Pronunciamentos

DEPUTADO CARLOS PIMENTA (PDT)

Discurso

Comenta a Conferência Estadual sobre Demarcação de Terra Indígenas realizada na Assembleia Legislativa, por iniciativa da Comissão Especial da Câmara dos Deputados, com o objetivo de obter subsídios para a Proposta de Emenda à Constituição Federal nº 215, de 2000, que trata desse assunto. Critica os critérios adotados pela Fundação Nacional do Índio – FUNAI - na demarcação de terras indígenas na região Norte de Minas.
Reunião 41ª reunião ORDINÁRIA
Legislatura 17ª legislatura, 4ª sessão legislativa ORDINÁRIA
Publicação Diário do Legislativo em 31/05/2014
Página 9, Coluna 1
Assunto ÍNDIO. DIREITOS HUMANOS. LEGISLATIVO.

41ª REUNIÃO ORDINÁRIA DA 4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 17ª LEGISLATURA, EM 27/5/2014

Palavras do deputado Carlos Pimenta


O deputado Carlos Pimenta* - Minha cara deputada Liza, na sua pessoa, quero cumprimentar os colegas presentes, a imprensa de Minas Gerais, as pessoas que prestigiam esta reunião e principalmente os servidores da área da Justiça, que, durante tanto tempo, têm vindo a esta Casa, esperando uma posição. Entendo que a persistência e principalmente o valor das reivindicações de vocês devem tranquilamente sensibilizar esta Casa, para encontrarmos uma solução e chegarmos a uma votação, porque, se hoje Minas Gerais tem uma estrutura muito boa, o maior patrimônio do Estado são seus funcionários, tanto nas áreas do Executivo e do Legislativo como na área da Justiça. Então fica aí o nosso reconhecimento, a nossa torcida e o nosso trabalho para que efetivamente alcancemos os méritos e atendamos as suas reivindicações no que for necessário.

Meus companheiros deputados, gostaria de relatar a reunião que fizemos nesta Casa ontem, quando a Assembleia Legislativa emprestou suas dependências para que a Câmara dos Deputados realizasse uma audiência, que começou por volta das 14 horas e terminou bem tarde. Ontem recebemos aqui os deputados federais Toninho Pinheiro e Domingos Sávio, pois estão realizando audiências públicas no País para que se chegue a um consenso, a um denominador sobre as questões da remarcação das terras indígenas no nosso país.

Criaram essa comissão especial da câmara, que está colhendo subsídios e informações, ouvindo as pessoas e os estados para que votem, ainda este ano, uma proposta de emenda à Constituição, que traz à Câmara Federal e ao Congresso Nacional a prerrogativa de estabelecer critérios na demarcação de terras indígenas.

Entretanto, meu caro deputado Doutor Wilson, hoje em dia, quem tem essa prerrogativa é a Funai, e, por ser um órgão do governo federal e por estar constantemente em contato com os índios e com as questões indígenas, tem extrapolado muito as suas funções e promovido demarcações sem maiores critérios, de uma maneira muito impositiva dentro do território brasileiro, principalmente aqui em Minas Gerais. Isso tem causado uma preocupação muito grande, principalmente aos trabalhadores rurais, que, na maioria das vezes, têm a posse legal de suas terras, mas, de repente, veem-nas incorporadas às reservas indígenas de forma arbitrária, e eles não têm a quem recorrer.

O Congresso Nacional, de uma maneira muito sábia, por meio dessa proposta de emenda à Constituição, está trazendo para a câmara a prerrogativa de apresentar projetos de lei, que serão amplamente debatidos em audiências públicas. Isso será feito de forma mais transparente, mais clara, sem essa ditadura que hoje a Funai impõe e colocará um ponto final nesses problemas que estão acontecendo.

Estavam presentes representantes de nações indígenas de Martinho Campos, de outras cidades e de Itacarambi, Norte de Minas. Em Itacarambi, acompanhamos de perto o problema que estava acontecendo. A Funai promoveu uma ocupação em quase sessenta mil hectares. Eles não gostam de falar que foi invasão, mas ocupação. Essa ocupação aconteceu em áreas produtivas; na maioria das vezes cerca de 95% eram de pequenos produtores. Isso gerou um mal-estar muito grande. De repente, as terras de Itacarambi passaram a não ter valor, ninguém comprava nem vendia terra. Ninguém se arriscava a fazer qualquer tipo de plantação, pois corria o risco, do dia para a noite, de ver suas terras invadidas e ocupadas sem maior diálogo. As coisas estavam acontecendo dessa forma.

O mais absurdo é que foram feitas várias solicitações à Justiça, e a Justiça Federal determinou a reocupação dessas terras pelos seus legítimos donos. Infelizmente, nesse aspecto a PMMG deixou de cumprir sua parte de devolver as terras aos legítimos donos. Talvez temendo um confronto maior, talvez temendo problemas maiores. Mas a questão se arrasta por tanto tempo e, o que é pior, meu caro João Leite, é que a Funai chegava perto do trabalhador, proprietário de terra e perguntava: “Você não quer se declarar índio para permanecer nas suas terras?” Isso está nos autos dos processos, mas parece brincadeira. Se a pessoa assinasse um documento antropológico dizendo que tinha raízes indígenas e que se sentia índio, recebia esse documento, a carteirinha de índio, e permanecia na terra. Vejam a que ponto chegou essa instituição do governo federal, respaldada pelo próprio governo federal. Isso aconteceu em Itacarambi em 1986. A Funai, na época, chegou, tomou posse das terras todas, expulsou os proprietários, ficou de pagar e não pagou. A Funai deu calote em centenas de trabalhadores rurais do Norte de Minas, principalmente em Itacarambi. E, agora, vem com essa conversa novamente, de reocupação das terras, fazendo ameaças. Em um dos processos, o próprio representante da Funai confessou ter ameaçado os trabalhadores. Já não bastasse o laudo falsificado de que as pessoas se declaravam índios, ameaçavam dizendo que se não saíssem das terras alguma coisa poderia acontecer. Isso está causando uma preocupação muito grande. O pior é que em uma audiência pública dessa comissão especial, a que estavam presentes deputados federais e estaduais, representantes dos trabalhadores, da OAB, dos índios, a Funai não compareceu em Belo Horizonte nem enviou sequer o seu representante em Minas Gerais. Ela não compareceu para dar explicações.

As coisas estão acontecendo dessa forma truculenta. Parece que o governo perdeu o rumo do seu navio neste país. Situações que poderiam perfeitamente ser discutidas estão acontecendo dessa forma. O País não sabe mais o que faz na área educacional, ele não sabe mais o que faz para assistir os brasileiros na área da saúde.

O País está largado às moscas. Ontem tivemos essa constatação quando, num momento gravíssimo, em que pessoas estão sendo expulsas de suas terras para ocupação indígena, a Funai não veio explicar o que estava acontecendo nem se defendeu das acusações que foram feitas quanto ao que está ocorrendo. A Justiça já sabe o que está acontecendo.

Quero, neste momento, cumprimentar o prefeito de Itacarambi, companheiro e amigo Ramon Campos, pela coragem que teve ontem, pela sua posição em favor da defesa da integridade do seu município e das pessoas que moram e trabalham em Itacarambi. Cumprimento o prefeito, assim como os vereadores que vieram de Martinho Campos, de Itacarambi e de outras cidades. Cumprimento, ainda, a OAB, que esteve aqui presente, assim como a Fetaemg e a Igreja Católica.

Sr. Presidente, neste momento, gostaria de trazer a esta Casa, a esta tribuna a minha indignação, o meu voto de repúdio. A Funai, em Minas Gerais, não teve o cuidado de comparecer para se defender, deixando até os pobres índios serem acusados. A verdade foi a que vimos ontem.

Faço também voto de repúdio ao Ministério Público Federal, que deveria estar presente. Muitas vezes ele se faz presente em causas menores. Numa reunião de tamanha importância aqui em Minas Gerais, com a presença de deputados, para resolver essa questão de terra no Norte de Minas, da reserva xacriabá, ele não se fez presente.

Em nenhum momento nos colocamos contra as questões indígenas. O índio tem de ser respeitado. Ele precisa de um cuidado maior por parte do governo federal e da sociedade brasileira. Hoje temos pouco mais de 500 mil índios em nosso país, mas índios verdadeiros. Não estou falando daquele índio que assina um documento e recebe a carteirinha de índio, de acordo com as conveniências da Funai ou do governo federal. O índio tem de ser respeitado, como precisam ser respeitadas as comunidades quilombolas em nosso estado e em nosso país.

Precisamos de órgãos como o Incra e a Funai que atuem de maneira transparente, que atuem trazendo benefícios e apaziguando conflitos, como os que estão acontecendo nessas terras. Estão invadindo propriedade de pequenos produtores, daquelas pessoas que moram em suas terras há muitos anos. São terras nas quais seus avós moraram e morreram, terras nas quais seus pais moraram e morreram e que hoje são usadas para o sustento dos filhos. Não queremos que a discórdia venha a acontecer, principalmente com relação à causa indígena. Todavia não podemos aceitar essa covardia que vem ocorrendo contra os proprietários de terra do Norte de Minas. Não podemos aceitar que a Funai se cale diante de uma situação tão constrangedora e importante, como se calou ontem.

Este repúdio estou fazendo ao vivo e de público, e o farei novamente, daqui a pouco, desta Casa. Pois órgãos como a Funai têm de estar presentes e mostrar sua cara, abrir seu peito com coragem, e não agir na surdina, covardemente, como estão fazendo ao expulsar os pequenos trabalhadores e proprietários de terras de suas casas.

Esta é a cara do Brasil, a cara que precisamos mudar, a cara que o brasileiro tem de encarar com indignação.

A única forma que o brasileiro tem para dizer não ao desmando que está acontecendo é mostrar que quem manda neste país somos nós, que este país tem de ter um governo voltado para os brasileiros, e não para partidos os políticos, como estamos vendo.

Ontem, fiquei com vergonha de ser deputado estadual e de ser brasileiro, fiquei com vergonha pelos índios, mas fiquei com mais vergonha ainda do descaso deste governo com o Brasil e com o povo brasileiro. Muito obrigado.

*- Sem revisão do orador.