Grupos de trabalho mobilizam pessoas em situação de rua
Participantes defendem ampliação de horários de atendimento e reorientação dos profissionais de segurança pública.
12/06/2018 - 15:09“Mostre o caminho”. Para Márcio Esperidião dos Santos, que já viveu nas ruas por oito de seus 57 anos, esse slogan exibido no Centro de Referência da População em situação de Rua (Creas Pop ou Centro Pop) é exemplo do que precisa mudar nesse tipo de serviço público. “O caminho não é colocar a pessoa em uma sala, vendo televisão”, afirmou Santos.
Há dez anos ele participa do movimento de pessoas em situação de rua e acredita que a melhor receita para tirar as pessoas dessa circunstância é uma combinação de emprego, moradia e uma mudança interior.
Em seu caso, essa mudança veio com o auxílio de uma igreja evangélica. “Fui para a rua por causa da cachaça. Perdi minha família, mas hoje ela voltou toda”, afirmou, complementando que há três anos voltou a ter moradia, pagando aluguel.
Márcio Santos é um dos participantes da etapa final do Fórum Técnico Plano Estadual da Política para a População em Situação de Rua, que acontece na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Nesta terça-feira (12/6/18), representantes desse segmento populacional, de entidades governamentais e da sociedade civil foram organizados em três grupos de trabalho que se reuniram na Escola do Legislativo.
O objetivo do encontro é discutir uma série de propostas para o plano de metas e ações que Minas Gerais deverá elaborar para implementação da Política Estadual para a População em Situação de Rua, instituída pela Lei 20.846, de 2013. O plano deverá ser encaminhado à ALMG pelo Poder Executivo.
Grupos de trabalho – O debate foi organizado em torno de três temas, cada um deles sob a responsabilidade de um grupo de trabalho. São eles: “Direitos Humanos e Cidadania”, “Moradia, Trabalho e Assistência” e “Saúde, Educação e Cultura”.
Moradia e trabalho, no entanto, são as palavras-chave prioritárias de qualquer receita para resolver esse problema social, que hoje não atinge apenas pessoas de baixa escolaridade.
Um dos exemplos disso é Francisco Januário Pereira, de 30 anos, que foi para as ruas após ficar desempregado, sendo obrigado a abandonar pela metade o curso superior de farmácia.
Passou por diversos pontos de Belo Horizonte, inclusive pela Praça da Assembleia. “Não gostei, muito frio”, recordou. Em abrigos públicos, também não se adaptou. Em um foi maltratado por quem administrava o local. Em outro, os albergados, que usavam drogas, eram o problema.
Seu principal obstáculo para superar essa situação é um círculo vicioso: não consegue um emprego por não ter moradia, e não pode sustentar uma residência por não ter renda além dos R$ 87,00 mensais do Bolsa-Família. “Eu já perdi quatro entrevistas de emprego por não ter um endereço fixo”, lamentou.
Participante reivindica ampliação do atendimento
Francisco trouxe ao Fórum Técnico uma proposta muito concreta: ampliação do horário de atendimento dos órgãos voltados para a população em situação de rua. “O restaurante popular não abre sábado e domingo. Onde vou comer? É muito ruim você ter que pedir a alguém para pagar um prato de comida pra você. Ninguém merece mendigar”, declarou.
A mesma ideia é dada por Francisco com relação aos dois Centros Pop mantidos pela Prefeitura de Belo Horizonte, nos bairros Floresta e Barro Preto.
Eles funcionam de segunda a sexta-feira, das 9 às 17 horas. Nos locais, são realizados atendimentos individuais e coletivos, encaminhamentos a serviços e projetos socioassistenciais e demais políticas públicas.
Outra proposta que Francisco considera prioritária na discussão promovida pelo Fórum Técnico é a capacitação dos profissionais de segurança pública, para que tratem as pessoas em situação de rua de uma forma mais adequada, sem violência.
“Eu não tenho família aqui, eu tenho que contar com a polícia. E eles são os primeiros a chegar com violência, chutando as nossas coisas”, relata.
Moradias populares - Os debates reuniram representantes de diversas regiões do Estado. Rogério Avelino dos Santos, de 50 anos, veio de Governador Valadares (Rio Doce).
Sua rotina se alterna entre os albergues públicos e as ruas. O que mais pretende defender é a utilização de imóveis públicos, abandonados, para a instalação de moradias populares. “Em Valadares, há postos policiais de três andares, em construção, que estão parados há muito tempo”, afirmou.
Outra queixa de Rogério Santos é a disponibilização de equipamentos para suporte médico de emergência, nos albergues públicos. Isso porque muitos dos albergados têm sequelas respiratórias ou outras, em consequência do uso de drogas.
“Já tivemos que sair correndo durante a madrugada para levar um colega ao hospital, porque não tínhamos um aparelho de nebulização”, afirmou.
As deliberações do Fórum Técnico Plano Estadual da Política para a População em Situação de Rua se encerram nesta quarta, em uma plenária final, na sede do Poder Legislativo.