Secretário veio à ALMG, mas não convenceu os parlamentares de que a cogestão é a melhor opção
Durante a reunião, dezenas de agentes se manifestaram do lado de fora da ALMG
Proposta de cogestão de sistema socioeducativo divide opiniões

Modelo de cogestão em unidades socioeducativas é rejeitado

Servidores temem sucateamento, e comissão quer esclarecimentos do MP. Deputado diz que Legislativo pode barrar processo.

03/11/2020 - 16:10

Durante audiência da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), nesta terça-feira (3/11/20), deputados afirmaram que não aceitam a ampliação do modelo de cogestão no sistema socioeducativo do Estado, como proposto pelo governador Romeu Zema, em editais publicados recentemente. O presidente da comissão, deputado Sargento Rodrigues (PTB), garantiu que o Legislativo pode impedir que o processo siga adiante.

Desta vez, o secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública, Mário Lúcio Alves de Araújo, esteve presente para tentar esclarecer as dúvidas sobre o assunto, mas não conseguiu convencer os demais participantes. Servidores efetivos do socioeducativo e representantes de sindicatos voltaram a criticar a cogestão que, segundo eles, vai sucatear o sistema, prejudicar os adolescentes internos, os servidores efetivos e os contratados pelo Estado, que já estão em serviço há vários anos.

Consulte o resultado e assista ao vídeo completo da reunião.

O secretário voltou a afirmar que entregar a administração de mais 12 unidades socioeducativas para entidades não governamentais foi a única forma encontrada pelo governo para não ter que fechá-las e reduzir drasticamente o número de vagas no sistema. A decisão do governo se baseia numa Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) que questiona as contratações temporárias no Estado e obriga que os contratados sejam afastados até fevereiro de 2021.

Mário Lúcio Alves disse que não se trata de terceirização. Mas, admitiu que todas as funções hoje exercidas pelos servidores efetivos ou pelos contratados temporariamente pelo Estado serão exercidas por funcionários das organizações. Os efetivos seriam remanejados para outras unidades, em outras cidades.

Segundo ele, em Minas 15 unidades já operam no sistema de cogestão com entidades do terceiro setor. Com os novos editais, mais seis centros de ressocialização de Belo Horizonte e outros em Sete Lagoas (Central), Ipatinga (Vale do Aço), Araxá (Alto Paranaíba), Unaí (Noroeste), Uberaba e Tupaciguara (ambas no Triângulo) passariam também a ser administradas da mesma forma, assim que o processo de seleção for concluído.

Desdobramentos - Como desdobramento da audiência, os deputados aprovaram requerimento para visita ao Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Público, em Belo Horizonte, para debater sobre os critérios de cogestão no sistema socioeducativo no Estado, em face da atribuição de controle externo daquele órgão.

Atividades são de natureza indelegável, na opinião dos parlamentares

Os deputados Sargento Rodrigues e João Leite (PMDB) se revezaram ao microfone apresentando motivos pelos quais são contrários à proposta. Citando várias legislações afetas ao tema, Sargento Rodrigues afirmou que não é possível transferir para uma Organização da sociedade civil o trabalho de vigilância, segurança e ressocialização de menores infratores.

João Leite disse que, por sua postura política social democrata, até aceita que algumas coisas feitas pelo Estado possam ser delegadas, desde que sejam muito bem fiscalizadas, com muito cuidado e com a participação do Legislativo. As atividades do sistema socioeducativo, no entanto, não estariam entre essas atividades passíveis de terceirização. "Assim com o Exército e a Polícia Militar são indelegáveis, assim também é o socioeducativo", disse o deputado ao secretário, que também é major do Exército.

A deputada Ana Paula Siqueira (Rede), que coordena a Frente Parlamentar de Defesa da Criança e Adolescente da ALMG, citou uma série de premissas da política do sistema socioeducativo em relação aos menores que cometeram infrações, como o direito a atividades de ressocialização, incentivo ao estudo e contato com a família, que seriam prejudicadas, caso o Estado continue entregando a administração para terceiros. A deputada reafirmou a posição da Comissão de Direitos Humanos, que também é "fortemente contrária à cogestão".

Uso da força - Outro alerta feito pelo deputado Sargento Rodrigues diz respeito às medidas de contenção do adolescente que cometeu ato infracional, quando necessário. "O Estado tem o monopólio legal e legítimo do uso da força, isso não pode ser delegado de maneira nenhuma a uma entidade privada", acrescentou.

O subsecretário de atendimento socioeducativo da Secretaria de Segurança Pública, Bernardo Pinto Coelho Naves, garantiu que, quando necessário o uso da força, a Polícia Militar será acionada. Mas Sargento Rodrigues alertou: "Nos centros de adolescentes infratores também têm rebeliões, agressões e até reféns. Não dá tempo pra chamar polícia. Os agentes tem que atuar, pra defender a própria vida", exclamou.

Também o deputado Hely Tarqüínio (PV), que preside a Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária da ALMG, fez questão de se manifestar contrariamente à entrega das unidades para entidades não governamentais. “Sou contra qualquer tipo de privatização. E é assim que começam, devagarinho, com esses tipos de parcerias com entidades”, comentou.

Esclarecimentos - Ao final da reunião, foi aprovado, ainda requerimento de autoria dos deputados Sargento Rodrigues, João Leite e Gustavo Santana (PL), para que seja encaminhado ao secretário de Estado de Justiça e Segurança Pública novo pedido de informações sobre quais estatutos legais ou fundamentos jurídicos embasam a aplicação do modelo de cogestão, no sistema socioeducativo no Estado.

Os parlamentares ainda querem saber, com o detalhamento possível, as razões pelas quais a administração pública adota tal política de cogestão, bem como as formas de remuneração das entidades e os custos contratualmente previstos por adolescente atendido no modelo de cogestão, assim como os custos atuais na prestação do serviço pela administração direta.