Governo do Estado e Prefeitura de Ribeirão das Neves não enviaram representantes à audiência
Para Denise de Paula Romano, iniciativa é o início da entrega do ensino médio para a iniciativa privada no futuro

Pressa e falta de diálogo marcam Mãos Dadas em Neves

Presentes à reunião da Comissão de Educação, pais e professores criticaram a adesão ao projeto de municipalização.

18/10/2021 - 15:30

Participantes de audiência da Comissão de Educação, Ciêncie e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) classificaram como vergonhosa a adesão do município de Ribeirão das Neves (Região Metropolitana de Belo Horizonte) ao Projeto Mãos Dadas, do governo estadual. O debate aconteceu na manhã desta segunda-feira (18/10/21).

O projeto prevê a municipalização dos anos iniciais do ensino fundamental das escolas estaduais. Conforme o Projeto de Lei (PL) 2.657/21, do governador, o Estado repassaria recursos às prefeituras interessadas em assumir essa responsabilidade, mediante a assinatura de um termo de adesão.

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

Segundo vários dos presentes à reunião, o projeto foi aprovado na Câmara Municipal em regime de urgência, sem a participação de representantes das comunidades escolares impactadas pela medida, indo contra o que havia sido pactuado em plenária virtual do Conselho Municipal de Educação.  

Diretora da Subsede do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE/MG) em Ribeirão das Neves, Marcelle Amador afirmou que chegou a ser aprovado um documento durante a plenária, com a comunidade e alguns vereadores se posicionando contrariamente ao projeto

“Fomos surpreendidos pela votação do projeto em caráter emergencial, de forma unânime. Questionamos os vereadores, quatro deles professores, que haviam se reunido conosco. Achamos que estávamos sendo ouvidos, mas foi um erro. Temos muitas dúvidas, pois nada foi esclarecido conosco: o transporte e alimentação das crianças, a fiscalização do envio dos recursos, como serão aplicados. O Estado tem um histórico de não cumprir suas promessas. Vinte escolas, quase 4 mil matrículas, serão impactadas. Por uma demanda que o município não dará conta de manter”, ressaltou.

Municipalização é criticada

Mãe de aluna e integrante do Colegiado da Escola Estadual Pedro Pereira, Cristiane Figueiredo reforçou que o município já está há alguns anos sobrecarregado com as demandas da educação que lhe cabem. “Sempre participei das atividades voltadas à educação e percebo que a responsabilidade de gerir, administrar, tem de ser do Estado. Eles podem fazer as melhorias que quiserem nas escolas e continuar administrando”, afirmou.

Professora da Escola Estadual Manoel Martins de Melo, Maria da Glória Silva lamentou a transição repentina para a municipalização. “Prestei concurso para trabalhar no Estado, onde estou há 17 anos, e agora fui informada que passarei a pertencer à prefeitura. O aluno nunca fica desamparado, nos esforçamos muito para que tenha educação de qualidade. Mas e os profissionais da educação? É uma falta de respeito muito grande. Designados estarão desempregados. E os concursados, vão para onde? Não quero ficar numa escola municipalizada. Educação tinha de ser gerida como patrimônio público, não como empresa”, pontuou. 

Coordenadora-Geral do Sind-UTE/MG, Denise de Paula Romano destacou que o regime de coabitação, que impactará 15 das 20 escolas a serem municipalizadas, não é algo inédito no Estado. “O relacionamento e a gestão são muito difíceis, é um retrocesso voltar a isso. Daqui a pouco vamos voltar a ter escolas funcionando em lojas comerciais, com porta de ferro. Esse é só o começo de uma movimentação que terá como consequência, no futuro, a entrega do ensino médio para a iniciativa privada”, denunciou. 

O Governo do Estado, a Prefeitura de Ribeirão das Neves e a Câmara Municipal foram convidados a participar da audiência, mas não enviaram representantes.

Trazendo informações sobre os investimentos do governo na educação do município, a deputada Laura Serrano (Novo) informou que serão, no total, R$ 125 milhões investidos em obras, equipamentos e aquisição de imóveis. Segundo ela, diminuir a rede estadual de ensino dará aos prefeitos a oportunidade de dar aos anos iniciais uma atenção mais individualizada. “O projeto Mãos Dadas foca no motivo das escolas existirem: a qualidade da aprendizagem dos nossos alunos”, salientou. 

Investimentos 

Diretor da Escola Estadual Antônio Rigueira da Fonseca, Anderson Fernandes Júnior disse não saber detalhes sobre como será o processo de municipalização e pediu esclarecimentos sobre como os investimentos serão feitos. “Esses valores serão investidos no município ou em cada escola estatual impactada? É essencial saber, porque a comunidade vai me cobrar melhorias na escola. E eu preciso saber se elas serão feitas”, questionou. 

A deputada Beatriz Cerqueira (PT) esclareceu que a contrapartida prevista no projeto é para a infraestrutura do município, não para cada escola. “Para se repassar o recurso para cada escola, são outros os mecanismos. E esses valores serão repassados apenas em 2022, tendo como referência o ano de 2021. Não temos informações sobre como o governo chegou a esses valores, quais os critérios técnicos que foram utilizados para se chegar nessa quantia”, afirmou. 

O deputado Professor Cleiton (PSB) se disse surpreso com a assessoria jurídica da Câmara Municipal permitir que o projeto de lei implementando o Mãos Dadas na cidade tenha sido aprovado, pois a iniciativa teria claramente “vícios de origem”.

“Vereadores não podem legislar sobre o destino de funcionários do Estado. Além disso, recebi denúncias de que, em algumas cidades onde a adesão ao projeto foi recusada, o Estado estaria recusando matrículas para os anos iniciais, como forma de revidar e forçar a adesão à municipalização”, relatou.