Segundo professora da UFMG, 13 estudos mundiais mostram uma associação do marketing de bebidas alcoólicas ao aumento do consumo por jovens
Álcool pode causar intoxicação e hemorragia estomacal, afirma Marcelo Ribeiro
Antônio Jorge (centro) explica que cervejas e vinhos não são considerados álcool pela lei

Restrição à publicidade de bebidas tem efeitos positivos

Constatação é de pesquisadora da UFMG, que participou de reunião sobre projeto de lei com esse objetivo.

08/11/2017 - 19:59 - Atualizado em 09/11/2017 - 17:21

A restrição à publicidade de bebidas alcoólicas tem obtido resultados positivos quanto à redução no consumo desses produtos mundo afora. A constatação é da professora e pesquisadora da UFMG, Ana Lúcia Brunialt Godard, que participou, nesta quarta-feira (8/11/17), de audiência da Comissão de Prevenção e Combate ao Uso de Crack e Outras Drogas da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Solicitada pelo presidente da comissão, deputado Antônio Jorge (PPS), a reunião teve como objetivo debater o Projeto de Lei (PL) 4.729/17, de autoria dele, que proíbe a publicidade de bebidas alcoólicas no rádio e na TV entre 6 e 21 horas.

Ana Godard apresentou um quadro sobre consumo de bebidas alcoólicas na França, Itália e Inglaterra. Nos dois primeiros, que adotaram legislações e políticas restritivas à publicidade de bebidas, o consumo caiu progressivamente de 1964 a 2014. Já no caso do Reino Unido, que não adotou nenhuma medida, o uso de álcool cresceu significativamente no período.

Na França, segundo Ana Godard, em 1991 foi aprovada a chamada Lei Évin, que proíbe a publicidade de álcool, com algumas exceções. Segundo a norma, os comerciais só são veiculados em horários específicos e trazem informações sobre o produto em si, sem associações com modo de vida, sexo e outros apelos. São proibidos também comerciais em canais abertos e naqueles voltados para jovens.

Por outro lado, Ana Godard mostrou como a ausência de restrições à publicidade traz malefícios. De acordo com ela, 13 estudos mundiais mostram claramente uma associação do marketing desses produtos ao aumento do consumo por jovens.

Vítimas do álcool - O diretor técnico do Hospital João XXVIII, Marcelo Lopes Ribeiro, disse que atende pessoas vitimadas pelo abuso de álcool, com casos de intoxicação alcoólica e hemorragia digestiva alta, principalmente. Segundo ele, esse número tem crescido muito, especialmente entre jovens. “Em 2008, tivemos redução de 25% no consumo, com a entrada em vigor da Lei Seca. Mas depois, a fiscalização foi afrouxando”, lamentou.

Nessa linha, também falou o presidente da Associação Nacional pela Restrição da Propaganda de Bebidas Alcoólicas, Lincoln Ferreira Lopes. Ele avaliou que todo o dinheiro gerado pelo consumo de bebidas e pelos tributos cobrados torna-se pouco comparado ao que se gasta no sistema de saúde com a recuperação dos viciados e o tratamento das doenças associadas e dos traumas decorrentes do uso de álcool.

Proibição a comerciais de cigarro foi eficaz

O deputado Antônio Jorge lembrou que, no caso da legislação restritiva ao tabaco, o Brasil avançou muito. “Fizemos o dever de casa direitinho, ao tirar a propaganda de cigarro do rádio e da TV. Com isso, reduzimos em um terço o número de fumantes no País", afirmou.

Já a Lei Federal 9.294, de 1996, que buscava o mesmo efeito quanto às bebidas alcoólicas, acabou sendo prejudicada pela influência do poder econômico, segundo ele. A lei prevê que os comerciais desse produto só devem ser veiculadas à noite e não devem ser vinculadas a sexo, esporte e bem-estar. Mas, para fins da lei, só foi considerada bebida alcoólica aquela com graduação acima de 13 graus, o que deixou de fora a cerveja e alguns vinhos.

“Isso é motivo de piada em nível mundial. O fígado não difere uísque de cerveja; o que muda é só a velocidade com que a pessoa se embriaga. Uma garrafa de cerveja tem mais álcool que uma dose de uísque”, explicou.

Quanto ao PL 4.729/17, o parlamentar disse que identificou uma nova seara para legislar em nível estadual. Ele argumentou que, no Paraná, entraram com ação civil pública contra propaganda diurna de álcool. A indústria de bebidas recorreu e o caso foi para a segunda instância, onde o desembargador confirmou a proibição, afirmando que “não é porque o ente federal está permeado de outros interesses que as crianças e adolescentes do Paraná serão prejudicadas”.

Projeto de lei recebe apoio

Gilmar de Assis, promotor do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Defesa da Saúde, declarou seu apoio e afirmou que a lei federal é inconstitucional. “Ela viola vários princípios constitucionais, como o da relevância da saúde, e o Código de Defesa do Consumidor”, apontou. Ele sugeriu que a ALMG faça uma representação contra a lei, mostrando sua inconstitucionalidade, no que recebeu resposta positiva do deputado Antônio Jorge.

Outros parlamentares manifestaram apoio à restrição à publicidade das bebidas alcoólicas. Segundo o deputado Missionário Márcio Santiago (PR), nos últimos dez anos, houve aumento de 43% no consumo de álcool no País e a ingestão de bebida é a principal causa de morte de jovens de 15 a 20 anos.

Também o deputado Leo Portela (PRB) qualificou a lei federal como mais uma agressão sofrida pela família brasileira. “O lobby das empresas de cerveja no Congresso é imoral. Não admitimos que os lacaios a serviço dessa indústria continuem fazendo mal à sociedade”, opinou.

Já o deputado Dilzon Melo (PTB) alertou para as pressões que virão da indústria de bebidas e da mídia. “É importante o apoio de toda a sociedade, pois não será uma batalha fácil. Mas esse é um projeto em favor da família, das futuras gerações”, concluiu.

Consulte o resultado da reunião.