Convidados são contra o projeto, mas parlamentares divergem sobre o teor da proposta do governo estadual
Para representante da Arsae, projeto não gera grandes mudanças
Mudança na lei do saneamento básico preocupa por receio de afetar custo da tarifa

Novo marco de saneamento recebe críticas em audiência

Participantes pedem mais debates sobre PL que modifica a Arsae, temem aumento de tarifas e riscos a agências regionais.

06/05/2021 - 19:06

Aumento do custo de tarifas e poder excessivo nas mãos da Agência Reguladora de Servicos de Abastecimento de Água e de Esgotamento Sanitário do Estado (Arsae-MG). Essas foram algumas das preocupações manifestadas na audiência da Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada nesta quinta-feira (6/5/21).

A comissão debateu os impactos do Projeto de Lei (PL) 2.274/20, de autoria do governador Romeu Zema, que altera a Lei 18.309, de 2009, que estabelece normas relativas à regulação e aos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Estado.

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

A proposição do Executivo inclui a distribuição de gás canalizado no rol de competências da Arsae e modifica a abragência, a vinculação e as funções regulatória, fiscalizatória e sancionatória da agência. Além disso, colocaria em risco a autonomia e a sobrevivência das outras agências reguladoras regionais existentes no Estado.

A deputada Beatriz Cerqueira (PT), coautora do requerimento para a reunião, considera que o projeto tem por objetivo criar atrativos para a privatização do serviço de saneamento e ofertar o gás canalizado para o mercado. Ela também alerta que a mudança de parâmetros da tarifação abre possibilidade de aumento do serviço para a população.

A deputada criticou, ainda, a transferência da Arsae da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad) para a Vice-governadoria. Segundo a parlamentar, toda autarquia é ligada a alguma secretaria e essa desvinculação tira da agência o papel de controle.

“Como o governo não consegue trazer o debate direto da privatização, está atuando pela gestão, fazendo alterações na legislação que possibilitem que o setor privado avance naquilo que tem que ser do serviço público”, advertiu. Ela informou que vai solicitar mais debate sobre a proposição, pela Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO), para onde segue o projeto.

O deputado Professor Cleiton (PSB), também autor do requerimento, questionou vários pontos do PL. Entre os riscos apontados, destacou a possibilidade de aumento das tarifas, entre outros prejuízos ao interesse público, sobretudo para a população economicamente mais vulnerável. Ele criticou a “ampliação monstruosa de competências da Arsae”, bem como o excesso de autonomia da agência, que avaliou como “aberração jurídica”.

Professor Cleiton lembrou, ainda, que a Copasa registrou um lucro, em 2020, de R$ 816,4 milhões, com uma alta de 8,2% em relação ao período anterior. Ele relatou que a autarquia dividiu 25% do lucro líquido entre os acionistas e questionou por que a empresa não investiu o excedente na ampliação e melhoria do serviço prestado.

A deputada Ana Paula Siqueira (Rede) foi outra parlamentar a registrar “muitas preocupações” com o teor da proposta e o excesso de autonomia que seria permitida à Arsae. Nesse ponto, ela lembrou recente decisão do presidente da agência, que teria se recusado a reformular a tarifa social. A parlamentar também quer que a proposição seja mais discutida e disse esperar que a ALMG “faça as mudanças necessárias na matéria”.

Convidados consideram proposta inconstitucional

Na visão de José Afonso Alencar, diretor da Unelagos - Furnas e Peixoto, o texto do projeto cria uma “agência reguladora irregulável, o que é uma excrescência do ponto de vista jurídico”.

Marlon Barbosa, consultor jurídico de regulação do Consórcio Intermunicipal de Saneamento Básico da Zona da Mata (Cisab), também criticou a legalidade da proposta, sobretudo no que tange à ampliação de alcance da Arsae e à sua imposição aos municípios, em detrimento das agências regionais.

Esmeraldo Santos, Rodopiano Evangelista e Francisco Lopes, da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento da Regional Minas Gerais (Assemae), entidade que representa cerca de 2 mil municípios e agências que cuidariam de 25% dos serviços de saneamento do Estado, também foram críticos ao teor da proposta.

Para Esmeraldo Pereira e Rodopiano Evangelista, o PL “fere o pacto federativo”. Francisco Santos ressaltou a possibilidade de acionar a Justiça caso a proposta passe na Assembleia com os problemas registrados.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Estado (Sindágua), Eduardo Oliveira, também avaliou que o projeto está voltado à privatização do setor de água e esgoto no Estado.

Deputada defende projeto e gestor justifica transferência da autarquia

Ao enfatizar que é servidora de carreira da Arsae, a deputada Laura Serrano (Novo) defendeu a proposta e o papel proposto para a agência. Para ela, a aprovação do projeto deve ampliar a abrangência dos serviços de saneamento e água tratada no Estado.

A parlamentar abordou o conceito de “modicidade tarifária” constante na matéria, que, segundo ela, visa a permitir a prestação dos serviços de forma universalizada, com melhoria da eficiência operacional e equilibrando os valores das tarifas. Laura Serrano observou que atualmente não há água tratada para 20% da população mineira e que cerca de 40% das pessoas não possuem saneamento básico.

De acordo com a deputada, a prestação desses serviços pela Copasa não cumpre a universalização necessária. “É preciso soluções diferentes para chegar a resultados melhores”, avaliou. Ela acredita que o novo marco vai garantir a universalização, viabilizando a prestação dos serviços com qualidade para todos.

Já o agente de Fiscalização dos Serviços da Arsae, Elbert Santos, considerou “normal” a transferência da autarquia para a Vice-governadoria, considerando a inclusão em suas atribuições do gás canalizado. Segundo ele, o gás “vai além do meio ambiente”, o que justificaria a saída da Semad.

Ele salientou que o PL 2.274 não faz grandes mudanças na lei já em vigor e traz instrumentos para aprimorar a regulação da prestação dos serviços da empresa. “O principal foco é a melhoria da prestação de serviço de forma justa, equânime e para contribuir com a qualidade de vida da população e do meio ambiente”, afirmou.