Movimento negro denuncia racismo em Juiz de Fora
Lideranças cobram solução para assassinatos de jovens negros na maior cidade da Zona da Mata.
04/12/2017 - 21:30 - Atualizado em 05/12/2017 - 11:04“A sociedade se acostumou a concentrar suas ações na punição, no controle e na violência da população negra. O estado brasileiro é violento com o corpo negro e Juiz de Fora não é diferente disso”. A reflexão é da representante do Movimento Candances Organização de Mulheres Negras e Conhecimento, Giane Elisa Sales de Almeida.
Ela participou de audiência pública da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) no município da Zona da Mata nesta segunda-feira (4/12/17), para debater o genocídio da população jovem negra.
Para ela, a violência contra o negro é uma realidade presente no imaginário social do País e que explica a situação vivenciada atualmente em Juiz de Fora, que já registrou até o dia 1° de novembro deste ano 125 assassinatos de jovens negros.
“Não podemos deixar de pensar nisso como um desejo de higienização dos espaços, e isso é um braço do racismo. Esse desejo está sempre presente no Brasil”, afirmou.
A representante do movimento Candances também fez uma correlação entre a violência contra os negros e o tráfico de drogas. Para ela, a política antidrogas no Brasil é um pano de fundo para os assassinatos nas periferias. “A narrativa de guerra às drogas é a que justifica os altos índices de mortalidade entre a juventude negra”, pontuou.
Oportunidades - Giane também disse que a expectativa de vida de um jovem negro é 23% menor do que a de um jovem branco. Por isso, defendeu a necessidade de se pensar novos olhares e estratégias para esse segmento da população. “A juventude tem que ter oportunidade de trabalho, educação e lazer”, disse.
Indicadores mostram desigualdade entre negros e brancos
O representante da Coordenação da Convergência Negra de Juiz de Fora, Martius das Chagas, apresentou dados para ilustrar as disparidades entre negros e brancos no município.
Segundo ele, a cidade é a terceira do Brasil com maior disparidade no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) municipal comparativo entre brancos e negros. “Isso significa que vivemos em uma cidade com duas populações distintas, sendo uma nivelada por baixo”, considerou Martius, que lembrou que 46% da população do município é negra.
Ainda pontuando as assimetrias existentes entre brancos e negros, ele disse que o analfabetismo atinge 2,16% da população branca e 5,71% da negra. No que se refere à renda per capita da população negra na cidade, ele disse que a média é de R$ 613, enquanto a da população branca chega aos R$ 1.380. “Se não tivermos um olhar diferenciado, não vamos conseguir corrigir essas distorções”, disse.
Morte de negros é vista como natural
Martius também falou sobre a naturalização das mortes das pessoas negras, que ele chamou de racismo. ”O pior é que as pessoas não ficam indignadas porque é morte de jovem preto de periferia”, disse. Segundo ele, o número de homicídios em Juiz de Fora vem aumentando ao longo dos anos. Em 2012, a cidade registrou 99 homicídios e, em 2016, o número de mortes chegou a 154, das quase 85% de pessoas negras com até 29 anos.
Na comparação de mortes por sexo, ele pontuou que a violência atinge mais os jovens negros homens do que as mulheres.
Deputado defende plano de enfrentamento de homicídios
Autor do requerimento para a realização da audiência, o deputado Cristiano Silveira (PT) defendeu que é preciso pensar a violência contra a juventude negra em um contexto nacional. Nesse sentido, ele afirmou que o Brasil não é um país pacífico, e a principal vítima da violência é a juventude negra. “A cada 23 minutos, um jovem negro é assassinado no Brasil”, disse.
O parlamentar também disse que a comissão vai propor ao Governo do Estado a elaboração de um plano estadual de enfrentamento ao homicídio jovem. Outro encaminhamento é no sentido de pedir à Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania da Câmara dos Deputados celeridade na tramitação dos projetos referentes à CPI que investigou o genocídio da juventude negra.
Nesse mesmo sentido, o secretário municipal de Desenvolvimento Social de Juiz de Fora, Abraão Gerson Ribeiro, ratificou a ideia de que a realidade da cidade faz parte de um contexto nacional e é consequência das políticas públicas executadas ao longo das últimas décadas. Segundo ele, a população negra e parda de Juiz de Fora é percentualmente menor do que as médias do Estado e do País, o que passa uma impressão errada de que o município enfrenta menos problemas com relação a esse segmento populacional.