Copasa se isenta de contaminação da água em Betim
Estudos independentes apontam outra realidade e moradores relatam problemas de saúde em decorrência do desastre da Vale.
19/11/2019 - 23:44Relatos de casos de diarreia, disenteria e vômitos entre crianças e adultos além da proibição do consumo de alimentos plantados na região do bairro Citrolândia, em Betim (Região Metropolitana de Belo Horizonte), foram denunciados em audiência da Comissão de Direitos Humanos realizada na noite desta terça-feira (19/11/19), que ouviu os moradores atingidos pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. Apesar de estar fora da área considerada atingida pelo desastre na percepção da empresa, a área é abastecida por sistema de captação do Rio Paraopeba.
Os moradores denunciaram também que a Vale pretende cortar a ajuda emergencial de dois salários mínimos por morador em áreas que não considere diretamente impactadas, além de já ter cortado o fornecimento de água mineral aos moradores da região.
Enquanto análises feitas pela empresa teriam atestado a qualidade da água fornecida pela Copasa aos moradores, estudos independentes feitos por técnicos contratados pelo Movimento de Atingidos por Barragens mostraram outra realidade.
Integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Thomaz Nedson Farias Pereira da Silva e Michelle Regina de Paula Rocha endossaram as denúncias dos moradores. De acordo com Michelle, a Vale suspendeu a entrega de água em Citrolândia e a comunidade não sabe a quem recorrer. “As plantações estão sendo regadas com essa água e a contaminação é exportada. Não temos nenhuma resposta da promotoria de justiça nem do Ministério Público quanto a isso. E eu não posso comer as jabuticabas do meu quintal porque moro próximo do rio Paraopeba”, revoltou-se.
Thomaz contou que o MAB fez dois estudos independentes para comprovar a contaminação da água e que essa contaminação teve origem no crime cometido pela Vale. “A empresa se nega a contratar assessoria técnica porque sabe que tem culpa. Em Barra Longa, comprovamos contaminação nos alimentos, peixe, e até leite com metal pesado. Isso é muito sério. E causa muitos problemas na saúde das pessoas”, explicou.
Ele protestou conta o corte da Vale à verba emergencial. “Nós sabemos que se tiver enchente do rio, a lama que está no fundo subirá para nossas casas. E essa lama é da barragem. Então estamos preocupados com as chuvas. Porque em caso de enchente não poderemos salvar nada”, enfatizou.
Metais na água - O biológo da Diretoria de Vigilância em Saúde da Secretaria Municipal de Saúde de Betim, Raimundo Loyola Júnior, explicou que a secretaria não tem competência para verificar diretamente a água do rio, só a de consumo direto, distribuída. Essa água fornecida foi analisada e cumpre os parâmetros previstos pelo Sistema Único de Saúde.
No entanto, sete pontos de cisternas monitorados que ficam próximos do rio Paraopeba, em Betim, tiveram taxas de ferro, manganês e chumbo acima do permitido, além da água estar turva. “O SUS precisava estar preparado para atender a essa demanda extra ocasionada pela Vale, e a empresa, por sua vez, deve ressarcir o SUS por ter causado isso. As doenças que ainda vão surgir, e sabemos que surgirão por causa de Mariana, sobrecarregarão o Sistema”.
Representando a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), Joaquim Braga tranquilizou a população ao afirmar que a Copasa está legalmente impedida de fornecer água do rio Paraopeba à população. Segundo ele, as ligações clandestinas são um grande problema em Citrolândia, cuja rede é enorme, composta por milhares de pontos.
“Questionem se vocês estão recebendo um produto diferente do que deveriam. Estamos fazendo mais de 500 análises por dia. E essa água tem de ser de qualidade. Vocês precisam ter caixa d'água nas casas de vocês para suprir por pelo menos 48 horas caso haja falta ou intermitência no fornecimento. Não é obrigado, mas é recomendado”, reforçou.
Joaquim afirmou também que a Copasa está na Justiça brigando para que a Vale faça as obras necessárias até dezembro de 2020, para que a região metropolitana não fique sem água por causa do rompimento da barragem.
MP orienta moradores em caso de enchentes
O promotor de Justiça e coordenador de Inclusão e Mobilização Social (Cimos), André Sperling Prado, criticou a Vale por tomar posições evasivas quanto aos crimes que cometeu. Ele recomendou que os moradores tirem fotos de seus pertences e suas casas, para terem provas, caso as casas sejam atingidas por enchentes nesse período de chuvas que se inicia.
“Isso seria uma forma de diminuir o prejuízo na Justiça. A Vale sempre apresenta provas. Tenham também. Eles querem vencer vocês pelo cansaço, tomem cuidado. Querem levar vocês ao limite e depois oferecer uma merreca e dizer que resolveram os problemas. E isso não pode acontecer”.
Autora do requerimento para a realização da reunião, a deputada Beatriz Cerqueira (PT) reforçou que, como o caso de Mariana mostra, quanto mais o tempo passa desde o desastre, mais doenças aparecem. Ela afirmou o compromisso da comissão de cobrar dos órgãos competentes análises sérias diretamente da água do rio Paraopeba, além de mais ações preventivas do governo de Minas contra as enchentes na região.