Dados do Ministério da Saúde apontam que o Brasil teve 184 mil novos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes entre 2011 e 2017

Debatedores defendem educação sexual para combater abuso

Segundo participantes de audiência, a falta de discussões sobre gênero e sexualidade torna as crianças mais vulneráveis.

14/05/2019 - 16:05

A necessidade de discutir questões ligadas a gênero e a educação sexual nas instituições de ensino, desde a pré-escola, bem como a importância de fortalecer a rede de apoio e enfrentamento à violência sexual, foram salientadas pelos convidados de audiência pública da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na manhã desta terça-feira (14/5/19). A reunião foi marcada em função das atividades do Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes (18 de maio).

Segundo dados do Ministério da Saúde apresentados pelo representante do Fórum Interinstitucional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes de Minas Gerais, Moisés Barbosa Costa, o Brasil teve 184 mil novos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes entre 2011 e 2017.

Cinquenta e um por cento desses casos foram contra crianças de 1 a 5 anos de idade, e em 69% deles o abusador é um membro da família. “É por isso que a escola precisa tratar desse assunto desde cedo, as crianças precisam aprender a diferenciar um toque de carinho e um de abuso”, disse.

Pedagogo e professor da rede municipal de ensino de Belo Horizonte, Moisés Costa defendeu que a educação sexual seja oferecida desde a pré-escola.

O coordenador da Frente de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Minas Gerais, Manuel Afonso Dias Muñoz, concordou e disse que as pesquisas internacionais deixam claro que a falta de discussões abertas sobre gênero e sexo aumenta a vulnerabilidade de crianças e adolescentes a esse tipo de violência. “Não podemos tratar essas questões como imorais e mantê-las como tabu porque isso é um risco para as crianças”, afirmou.

Ambos os convidados fizeram coro com os demais ao afirmar que a rede de enfrentamento ao problema está mais fraca do que há uma década. Uma ação que, segundo os presentes, já foi ostensiva e acabou abandonada foi a de promoção de campanhas educativas.

“Falar que é crime, divulgar telefones de denúncia, incentivar a comunidade a participar do combate a essa violência é essencial especialmente porque se trata de um problema que acontece no ambiente privado e familiar”, disse Eliane Quaresmo de Araújo, vice-presidenta do Conselho Estadual da Criança e do Adolescente de Minas Gerais.

Um dos passos que, para os presentes, precisa ser dado para fortalecer novamente a rede é a retomada da Frente Parlamentar de Prevenção e Combate à Violência Sexual. O deputado Professor Cleiton (DC) afirmou que a Frente já está sendo recriada e conta com o número de assinaturas de parlamentares necessárias.

A deputada Ana Paula Siqueira (Rede) reforçou que é importante unir esforços para prevenir e combater o problema. Já o deputado Doutor Jean Freire (PT) disse que seu município natal, Itaobim (Vale do Jequitinhonha), já foi conhecido pela exploração sexual de crianças e que as campanhas de conscientização foram importantes para ajudar no combate ao problema. 

Municípios pobres concentram maior número de vítimas

A importância de se regionalizar as ações também foi destacada pelos convidados. Manuel Muñoz afirmou que os municípios mais vulneráveis economica e socialmente, conforme classificação dos últimos dados do IBGE, de 2010, são também os com maiores índices de exploração sexual de crianças e adolescentes. Esses municípios são, segundo ele, frequentemente localizados às margens de grandes rodovias federais e, assim, seria importante a participação da Polícia Rodoviária na rede de enfrentamento.

Também pensando na regionalização das ações, a coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, Paola Domingues Botelho, disse que tem sido desenvolvido pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) um roteiro de atuação para os municípios nos casos em que as violências se concretizam.

Ela lembrou que a legislação já é protetiva, em especial no que diz respeito ao “depoimento especial”, no qual determina-se uma escuta cuidadosa e qualificada das vítimas, de forma a acolhê-las e não revitimá-las. Assim, é necessário, para ela, qualificar os atores da rede para garantir o adequado cumprimento da legislação.

A superintendente de participação e diálogos sociais da Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania, Letícia Silva Palma, disse que a atuação da pasta tem sido no sentido de oferecer capacitação para os atores da rede. 

Geração de dados ainda é desafio

Outra demanda apresentada por Manuel Muñoz é um sistema integrado e confiável de geração de dados que possam subsidiar as políticas públicas do setor. Ele ressaltou que existem dados sobre denúncias feitas no Disque 100 e do Ministério da Saúde sobre os casos atendidos em hospitais, mas não há nenhuma forma de acompanhar esses casos.

Assim, sabe-se o número de denúncias, mas não se sabe quantos desses casos foram investigados, quantos foram judicializados, quantos foram resolvidos. Ele também salientou a importância de se criar um controle efetivo para circulação de conteúdo on-line de pedofilia e sugeriu entender melhor as experiências da Inglaterra e do Canadá, que, segundo ele, têm programas efetivos nesse sentido.

Consulte o resultado da reunião.