DEPUTADA ANDRÉIA DE JESUS (PSOL)
Discurso
Legislatura 19ª legislatura, 2ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 17/09/2020
Página 15, Coluna 1
Assunto ADMINISTRAÇÃO ESTADUAL. COMPANHIA DE SANEAMENTO DE MINAS GERAIS (COPASA). EDUCAÇÃO. RECURSO HÍDRICO. SANEAMENTO BÁSICO.
Normas citadas EMC nº 50, de 2001
40ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 19ª LEGISLATURA, EM 15/9/2020
Palavras da deputada Andréia de Jesus
A deputada Andréia de Jesus – Boa tarde, presidente; boa tarde, colegas deputados e deputadas; bota tarde, público que nos assiste!
Presidente, eu me inscrevi no Plenário para trazer duas grandes preocupações. Todas duas estão intimamente ligadas a esse modelo de governo liberal que vem fazendo uma intervenção direta, desconstruindo o Estado por dentro. Eu falo isso, presidente, porque fomos surpreendidos com informações de privatizações que surgem nas redes sociais. A pandemia e todo esse desafio que é organizar a vida política durante o isolamento social fizeram também com que a gente fosse surpreendido com decisões do governo, como a relativa à educação remota emergencial, que também sem debate público foi empurrada goela abaixo. A própria reforma da Previdência veio cheia de pegadinhas, reforma tributária, reforma administrativa, criação de autarquias, tudo isso em meio a projetos que parecem reformas. E eu quero aqui registrar que não sou reformista, mas me surpreende a maldade e a capacidade elaborativa desses governos liberais, que inclusive estão destruindo o Estado por dentro.
Agora fomos surpreendidos com um empresário nas redes sociais anunciando o novo modelo de educação, de privatização de escola, a escola charter. Presidente, estamos extremamente assustados porque o governo Zema conseguiu terceirizar até mesmo as informações que são oficiais. Chegam para a gente primeiramente mudanças estruturais. Estou falando de políticas constitucionais fundamentais para o Estado e a sobrevivência das pessoas e que estão sendo alteradas. E a informação chega para nós, para a Assembleia Legislativa e para o povo mineiro por meio das redes sociais de um empresário, não é mesmo?
Essa informação não consegue dialogar. Por exemplo, a escola charter é um modelo de escola de gestão privada, e estão anunciando aí as próximas quatro para o ano que vem. Não sei como se dá isso. Se um aluno da escola pública custa R$7.000,00 e um aluno de escola privada, em média, R$32.000,00, o que o governo do Estado está preparando diante desse modelo que ele empurra para nós, surpreendendo-nos com a alteração de políticas estruturais de décadas e nos informando de forma terceirizada também – volto a dizer isso – e surpreendente?
A nota do governo não responde nada, não explica nada. Então resta a nós, parlamentares, questionar e fazer novamente o nosso papel de fiscalizar e demonstrar para o governador Zema que isso aqui não é loja, não é liquidação. Então, para que haja qualquer alteração nas políticas que são estruturais e estruturantes para o Estado existir, é preciso haver amplos debates.
E com isso eu venho denunciar que é um absurdo a gente observar pelas redes sociais comunicações – essas, sim, foram oficiais – de que a Copasa está sendo preparada para ser privatizada. Por que estou dizendo isso, presidente e parlamentares que têm ainda senso de justiça, que não se alienam diante de pautas muitas vezes transvestidas de inovação? Na verdade, o que a gente está vendo é um desmanche do Estado.
A água é um elemento fundamental. Durante as queimadas, o Pantanal está desaparecendo, a imagem do Brasil lá fora é de um grande caldeirão queimando, e a proposta do governador Zema, que tem demonstrado isso em várias publicações, é elaborar estudos, construir condições de privatização da Copasa, uma empresa que existe há cinco décadas.
Não estamos falando de programas – não é? – que a cada governo são alterados; estamos falando de uma política de abastecimento de água, de saneamento que alcança mais de 600 municípios e que está toda ameaçada porque a movimentação do governador, que me parece muito danosa, é no sentido de empurrar esse patrimônio cobiçado por várias empresas, mais uma vez, para a iniciativa privada usando o recurso público.
Primeiro, houve uma nota dizendo que a Copasa estava aberta para estudos de contratos, e aí não deixa nítido que tipo de contrato é esse, apenas que ela está aberta para o mercado, para novos contratos. E aí, de repente, aparece a formulação de um contrato com o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – justamente estruturando a empresa para que ela tenha investimento capital ou financeiro. Os acionistas precisam responder isso para a gente. O que é que está acontecendo? É possível criar condições, federalizar a empresa? O que é que o governador Zema está, de forma insidiosa, fazendo com a Copasa e com a educação pública?
Eu trago essa questão, presidente, porque a empresa não tem nenhum déficit, só cresce. Por que fazer caixa entregando todo o patrimônio público, privilegiando iniciativas privadas que já quebraram mundialmente? Desde 2008, a gente vem falando em crises econômicas. A acumulação de capital nas mãos de cinco ou seis já não se sustenta. Agora, eu queria que o governador tivesse a coragem de chegar a um quilombola lá em Manga, que está assentado lá agora, de frente para o Rio São Francisco, que está ali próximo àquelas águas santas, e explicar o que é a privatização da água – um bem público, um mineral. Mundialmente, a água é protegida como a única forma de sobrevivência da humanidade, e aqui, no Brasil, no Estado de Minas Gerais, vêm... Eu falo no Brasil porque a aprovação da lei de saneamento também empurra a massa, empurra o povo a acreditar que, a partir da privatização, o serviço vai melhorar e alcançar a todos, não é? Queira Deus a gente veja isso acontecer porque, até agora, o modelo capitalista incendiou o Brasil, acabou com o Estado de Minas Gerais. As mineradoras só deixam buracos, pessoas adoecidas. Onde está o ganho disso para as próximas gerações? Para os meus filhos, para os seus filhos, para os nossos netos?
Estou aqui muito preocupada com a água e com as atividades industriais que vêm avançando. As indústrias mineradoras, as siderúrgicas, a produção de bebidas, o agronegócio são consumidores de água neste país. Qual o interesse de empresas internacionais? Nós acompanhamos de perto as denúncias contra elas, que já vêm privatizando águas minerais, comprando terrenos onde há nascentes de água mineral. A privatização já acontecia sem a autorização. O que o governo Zema tem feito é empurrar e acelerar cada vez mais isso sem autorização legislativa. Isso é importante nessas denúncias que estou trazendo: essa leitura, essa narrativa construída pelo governo do Estado com esse discurso de otimizar, melhorar, gastar menos, ser mais efetivo, trabalhar com excelência. Até agora, ele está destruindo o Estado por dentro com essa forma bem mineira: comendo pelas beiradas. No fundo, ele está tirando, inclusive, a competência desta Casa. Qual a nossa competência diante de um governo que muda políticas estruturais, constitucionais, por meio de decreto, nota pública, Twitter, Twitter de terceiros? A habilidade deles é terceirizar.
Não é admissível que a Copasa seja vendida sem a discussão com os 21 milhões de mineiros. Nós precisamos, sim, abrir o debate, e esta Casa tem esse importante papel de garantir que qualquer debate desse nível precise passar pela Assembleia e que também possam ser ouvidas as pessoas por meio de instrumentos constitucionais que ainda existem, não é? Vamos garantir que as pessoas sejam ouvidas. Elas saberem quais serão os danos causados pela privatização é essencial.
Em 2001, durante o governo Itamar Franco, foi aprovada e sancionada a Emenda Constitucional nº 50, que passou a exigir que, para privatizar a Cemig e a Copasa, era preciso uma aprovação de 48 dos 77 deputados e pela população mineira, consultada em referendo. É bom que a gente a leia. Eu coloquei isso no twitter do governador, porque ele pode desconhecer a Constituição. Vou acreditar que é isso, que ele não está agindo na ilegalidade por consciência, mas por desconhecimento de que, para haver qualquer alteração, ele vai precisar debater com esta Casa, apresentar mudanças na Constituição e, principalmente, ouvir os mineiros, a menos que a emenda seja alterada. Hoje está previsto esse referendo. Essa alteração é necessária, mas é preciso ser enviada pelo governador. Essa proposta tem de passar pela Casa e ser amplamente debatida. Não cabem essas práticas ilegais, injustas, antidemocráticas e que ferem diretamente o papel do Poder Executivo, do Poder Legislativo.
A Assembleia autorizou a negociação de crédito do nióbio para garantir o 13º salário, votou a reforma tributária para Minas ter equilíbrio fiscal, alcançou a certidão de regularidade da Previdência para repasses federais, enquanto isso o povo está perdendo direitos e patrimônio. E agora? O que está vindo pela frente com a escola privatizada, com a entrega de recursos de fundos, como o Fundeb, para a iniciativa privada? Como vai se dar esse repasse? Como vai ser o controle disso? E agora? O que vem pela frente? A privatização da Copasa vai motivar... Qual será a chantagem que o governo do Estado vai utilizar para privatizar a Copasa? Nós, parlamentares, nós, povo mineiro, nós, mulheres, não podemos aceitar isso.
A Assembleia é altiva, responsável e comprometida com a população mineira. Vamos resistir a qualquer investida do capital financeiro, dos fundos internacionais de se apropriarem de bens públicos, como a água, que é imprescindível para manter a vida e para manter um Estado soberano. A presença do capital internacional no cotidiano da nossa vida significa o retorno ao modelo colonial. Isso não é só retrocesso de leituras políticas, democráticas, é um retrocesso na história. Estamos voltando a modelos monárquicos, como já defendidos aqui na Casa. E respeito, respeito, mas nós estamos na República, estamos no Estado Democrático de Direito, e a participação das pessoas, com consciência, é extremamente importante para elas entenderem quais os danos que estão por vir com esses modelos de privatização, de entrega de bem público para a iniciativa privada.
Eu fecho aqui, presidente, dizendo que estamos tomando providências, oficiando à Copasa. Agora, sobre as escolas, nem sei se mando requerimento para o dono da Localiza ou se mando para a Secretaria de Educação. Já não sei mais quem vai responder diretamente pela educação no Estado de Minas Gerais, mas eu continuo aqui, intransigente, defendendo a democracia, defendendo modelos institucionais já previstos na Constituição e garantindo, mais do que nunca, que a vida das pessoas não vire moeda de troca para empresários mesquinhos, que acham que... Aliás, não acho nem que eles tenham uma vida, porque Zema tem dinheiro para poder ter sete vidas, e não sei o que ele vai fazer com isso, se os filhos dele continuarem morrendo asfixiados, como a maioria dos mineiros está morrendo, por falta de oxigênio. Agora vão morrer por falta de água, se a Copasa continuar caminhando para a privatização.
Presidente, essas são as minhas palavras. Agradeço pelo espaço.
O presidente – Muito obrigado, deputada Andréia de Jesus. Com a palavra, para seu pronunciamento, o deputado Carlos Pimenta.