Durante reunião nesta quinta (23), foi enfatizado que doença mental é multifatorial e tem nuances diversas
Vivian Zicker explicou que o enlutado por um suicídio vive um luto diferente
O bombeiro Kleber Silveira relatou que a corporação é treinada para lidar com ocorrências ligadas a transtornos mentais
Fabrizia  Nicolai disse que, em 20 anos, o suicídio aumentou 25% na PRF

Escuta atenta é ferramenta para prevenir suicídios

Em audiência, Comissão de Saúde abordou impactos da pandemia de Covid-19 na saúde mental da população.

23/09/2021 - 14:52

O papel da escuta atenta para a prevenção de casos de suicídio foi enfatizado por participantes de audiência pública realizada nesta quinta-feira (23/9/21). A reunião, da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), abordou ainda os impactos da pandemia de Covid-19 na saúde mental.

Para a porta-voz do Centro de Valorização da Vida (CVV), Norma Moreira Oliveira, essa escuta sem emitir opiniões, embora pareça simples, cumpre função importante.

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

“A gente não tem encontrado alguém para nos ouvir. E o CVV faz isso. Quando a pessoa está angustiada, ela precisa ser ouvida com respeito. Não é uma escuta que aconselha e julga, é um ombro amigo para que a pessoa possa encontrar outro caminho que não o suicídio”, reforçou.

Ela contou que o CVV atua na prevenção ao suicídio e no apoio emocional por meio do trabalho de 4 mil voluntários espalhados pelo Brasil, tendo inclusive o número 188 para atendimento gratuito 24 horas por dia.

O coordenador do Projeto HELP!, Tindaro Lanes Magalhães, contou que, em cerca de quatro anos, a iniciativa tem ajudado diversas pessoas com o trabalho de 370 voluntários em Minas e 7.500 no Brasil.

Conforme contou, o projeto oferece palavras motivacionais e apoio por telefone (11 4200-0034) a quem precisa ser ouvido. “Amarramos cartinhas em árvores e viadutos com conteúdo motivacional e palavras de esperança”, relatou.

SUS - De acordo com a psiquiatra Dagmar Fátima de Abreu, é preciso unir esforços para buscar uma melhor assistência à saúde mental no Estado e no País a toda a população por meio do Sistema Único de Saúde (SUS).

Ela explicou que a doença mental é multifatorial e tem nuances diversas. “O transtorno mental deve ter a mesma urgência de um infarto ou fratura”, afirmou.

“Existem momentos em que os pensamentos e as emoções se tornam tão dolorosos que parece ao indivíduo ser menos sofrido tirar a vida do que lidar com isso”, acrescentou.

Grupo atende enlutados por suicídio

Coordenadora do Grupo de Apoio a Enlutados por Suicídio na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Vivian Zicker, explicou que o enlutado por um suicídio vive um luto diferente.

“Gera sentimentos de vergonha, raiva e abandono. É um luto muito pesado. Por isso, o enlutado também precisa de cuidados porque o risco de ele também apresentar transtorno mental aumenta potencialmente”, contou.

Ela relatou que o grupo, criado em 2017, realiza reuniões online semanais e gratuitas para promover acolhimento. 

Psicóloga enfatiza agravamento de transtornos na pandemia

Psicóloga na ALMG, Daniela Piroli enfatizou que a pandemia da Covid-19 traz muitas consequências para a saúde mental. “O isolamento social, o uso e o abuso de substâncias químicas como o álcool, a violência doméstica, o alto número de mortes pela doença e o luto agravam os quadros de transtornos mentais, com consequente aumento nas taxas de suicídio”, contou.

Ela salientou a importância de se debater exaustivamente o assunto. “Temos uma pandemia evidente e uma epidemia de transtornos mentais que, muitas vezes, é invisível porque ainda é um tabu falar do tema. O suicídio é fenômeno multicausal e complexo e, por isso, as soluções devem ser pensadas de modo interdisciplinar”, disse.

Daniela Piroli acrescentou que, diferentemente da curva da Covid que sobe e desce, os efeitos para a saúde mental de toda a população têm tendência de elevação e de seguir depois como um platô a longo prazo.

Órgãos ressaltam ações voltadas à saúde mental

Segundo o chefe da Divisão Operacional do 1º Comando Operacional de Bombeiros do Corpo de Bombeiros Militar, Kleber Silveira de Castro, a corporação é treinada para lidar com ocorrências ligadas a transtornos mentais de forma humanizada.

“A prevenção é fundamental, mas se chegar a um momento crítico, de um suicídio, vamos trabalhar com qualidade para atender à população. Numa crise, ligue para o 193”, afirmou.

A chefe da Seção da Academia de Bombeiros Militar de Minas Gerais, Vanessa Rodrigues, citou que o agravamento da saúde mental também ocorreu na corporação na pandemia, o que decorre, em sua opinião, de o trabalho ser essencial e não ter parado em momento algum.

Polícias Militar e Civil enfatizam trabalho

O chefe do Centro de Operações Policiais Militares da Polícia Militar (PM), Ricardo Gonçalves Pessoa Leite, salientou que a PM também atua nesses casos, muitas vezes, com o apoio dos Bombeiros.

A chefe-adjunta da Polícia Civil (PC), Irene Angélica Franco e Silva Leroy, comentou que a corporação, embora atue sobretudo na investigação, trabalha com a prevenção para o público externo e interno.

Ela comentou que a PC, ao trabalhar com crianças e mulheres vítimas de violência, por exemplo, consegue identificar casos em que há potencial de desenvolvimento de algum transtorno mental e encaminhar para a rede de proteção.

Governo - A secretária Executiva de Segurança Pública da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), Tatiana Telles, disse que o governo se preocupa com a saúde mental dos servidores da área, que são impactados porque lidam diariamente com casos de violência.

Ela contou que, desde 2019, cerca de R$ 2 milhões foram investidos no projeto chamado “Cuidar bem de quem cuida”, do eixo valorização do servidor público.

Aumento do número de suicídios na Polícia Rodoviária Federal 

Já a diretora social do Sindicato dos Policiais Rodoviários Federais no Estado de Minas Gerais, Fabrizia de Pinho Nicolai, disse que, em 20 anos, o suicídio aumentou 25% na corporação e é quarta causa de morte dos profissionais, atrás de acidentes de trânsito, doenças cardiovasculares e violência interpessoal.

Ela enfatizou que está em andamento um projeto de apoio psicológico e saúde mental aos policiais, além de campanhas de prevenção.

O chefe do Serviço de Assistência Social da 4ª Região Militar do Exército Brasileiro, Roberto Lúcio Corrêa de Abreu, comentou que o Exército, dado o acesso a armamentos, apresenta índice de suicídio acima da média.

"Foi criado um plano de assistência social que tem como um dos eixos a prevenção ao suicídio”, contou, reforçando a queda do número de suicídios com as medidas implantadas.

Deputados destacam importância do debate

Para o autor do requerimento da audiência e coordenador da Frente Parlamentar de Prevenção ao Suicídio, à Depressão e à Automutilação, deputado Charles Santos (Republicanos), é relevante debater o assunto em questão, sobretudo neste mês, em que se celebra o Setembro Amarelo, de prevenção ao suicídio.

“As dificuldades ligadas à saúde mental são antigas. Mas, neste momento, são agravadas pela pandemia da Covid-19”, disse. Ele reforçou que a ALMG tem preocupação constante com o tema e que diversos projetos de parlamentares que abordam o assunto tramitam atualmente.

De acordo com o deputado Doutor Paulo (Patri), o Brasil e o Estado têm taxas elevadas de suicídio. “A pandemia agrava a situação pelo isolamento social e pelo desemprego que estamos vivenciando”, disse.