Representantes dessas comunidades acusam o Executivo de atuar contra as instituições, por questões ideológicas dos gestores das políticas públicas
Cláudia Pequeno disse que o governo estadual assume o atraso dos repasses desde junho de 2017
Governo informa que está regularizando a situação do pagamento das entidades

Governo garante continuidade do programa Aliança pela Vida

Comunidades terapêuticas questionam interrupção do encaminhamento de dependentes químicos e do pagamento de serviços.

21/02/2018 - 20:00

Apesar do atraso no repasse de recursos e dos obstáculos burocráticos que atualmente impedem o encaminhamento de dependentes químicos às comunidades terapêuticas, o Governo do Estado garante a continuidade do programa Aliança pela Vida, criado em 2011 para atuar na prevenção ao uso de drogas e prestar assistência aos usuários.

A afirmação é da diretora de Redes Assistenciais da Secretaria de Estado de Saúde (SES), Claúdia Pequeno, que participou de audiência pública da Comissão de Prevenção e Combate ao Uso de Crack e Outras Drogas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) nesta quarta-feira (21/2/18).

Durante a reunião, diversos representantes de comunidades terapêuticas acusaram o Poder Executivo de atuar contra essas instituições, por motivação ideológica dos gestores das políticas públicas voltadas ao setor. Essa postura estaria embasada na discordância em relação à adoção de práticas religiosas nesses estabelecimentos, bem como à internação e ao isolamento social dos dependentes, que integrariam um novo modelo manicomial.

Diante desse contexto, os responsáveis pelas CTs, como são conhecidas as comunidades terapêuticas, temem pelo fim do programa, que financia suas atividades em um trabalho de parceria com o poder público.

“Neste governo, houve muito retrocesso no Aliança pela Vida. Não há articulação entre os órgãos públicos e as comunidades terapêuticas”, afirmou Billy Pena, membro da Federação Brasileira das Comunidades Terapêuticas Católicas e Instituições Afins (Febrac).

Ele denunciou que um agente público já chegou a abordar um interno da Fazenda Renascer, local que coordena, dizendo que aquele não era um local adequado para o interno. Em relação aos débitos do governo com a instituição, Billy alega que 1.211 diárias estão em atraso.

Situação semelhante descreveu a assistente social do Centro de Recuperação Contra as Drogas de Juiz de Fora (Zona da Mata), Evelyn Gobbi. Ela cobra o pagamento de dois anos de serviços prestados pelo programa. Evelyn também classificou como muito difícil a articulação com o Centro de Atenção Psicossocial (CAP) no município.

Segundo Gabriel Cascardo, da comunidade Comvida, de Muriaé, também na Zona da Mata, coordenadores do serviço desestimulam o encaminhamento de dependentes às CTs. Ele inclusive já ouviu relatos de que funcionários do CAP no município teriam aconselhado dependentes a usarem drogas mais leves, em vez de buscarem qualquer tipo de internação. Ex-dependente químico, hoje ele é subsecretário de Saúde de Muriaé.

Participantes da audiência também denunciaram que teriam sido prometidas bonificações aos CAPs que não enviarem pacientes para as comunidades.

Software é entrave para o encaminhamento de dependentes

Claúdia Pequeno, diretora da SES, explicou que a política estadual de atenção aos usuários de álcool e drogas define as comunidades terapêuticas como um lugar de abrigamento transitório. Ou seja, o programa credencia e habilita as instituições para custear atividades de suporte ao tratamento, serviço que fica a cargo da rede básica de saúde, de unidades de urgência e dos próprios CAPs, por exemplo.

Conforme informou, hoje 52 CTs estão credenciadas: 27 aptas a receber usuários, com um total de 450 vagas, com contrato válido até 2019; e 25 contratadas por meio de um edital já expirado e, por isso, com suas habilitações vencidas. Aderiram ao programa no Estado 246 municípios.

De 2015 a maio de 2017, foram repassados R$ 8,5 milhões para as comunidades terapêuticas. O governo assume o atraso dos repasses relativos aos serviços prestados desde junho do ano passado. Para fortalecer o programa e o relacionamento com as comunidades, o Executivo elabora um novo edital de contratação e o desenvolvimento de um novo sistema de monitoramento de vagas nas CTs.

Esse sistema é essencial para o Estado saber como direcionar os dependentes e para haver o controle dos serviços que precisam ser remunerados. O problema é que venceu em setembro de 2017 o contrato firmado com a empresa desenvolvedora do software, que se nega a fornecer o código do sistema para que a própria SES o administre. Sem esse controle, nenhum usuário pôde ser encaminhado para as comunidades terapêuticas desde então.

Deputados criticam posicionamento do governo

O deputado Antônio Jorge (PPS), que solicitou a audiência, criticou a SES por não ter tomado providências antecipadas para o problema. No seu entender, isso não pode ser desculpa para o não encaminhamento de pacientes às comunidades. Como alternativa, ele sugeriu a criação de um sistema manual.

O parlamentar também definiu como uma perseguição obscurantista a visão do Governo do Estado em relação às comunidades terapêuticas, que, na sua opinião, foram abandonadas. “Em 2013, foram executados R$ 45 milhões no Aliança pela Vida. Este ano, estão previstos apenas R$ 7 milhões para toda a Subsecretaria de Políticas Sobre Drogas”, comparou.

O deputado Dilzon Melo (PTB) se disse desesperançoso com a situação porque, no seu ponto de vista, além da falta de recursos para a saúde, falta também boa vontade. “O governo tem a capacidade de mandar para a Assembleia projeto dizendo que vai pagar a saúde com recursos da Lei Kandir, que não está nem em discussão”, exemplificou.

Para o deputado, as comunidades podem morrer por inanição, diante do não encaminhamento de pacientes pelos equipamentos da saúde mental. “Com a crise, aumenta o consumo de drogas. Falta responsabilidade ao governo”, criticou.

Consulte o resultado da reunião.