Servidores e usuários refutam OS na gestão hospitalar
Poder Executivo apresentou proposta durante reunião, mas profissionais da área dizem que não foram ouvidos no processo.
28/08/2019 - 14:48 - Atualizado em 28/08/2019 - 16:05Representantes do Poder Executivo, comandado por Romeu Zema (Novo), apresentaram a proposta de ceder a administração de hospitais da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) para Organizações Sociais (OS), durante reunião da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na manhã desta quarta-feira (28/8/19). Representantes de servidores e da sociedade civil que estiveram presentes, porém, refutaram a proposta e questionaram o modelo apresentado.
As organizações sociais, como define a Lei Federal 9.637, de 1998, que trata do assunto, são entidades privadas, sem fins lucrativos, com as quais o poder público estabelece parcerias, por meio de contratos de gestão, para fomento e execução de atividades dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde.
Em Minas, o assunto é objeto da Lei 23.081, de 2018, que dispõe sobre o Programa de Descentralização da Execução de Serviços para as Entidades do Terceiro Setor.
Os secretários estaduais de Saúde, Carlos Eduardo Amaral Pereira da Silva, e de Planejamento e Gestão (Seplag), Otto Alexandre Levy Reis, estiveram presentes e apresentaram a legislação e os estudos que devem dirigir a implantação do modelo em Minas Gerais.
Uma das grandes reclamações dos presentes é a falta de transparência da atuação do Poder Executivo, que, segundo alguns dos convidados, estava negando a existência desse projeto e, agora, deixa claro que ele está em andamento.
“Nós sabemos que a situação da Fhemig está ruim, aliás falamos isso há anos, e sabemos que são necessárias mudanças, mas nossas experiências e propostas precisam ser consideradas para encontrar soluções”, disse o presidente da Associação Sindical dos Trabalhadores em Hospitais de Minas Gerais (Asthemg), Carlos Augusto dos Passos Martins.
Ele refutou a proposta das OS nas administrações dos hospitais e disse que não se pode admitir que cada novo governo chegue com uma resposta milagrosa sem consultar quem trabalha no dia a dia dos hospitais.
Convidados questionam vários pontos da proposta
Além de cobrar participação dos servidores e usuários dos hospitais na construção de soluções para os problemas vividos pelo sistema de saúde, muitos dos convidados rebateram as colocações dos representantes do Poder Executivo sobre a proposta de gestão via OS.
Essas colocações foram, em grande parte, apresentadas pelo superintendente de parcerias com terceiro setor da Seplag, Eduardo Campos. Segundo ele, uma das vantagens do modelo de gestão por OS seria a desburocratização dos processos de compras de insumos, já que na gestão pública todas precisariam passar por licitações e processos longos para serem concluídas.
Carlos Martins, da Asthemg, porém, ressaltou que o problema da falta de insumos nos hospitais da Fhemig – de injeções a remédios – não se dá em razão de burocracia, mas sim de falta de repasses financeiros. “Se não tem manutenção de um prédio hoje é porque a empresa não foi paga antes e agora se recusa a prestar o serviço. O problema não é a forma de contratação”, disse.
Além disso, ao negar que os hospitais serão privatizados, Eduardo Campos disse que apenas a gestão será feita por OS, de forma que as unidades de saúde continuarão públicas e prestando serviços para o SUS.
Ele afirmou, ainda, que as instituições serão escolhidas entre aquelas com pelo menos dois anos de experiência na área da saúde e que o critério não será o de menor custo, como acontece em outros processos desse tipo, mas sim por medições acerca da qualidade do atendimento proposto.
O diretor de mobilização do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais, Cristiano Túlio Albuquerque, porém, afirmou, na mesma linha do colega da Asthemg, que o problema dos hospitais não está na sua gestão, mas, de novo, no financiamento. “O recurso não chega hoje, porque vai chegar para as OSs?” questionou.
Para ele, não existem instituições no terceiro setor aptas a administrar hospitais públicos, enquanto no Estado esses gestores existem e são formados, por exemplo, pela Escola de Saúde Pública e pela Fundação João Pinheiro.
Servidores - Sobre os servidores da Fhemig, o representante da Seplag, Eduardo Campos, afirmou que eles terão todos os seus direitos garantidos e poderão optar por serem ou não cedidos para trabalhar nas OSs selecionadas. Carlos Martins, porém, questionou qual será o procedimento com aqueles que não aceitarem. “A opção será ir trabalhar longe ou mais longe?”, ironizou ao dizer que, a depender das opções, elas serão inviáveis para os servidores.
Minas Gerais é um dos últimos estados a aderir à gestão hospitalar por OSs
De acordo com a apresentação dos representantes do governo, Minas Gerais, Roraima e Acre são os únicos estados que não implementaram o modelo de gestão hospitalar via OSs, nem na rede estadual nem nas redes de saúde das capitais. Para Eduardo Campos, da Seplag, esse atraso foi favorável a Minas Gerais, que acumulou as experiências anteriores e, assim, editou uma legislação capaz de enfrentar os erros anteriores.
Muitos dos presentes, porém, ressaltaram que o modelo não funcionou em nenhum lugar onde foi implantado. Carlos Martins, da Asthemg, exemplificou que, no Espírito Santo, o governo estadual está analisando a possibilidade de criar uma fundação, nos moldes da Fhemig, para retomar a gestão dos hospitais hoje conduzidos por OSs, ao perceber que o modelo não funcionou.
O vice-presidente do Conselho Estadual de Saúde, Ederson Alves da Silva, disse que o conselho, que é a organização da sociedade civil que atua no controle social da saúde, já analisou e se pronunciou contrariamente à opção de entrega da gestão para as organizações sociais. Segundo ele, a proposta foi refutada em plenárias do Conselho.
Os deputados se diviram a respeito da proposta. Enquanto o presidente da comissão, deputado Carlos Pimenta (PDT), mostrou-se favorável, os deputados Professor Cleiton (DC) e Professor Wendel Mesquita (SD) pediram cautela.
Carlos Pimenta disse que o atual governo está tentando sanar os problemas deixados pela gestão anterior e, assim, merece crédito em sua proposta. Já Professor Cleiton e Professor Wendel Mesquita diseram que é preciso ampliar o debate, incluindo servidores e usuários dos hospitais da Fhemig.