Janaína Almeida disse que a vacinação dos trabalhadores da SES foi feita a partir das doses que compunham a reserva técnica do Estado
Depoimentos mostram divergência sobre responsabilidade da lista de vacinados fora da prioridade

PBH não foi procurada para vacinar servidores da SES

Possibilidade de que vacinação fosse realizada pelo município foi cogitada pela secretaria, mas não foi adiante.

04/05/2021 - 17:40

Apesar de a área técnica da Secretaria de Estado de Saúde (SES) ter cogitado informalmente a possibilidade de que os servidores administrativos do órgão fossem vacinados pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), a tratativa com o município teria sido negada, também de maneira informal, por decisão colegiada no âmbito do governo estadual.

A informação foi trazida pela diretora de Vigilância de Agravos Transmissíveis da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais, Janaína Fonseca Almeida. Ela foi ouvida na condição de investigada, nesta terça-feira (4/5/21), pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Fura-Filas da Vacinação, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), assim com também a ex-assessora-chefe de Comunicação Social da SES, Virgínia Cornélio da Silva.

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

Questionada pelo presidente da CPI, deputado João Vítor Xavier (Cidadania), sobre quem no governo estadual teria vetado informalmente a realização do contato com a PBH para que a vacinação dos servidores da SES fosse feita pelo município, a diretora de Vigilância de Agravos Transmissíveis informou o nome do responsável por escrito, devido à Lei Geral de Proteção de Dados. Após a leitura do documento, o parlamentar apontou que a negativa teria acontecido no âmbito do gabinete do secretário estadual de Saúde.

Conforme Janaína Almeida, a conversa ocorrida informalmente no governo acabou definindo que seria seguida a outra possibilidade, que era a vacinação dos servidores na Rede de Frio da SES, segundo ela, com o objetivo de não sobrecarregar o município de Belo Horizonte.

A diretora apontou que, com essa definição, a vacinação dos trabalhadores da SES foi feita a partir das doses que compunham a reserva técnica do Estado. Ela explicou que a reserva é feita com a separação de 5% de todas as remessas de vacinas encaminhadas pelo Ministério da Saúde e é destinada aos municípios para a reposição de perdas técnicas, roubos e problemas com a temperatura de armazenamento das doses.

João Vítor Xavier criticou a vacinação não ter ocorrido através da PBH e lembrou que, de acordo com o Plano Nacional de Imunização, as vacinas devem ser aplicadas pelos municípios. No seu entender, a utilização da reserva legal não deveria ter acontecido, já que vacinação de servidores não estaria entre uma das suas destinações.

Registro das doses – Janaína Almeida disse que, apesar de a vacinação não ter ocorrido através da PBH, o município tinha conhecimento e possibilitou o acesso ao sistema SCPA, do Ministério da Saúde, para que a aplicação das doses fosse registrada. Ela defendeu que o registro de todas as doses aplicadas, com nome dos servidores vacinados, indica a transparência do processo.

Esse sistema a que a servidora se referiu é o Sistema de Cadastro e Permissão de Acesso do ministério. Janaína informou que a coordenação municipal de imunização deu à coordenação estadual da Rede de Frio acesso para esse lançamento das doses aplicadas. Para isso, a vacinadora que aplicou as doses na Rede de Frio criou seu perfil e senha no SCPA.

Questionada pelo deputado Roberto Andrade (Avante) se a PBH em algum momento fez alguma objeção à realização dessa vacinação, Janaína Almeida esclareceu que a operacionalização da vacinação dos servidores diretamente pela SES já havia sido realizada em outras campanhas de vacinação e ressaltou que não há dificuldades no tratamento entre as áreas técnicas da secretaria e do município.

Indagada pelo deputado Sargento Rodrigues (PTB) sobre quem na PBH teria fornecido o acesso da SES ao sistema de vacinação, ela forneceu a informação por escrito. Sem esse acesso, frisou, a vacinação não poderia ser viabilizada.

Nesse contexto, Sargento Rodrigues e o deputado Zé Guilherme (PP) defenderam que a PBH seja escutada pela CPI, para que essas dúvidas sobre as tratativas com o município sejam esclarecidas.

SES não realizou uma análise das listas de servidores a serem vacinados

Outro ponto de destaque do depoimento foi a informação de que a SES não teria feito uma análise qualitativa das listas de servidores a serem vacinados definidas por cada chefia da pasta. A falta dessa análise foi duramente criticada pelos deputados, que apontaram que esse fato acabou por possibilitar que a ordem de prioridade definida pelo Memorando 7 da SES não fosse corretamente seguida.

Questionada pelo relator, deputado Cássio Soares (PSD), se ela era responsável por essa análise, Janaína Almeida explicou que era responsável por uma filtragem quantitativa, na qual selecionava os servidores a serem vacinados a partir das listas enviadas por cada chefia da SES, de acordo com o número de doses disponíveis.

Ela afirmou que seu papel era apenas definir as datas da vacinação dos servidores que constavam nas listas encaminhadas, seguindo os critérios do Memorando 7, que colocava, por exemplo, em primeiro lugar os servidores da Rede de Frio.

A diretora reforçou que sua função não era avaliar qualitativamente os servidores presentes nas listas e que essa análise não foi feita pela SES, já que seria de responsabilidade de cada chefia seguir os critérios definidos pelo memorando e elaborar a lista com os servidores aptos a receberem as doses.

Os deputados Cássio Soares, João Vítor Xavier e Cristiano Silveira (PT) criticaram a falta de uma análise geral das listas pela secretaria. Para Cássio Soares, essa falha na triagem acabou por permitir que a ordem do memorando fosse invertida.

Aeroporto – Outro questionamento do deputado Cássio Soares abordou a aplicação de 35 doses que restaram das vacinas que foram aplicadas pelo Governo do Estado em evento no Aeroporto de Confins, que celebrou a chegada da primeira remessa em Minas.

Janaína Almeida respondeu que, após a realização do evento, foi constatada que as doses restantes nos frascos utilizados haviam sofrido mudança de temperatura e, dessa forma, para não correr o risco de ter que descartá-las, optou-se por aplicá-las. Foram vacinados então 35 servidores que estavam trabalhando na Rede de Frio na noite daquele dia, inclusive ela.

Ex-assessora nega indicação apontada em áudio

Para o presidente da CPI, nem todas as chefias da SES teriam competência para avaliar tecnicamente os critérios e montar a lista de servidores aptos a se vacinarem, como a diretora de Vigilância de Agravos Transmissíveis disse ter ocorrido.

Janaína Almeida argumentou que a montagem da lista não exigiria um conhecimento técnico, já que era apenas uma classificação sobre a função dos servidores, como quem exerce trabalho de campo ou quem estava trabalhando presencialmente ou não.

Já a ex-assessora-chefe de Comunicação Social da SES, Virgínia Cornélio da Silva, considerou, em depoimento dado após a fala de Janaína, que uma análise qualitativa e técnica das listas seria importante, mas em resposta à comissão disse desconhecer se isso teria sido feito.

Ela acrescentou que o setor mais apto a proceder a essa análise seria a Subsecretaria de Vigilância em Saúde. A Vigilância de Agravos Transmissíveis está subordinada a esta subsecretaria.

A ex-assessora da pasta foi indagada sobretudo sobre a indicação à vacinação de servidores da Comunicação que estariam em home office, o que ela negou.

Áudio vazado - Esse fato questionado veio à tona em reunião com outros servidores da pasta realizada em abril, que teve seu áudio vazado para a imprensa. No aúdio, o então chefe de gabinete da SES, João Márcio de Pinho, teria se dirigido a dois servidores que estavam em home office, dizendo que eles constavam na lista enviada para vacinação como se estivessem em trabalho presencial, por indicação da ex-assessora.

Virgínia disse que estranhou a menção no aúdio, pois se tratariam de servidores em escala híbrida de trabalho, atendendo a revezamentos para suprir as demandas da pasta. As folhas de ponto dos servidores foram entregues por requisição à CPI.

Em respostas a outros questionamentos do presidente, a ex-assessora disse que a ordem enviada às diversas chefias para fazer as listagens chegou da Subsecretaria de Vigilância em Saúde, por meio da diretoria de Agravos Transmissíveis. Segundo ela, foi pedida simplesmente a lista dos servidores assinalando o regime de trabalho.

Como a informação era a de que todos os da área de saúde seriam vacinados, Virgínia disse que listou todos os 33 servidores da Comunicação, efetuando várias marcações na planilha junto aos nomes de todos aqueles que estavam na escala híbrida.

Escala de trabalho entregue ao MP teria sido alterada

A ex-assessora de comunicação informou ao presidente da comissão que, sob sua chefia, apenas quatro dos 33 servidores do setor estavam integralmente em teletrabalho. Os demais se revezavam entre home office, trabalho presencial ou de campo, conforme teria assinalado na planilha.

Ela se disse surpresa ao ter conhecimento de que a lista da Comunicação enviada pela SES ao Ministério Público não teria seguido as suas marcações originais sobre o revezamento, nela constando apenas se o trabalho seria presencial ou teletrabalho.

Virgínia também afirmou que não houve uma conversa com qualquer setor da SES sobre a ordem em que a vacinação ocorreria dentro da lista de cada área. 

Em resposta ao relator, ela ainda disse ter sido exonerada sob a justificativa de que o novo titular da pasta chegou já com uma equipe com a qual trabalhava há anos.

Vacinação de secretário - Sobre o fato de o secretário anterior, Carlos Eduardo Amaral, ter se vacinado em fevereiro, dizendo depois que o fez para dar o exemplo à população sobre a importância da imunização, Virgínia relatou que em nenhum momento a Comunicação foi acionada para dar publicidade ao fato, seja antes ou após a vacinação.

O deputado Roberto Andrade (Avante) ainda questionou Virgínia sobre quais os demais itens constavam na planilha para determinar a ordem daqueles que seriam vacinados. Segundo ela, constavam dados como o nome e o CPF do servidor, se fazia parte da Rede de Frios, se ia a campo, se tinha mais de 60 anos, se trabalhava presencialmente e se pertencia ao núcleo de transportes, entre outros critérios.

O parlamentar também perguntou se a ex-assessora-chefe chegou a cobrir, divulgar ou ter conhecimento de encontros ou reuniões do então secretário de Saúde com a Prefeitura de Belo Horizonte, para tratar de assuntos da área. Ela disse se lembrar de várias prefeituras se reunirem com o secretário, mas que não se recordava de nenhuma reunião com a PBH.

Ofício - Ao final da reunião, foi aprovado requerimento, de autoria do presidente da comissão e do relator, para envio de ofício à SES pedindo informações, a serem prestadas no prazo de cinco dias úteis, sobre os servidores do nível central da SES, da Superintência Regional de BH e da Fundação Hospitalar do Estado (Fhemig) que receberam a vacina contra a Covid-19 antes de 17 de fevereiro deste ano, data de assinatura do Memorando-Circular nº 7.