As Comissões de Transporte e de Defesa do Consumidor promoveram amplo debate sobre a regulamentação dos ônibus fretados
O secretário Fernando Marcato defende a aprovação do PL 1.155/15 na forma do substitutivo nº 1, da CCJ
Projeto com marco regulatório sobre fretamento do transporte coletivo é debatido

Regulamentação de ônibus fretados divide opiniões

PL 1.155/15 propõe regras para transporte intermunicipal de passageiros operado por aplicativos como o Buser.

17/08/2021 - 19:33

A regulamentação do fretamento de ônibus intermunicipais, conforme prevê o Projeto de Lei (PL) 1.155/15, divide opiniões de deputados, autoridades, sindicalistas e motoristas autônomos. O assunto gerou polêmica na reunião conjunta das Comissões de Transporte, Comunicação e Obras Públicas e de Defesa do Consumidor e do Contribuinte realizada na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta terça-feira (17/8/21).

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

O PL 1.155/15 é de autoria do deputado Alencar da Silveira Jr. (PDT) e sua aprovação teria impacto direto sobre o chamado fretamento colaborativo, viabilizado por aplicativos como o Buser, que comercializam passagens mais baratas que as das empresas de ônibus convencionais. 

Para o deputado Bartô (Novo), ao favorecerem a livre concorrência, os aplicativos fizeram os preços das passagens caírem, beneficiando os passageiros. “Só o livre mercado é capaz de oferecer serviços melhores a preços mais baixos”, defendeu.

Opinião semelhante foi manifestada pelo deputado Guilherme da Cunha (Novo). Para ele, a restrição da concorrência retira oportunidades de trabalho e prejudica o consumidor. “As empresas de ônibus têm um monopólio garantido artificialmente. A aprovação do PL 1.155/15 pode ter efeitos nefastos para a nossa economia”, afirmou. Segundo o parlamentar, pelo menos 90 municípios mineiros não têm nenhuma conexão rodoviária por falta de interesse das empresas.

Na avaliação da deputada Laura Serrano (Novo), o projeto cria uma série de restrições que não agregam em nada em relação à segurança e à qualidade das viagens. No seu entender, ao reduzir a concorrência, os usuários acabam pagando mais caro. O deputado Bruno Engler (PSL) também defendeu os benefícios da maior concorrência entre os serviços fretado e regular. 

Já o deputado Celinho Sintrocel (PCdoB) se disse preocupado com o risco de desequilíbrio dos contratos de concessão das linhas regulares de ônibus, o que pode gerar precarização do serviço e demissões de trabalhadores. “A população não aguenta mais pagar tarifa cara. Mas não dá pra dizer que o Buser vai resolver esse problema”, disse.

Como o PL 1.155/15 está pronto para votação em 1º turno no Plenário, o deputado Alencar da Silveira Jr. propôs modificar a proposição no 2º turno. Ele defendeu a apresentação de um outro projeto específico para regulamentar os aplicativos e sugeriu que os ônibus fretados operem as linhas abandonadas pelas concessionárias antes de disputarem mercado nas rotas mais lucrativas. “Estou do lado da legalidade”, afirmou.

Os deputados Léo Portela (PL), Duarte Bechir (PSD), Cleitinho Azevedo (Cidadania), Bosco (Avante) e Mauro Tramonte (Republicanos) defenderam uma ampla discussão sobre o assunto, de modo a conciliar os interesses de empresas de ônibus, trabalhadores, fretadores autônomos e passageiros.

Governo quer evitar questionamentos jurídicos

O funcionamento de aplicativos como o Buser foi regulamentado em janeiro deste ano, quando o Governo do Estado editou o Decreto 48.121. Atendendo a recomendação do Tribunal de Contas do Estado (TCE), a ALMG suspendeu os efeitos desse decreto por meio da Resolução 5.575, promulgada em agosto. 

O secretário de Estado de Infraestrutura e Mobilidade, Fernando Marcato, esclareceu que havia um acordo para que o PL 1.155/15 fosse aprovado na forma do substitutivo nº 1, apresentado pela Comissão de Constituição e Justiça.

Conforme esse texto, o serviço fretado deveria ser autorizado pelo Departamento de Estradas de Rodagem (DER-MG) com até três horas de antecedência do início da viagem. Essa autorização só poderia ser concedida para o chamado circuito fechado, ou seja, o mesmo grupo de passageiros para os trechos de ida e volta. Além disso, seria proibida a venda de passagens individualizadas e por meio de terceiros. 

Porém, ao longo da tramitação, o PL 1.155/15 recebeu diversas sugestões de alteração. Ao analisar emendas apresentadas pelos deputados durante a discussão em 1º turno no Plenário, a Comissão de Transporte apresentou o substitutivo nº 4. 

Segundo esse novo texto, seria necessário enviar ao DER-MG a relação dos passageiros a serem transportados até seis horas antes do início da viagem. Essa relação poderia ser parcialmente alterada e comunicada ao DER-MG até o início da viagem. 

Além disso, o substitutivo nº 4 veda expressamente a prestação do serviço intermediado por terceiros. O fretamento também não poderia ter características de transporte público, ou seja, as viagens não poderiam ter regularidade de dias, horários ou itinerários e o embarque e o desembarque de passageiros não poderiam ser feitos em terminais rodoviários.

O secretário Fernando Marcato reiterou que o governo não concorda com as alterações promovidas pelo substitutivo nº 4 por entender que elas prejudicam os passageiros. Segundo ele, caso esse texto seja aprovado, será alvo de vários questionamentos jurídicos. 

Para fretadores, projeto inviabiliza a atividade

Entidades que representam serviços de transporte fretado foram ouvidas durante a audiência e manifestaram sua preocupação com o PL 1.155/15. De forma geral, eles reforçaram os argumentos de que as regras previstas na regulamentação da atividade são anacrônicas e funcionam como barreiras para a livre concorrência.

Para os fretadores, não faz sentido cobrar a relação de passageiros horas antes do início das viagens com as tecnologias hoje disponíveis, nem exigir que o mesmo grupo de usuários usufrua do transporte nos trajetos de ida e volta. “Ninguém quer andar à margem da lei, mas a lei precisa nos dar condições para trabalhar”, resumiu Amilton Ferreira, presidente da Associação do Transporte Alternativo Complementar e Compartilhado do Estado.

Na mesma linha, o CEO da Buser, Marcelo Abritta, afirmou que a inovação está enfrentando a resistência de um sistema antigo, com a discussão de questões já superadas nos setores de telefonia, música e streaming, por exemplo. Segundo ele, a empresa oferece passagens com preços muito mais atrativos e oferece serviços de melhor qualidade.

O empresário garantiu que os seus ônibus são seguros e que não há precarização do trabalho. Ele também afirmou não haver subsídio cruzado nos contratos de concessão de linhas e se disse favorável à regulação de benefícios, como as gratuidades também no serviço de fretamento.

Empresas de ônibus preocupadas com concorrência desigual

A possibilidade de liberação da concorrência do serviço regular de ônibus com os fretamentos preocupa a Confederação Nacional do Transporte (CNT). Segundo o consultor jurídico da entidade, Thiago Barra de Souza, as empresas concessionárias são obrigadas por contrato a operar linhas economicamente inviáveis e administrar as gratuidades determinadas por lei, enquanto o Buser não tem essas obrigações. “Como falar em competição com essa assimetria?”, questionou.

Os representantes de sindicatos dos rodoviários, por sua vez, querem que o PL 1.155/15 assegure os direitos trabalhistas da categoria. “Estamos juntos na luta para garantir emprego e trabalho para todos, seja no fretamento ou no transporte regular”, afirmou o presidente da Federação dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários (Fettrominas), Erivaldo Adami da Silva.