantendo o número de parcelas, o que a gente precisa conversar e construir depois para termos um aumento maior. Estudos mostram o seguinte: quando você faz essa flexibilização, você melhora a arrecadação e diminui a inadimplência. Ou seja, será bom para o contribuinte, que tem que pagar o imposto; será bom para o Estado, que vai aumentar a arrecadação; será bom para os trabalhadores e para os empregadores do comércio, que terão também essa flexibilização.
Por fim, quero trazer uma preocupação em relação ao projeto que vai tramitar agora no Congresso Nacional e que diz respeito ao ajuste fiscal do governo federal. Eu acho muito saudável quando, por exemplo, o governo propõe a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$5.000,00, fazendo a compensação dessa arrecadação com aqueles que ganham acima de R$50.000,00 e não pagam imposto de renda, por exemplo, ou não chegam ao mesmo percentual de contribuição daqueles que recebem menos. Então acho que isso é justiça tributária. Só que, dentro de várias medidas, algumas salutares, há algumas que nos preocupam, e aí nós temos que fazer a discussão. Eu também não passo pano, não. Não é porque o governo é do PT que eu passo pano, não. Quando eu acho que está errado, eu venho aqui e falo. Isso é capacidade de discernimento, é a gente não ser efeito manada: o chefe mandou, eu vou e faço. Não.
Eu acho que é preocupante, por exemplo, deputado Jean, o que está sendo proposto para o BPC, Benefício de Prestação Continuada. Há medidas que poderão afetar as pessoas com deficiência. Cito duas medidas para vocês terem uma ideia. Primeiro: a que classifica a tipologia da deficiência, colocando condições de deficiência extremamente severas, e a gente, que milita na causa, sabe que nem sempre é apenas uma condição de acamado, há outras comorbidades que impedem completamente a pessoa de ter qualquer capacidade laboral produtiva. Quando o governo adota essa medida, ele faz uma restrição muito grande.
O segundo ponto é quando se diz o seguinte: “Mesmo naquele núcleo familiar, se uma outra pessoa já estiver recebendo o benefício, esse será contabilizado para cálculo do per capita de 1/4 de salário por residente naquela família”. Isso é preocupante porque o benefício já é pouco, não é suficiente, e a maioria dessas pessoas tem muita despesa. Então hoje quem já tem o benefício do núcleo familiar não é considerado, o que é correto e justo, porque você não pode transferir o benefício de um sujeito para o outro. A outra preocupação é que, mesmo que não estiver no mesmo ambiente domiciliar, como, por exemplo, o pai que é separado e mora em outra casa, a renda será contabilizada para o núcleo familiar daquele que será proponente do pedido de benefício. Acho gravíssima essa proposta do governo. Nós temos que fazer um debate profundo, conversar com as nossas bancadas, porque creio que haverá um grande retrocesso para as pessoas com deficiência no nosso país que precisam do benefício caso a medida seja aprovada dessa maneira. Sou do Partido dos Trabalhadores, presidente do PT em Minas Gerais, mas acho que é um erro do nosso governo essa medida. Dá para cortar muita coisa, inclusive um monte de benefício fiscal que o próprio governo já identificou, mas cortar o benefício de quem mais precisa acho um erro. Obrigado, presidenta.