Educar contra o machismo ajuda a combater violência à mulher
Debate na ALMG aponta a agressão como instrumento de dominação. Brasil é o 5° país no ranking mundial de feminicídios.
25/11/2019 - 19:30 - Atualizado em 26/11/2019 - 12:57Investir na educação contra o machismo tem uma importância fundamental na luta contra a violência à mulher. Essa foi uma conclusão apresentada durante audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizada nesta segunda-feira (25/11/19). A reunião marcou o dia latino-americano e caribenho contra a violência à mulher.
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Coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres, Bernadete Esperança Monteiro lembrou que o Brasil está em quinto lugar no ranking mundial de feminicídios e acusou o Governo do Estado de “maquiar dados”, por não estar mantendo as políticas para as mulheres.
“É a mulher negra que mais sofre. E a violência é um instrumento para manter a dominação das mulheres, manter as coisas como estão. Precisamos pensar no recorte racista, patriarcal e capitalista, numa política pública que atenda a mulher favelada”.
Bernadete enfatizou que as agressões têm por finalidade constranger as mulheres a voltar ao espaço privado.
“Precisamos de uma educação que não seja sexista, como a atual. É onde está a nossa possibilidade de transformação social. Seja nas escolas, onde quer que seja. Essas relações de poder precisam ser discutidas. E preciso dizer a todas as mulheres: quando um homem quer controlar sua vida e seu corpo não é ciúme nem cuidado, é violência. Estupradores não são doentes. Mulheres não são estupradas por causa da roupa ou de onde estão. É um exercício de poder”, explicou.
Autonomia poderia romper ciclo de violência
A coordenadora do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, Patrícia Habkouk, reforçou a necessidade de se fomentar ações para reavaliar o papel dos homens e das mulheres na sociedade.
“Temos muitos desafios pela frente num Estado tão grande e com tantas realidades como Minas Gerais. Acreditamos na Maria da Penha e na lei do Feminicídio. Mas só as leis não resolvem”. Ela reforçou a necessidade de pensar em formas de dar autonomia às mulheres, para romperem com o ciclo de violência.
A defensora pública do Núcleo de Defesa dos Direitos da Mulher em Situação de Violência (Nudem) da Defensoria Pública de Minas Gerais, Samantha Vilarinho Mello Alves, frisou que o machismo e o racismo perpassam todas as camadas da sociedade.
“A mulher negra não acessa nossos serviços. Ela já sofre muitas opressões então não procura ajuda, vai suportando. Por isso, quando ela acessa algum serviço nosso, precisamos estar capacitados. Estava no (hospital) Sofia Feldman fazendo treinamento porque, se os serviços de saúde não souberem o básico, a mulher vai embora sem saber pelo que passou e como vai lidar com isso. Esse cuidado tem de extrapolar as delegacias”, lembrou.
Membro do Movimento dos Atingidos por Barragens, Joelisia Moreira Feitosa enfatizou que as mulheres foram as maiores vítimas na tragédia de Brumadinho, que completou 10 meses na data da reunião. Elas estão muito mais vulneráveis, mas, ao mesmo tempo, também são as mais mobilizadas e organizadas em coletivos pelas vítimas.
“O governador deveria trabalhar para proteger e defender os cidadãos e cidadãs, mas, ao invés disso, deu entrevista hoje falando que relembrar o crime é voltar ao passado. Ficamos muito revoltados com isso porque em 300 dias ninguém foi preso, o rio Paraopeba não foi recuperado, não temos acesso à água limpa para beber ou cozinhar. Nossas crianças estão doentes. E a Vale nem reconhece muitos de nós como vítimas. Às vezes parece que nós que somos os criminosos”, revoltou-se.
Comportamento feminino não pode justificar agressões
Autora do requerimento para a realização da reunião, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) enfatizou que os agressores são eficazes em usar o psicológico para ferir as mulheres, em formas mais traiçoeiras de violência. “A escola seria um lugar importante para educar os meninos e ter essa conversa. Precisamos desconstruir essa cultura machista de que o comportamento das mulheres justifica os mais diversos tipos de agressões, que não deixam o corpo roxo, mas machucam a alma”.
A deputada Andréia de Jesus (Psol) lembrou a história das três irmãs Mirabal, assassinadas em 25 de novembro de 1960 pela polícia da República Dominicana, e que inspiraram o dia de luta contra a Violência contra a Mulher. “Elas lutaram por direito à moradia e educação. Observamos essa mesma luta ainda hoje nas trabalhadoras do campo e da cidade, que não tiveram seus esforços reconhecidos ainda”, ponderou.
A deputada Leninha (PT) lamentou que Minas Gerais seja o único Estado em 2019 onde os casos de feminicídios cresceram, fora os casos subnotificados. “Não é possível ter delegacias que não atendem no fim de semana, quando os companheiros bebem e ficam mais violentos. Sem falar da segunda violência pela qual as vítimas passam, de ir denunciar e não receber o atendimento adequado. E, sim, o debate na educação é fundamental, temos de ensinar as relações de respeito com quem é diferente e abordar isso desde cedo para romper com o ciclo de violência”, completou.