Sociedade civil e parlamentares divergiram sobre a necessidade de se aprovar rapidamente regras mais duras ou prolongar ainda mais o debate
Cruzes com os nomes das vítimas da tragédia em Brumadinho foram colocadas no auditório
Movimentos sociais cobram esclarecimentos sobre projeto das barragens

Projeto sobre barragens deve incluir novas restrições

Proibição de construir estrutura administrativa em área de autossalvamento estaria entre as novidades.

21/02/2019 - 17:18 - Atualizado em 21/02/2019 - 19:06

Durante audiência pública realizada nesta quinta-feira (21/2/19) pela Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), deputados mineiros afirmaram que o debate realizado com integrantes de outras instituições já garantiu a inclusão de novas restrições à operação de barragens de rejeitos de minério ao Projeto de Lei (PL) 3.676/16, que dispõe sobre o licenciamento ambiental e a fiscalização de barragens no Estado.

De acordo com o presidente da comissão e relator do projeto, deputado João Magalhães (MDB), o substitutivo (novo texto) para o PL 3.676/16 está sendo formatado com a participação do Ministério Público, da Agência Nacional de Mineração (ANM), da superintendência regional do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e da sociedade civil.

Um dos participantes do debate para elaboração do novo texto, o deputado João Vítor Xavier (PSDB) citou algumas novidades que serão incluídas no substitutivo. Segundo ele, o novo texto deverá acatar quase a totalidade do PL 3.695/16, de iniciativa popular, que trata do mesmo tema e ficou conhecido como “Mar de Lama Nunca Mais”, além do PL 5.316/18, de sua autoria, que institui a Política Estadual de Segurança de Barragens.

Uma das novidades, segundo João Vítor Xavier, é um capítulo completo sobre descomissionamento (desativação) de barragens, incluindo sua descaracterização, que implica na retirada de toda a água da estrutura. Essa sugestão, segundo o deputado, foi incluída a partir de sugestão do Ibama.

Também deverá ser acatada, segundo João Vítor Xavier, proposta da ANM de proibir a construção de estruturas administrativas e profissionais na área de autossalvamento, que está imediatamente abaixo das barragens. A existência dessas estruturas foi determinante para o grande número de vítimas causado pelo rompimento da barragem da mineradora Vale no município de Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte), no dia 25 de janeiro.

Uma terceira novidade é a determinação de que o Ministério Público Federal seja incluído nas mesas de discussão previstas no projeto. E uma quarta alteração citada por João Vítor Xavier é um tratamento diferenciado para barragens de pequeno porte, a fim de não prejudicar empreendimentos menores, tais como alambiques e pocilgas.

Sociedade civil quer ampliar prazo de discussão

Durante toda a audiência pública, foi intenso o debate e divergências entre os próprios parlamentares e também com representantes da sociedade civil sobre a necessidade de se aprovar rapidamente regras mais duras ou prolongar ainda mais o debate, a fim de garantir a participação mais ampla da sociedade civil.

O deputado Guilherme da Cunha (Novo) disse que, logo no início de março, diversos vetos passam a travar a pauta de votação do Plenário, o que pode atrasar muito a aprovação do PL 3.676/16. “Minha proposta é que a gente construa o que é possível agora. Nada impede que se discutam novas propostas depois”, afirmou. O deputado João Magalhães também disse que há uma preocupação de se dar uma resposta rápida à sociedade, com a votação do projeto em Plenário até segunda-feira (25).

Por outro lado, diversos deputados e representantes da sociedade civil defenderam uma discussão mais ampla, com mais tempo para a participação da sociedade. “A sociedade civil não teve acesso a esse novo texto, deve se dar a devida publicidade”, afirmou uma das coordenadoras do Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais (Gesta/UFMG), professora Raquel Oliveira. Para a coordenadora, se isso não for feito, a Assembleia estará construindo uma proposta autoritária.

Reunião foi suspensa para entendimentos

A audiência chegou a ser suspensa para entedimentos e teve, ainda, momentos de tensão, quando representantes de movimentos organizados e outras pessoas presentes na plateia pediram para fazer uso da palavra antes dos deputados.

Coordenadora do Movimento pelas Serras e Águas de Minas (MovSam), Maria Teresa Corujo cobrou a divulgação do texto proposto para o projeto. "Sem a disponibilização do texto não há como se tratar aqui de contribuições, o que é grave depois de duas tragédias", frisou, defendendo que fosse considerado no relatório da comissão o PL 3.695/16.

Após uma suspensão dos debates por duas horas, o dirigente nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Joceli Andriolli, considerou como avanço a proposta da comissão de elaborar um relatório partindo do projeto de iniciativa popular.

Insistiu, contudo, em que o parecer da comissão não seja votado nesta sexta (22), como pretendido, para que os movimentos tivessem mais tempo de verificar se ainda não existiriam lacunas relevantes na proposta.

MP - A representante do Ministério Público, Gisele de Oliveira, também pontuou que análise técnica do órgão considera que houve avanços nas discussões e que o PL 5.316/18 também aperfeiçoa o texto do Projeto Mar de Lama.

O representante da Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Hildebrando Canabrava, apresentou sugestões do órgão para o novo texto. Uma delas é que o plano de contingência seja submetido à análise não dos órgãos ambientais, mas dos órgãos de defesa civil, que teriam competência para isso. Também foi sugerida a proibição de licenças de operação corretivas, que permitiriam saltar etapas de licenciamento.

Deputados defendem resposta rápida

Durante a audiência, defenderam a criação da CPI da Mineração na ALMG deputados como Sargento Rodrigues (PTB), Raul Belém (PSC) e Léo Portela (PR).

"Em cidades como Itabira, a população está em pânico com riscos de barragens se romperem", frisou este último, comentando que o avô viveu no Córrego do Feijão, região de Brumadinho onde a barragem de rejeitos da Vale se rompeu.

Também apoiaram uma solução ágil para a situação das barragens os deputados Osvaldo Lopes (PHS), Coronel Sandro (PSL) e Alencar da Silveira Jr. (PDT), que ainda anunciou a apresentação, junto com o Colégio de Líderes da Assembleia, de uma emenda ao projeto em discussão. O objetivo, conforme frisou, é que seja garantida a repartição igualitária, entre Estado e municípios atingidos, do valor arrecadado com multas aplicadas ao setor minerário, como defendido na audiência pelo prefeito de Mariana (Central), Duarte Júnior.

A deputada Andreia de Jesus (Psol) e o deputado Cleitinho Azevedo (PPS) defenderam um debate mais prolongado, que permita uma participação mais ampla dos interessados. Já o deputado Professor Cleiton (DC) disse que a legislação deve incluir, entre outros pontos, um comprometimento formal de acionistas e executivos de empresas com a segurança de suas barragens.

O deputado federal Rogério Correia (PT-MG), que na legislatura passada foi o relator da Comissão Extraordinária das Barragens, que elaborou o PL 3.676/16, defendeu que projetos de lei contemplem também os atingidos por barragens e que haja a paralisação imediata de todas as barragens de rejeitos de minérios, com definição de prazo para seu descomissionamento. Também criticou a falta de punição aos envolvidos nas tragédias de Mariana e Brumadinho. 

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