Coletivos de hip hop combatem machismo e racismo
Em reunião nesta quinta-feira (21), mulheres da cultura hip hop falam sobre avanços e desafios para reconhecimento.
21/11/2019 - 16:12Mulheres envolvidas com a cultura hip hop falaram, em audiência pública na manhã desta quinta-feira (21/11/19), sobre as dificuldades para ocupar esse espaço majoritariamente masculino e sobre como a organização delas ajuda a construir locais de diálogo sobre políticas públicas. A reunião foi realizada pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). Questões ligadas a discriminações que cruzam questões raciais e de gênero deram o tom do debate.
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Formada a partir de quatro elementos artísticos, a cultura hip hop abarca a música (DJs), a rima (MCs), as artes plásticas (grafite) e as danças (break). Quem fez essa conceituação foi a cantora e produtora cultural Ildslaine Mônica da Silva, conhecida como Sharylaine. Parte da cultura hip hop em São Paulo desde a década de 1980, Sharylaine conta que, na época, ela não percebia o machismo nos espaços que frequentava.
Segundo ela, os homens que a cercavam a incentivavam. Até que ela percebeu que os produtores culturais só procuravam os homens e só eles conseguiam lançar seus discos e se promover. “Muitas vezes, as mulheres só entendem como violência o que corta e sangra, mas existem muitos outros tipos de violência”, disse, ressaltando a importância da criação de coletivos feministas dentro do hip hop, que acabam discutindo questões muito além da cultura.
Segundo ela, essa organização começou no início da década de 1990 e culminou com um evento batizado “Minas da Rima”, do qual participaram mulheres de 11 estados brasileiros.
A organização prosseguiu até que, em 2010, em um novo encontro nacional, foi aprovada uma Carta de Intenções, que trouxe, como uma das diretrizes, a criação de uma Frente Nacional de Mulheres do Hip Hop, que teria entre as suas prioridades a discussão de políticas públicas.
Luciana Arruda, coordenadora da Frente em Minas Gerais, conta que, a partir da criação desses coletivos, as integrantes passaram a ter diálogos sobre outras situações semelhantes que permeavam suas vidas, como violências domésticas. Assim, elas criaram redes de apoio para ajudar as vítimas, o que ressalta a importância dos encontros – virtuais ou reais. Ela é mais conhecida como Miss Black e conta que conheceu a cultura há cerca de 20 anos, quando começou a fazer “back vocal” em um grupo de homens.
Incentivar o hip hop feminino implica em combater o machismo e o racismo
As políticas públicas discutidas nesses espaços abarcam temas como a cultura, segurança, educação e economia. Uma das preocupações das deputadas presentes foi entender como podem ser construídas políticas públicas que atendam a esses grupos.
A deputada Andréia de Jesus (Psol) ressaltou que uma das suas preocupações é sobre a necessidade de avançar no reconhecimento do hip hop, que, como parte da cultura negra, ainda é perseguido por ações policiais que não aceitam suas manifestações, como o grafite.
A parlamentar afirmou que alguns avanços já foram feitos, mas ainda é pouco. Ela lembrou da Semana do Hip Hop de Belo Horizonte como exemplo de avanço.
As convidadas reconheceram a importância desse espaço, mas lembraram que a Semana ajuda a avançar no reconhecimento do Hip Hop, mas esse segue sendo um espaço machista. Segundo Stefanny Jéssica Geraldo, do Coletivo Flores do Beco, ao longo das comemorações dessa semana em 2019 foram 36 homens se repetindo em apresentações, enquanto apenas seis mulheres se apresentaram.
Uma das dúvidas colocadas pela deputada Marília Campos (PT), autora do requerimento que deu origem à reunião, foi como incentivar a cultura hip hop e as mulheres nessa cultura sem institucionalizar e, assim, enfraquecer as manifestações.
Sharylaine falou sobre a importância dessa preocupação e exemplificou com um Projeto de Lei apresentado na Câmara Federal pelo deputado Romário que, entre outras coisas, proibia menores de 16 anos de praticarem a cultura e estabelecia um número de horas semanal máximo de trabalho para os DJs.
Políticas construídas coletivamente, porém, podem ajudar e são bem-vindas, como ressaltado pelas convidadas. Uma das necessidades é mapear os coletivos, as atividades e, assim, ajudar a distribuir recursos e apoios pelos territórios periféricos das cidades e dos estados.
Defensoria – A defensora pública Samantha Vilarinho Alves participou da audiência e falou sobre a interseccionalidade – o cruzamento de questões ligadas a gênero, raça e classe que levam mulheres diferentes a vivenciarem problemas diferentes.
Falou, então, do seu constrangimento de ser uma mulher branca na audiência, presença que se dá pela baixa representatividade das negras no órgão que representa. E, assim, ressaltou a importância de se compreender os contextos específicos para que as políticas públicas atendam as mulheres na totalidade das suas necessidades.
Estatísticas - Em uma manhã na qual foi debatida a necessidade de se conhecer a realidade das diferentes mulheres mineiras para que seja possível construir políticas públicas que as ajudem a superar desigualdades de gênero, a comissão aprovou parecer favorável ao Projeto de Lei (PL) 689/15, que pretende ser um passo nesse sentido. De autoria da deputada Marília Campos (PT), o texto autoriza o Estado a criar um banco de dados atualizado destinado a dar publicidade a informações relativas à condição da mulher no Estado.
A proposição elenca uma série de informações estatísticas que deverão compor essa base de dados, tais como o nível de emprego formal das mulheres, por setor de atividade; e o número de vítimas de violência física, sexual ou psicológica. O PL tramita em 2º turno e o parecer da deputada Andreia de Jesus foi pela aprovação na forma do Vencido.