O debate público tratou dos direitos humanos como princípio determinante para a consolidação da democracia e o pleno exercício da cidadania

Debate público defende resgate dos direitos humanos

Primeiro evento do tipo realizado na legislatura ressalta necessidade de resistir ao desmonte da Constituição de 1988.

08/05/2019 - 19:57

A necessidade de resistir à desconstrução de direitos conquistados desde a Constituição de 1988 e de resgatar os que foram perdidos foi a principal mensagem dos participantes do debate público realizado nesta quarta-feira (8/5/19), pela Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). O evento tratou dos direitos humanos como princípio determinante para a consolidação da democracia e o pleno exercício da cidadania, atendendo requerimento da deputada Leninha (PT).

Presidente da comissão, Leninha abriu o evento listando as razões que tornam fundamental o debate. “É um momento de crise econômica e política, em que estamos devolvendo 13 milhões de pessoas para as filas do desemprego, um momento de violência e de marginalização crescente das populações carentes”, afirmou a deputada. Ela também criticou a ausência proposital de políticas públicas federais para combate ao feminicídio, à tortura e à violência contra minorias, tais como os indígenas e a população LGBT.

Já a deputada Beatriz Cerqueira (PT) manifestou seu estranhamento com a hostilidade de alguns grupos contra os direitos humanos. “É um momento tão estranho, que temos que defender o que antes era óbvio. Ouvi de um deputado, aqui na Casa, que as pessoas têm direito à terra é no cemitério”, lamentou a parlamentar.

Entre os participantes, a presidente da Associação de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade, Maria Teresa Santos, cobrou que a Assembleia crie uma comissão itinerante que leve o debate sobre direitos humanos para a periferia. "Aqui, tenho certeza que todo mundo está cansado de saber tudo isso que foi falado", afirmou.

Debatedores defendem mobilização otimista e internacional

Ao discutir os desafios atuais para os direitos humanos, o debatedor Paulo Vannuchi defendeu o otimismo. “Já enfrentamos momentos mais duros e revertemos”, afirmou. Vannuchi integra a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns, criada em fevereiro deste ano para denunciar casos de violações de direitos humanos que envolvam morte ou tortura.

Vannuchi ressaltou que explicar a importância dos direitos humanos é uma necessidade evidente, tendo em vista o grande número de pessoas dispostas a ir para a rua, de verde-amarelo, para pedir a volta da ditadura. “Ainda existe uma visão de que não houve violações massivas de direitos humanos (durante a ditadura militar)”, afirmou.

A advogada feminista Mariana Prandini, do Coletivo Margarida Alves, traçou um histórico dos direitos humanos, desde a Revolução Haitiana (1791-1804), impulsionada pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, criada durante a Revolução Francesa (1789). “Foi a única revolução escrava do mundo”, ressaltou a advogada.

Ela comentou os desdobramentos históricos que resultaram em lutas mais segmentadas, tais como o movimento feminista. Mariana Prandini salientou a necessidade de uma prática internacionalista dos direitos humanos, tanto para se opor a um “nacionalismo regressista” que vivemos no Brasil, como também a uma articulação transnacional em favor da desigualdade.

Outro debatedor, Darci Frigo, explicou como se desenvolveu essa articulação internacional em favor dos grandes grupos econômicos, por meio da reafirmação do neoliberalismo e da doutrina do choque (ou do capitalismo do desastre). Frigo coordena a Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Dhesca Brasil).

Comentando o pronunciamento de Frigo, a deputada Marília Campos (PT) defendeu a necessidade de se fortalecer a democracia participativa e criticou o governo federal, por sua iniciativa de acabar com diversos conselhos representativos, em diferentes setores. “O governo tenta acabar com a democracia participativa”, afirmou.

Restrições a políticas públicas de direitos humanos são criticadas

Ao apresentar um segundo tema de debate, a construção de políticas públicas de direitos humanos, a deputada Andréia de Jesus (Psol) condenou a ideia de se transformar o Estado em uma “empresa”, que ignora carências e necessidades básicas da população. “Para se discutir direitos humanos, é preciso antes ter alimento na mesa”, afirmou.

Ex-secretário especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (2003 a 2005) e ex-secretário de Estado de Direitos Humanos de Minas Gerais (2015 a 2018), Nilmário Miranda comemorou, em seu pronunciamento, a mobilização dos estudantes contra os cortes nas universidades federais. “A luta nas ruas é insubstituível. Não há rede social que substitua”, afirmou. Ele criticou a ideia de criminalização da luta social e descreveu como isso foi tratado nos governos de que participou. Também condenou a extinção da secretaria pelo atual governo estadual.

A promotora de Justiça Cláudia Spranger, coordenadora das Promotorias de Justiça de Defesa dos Direitos Humanos, Apoio Comunitário e Conflitos Possessórios Urbanos, defendeu a preservação da Constituição e de políticas públicas que buscam o bem-estar da coletividade. Ela também ressaltou a necessidade de transparência governamental para viabilizar uma participação qualificada da população nessas políticas oficiais.

Professor de Direitos Humanos da Academia da Polícia Militar de Minas Gerais, o capitão PM Francis Albert Cotta afirmou que o papel das forças de segurança, em um Estado democrático, é garantir os direitos de todos, de forma que elas não sejam instrumentalizadas por uns poucos. Segundo ele, no Brasil, isso é dificultado pela mentalidade autoritária.

Atendendo solicitação de um participante, foi proposto pela deputada Marília Campos um requerimento para que o Executivo cumpra a Lei 23.137, de 2018, que obriga o Estado a indenizar os filhos de pessoas com hanseníase que, no passado, foram separados compulsoriamente de seus pais.