Delegacia de Mulheres em Neves pede mais efetivo
Fortalecimento de rede de proteção e vara especializada sobre violência doméstica também são demandas.
29/05/2019 - 17:07Mais de cinco mil inquéritos estão atualmente em tramitação na Delegacia Especial de Crimes contra a Mulher, o Idoso e o Adolescente de Ribeirão das Neves (Região Metropolitana de Belo Horizonte). A maioria é de ameaça e lesão corporal em casos de violência doméstica contra a mulher, mas também há muitos de abuso sexual contra crianças e adolescentes.
Esse foi o quadro encontrado pelas deputadas Marília Campos (PT) e Andréia de Jesus (Psol), que participaram da visita técnica ao local realizada pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
O alto número de inquéritos em andamento, apresentado durante o encontro da manhã desta quarta-feira (29/5/19), é um dos indicativos ressaltados pela delegada Carla Amorim de que é necessário aumentar o efetivo.
Segundo ela, há apenas uma escrivã, que é responsável por todas as oitivas - com vítimas, testemunhas e agressores. A própria delegada também atende, em revezamento com outros colegas, outra delegacia da região que está sem titular.
Outro problema relatado é que a maioria dos investigadores é de homens, o que dificulta o trabalho, já que muitas das vítimas não se sentem confortáveis em serem atendidas por eles.
Carla Amorim destacou ainda que, ao contrário de outras delegacias, que se concentram nos crimes e nos agressores, ali o foco é no atendimento das vítimas e no seu encaminhamento para outros atores da rede, como psicólogos, para garantir sua retirada da situação de violência. Assim, seria necessário um treinamento específico aos investigadores, escrivães e delegados, o que não é oferecido pela Polícia Civil.
Rede de proteção precisa ser fortalecida não só com melhorias na delegacia
Entre os gargalos para melhor encaminhamento das situações estaria a inexistência, no município, de uma vara judicial específica para atender os casos de violência doméstica. A delegada Carla Amorim explicou que é comum, por exemplo, que o juiz conceda medidas protetivas, que determinam o afastamento do agressor da vítima, como procedimento de urgência e, assim, essa medida acaba extinta pouco tempo depois, sem que as ameaças tenham cessado.
O encontro desta quarta-feira (29) contou com a presença de outros atores da rede de proteção à mulher de Ribeirão das Neves, como psicólogas e assistentes sociais que atuam na área a partir da prefeitura. Segundo elas, já têm sido realizadas conversas com os representantes do Poder Judiciário, mas ainda de forma muito incipiente. Elas reivindicaram treinamento para os membros desse Poder de forma a garantir que eles entendam as especificidades das violências domésticas.
Agressão - Uma mulher que foi atendida na Delegacia durante a visita da comissão deu seu depoimento e contou que se mudou de Ribeirão das Neves com as filhas de 4 e 17 anos para fugir das agressões do ex-marido. Ele, porém, alegou alienação parental para reivindicar a guarda das crianças e o juiz da Vara da Infância a concedeu a ele. Agora, ela não pode nem visitar as filhas. Para lutar pela guarda novamente, precisou retornar a Ribeirão das Neves e voltou a ser agredida e ameaçada pelo ex-companheiro.
Diante do relato, os presentes ressaltaram que o município conta com apenas uma Vara da Infância, que funciona juntamente com a Vara de Sucessões. Dessa forma, os juízes que atuam na área estão sempre sobrecarregados e têm dificuldades para julgar e acompanhar adequadamente os casos que chegam.
A deputada Andréia de Jesus, que é moradora de Ribeirão das Neves, também falou da necessidade de fortalecer a Defensoria Pública do município. Segundo ela, para conseguir atendimento no órgão, é necessário dormir na fila para pegar uma senha de atendimento.
Polícia Militar - Também o atendimento da Polícia Militar foi citado como um ponto de atenção. Segundo a escrivã Cristiane Dias, é comum ouvir das vítimas que já denunciaram os agressores outras vezes, mas acabaram revitimadas, que voltaram para os maridos ou companheiros porque gostam. A Patrulha de Atendimento à Violência Doméstica da Polícia Militar, que começou a funcionar em Ribeirão das Neves há pouco mais de um ano, de acordo com Cristiane Dias, amenizou o problema.
A patrulha trabalha em parceria com a delegacia, que indica os casos em que as mulheres ou crianças estão em maior vulnerabilidade para que os militares façam visitas regulares para conversar com vítimas e agressores de forma a evitar violências mais graves. O problema, na avaliação da escrivã da delegacia da Polícia Civil, é que a patrulha da Polícia Militar do município conta com apenas dois policiais, um homem e uma mulher, o que é pouco para atender uma cidade de 400 mil habitantes.
Comissão deve visitar outras delegacias
Segundo a presidenta da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, deputada Marília Campos (PT), as parlamentares devem visitar todas as delegacias especializadas da Região Metropolitana da Capital nas próximas semanas. O objetivo é entender quais são os principais gargalos e como o atendimento da legislação pode ser efetivado.
A parlamentar lembrou que as leis brasileiras de proteção à mulher, como a Lei Maria da Penha, são avançadas e que é necessário garantir seu cumprimento.
A deputada também disse que a comissão está empenhada em criar formas de prevenir as violências de gênero a partir, por exemplo, de ações educativas. Ela lembrou que na recente reforma administrativa de Minas Gerais, proposta pelo governador Romeu Zema e votada na ALMG, a competência de atuar nas políticas de proteção às mulheres não estava prevista, mas que as deputadas da comissão conseguiram, por meio de emenda, incluir a competência na Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedese) e ressaltou a importância de ter essa articulação junto ao Poder Executivo.