Participantes da audiência temem perder direitos se ADFP 183 for acatada pelo Supremo Tribunal Federal
Sérgio, do MBV, disse que a liberdade da profissão vem da regulamentação
Músicos criticam possível desregulamentação da profissão

Músicos querem renovação de entidade representativa

Processo que tramita no STF pode significar o fim da Ordem dos Músicos. Debate na ALMG teve protesto da categoria.

09/08/2018 - 18:32

Representantes dos músicos do Estado temem que a aprovação da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 183 signifique o fim da Ordem dos Músicos do Brasil (OMB) e a precarização da profissão. A ADPF aponta inconstitucionalidade em 22 artigos da Lei 3.857, de 1960, norma que criou a Ordem dos Músicos do Brasil, estabeleceu requisitos para o exercício da profissão de músico e instituiu o poder de polícia sobre essa atividade artística.

O assunto foi discutido nesta quinta-feira (9/8/18), em audiência da Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

A ADPF 183 foi apresentada no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2009, pela então procuradora-geral da República, Deborah Duprat. A previsão é que o STF julgue a matéria em setembro deste ano. O principal argumento da autora da ADPF é que os artigos contestados são incompatíveis com a liberdade de expressão da atividade artística e com a liberdade profissional.

O artigo 18, por exemplo, prevê que todos os que se anunciarem músicos ficarão sujeitos às penalidades aplicáveis ao exercício ilegal da profissão. Já o artigo 16 determina que somente pode exercer a profissão de músico quem estiver regularmente registrado.

Participantes da reunião externaram a preocupação dos representantes da classe. A presidente do Sindicato dos Músicos Profissionais de Minas Gerais, Vera Pape, lembrou a origem da Lei dos Músicos, uma conquista da classe em 1960.

“A partir do fim dos cassinos, que empregavam muitos músicos, enfrentamos abandono, desprezo e desrespeito. A criação da Ordem foi exigência dos músicos, pra nos defender e fiscalizar nosso exercício. No entanto, durante a Ditadura, o presidente da entidade foi eleito pelos militares e a função dela foi descaracterizada”, explicou.

Ela também falou da atual situação do mercado, com contratos precários, falta de fiscalização e uma lei que necessita de atualização urgente. “Defendemos amplo debate, a democratização da Ordem dos Músicos por meio de eleições diretas e também políticas públicas que contemplem os músicos que querem se profissionalizar. Não podemos abrir mão da Ordem dos Músicos. Mas ela precisa mudar, com abertura de diálogo”.

A mestre em Direito pela UFMG e doutoranda pela Universidade de Lisboa, Sarah Campos, defendeu que a classe precisa se decidir sobre algumas questões antes que o julgamento aconteça.

“A vinculação à entidade deve ser ou não obrigatória? Precisamos avaliar. Uma legislação que coloca condicionantes fere o direito da população de exercer a atividade artística livremente? A proteção desse trabalhador tem de ter um arcabouço legislativo por detrás. O diploma feriria a liberdade artística? A pejotização (exigência de contrato com pessoa jurídica) não fere a liberdade artística? O couvert não deveria ser regulamentado? Qual percentual é do músico? Isso também não fere a liberdade de expressão? Todas essas ponderações precisavam ser levadas em consideração pelo STF”, concluiu.

O 1º-secretário da Ordem dos Músicos do Brasil, José Dias Guimarães de Almeida, ressaltou que a categoria dos músicos “não tem nada a ganhar” sem uma associação representativa ou carteira profissional de trabalho.

“Não existe nenhuma categoria que consiga direitos sem ter representação. Todos os dias, em todo lugar, lidamos com relações precárias de trabalho. Quando encontramos um lugar que nos trate corretamente, é exceção”, explicou. Ele também pediu uma maior participação dos músicos na Ordem. “Queremos as sugestões e críticas de vocês. Venham conversar conosco”, pediu.

Categoria não teria sido consultada - Representante do Movimento nos Bares da Vida (MBV), Sérgio Almeida Ribeiro da Silva falou da contradição apresentada pela ADPF, já que a liberdade da profissão vem justamente da regulamentação.

“O Ministério Público desconsidera os destinatários dessa norma, nós sequer fomos consultados, os mais interessados no assunto. O Estado quer retirar a norma jurídica em nome da nossa liberdade, sendo que a lei foi uma conquista que nos foi concedida. O próprio Ministério da Cultura reconheceu que essa ação é injusta. Aceitar a desregulamentação é aceitar o fim dos órgãos representativos e que os músicos percam seus direitos. Precisamos nos unir para que isso não aconteça”, enfatizou.

A presidente do Sindicato dos Professores da Rede Privada, Valéria Morato, ponderou que a entidade não deve acabar, mas, sim, ser reapropriada pela classe. “Vamos concorrer às eleições, recuperar a entidade e valorizar os músicos”.

Já o presidente da Associação do Coral Lírico de Minas Gerais, Wellington Villaça , reforçou que a APDF significará a diminuição dos direitos do músico e um sucateamento ainda maior na área musical. “E isso numa área que tem de trabalhar, estudar e se dedicar muito à profissão, mas cujo reconhecimento é pífio”, completou.

Autor do requerimento para a realização da reunião, o deputado Rogério Correia (PT) disse que a Cultura é apenas um dos setores cujos trabalhadores estão tendo seus direitos dilapidados no Brasil.

“Atualmente a Justiça do Trabalho está em xeque. Temos menos carteiras assinadas do que trabalhadores informais. A terceirização cobra um preço cruel, de maior jornada e exploração. E a Cultura é sempre a primeira a resistir em tempos difíceis. Quem se lembra da mobilização quando Temer tentou acabar com o Ministério da Cultura? Esse projeto de desmonte do País está em ampla expansão”.

Consulte o resultado da reunião.