As 400 famílias do distrito de Piedade do Paraopeba temem ver suas casas destruídas, como em tragédias anteriores - Arquivo ALMG

Mineradora teria descumprido lei por obra em barragem

Legislação aprovada na ALMG em 2019 proíbe concessão de licença ambiental, tema de debate nesta quinta (24), às 10h30.

23/02/2022 - 14:38 - Atualizado em 23/02/2022 - 16:23

Debater o suposto descumprimento da Lei 23.291, de 2019, que institui a Política Estadual de Segurança de Barragens, pela Vallourec Mineração, na Barragem Santa Bárbara, integrante da Mina do Pau Branco, de sua propriedade, em Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).

Esse é o objetivo da audiência pública que a Comissão de Administração Pública realiza nesta quinta-feira (24/2/22), a partir das 10h30, no Auditório José Alencar da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Acompanhe a reunião ao vivo e participe do debate.

A barragem fica distante apenas um quilômetro da sede do distrito de Piedade do Paraopeba, já no município de Brumadinho, também na RMBH e que foi cenário da morte de quase 300 pessoas após o rompimento de outra barragem de mineração, da Vale, em janeiro de 2019.

O debate atende a requerimento da deputada Beatriz Cerqueira (PT), que lembra as denúncias frequentes que tem recebido dos moradores da região dando conta de que a Vallourec, um conglomerado franco-japonês, estaria utilizando obras emergenciais como pretexto para ampliar e altear a Barragem Santa Bárbara. 

O tema da audiência ganhou ainda mais relevância porque a obra em questão teria sido no mesmo complexo minerário na qual está situado o Dique Lisa, cujo vertedouro transbordou no início deste ano após fortes chuvas.

Isso provocou uma avalanche de lama de resíduos minerários a interditar completamente o tráfego de veículos na BR-040, na altura do km 562, bem próximo ao trevo de Ouro Preto, no trecho que liga Belo Horizonte ao Rio de Janeiro. Carros que trafegavam pela rodovia foram atingidos, mas não houve vítimas.

Na sequência, a Mina de Pau Branco teve inclusive suas atividades suspensas por determinação da Agência Nacional de Mineração (ANM) e da Justiça, sendo que esta última atendeu a pedido do Ministério Público (MP).

A Barragem Santa Bárbara teria mais de 20 anos de uso e 60% do volume total seria composto de sedimentos, uma espécie de lama tóxica de resíduos da mineração.

Briga na Justiça

No despacho da Justiça que determinou a suspensão das atividades foi citado, por exemplo, que o pedido do MP lembrou que apenas um mês antes teria sido celebrado Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para que medidas preventivas extras de segurança fossem tomadas com relação à estrutura, como a contratação de auditoria técnica independente para avaliar suas condições, o que ainda não teria sido realizado.

Mas a disputa entre MP e Vallourec começou ainda em junho de 2021, quando foi dada entrada em uma Ação Civil Pública contra a empresa após uma vistoria da própria ANM, realizada em abril de 2020, que teria constatado uma série de irregularidades na Barragem Santa Bárbara.

Ainda em junho do ano passado, o juiz responsável pelo caso teria determinado que a empresa se abstivesse de lançar rejeitos ou praticar qualquer intervenção na barragem enquanto não comprovasse a integral estabilidade e segurança da estrutura.

Lei das Barragens

Na audiência pública, os deputados querem apurar se a Vallourec teria se envolvido na violação do que diz o artigo 12 da Lei 23.291, que veda a concessão de licença ambiental para construção, instalação, ampliação ou alteamento de barragem em cujos estudos de cenários de rupturas seja identificada comunidade na zona de autossalvamento.

A chamada zona de autossalvamento, conforme explica a lei, é a porção do vale a jusante da barragem em que não haja tempo suficiente para uma intervenção da autoridade competente em situação de emergência.

A Lei 23.291 foi aprovada pela ALMG após duas tragédias humanas e ambientais semelhantes envolvendo a atividade minerária, a primeira delas em Mariana (Central), em 2015, em uma barragem da Samarco, subsidiária da Vale e da multinacional australiana BHP.

Entre outros avanços, a lei determinou, em seu artigo 13, a erradicação das estruturas construídas pelo método de alteamento a montante, como as duas que romperam, causando mortes e destruição nas bacias dos Rios Doce e Paraopeba.

Isto deveria acontecer em todo o Estado até esta sexta-feira (25), após três anos da entrada da lei em vigor, mas apenas uma pequena parcela foi descaracterizada (mudança de finalidade). Agora, as mineradoras pedem mais prazo para cumprir esse item da lei.

Convidados

Foram chamados para o debate representantes do Ministério Público e da Defensoria Pública, além de ambientalistas e de lideranças locais, como os ligados à Comissão Pastoral da Terra, ao Movimento pela Soberania Popular na Mineração e ao Movimento dos Atingidos por Barragens.

Também foram convidados moradores do Distrito de Piedade do Paraopeba, que temem ser as novas vítimas de mais uma tragédia de grandes proporções na mineração.

O eventual rompimento da barragem de rejeitos atingiria cerca de 400 famílias, a Escola Municipal Padre Xisto, onde estudam mais de 250 crianças, e o patrimônio natural, cultural e arqueológico do povoado, que fica distante 20 quilômetros da sede de Brumadinho e tem 300 anos de história.