Para deputadas, política de saneamento penaliza mais pobres
Tarifas altas, serviços ruins ou ausentes e ameaça de privatização foram criticados por parlamentares e convidadas.
25/10/2021 - 19:33Deputadas que integram a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG ) criticaram, nesta segunda-feira (25/10/21), o impacto das altas tarifas de água e esgoto no Estado e a possibilidade de privatização desses serviços, com consequências danosas para a população mais pobre de Minas, em especial para as mulheres.
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Durante o debate, a Agência Reguladora de Serviços de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário de Minas Gerais (Arsae-MG) foi muito criticada por ter determinado, em agosto, a unificação da tarifa de esgoto. Foi também cobrada por não exigir mais investimentos da Copasa, mesmo diante dos lucros expressivos da empresa.
“A Arsae não está cumprindo o seu papel. Quem está pagando mais caro são os menos favorecidos”, acusou a deputada Ione Pinheiro (DEM). Ela também criticou o fato de a Copasa não ter enviado representantes à reunião e defendeu a criação de uma comissão especial na Assembleia para discutir a questão do saneamento. “A Copasa teve um lucro de quase R$ 1 bilhão em um ano e praticamente nenhum investimento”, afirmou.
Presidenta da comissão, a deputada Ana Paula Siqueira (Rede) disse que as altas tarifas e o serviço ruim não devem ser vistos como um argumento para a privatização da companhia. “Fica uma falsa impressão para a população de que o problema é a empresa. O problema é a gestão”, pontuou. Ione Pinheiro reforçou o posicionamento da colega, lembrando que 25% das ações da Copasa hoje já pertencem a sócios estrangeiros.
O diretor Rodrigo Polizzi, que representou a Arsae no debate, negou que a autarquia venha se omitindo de fiscalizar a Copasa. “A Arsae determinou a devolução, pela Copasa, de mais de R$ 500 milhões cobrados indevidamente em 2020”, afirmou o dirigente.
Polizzi admitiu que a estatal não tem investido o que seria desejado no melhoramento dos serviços, mas ponderou que a agência tem limitações para mudar isso. “A Arsae não tem como obrigar que esse lucro seja convertido em investimento”, declarou. Ele complementou que alguns contratos permitem à empresa postergar investimentos.
Quanto à unificação da tarifa de esgoto, o gestor disse que os prejuízos para a população existem, mas não são generalizados. “Entendemos que algumas pessoas foram prejudicadas, mas 85% da população teve redução de tarifa”, destacou. Segundo ele, ainda há o objetivo de aprimorar essa cobrança.
Com a unificação da tarifa, aqueles que contam apenas com o serviço de coleta pagam o mesmo do que aqueles que também usufruem do serviço de tratamento de esgoto.
Localidades do Jequitinhonha dependem de caminhões-pipa há anos
Trabalhadora rural e presidente da Associação Comunitária do Quilombo do Rocha, localizado em Chapada do Norte (Jequitinhonha/Mucuri), Maria Aparecida Silva resumiu o problema que comunidades isoladas e de baixa renda enfrentam em decorrência da falta de água e saneamento.
De acordo com ela, várias dessas comunidades convivem há anos com a falta de água, sendo abastecidas por caminhões-pipa ora fornecidos pelas prefeituras, ora pagos pelas famílias. Em alguns casos, a solução é se mudar para a área urbana, mas isso implica em dissolução das comunidades, sobrecarga nas cidades, que não têm estrutura para receber a todos, e aumento das dificuldades financeiras das famílias, que passam a arcar também com os aluguéis.
Diversas convidadas ressaltaram que água e saneamento não podem ser vistos como uma mercadoria e cobraram a universalização dos serviços.
Nesse sentido, a diretora de Resíduos Sólidos Urbanos e Drenagem de Águas Pluviais da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Juliana Pacheco, afirmou que um dos objetivos do Projeto de Lei (PL) 2.884/21, que institui as Unidades Regionais de Saneamento Básico (URSBs) do Estado, é promover ganhos de escala que viabilizem essa universalização nos menores municípios.
O projeto tramita na ALMG e adapta a legislação mineira ao novo marco legal federal sobre saneamento básico, a Lei Federal 14.026, de 2020. A proposta divide Minas Gerais em 22 unidades regionais de água e esgoto e 34 unidades regionais de gestão de resíduos sólidos. Os municípios que estão fora de regiões metropolitanas podem optar se participam ou não desses agrupamentos.
A engenheira civil Maria Angélica Abreu afirmou que Juiz de Fora (Zona da Mata) é exemplo de um município que não pretende aderir. Segundo ela, a atual gestão municipal teme que a regionalização leve à privatização e ao aumento de tarifas. Ela informou que o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia de Minas Gerais (Crea-MG), em associação com a Associação Mineira de Municípios (AMM), realizará até o final do ano um evento para divulgar uma análise sobre o PL 2.884/21.
Sônia Dias representou, no debate, uma organização internacional que atua em mais de 60 países, a Wiego, sigla traduzida como "Mulheres no emprego informal: globalizar e organizar". Conforme relatou, em mais de 50 países há uma tendência de reverter processos de privatização na área do saneamento, em cidades como Turim (Itália), Oslo (Noruega), Cochabamba (Bolívia) e Montreal (Canadá). “Promessas de que a privatização ia trazer melhorias, em muitos casos, falharam. Houve aumento excessivo de tarifas e taxas de ligação”, afirmou.